Momentos económicos… e não só

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o investimento público, uma vez mais a sair da sombra…

As discussões sobre investimento público e o seu papel para o crescimento económico seguem ciclos, e com o início da corrida para as eleições legislativas vão começar a surgir os apelos para a despesa pública. E claro que toda a despesa que se anuncie não é despesa, será investimento público, e investimento público é obviamente bom, sobretudo se for em infra-estruturas (logo, tudo será infra-estrutura de alguma coisa, naturalmente). Será?

O investimento público não é bom ou mau por si mesmo. Numa perspectiva macro associada com Keynes, a ideia de que qualquer despesa pública é boa para o crescimento económico, tem que ser vista nas respectivas condições em que foi defendida e se estamos a falar num curto prazo com excesso de capacidade ou a pensar num longo prazo com crescimento da produtividade e da capacidade produtiva da economia. Até porque aprendemos da forma mais dura que financiar despesa pública com dívida crescente tem os seus riscos (é preciso alguém tomar a dívida, naturalmente).

Pensando na capacidade produtiva da economia, interessa saber qual o retorno (social) do investimento que é realizado. E aqui Portugal não tem sido historicamente brilhante. Ou seja, em média, decide-se mal quais os projectos de investimento público que são realizados. Alguns dos projectos até terão uma boa taxa de retorno no investimento realizado, mas outros com maus resultados reduzem a taxa de retorno média.

Assim, quando se volta a falar de investimento público, será fundamental que se falem dos mecanismos pelos quais esse investimento público é seleccionado em termos de projectos concretos – em vez de falar de uns quantos milhões para estradas e/ou equipamentos sociais (e até às eleições isso vai surgir), que se refiram quais os projectos concretos, que se dê tanto quanto possível a base de evidência para a taxa de retorno desse investimento, e já agora o registo de projectos realizados e seus resultados dos proponentes  desse investimento – sei que talvez seja injusto, mas propostas de investimento de quem no passado apenas conseguiu falar de “elefantes brancos” em termos de investimento público devem ter aplicado um factor de desconto.

Mas não é só o investimento público que deverá ser escrutinado. Há igualmente projectos de investimento privado que têm de ser bem analisados, pois há alguma tentação de fazer com que os projectos privados sejam rentáveis desde que tenham apoio de fundos públicos.

Como leitura sugerida sobre a taxa de retorno do investimento público, António Afonso e Miguel St. Aubyn, Macroeconomic rates of return of public and private investment – crowding-in and crowding-out effects, European Central Bank, 2008. (publicado na revista The Manchester School, mas a versão working paper é gratuita), reproduzo abaixo a conclusão do artigo:

“Public investment can either crowd in or crowd out private investment. In strong crowding-out cases, it is possible that increased public investment could lead to a decrease in GDP. In our paper, by estimating VARs for 14 European Union countries, plus Canada, Japan and the United States, we estimated that, between 1960 and 2005:

– public investment had a contractionary effect on output in five cases (Belgium, Ireland, Canada, the United Kingdom and the Netherlands) with positive public investment impulses leading to a decline in private investment (crowding-out);
– on the other hand, expansionary effects and crowding-in prevailed in eight cases (Austria, Germany, Denmark, Finland, Greece, Portugal, Spain and Sweden).(In somewhat related work Zou (2006) reports that public and private investment have expansionary effects on Japanese economic growth, while in the US the relevance for economic growth of private investment is higher than the one from public investment.)

These effects correspond to point estimates and care should be taken in their interpretation, as 95 percent confidence bands concerning public investment effects on output always include the zero value.

When it is possible to compute it, the partial rate of return of public investment is mostly positive, with the exceptions of Finland, Italy, Japan and Sweden. Taking into account the induced effect on private investment, the total rate of return associated with public investment is generally lower, with the exception of France, and negative for the cases of Austria, Finland, Greece, Portugal and Sweden, countries where the increase in GDP was not sufficiently high to compensate for the total investment effort.

Private investment impulses, by contrast, were always expansionary in GDP terms and effects were usually significant in statistical terms. Public investment responded positively to private investment in all but three countries (Belgium, Greece and Sweden). The highest estimated return was in Japan (5.81 percent, partial), and there were very few cases of slightly negative private investment rates of return, either partial or total – Belgium, Denmark and Greece.”


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SATU – rest in pieces…

Esta semana soube da notícia da próxima extinção do SATU – Sistema Automático de Transporte Urbano, no concelho de Oeiras.

O SATU liga a estação da linha de Cascais de Paço de Arcos ao Centro Comercial OeirasParque. É uma obra do tempo de Isaltino de Morais na Câmara Municipal de Oeiras.

Tendo vivido muito tempo em Paço de Arcos, perto da estação, foi com algum carinho que vi nascer o SATU (apesar de já não beneficiar dele). E houve mesmo um ano em que tomei a resolução de andar pelo menos uma vez no SATU. Silencioso no deslocar, rápido, com pouca gente e uma vista magnifica sobre o Tejo. O mesmo sistema sem condutor do SkyTrain do aeroporto de Dusseldorf, só com menos passageiros.

E apesar da simpatia pelo SATU, as contas de exploração são terríveis. Ignoremos o custo do investimento, é custo afundado. Com base no relatório e contas de 2013, teve 170 586 viagens vendidas. As vendas de serviços prestados constantes da Demonstração de Resultados são 128 088 euros (menos de um euro por viagem vendida). Dá 467 passageiros por dia (incluindo feriados e fins de semana), com uma receita por viagem vendida de cerca de 75 cêntimos.

Os custos com pessoal são 161 950 euros, e a assistência técnica e manutenção do sistema, em regime de serviços especializados fornecidos à empresa, foram 846 796 euros. Juntando “custos das mercadorias vendidas e das matérias consumidas”, tem-se a soma de 1,056 milhões de euros. (O resultado líquido foi 2,27 milhões de euros).

Para cobrir apenas estes custos indispensáveis à exploração, ignorando todos os outros, seria necessário ao mesmo valor de receita média, multiplicar por 8,25 o número de passageiros diários, passar de 467 para 3854, o que não se afigura provável. É certo que nos transportes públicos podemos considerar alguns efeitos de externalidade de descongestionamento e até um certo subsídio público à exploração. Porém, o valor aqui envolvido para um subsídio de apoio é claramente excessivo.

A proposta de sobrevivência é chegar à estação do Cacém da linha de Sintra, o que não se afigura como sendo previsível num futuro próximo nem é claro que viesse a ter os passageiros necessários para tornar sustentável financeiramente.

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imagens e promoção de Portugal como destino de investimento

Dubai 2015 – Feira de investimento. Local onde se pode procurar atrair investimento estrangeiro, que todos dizem estar interessados em trazer para Portugal. Em paralelo decorre a 5th Annual Investment Meeting, com participação de Miguel Frasquilho, presidente da AICEP (ver aqui notícia no site da AICEP).

Stand com nome de Portugal – não é claro da foto que seja representação oficial portuguesa; mas mesmo que não seja é de elevado contraste a presença portuguesa (repito, mesmo que não oficial) com a de outras zonas geográficas que procuram atrair investimento, como a República do Sudão e a República do Tatarstão (Tatarstan no original). E de como o “selling point” de Portugal assenta nos Golden Visa e num poster!

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República do Sudão

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República do Tatarstão (Rússia)

Marrocos

Marrocos

República do Tatarstão (Rússia)

República do Tatarstão (Rússia)

Invest Saudi

Invest Saudi

Invest Saudi

Invest Saudi


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miopias

O Relatório do Banco de Portugal divulgado ontem (aqui) revela que a taxa de poupança aumentou no último ano e que os pensionistas são dos que mais poupam (p.125 do Relatório). E surgem logo alguns comentários de que esta informação poderia servir de argumento político para tributar mais os pensionistas, mas creio que é apenas e unicamente como alerta para o absurdo que seria tributar a poupança, e logo apenas a poupança de alguns. Esperemos que não se entre sequer nessa discussão, uma vez que esse é o tipo de erro fatal para a economia.

Por um lado, do ponto de vista macroeconómico, quer-se ter mais investimento privado. O financiamento desse investimento tem que ser feito preferencialmente a partir de poupanças privadas, e com mecanismos diversificados de fazer o encontro entre a poupança e o desejo de investir, ou seja, não ser sobretudo e quase apenas por intermediação bancária (depósito das poupanças, empréstimo dos bancos). Logo tributar a poupança é contrário a esse objectivo.

Por outro lado, do ponto de vista individual, o aumento da poupança privada em 2012, acima do que seria previsível com base nos elementos normais (ver o relatório do banco de portugal para mais detalhes), deveu-se muito provavelmente ao clima de incerteza gerada, as poupanças estão a ser feitas não por disponibilidade de rendimento e sim por precaução. Se essa poupança passar a ser tributada, seja por que via for, e aumentar impostos sobre os pensionistas é uma forma de tributar a poupança destes, então a reacção normal será passar essa poupança para consumo (que até pode ser de bens duradouros que possam ter papel similar) – se quanto mais se poupa mais se paga de imposto presente ou futuro, então poupar de forma visível perde interesse.

Mais do que tributação dos pensionistas, a discussão tem que ser colocada de outra forma. Tributar tem sempre um ar de penalização. Será preferível colocar a discussão num plano de justiça intergeracional e até mesmo de justiça intrageracional (mesmo entre os actuais pensionistas, pensões iguais podem ter correspondido a contribuições muito diferentes – a questão não será de legalidade, mas de equidade). Mas para fazer essa discussão é preciso muito mais informação. Não é da taxa de poupança dos pensionistas que se vai conseguir inferir algo sobre justiça intergeracional, e muito menos intrageracional.


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parlamento global

iniciei uma nova colaboração online há tempos, aqui, é no blog Parlamento Global, o segundo texto saiu hoje:

Investimento e apoios públicos

por Pedro Pita Barros, em 12.03.13

O reconhecimento de que depois de realizada a consolidação orçamental se torna necessário ter investimento produtivo para conseguir ter crescimento económico está a tornar-se generalizado.

 

Sendo em si mesmo um princípio razoável – a existência de investimento para ter crescimento – é fundamental também reconhecer que não basta aumentar as estatísticas que digam que o investimento aumentou, ou que as despesas classificadas como investimento aumentaram.

É elemento crucial é que seja investimento produtivo, com capacidade de gerar retorno para esse investimento. Investir em estradas, por exemplo, tem um baixo rendimento mesmo em termos sociais, dada a rede que já existe. Mas investir em capacidade produtiva significa identificar e conhecer que produtos e serviços são mais desejados, sobretudo nos mercados externos. A dimensão de Portugal e as actuais condições económicas e as do futuro próximo não vão permitir que um crescimento significativo e sustentado possa ser feito só com o mercado doméstico.

Ora, identificar as oportunidades de investimento produtivo que satisfaçam necessidades e procura de mercados externos não será exactamente fácil. Sobretudo não será feito a partir de gabinetes de organismos do estado. Não é uma questão de competência ou conhecimento de quem esteja nesses gabinetes. É uma questão de dimensão. Havendo provavelmente milhares de possibilidades, nunca esses gabinetes terão a possibilidade de as explorar todas, quanto mais criar os mecanismos para que uma oportunidade específica seja aproveitada por uma empresa portuguesa. É inevitável que sejam as muitas empresas e indivíduos com espírito de procura dessas oportunidades a fazer as suas tentativas e erro. Porque erros existirão. Nem sempre o que parece uma boa oportunidade terá o resultado esperado.

 

A exigência de rendimento do investimento é essencial para que a escolha das oportunidades seja feita de forma adequada, e para isso é necessário que quem investe corra o risco de ficar com os ganhos ou suportar as perdas. Essa avaliação não se faz em gabinetes por conta de outros.

 

O apoio ao investimento que é necessário não é uma questão de execução de verbas de financiamentos europeus. O apoio ao investimento é ajudar na selecção dos melhores projectos, o que num contexto globalizado e de múltiplas oportunidades significa dar condições para que a iniciativa das empresas e dos empresários se liberte, que sejam reduzidas as barreiras a essa iniciativa mas que não deixem de ficar com os louros do que fizerem e com as consequências negativas, se as houver. Só estaremos no bom caminho, em termos de políticas públicas, quando em vez de se perguntar ao governo qual foi a taxa de execução de uma verba vinda de Bruxelas se perguntar qual foi a taxa de rentabilidade média dos projectos que receberam algum apoio.