Momentos económicos… e não só

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E eis que “ela” volta à discussão, a produtividade

Pela mão da Moody’s (aqui), no seu mais recente relatório, embora só tenha visto o press release (não tenho acesso ao documento mais substancial), a “culpa” de não haver uma visão mais simpática está na evolução previsível da produtividade, que até aumentou recentemente.

Oops, mas não era isso que queríamos? Sim, mas …
O mas ė aqui importante e a Moody’s tem motivo para chamar a atenção. Portugal tem feito ajustamentos no passado na sua produtividade agregada – pib / valor acrescentado por trabalhador – que resultaram de redução do número de trabalhadores mantendo o valor acrescentado e não pelo aumento do valor acrescentado que se produz.

Com a actual crise aparentemente é esse mecanismo que voltou a funcionar (no passado foi algo que me chamou a atenção, ver aqui e ver aqui, e as visões há 10 anos de Pedro Lains e Miguel Lebre de Freitas aqui).
As empresas despediram mas conseguiram manter a produção. As empresas com menor produtividade, que geram menor valor acrescentado foram desaparecendo.
Em si mesma esta evolução ao nível de cada empresa é melhor do desaparecer, seria melhor que as empresas tivessem conseguido aumentar o valor acrescentado do que produzem e mantido o emprego. O ajustamento feito poderia ter sido melhor (podia ter sido pior também mas devemos ser exigentes).
Como esses trabalhadores que perderam o emprego não tiveram oportunidade de encontrar outro o desemprego atingiu níveis muito elevados e inéditos em Portugal.

O desafio que agora existe é conseguir simultaneanente dois objectivos – que as empresas consigam aumentar o valor acrescentado do que produzem e com isso recrutar novamente trabalhadores sem que a produtividade volte a baixar, e que os trabalhadores desempregados se direccionem para os sectores com maior crescimento e potencial de crescimento da produtividade.

A recuperação de empregos nos próximos anos não vai ser, é bom que não seja, nos mesmos sectores e empregos que foram destruídos na actual crise. As oportunidades mais interessantes para os desempregados vão estar noutras áreas e aqueles que mais rapidamente as descobrirem melhor resolverão a sua situação.

Esta transiçāo de trabalhadores para sectores diferentes daqueles onde trabalharam coloca maior responsabilidade no próprio desempregado. Será difícil que um qualquer centro de emprego consiga saber melhor que o próprio trabalhador que tipo de emprego mais o satisfaz fora do que foi a sua experiência passada. Os mecanismos de apoio público têm que descobrir como apoiar da melhor forma esta passagem de uns sectores para outros.

Ė este afinal o ponto central que deve ser retirado, a meu ver, do press release da Moody’s.


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sonhos desfeitos

Podemos pensar que a actual incerteza sobre as pensões e a quebra do “contrato informal” em que o sistema assenta sucede apenas em Portugal, mas não é correcto.

Na Holanda, em 2006, houve uma alteração das regras das pensões – a pensão para os que tivessem nascido depois de 1 de Janeiro de 1950 passou a ser 8,5% menor do que a pensão para quem se reformasse no mesmo ano mas tivesse nascido antes de 1 de Janeiro de 1950. A regra de formação da pensão foi alterada, como se pensa que poderá vir a fazer por cá uma vez mais.

Os trabalhadores nascidos a partir de 1950 tinham que trabalhar mais um ano e um mês para alcançar a mesma pensão dos trabalhadores nascidos antes de 1950 (soa familiar).

De Grip, Lindeboom e Montizaan, num estudo publicado em 2011, Shattered dreams: the effects of changing the rules late in the game, avaliavam a saúde mental dos trabalhadores dos dois grupos etários (nascidos antes e depois de 1 de Janeiro de 1950) num período de dois anos após a instituição das novas regras (avaliação em 2008).

Encontraram nessa comparação um forte efeito de aumento da depressão – 50% mais elevada nos trabalhadores mais novos – associado com a mudança legislativa.

Estas mudanças têm efeitos significativos e permanentes sobre a saúde mental dos trabalhadores. A novidade não está na existência do efeito, pois não seria difícil prevê-lo. A novidade está na magnitude do efeito, de um aumento considerável dessas situações de depressão.

Os custos de alterações legislativas no campo das pensões não estão apenas nos valores pagos ou na “corrida à reforma”; estão também na necessidade de maior acompanhamento da saúde mental dos trabalhadores, que tenderão a ter menos produtividade, terão maior absentismo laboral, maior propensão a erros profissionais e mesmo mais acidentes no local de trabalho.

Prolongar a vida activa por via administrativa e impondo uma idade de reforma mais elevada não vem sem custos para o sistema de saúde e e para o sistema produtivo.

Na origem destes efeitos não está apenas a diferença de valor da pensão resultante da alteração das regras. A existência de um sentimento de injustiça, sobretudo face a uma alteração de regras que deixou pouca margem de ajustamento aos mais afectados.

Num momento em que se considera, em Portugal, alterar os valores das pensões dos reformados, e não só para quem ainda está a trabalhar, de uma forma permanente, deverá haver o cuidado de pensar também quais os impactos na saúde mental das faixas populacionais afectadas, mais idosas, e para quem um corte da pensão terá um efeito psicológico negativo e reforçado pela sensação de não ter como responder. A forma de definir essas mudanças, a forma de a comunicar e o sentimento de “justiça” e “equidade” são cruciais, e deverá ser pensada que resposta de apoio pode ser dada pelo próprio Serviço Nacional de Saúde, ao mesmo tempo que estas medidas fornecem um exemplo quase perfeito de aplicação do princípio “health in all policies” (saúde em todas as políticas) que se defende na retórica e que se pode aplicar aqui na realidade.


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ainda em ritmo quase de férias,

sobre “QUANDO SE SENTE EUROPEU?” em poucas palavras, no dn de hoje,

Estando “Onde a terra se acaba e o mar começa”, sinto-me europeu quando vou de Lisboa a Berlim sem ter que mostrar identificação; quando levanto dinheiro numa caixa multibanco da mesma forma e com os mesmos custos em Coimbra, Toulouse, Barcelona ou Essen; quando entro em Espanha pela fronteira terrestre sem filas, sem verificação de passaportes, sem realização obrigatória de seguro, e sem troca de moeda.

Sinto-me europeu quando entro numa sala de aula e mais de metade dos alunos são oriundos dos quatro cantos da Europa. A fácil mobilidade, sentida e usufruída pelas gerações mais novas, é a melhor forma de construir uma identidade europeia que se adiciona, não substitui, uma identidade nacional.

A esta facilidade junta-se a liberdade política e a liberdade económica. A construção da identidade europeia tem que se fazer todos os dias, com a contribuição também de Portugal. É um esforço político, económico e social, feita de valores partilhados dentro das diferenças que existem e que nos levam a conhecer o “resto da Europa”.

Outras ideias de como se sentir europeu nos dias de hoje?


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texto a pedido do Jornal Público,

publicado a semana passada, sobre o legado de Vitor Gaspar.

 

Gaspar 1 Gaspar 2


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deja vu (quase perfeito)

das notícias de ontem chegaram ecos do final da recessão técnica – termo que significa apenas que os indicadores de actividade económica não decresceram no último trimestre medido face ao penúltimo, o que só é novidade porque há mais de dois anos que tal não sucedia.

Não será o final das dificuldades, nem ainda o retomar de um crescimento económico que reponha o nível de vida, desta vez alicerçado em produtividade e capacidade produtiva.

Em ritmo de férias, e face a estas notícias, decidi olhar para o lado e ver se haveria algum sinal coincidente. E fiquei com dúvidas.

Olho para a direita, e o local onde compro pão fresco de manhã, que abre às 8h30 às 9h00 já esgotou o pão (e não porque tenha muitos clientes), e o stock dos restantes produtos tem decrescido sucessivamente ao longo da semana, em produtos como alfaces, laranjas, fiambre embalado, etc… (aquelas coisas de tempo de praia). Está quase vazio. Quem está a atender e a gerir a lojeca quando inquirida só diz “não sei” (nisso mantém-se igual à situação de há dois anos). A crise toma aqui a imagem de prateleiras vazias, literalmente vazias, e não por falta de procura. Apesar da crise, pouco ou nada mudou no processo e na atenção ao cliente (mesmo que sazonal).

Olho para a esquerda, e penso nas tentativas dos últimos dias de marcar um restaurante para jantar, normal, e que nesta época do ano é melhor sempre tentar reservar mesa mesmo numa tasca ou casa de pasto. Surpresa, na segunda-feira não aceita reservas para o dia, nem para o dia seguinte, nem para o outro, isto só lá para sexta-feira. Ou a crise fez com que toda a gente viesse para o mesmo sítio, ou a crise acabou e face aos anúncios do fim da recessão técnica toda a gente decidiu comemorar. (enfim, quanto ao jantar, nada que uma água a ferver e umas massas não resolvam a contento).


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no outro lado do mundo,

mais precisamente em Darwin, encontra-se a empresa/aventura de um brasileiro, o Ricardo, que depois de ter feito os seus estudos e trabalhado em marketing decidiu partir “à procura de si mesmo”.  Acabou a fundar uma empresa que recicla materiais de lona usados nos “comboios de atrelados” (road trains, no termo original) que circulam pelas estradas desertas da Austrália.

Não se limitam a reciclar, mas incorporam design e funcionalidade nas peças que fabricam, e vendem-nas em mercados e feira. A foto que se segue é do mercado na praia de Mindil, onde duas vezes por semana se faz festa para ver o pôr do sol (o que é também um bom exemplo de como gerar receitas locais com base no turismo).

Demorou dois anos a passar da ideia ao “mercado”, com vários testes pelo caminho para desenvolver o conceito e perceber o que as pessoas estão dispostas a adquirir, não por ser reciclado mas pelo design e apesar de ser material reciclado.

A empresa chama-se afroblonde, e vale a pena uma visita. Não sei se vende apenas a turistas, mas segundo quem viu, é fácil encontrar nas cabeças que passeiam por Darwin os chapéus criados por esta “aventura”, e que não são baratos em valor absoluto e por comparação com os tradicionais chapéus australianos.

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voltando a um tema antigo

e que tem estado fora dos holofotes mais recentes – o cumprimento do memorando de entendimento e o objectivo de se atingir em 2013 um valor de 1% do PIB em despesa pública com medicamentos – em 2012, esse objectivo foi de 1,25% do PIB (embora este PIB tenha sido definido como um valor pré-determinado para tornar o objectivo independente da quebra da economia).

Para o ano de 2012 vigorou um acordo entre a APIFARMA (representante das principais empresas farmacêuticas) e o Governo que garantia o valor da despesa pública via uma devolução de verba caso fossem excedidos os objectivos fixados para a despesa pública no mercado em ambulatório e no mercado do medicamento hospitalar.

O primeiro passo para saber como estamos neste aspecto foi procurar os valores de 2012 para a despesa com medicamentos, na fonte habitual, a informação mensal do INFARMED. E se no caso da despesa em ambulatório essa informação está disponível, já no caso do consumo de medicamentos em meio hospitalar há um curioso “buraco”, o relatório referente a Dezembro de 2012 que conteria os valores do ano não está disponível, embora já estejam disponibilizados na internet os relatórios até Maio de 2013. É um mês “missing in action”, mas nenhum dos relatórios posteriores a Dezembro de 2012 permite perceber os valores do ano de 2012. Esta estranha característica pode ser confirmada aqui.

Assim sendo, houve que fazer uma “estimativa” do que seria o valor de Dezembro de 2012 baseado nos valores mensais conhecidos e assim criar uma série completa. O valor que procuro calcular em cada mês é o cumulativo dos 12 meses anteriores dividido pelo PIB de referência para estes objectivos, pelo que de alguma forma esse valor de Dezembro de 2012 mesmo sendo estimativa fica algo diluído no total.

Em 2013, com a integração das despesas com medicamentos da ADSE no total da despesa pública do SNS reportada, há um ligeiro aumento da despesa em ambulatório com medicamentos, mas que se deve a esse aspecto de contabilização. Com esta informação disponível para os primeiros 5 meses do ano, antecipa-se como muito improvável que o objectivo de 1% do PIB para a despesa pública em medicamentos seja atingida. Assim sendo, depois do Verão devemos começar a ver qual será a “solução”, que tanto pode ir de se ignorar o objectivo (se a troika deixar e tiver aspectos mais importantes das contas públicas com que se preocupar) como ter o uso da “arma” habitual pelo menos desde 2005, a descida administrativa de preços dos medicamentos, passando pela solução intermédia de retomar o acordo de pagamento retroactivo por parte da indústria farmacêutica, para passar o ano de 2013, e entrar em 2014 sem qualquer objectivo quantitativo para a despesa total pública com medicamentos.

Só estranho é o silêncio que se vai “ouvindo”.

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pensões e equidade

com o risco de me repetir nas ansiedades e perplexidades, continuo a não entender de todo a insistência em falar de equidade a propósito dos cortes das pensões. Falou-se, e continua-se a falar, de equidade e pensões sem haver qualquer explicação do que tal significa, para além de querer pensões iguais pagas pela Caixa Geral de Aposentações e pelo regime geral. Mas tem que existir a preocupação de definir o que é equidade neste contexto, o que é um sistema de pensões equitativo. É um sistema em que todos têm uma pensão de valor monetário igual, sendo irrelevante quanto e durante quanto tempo se contribuiu? É um sistema em que a pensão que se recebe reflecte apenas e integralmente a carreira contributiva? Que elementos de redistribuição se querem ter e com que intensidade? Qual a situação actual face a esses critérios de equidade? Como é que as alterações propostas correspondem a uma melhoria da equidade, segundo os critérios que tenham sido estabelecidos?

A falta de preocupação com essas explicações mínimas acabam por minar a credibilidade das propostas apresentadas, independentemente da sua adequação à actual situação económica.

É certo que é fácil recolher exemplos de abuso no sentido de a pensão paga pela CGA ser desproporcionada face às contribuições que foram realizadas, mas a existência desses casos não é motivo para fazer com quem teve uma carreira contributiva completa para a CGA tenha agora que sofrer uma penalização para compensar, agregadamente, os outros casos.

Admitamos que queremos tratar da mesma forma quem contribuiu de modo idêntico, tenha sido na CGA ou no regime geral. Admitamos, como parece ser o caso, que se toma o regime geral como ponto de referência. Então, para uma pessoa média no regime geral, veja-se qual o valor actualizado da sua carreira contributiva e qual o valor actualizado esperado dos valores de pensão de reforma que lhe serão pagos.

Para ser igual tratamento nos dois regimes, quem tiver a mesma carreira contributiva na CGA deverá ter a mesma pensão.

Como será complicado encontrar um caso exactamente gémeo em cada um dos dois sistemas, uma solução simples para aferir estes aspectos de equidade entre os dois sistemas seria começar por ver qual o rácio ( valor actualizado esperado dos valores de pensão de reforma que  serão pagos no regime geral)/(valor actualizado da carreira contributiva), e aplicar esse mesmo rácio aos descontos feitos para a CGA, obtendo-se assim o volume global de pensão a ser paga, dividindo pelos meses de vida esperados após a reforma encontrar-se-ia o valor mensal que pode ser comparado com o valor da pensão actualmente paga.

É um cálculo aproximado? é!

É um cálculo que exige informação detalhada sobre percursos contributivos? é!

Mas é melhor que nada, e não o fazer é procurar mascarar com uma capa de “equidade” medidas que podem nada ter de equitativo. A importância do assunto, e o tempo que já se teve desde que se iniciou a discussão sobre cortes nas pensões, mereceria que houvesse este cuidado.

A correcção das situações de desigualdade e de iniquidade que se geraram ao longo de anos pelas regras (legais) da CGA é um objectivo meritório. A forma de o fazer, se não for cuidada, poderá corrigir ou agravar essas situações (aliás, de imediato foram mencionadas logo excepções…todas legais certamente, mas se o argumento é de equidade, serão que são excepções que respeitam princípios de equidade?)

Nota final: o Prof. Carlos Pereira da Silva anda há uma década ou mais a falar da importância de se ter estes cálculos actuariais. Não se ter preparado o caminho conforme ele preconizava só mostra como a responsabilidade de cortes cegos nas pensões deve ser atribuída a sucessivas gerações de políticos e governantes.


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IPOs e avaliação das vantagens de novos medicamentos

ontem foi noticia uma queixa que surge periodicamente – houve a opção de não administrar um novo medicamento por não ter vantagem terapêutica face ao seu custo. Esta situação levanta sempre o véu sobre as opções dificeis que é necessário tomar no dia a dia no campo da saúde.

Esta é uma discussão que não é exclusivamente portuguesa, mas que em Portugal se tende a fazer pelo lado emocional apenas. Num contexto de falta de recursos, dar um medicamento novo e que implica uma despesa grande tem como consequência deixar de fazer qualquer outra coisa. E dentro das unidades de saúde, significa que é outra intervenção de saúde que deixará de ser feita. Saber se vale a pena implica conhecer os benefícios adicionais desse medicamento e também os custos em termos do que deixou de ser realizado. Por exemplo, é fácil e pouco visível cortar em prevenção e rastreio, os seus custos não são observáveis imediatamente.

Que a discussão não é simples é evidente, e o primeiro passo é saber que critérios devem estar presentes. Mas quando se fala de critérios surge a critica de se estar a “racionar”, apelando para um imaginário de escassez extrema e injusta.

Em Inglaterra começa-se agora a ter informação sobre o custo em termos de mortalidade num contexto de orçamento fixo das instituições de saúde de se introduzirem inovações que retiram verbas de outras intervenções – ver aqui.

Claro que se pode argumentar que o orçamento da saúde não deveria ser fixo, mas isso significa cortar nalgum outro lado, e então é necessário saber qual o seu custo social.

Acresce que a visão individual, de cada doente, tende a enfatizar os benefícios que pode retirar face a custos que são diluídos por muitos e frequentemente nem sequer perceptíveis.

Encontrar a forma de fazer a discussão dos critérios a usar neste tipo de decisões, e depois encontrar a forma de aplicar esses critérios, é algo que como sociedade teríamos toda a vantagem em conseguir fazer. As discussões acaloradas que periodicamente se geram não dão grande esperança quando à capacidade de o fazer. E nem sequer conseguiremos quantificar qual o custo em termos de saúde de não ter essa capacidade de organização.


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nas questões de energia,

é sempre útil dar atenção a Mira Amaral, no ionline. Embora não coloque as questões dessa forma, Mira Amaral identifica dois tipos de problemas. Um é político (que se torna jurídico) – a capacidade de influência de decisões políticas por parte de grupos, que depois são transformadas em leis ou contratos que solidificam posições e “rendas económicas”. A dificuldade de limitar as ditas “rendas excessivas” não é só política, é também legal. O segundo problema é económico, os custos de produção de cada tipo de energia têm que incluir os custos que criam ao sistema como um todo. E no caso das energias renováveis, a atenção centrou-se sempre na necessidade de atrair investimento privado e daí oferecerem-se taxas de remuneração do investimento seguras e muito atractivas, e com o amadurecimento das tecnologias e sua divulgação não se fez a passagem para uma remuneração “de mercado”, com incerteza e dependendo do mérito do desempenho apresentado, nem se passou a incorporar o custo imposto ao sistema para segurança da continuidade de serviço. Se percebi correctamente o argumento de Mira Amaral, como há imprevisibilidade no vento, é necessário ter centrais térmicas de produção de energia sempre preparadas para funcionar caso haja uma quebra inesperada na produção eólica de um momento para o outro. E esses custos não estão a ser pagos pela produção de energia eólica e sim pelos consumidores em geral. Chegando a este ponto, há que pensar no que possa ser feito, e infelizmente Mira Amaral não nos dá soluções (acredito que as tenha pensado, mas não as detalha no artigo).  A meu ver, há aqui duas actuações, que não são mutuamente exclusivas, podem ser consideradas – primeiro, saber qual a real imprevisibilidade do evento para se avaliar quanto de segurança adicional pelas centrais tradicionais é preciso manter (até é possível que já esteja a ser feito, espero que sim). Segundo, se há necessidade de um “seguro” contra a imprevisibilidade do vento (ou da água/chuva ou do sol), então deveriam ser as produtoras de energia renovável a pagar esse “seguro” – deveria ser um serviço pago pelas empresas de energia renovável, e retirado da conta dos consumidores. Ah, e não haverá o problema de essas empresas repercutirem esse custo sobre os consumidores? bem, se as remunerações auferidas por essas empresas estão fixas por contrato, não há razão para isso. Se não estão, então pelo menos nas suas decisões de produção passam a incorporar todos os custos relevantes da actividade, o que é sempre desejável.