Momentos económicos… e não só

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sobre o “Programa Nacional de Reformas 2015” (5)

(continuando)

  1. Reforçar a cooperação entre a investigação pública e o sector empresarial e impulsionar a transferência de conhecimentos. Não há aqui uma ideia nova. Na verdade achei muito similar em espírito ao documento “Centeno” para o PS. (ou vice-versa)
  2. Estabilidade do sistema financeiro, com atenção à detecção precoce de endividamento excessivo.

Porque não deixar os mecanismos económicos funcionar? Nem todas as empresas são viáveis, e tentar recuperar empresas a todo o custo poderá ser pior a prazo do que ter formas de apoiar de modo eficaz quem perde emprego a encontrar outro.

  1. Aplicar medidas no sector da energia, atuar sobre as regras que distorcem o funcionamento do mercado: neste ponto, o aspecto central, que é difícil de especificar, é como se vai lidar com as empresas do sector com um historial de forte poder de negociação.
  2. Aplicar plano de longo prazo dos transportes, investimentos e fusões, ajustamento das regras de regulação neste campo.
  3. Assegurar a sustentabilidade financeira das empresas públicas no sector dos transportes, com redução dos custos operacionais. E deixar de as usar como instrumento de investimento público ou de intervenção política junto das populações, também seria um passo acertado.
  4. Reforçar a eficiência e a concorrência no sector ferroviário: mas a descrição da experiência de outros países seria útil para saber o que funciona e o que não funciona. Nem todas as alterações neste sentido noutros países podem ser classificadas como rotundo sucesso.

(continua…mas será interrompida por uns dias para dar lugar aos comentários sobre a proposta de programa do PS para a saúde)


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nas questões de energia,

é sempre útil dar atenção a Mira Amaral, no ionline. Embora não coloque as questões dessa forma, Mira Amaral identifica dois tipos de problemas. Um é político (que se torna jurídico) – a capacidade de influência de decisões políticas por parte de grupos, que depois são transformadas em leis ou contratos que solidificam posições e “rendas económicas”. A dificuldade de limitar as ditas “rendas excessivas” não é só política, é também legal. O segundo problema é económico, os custos de produção de cada tipo de energia têm que incluir os custos que criam ao sistema como um todo. E no caso das energias renováveis, a atenção centrou-se sempre na necessidade de atrair investimento privado e daí oferecerem-se taxas de remuneração do investimento seguras e muito atractivas, e com o amadurecimento das tecnologias e sua divulgação não se fez a passagem para uma remuneração “de mercado”, com incerteza e dependendo do mérito do desempenho apresentado, nem se passou a incorporar o custo imposto ao sistema para segurança da continuidade de serviço. Se percebi correctamente o argumento de Mira Amaral, como há imprevisibilidade no vento, é necessário ter centrais térmicas de produção de energia sempre preparadas para funcionar caso haja uma quebra inesperada na produção eólica de um momento para o outro. E esses custos não estão a ser pagos pela produção de energia eólica e sim pelos consumidores em geral. Chegando a este ponto, há que pensar no que possa ser feito, e infelizmente Mira Amaral não nos dá soluções (acredito que as tenha pensado, mas não as detalha no artigo).  A meu ver, há aqui duas actuações, que não são mutuamente exclusivas, podem ser consideradas – primeiro, saber qual a real imprevisibilidade do evento para se avaliar quanto de segurança adicional pelas centrais tradicionais é preciso manter (até é possível que já esteja a ser feito, espero que sim). Segundo, se há necessidade de um “seguro” contra a imprevisibilidade do vento (ou da água/chuva ou do sol), então deveriam ser as produtoras de energia renovável a pagar esse “seguro” – deveria ser um serviço pago pelas empresas de energia renovável, e retirado da conta dos consumidores. Ah, e não haverá o problema de essas empresas repercutirem esse custo sobre os consumidores? bem, se as remunerações auferidas por essas empresas estão fixas por contrato, não há razão para isso. Se não estão, então pelo menos nas suas decisões de produção passam a incorporar todos os custos relevantes da actividade, o que é sempre desejável.


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sobre as “rendas” da energia

muito tem sido dito, e hoje, certamente por acaso, recebi uma carta da EDP, juntamente com a conta, tendo como assunto “Esclarecimento sobre a composição dos preços da eletricidade, incluindo os custos de interesse económico geral”.

O que diz a carta (que prevejo deva estar a chegar a muitas casas por estes dias):

26% do custo é redes de transporte e distribuição (actividade regulada)

43% do custo é preço da energia (actividade desenvolvida em mercado livre)

31% do custo são custos de interesse económico geral (determinados por políticas passadas – últimos 10 a 15 anos).

Em cima disto temos ainda que colocar 23% do IVA (o que até faz com que seja bom aumentar os custos de interesse económico geral).

Dos 31% de custo de interesse económico geral, tem-se

21% para rendas de municípios

9% para sobrecusto das energias renováveis – e deve ser este o objectivo da carta, mostrar que menos de 3% do custo da energia vem das renováveis

11% para sobrecusto associado com energias não renováveis

13% para sobrecusto das regiões autónomas – solidariedade do continente com as ilhas

7% para outros custos

40% de sobrecusto da produção em centrais térmicas e hidricas – são cerca de 12% do custo total – ok, devemos daqui inferir que a EDP sugere que se olhe para a questão das rendas excessivas através deste sobrecusto? o que são estes sobrecustos? “Sobrecusto dos contratos de aquisição de energia, custos para a manutenção do equilíbrio contratual e garantia de potência” . Numa nota da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos de 2011 (aqui) estes sobrecustos não eram muito diferentes, e em agosto de 2012 a garantia de potência já foi revista. Mas como estes custos continuam a ser ainda uma parte importante, seria interessante conhecer melhor como podem ser reduzidos de forma apreciável – por exemplo, eliminar completamente a garantia de potência.

Mas também pode valer a pena olhar para as duas outras componentes – no caso das redes de distribuição e transporte, revisitar as taxas de remuneração asseguradas aos activos das empresas, e eventualmente eliminar completamente o sobrecusto nas energias renováveis e das não renováveis (cogeração e microgeração) – até porque o peso das energias renováveis no total da factura energética sugere que já não devam ser tratadas como energia emergente. Quanto à cogeração e microgeração, nas actuais condições económicas do país, ou são capazes de subsistir por si, ou demonstram que têm grande valor social, ou acabe-se com o respectivo sobrecusto.

Além disso, como se tem criticado muito as “rendas excessivas” na área da energia, demonstrando alguma falta de confiança nas decisões do Governo e do próprio regulador, porque não pedir a três reguladores de outros países que produzam uma apreciação da situação actual em Portugal – a pergunta a colocar seria simples, face às condições de mercado e de economia, que regulação escolheriam se a situação se passasse no respectivo país, com o objectivo de baixar o custo das energias (electricidade e gás natural)? as opiniões individuais de cada regulador até poderiam ficar secretas quanto à autoria respectiva – e por isso serem três, para lhes dar maior liberdade de pensamento.

Uma solução destas só teria vantagens – se corroborarem integralmente as opções até agora tomadas em Portugal, acabava-se a discussão sobre tema e passava-se a concentrar esforços noutro lado; se tiverem ideias novas, ficamos a ganhar com o poder aproveitá-las.


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colecção de notícias

Noticia nº1: “o Executivo e a EDP, que é a companhia que tem mais clientes domésticos de eletricidade, já chegaram a um consenso num dos pontos mais relevantes de todas estas negociações: o aumento do preço da luz para os consumidores a partir de 2013. (…)” (Dinheirovivo.pt, 30.03.2012)

Notícia nº2: “Decreto-Lei nº 75/2012, de 26 de Março

(…)

Artigo 2

Extinção das tarifas reguladas

1 — As tarifas reguladas de venda de eletricidade a clientes finais com consumos em BTN são extintas:

a) A partir de 1 de julho de 2012, para os clientes com potência contratada superior ou igual a 10,35 kVA;

b) A partir de 1 de janeiro de 2013, para os clientes com potência contratada inferior a 10,35 kVA.

2 — A partir das datas previstas no número anterior, os novos contratos de venda de eletricidade a clientes finais são obrigatoriamente celebrados em regime de preços livres, sem prejuízo do estabelecido no número seguinte.

(…)

Artigo 4

Tarifas transitórias 

1 — Sem prejuízo da extinção antecipada das tarifas reguladas nos termos e nas datas previstas no artigo 2, os comercializadores de último recurso devem continuar a fornecer eletricidade a clientes finais com consumos em BTN que não exerçam o direito de mudança para um comercializador de mercado livre, de acordo com os seguintes termos:

a) Para os clientes finais com potência contratada compreendida entre 10,35 kVA, inclusive, e 41,4 kVA, inclu- sive, até 31 de dezembro de 2014;

b) Para os clientes finais com potência contratada inferior a 10,35 kVA, até 31 de dezembro de 2015;

c) Para os clientes finais economicamente vulneráveis que assim optarem, nos termos a estabelecer por diploma legal.

(…)

3 — Compete à ERSE fixar as tarifas transitórias de venda de eletricidade em BTN, as quais são determinadas pela soma das tarifas de energia, de acesso às redes e de comercialização, acrescidas de um montante resultante da aplicação de um fator de agravamento, o qual visa induzir a adesão gradual às formas de contratação oferecidas no mercado. ” (26.03.2012, ênfase adicionado)

Notícia nº3: “ERSE continuará a fixar tarifas bi-horárias e tri-horárias durante os próximos três anos ” (aqui) (ERSE, 18.01.2012)

Resumindo, Governo (decreto-lei) e ERSE dizem que as tarifas de electricidade são fixadas pela ERSE.

Resumindo, Governo e EDP têm um consenso sobre o aumento da luz. Não há referência à ERSE.

Concluindo, ou existem tarifas de luz em Portugal que não são fixadas pela ERSE, ou isto preciso que me expliquem melhor quem fixa o quê…

A ver, se a EDP fixa por consenso com o Governo tarifas num mercado liberalizado, será que a Autoridade da Concorrência pode condenar os dois por cartelização? ou fixam num mercado (ainda) regulado, e o regulador não foi chamado?


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às vezes não entendo mesmo este país…

através de uma noticia na rádio, fiquei a saber que teria sido afirmado que era “intenção” os preços da electricidade até 2020 subirem até 2% em termos reais, o que vim a confirmar por uma notícia online (aqui, por exemplo), apesar de ontem o presidente da entidade reguladora dos serviços energéticos ter dito que não se poderia ainda definir o aumento para 2013 (ver aqui).

Subida em termos reais significa 2% acima da taxa de inflação, só que é difícil perceber como esta “intenção” do Governo pode ser mantida num contexto de mercado livre, em que os preços da energia reflectem os custos de produção.

Se o preço do gás natural subir de forma acentuada no mercado internacional, a intenção deixará de se cumprir, mas será apontada a falha em cumprir uma promessa (e não tenho dúvidas que a “intenção” fica transformada em “promessa” em termos políticos). A menos que para cumprir a “intenção” se regresse a uma situação de subsidiação de preços com aumento da dívida dos consumidores aos produtores (um tal de défice tarifário não é mais do que isso!).

A definição, aceitação e cumprimento de uma política energética até 2020 não é uma coisa simples, nem fácil, nem isenta de incertezas. Adicionar confusão adicional com “promessas/intenções” de evolução de preços que com elevada probabilidade não serão cumpridas não é propriamente desejável. A ver vamos se não será mesmo 2013 a desfazer a intenção…