Hoje, no meio do trânsito, ouvi uma notícia que fui depois confirmar (aqui, no Público). O Governo reduz a tributação sobre o gasóleo nas zonas de fronteira para evitar que as empresas vão abastecer a Espanha, onde o preço é suficientemente mais baixo para valer a pena a deslocação.
É uma opção política, mas legitima, podendo-se discordar ou não.
O que me chamou a atenção foi a afirmação que surge no final da noticia:
“O Governo já afirmou que a medida não deverá ter impacto nos cofres do Estado, estimando que a perda de receitas fiscais por via do reembolso (que rondará os 150 milhões de euros) seja compensada com um aumento do volume de abastecimentos feitos nos postos portugueses.”
É aqui que o Governo devia ir consultar os seus economistas no Ministério das Finanças e colocar-lhes uma pergunta simples: Qual o valor estimado para a elasticidade procura preço de gasóleo que é compatível com esta afirmação?
Esta formulação é bastante técnica, mas explica-se rapidamente – quando se altera uma taxa de imposto altera-se o preço final do produto, se o preço final se altera espera-se que o consumo do mesmo produto reaja (baixando se o preço aumenta, aumentando se o preço baixa). Para a receita fiscal se manter constante é preciso que o efeito indirecto de aumento de consumo em Portugal (por desvio de consumo que estava a ser feito em Espanha) compense o efeito directo de se cobrar menos imposto em todos os consumos que são feitos em Portugal (o imposto não discrimina entre quem iria ou não iria abastecer em Espanha, por ser impossível conhecer esse padrão).
Esta sensibilidade do consumo ao preço é conhecido tecnicamente por “elasticidade procura preço”. E no caso destes impostos, terá que ser elevada (superior a 1) para que esta neutralidade fiscal se verifique. Um estudo antigo, de 2001, (não encontrei nenhum recente numa busca rápida) indicam que esta elasticidade no curto prazo está bastante abaixo de 1, embora aqui se esteja a tratar de um subconjunto de consumidores de gasóleo que poderão ser mais sensíveis ao preço que o média do consumidores.
Ou seja, a informação conhecida sobre os fundamentos económicos do sector sugere que é improvável que a receita fiscal se mantenha constante (ou aproximadamente constante), como foi afirmado, pelo que cabe ao Governo fazer prova de que realizou os cálculos necessários para que tal seja uma expectativa razoável. Até os pode ter feito, e nesse caso deveria divulgar para dar credibilidade à afirmação. De outro modo, é “politicalware” – afirmações para justificar mesmo que não tenham suporte real.
Curiosamente, se subir ou descer este imposto fosse neutral do ponto de vista fiscal, porque é que houve a preocupação de o subir anteriormente? (por causa dos consumidores de combustíveis que não têm possibilidade de ir a Espanha, e têm por isso uma procura que não se pode alterar muito – baixa elasticidade procura preço – ?)