Momentos económicos… e não só

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sobre o “Programa Nacional de Reformas 2015” (6)

(continuando)

  1. Mercado de habitação e economia paralela nesse mercado: como é sobretudo acompanhamento, nada sairá em tempo útil. É um sector de pouca agilidade em Portugal, e que contribui para pouca mobilidade geográfica da população, o que poderia facilitar também questões de emprego (todos querem emprego qualificado à porta de casa, em vez de considerar mudanças de localização para obter um emprego melhor – é quase mais fácil ver pessoas a mudar para Londres, Lausanne ou Barcelona do que para o Porto em resposta a um desafio profissional).
  2. Aspectos legais de regulação a serem melhorados.
  3. Eliminar restrições em serviços profissionais: aparentemente está em curso, com produção legislativa como solução. E provavelmente irá sendo adiado e transformado até que o efeito seja nulo em termos práticos.

25, Eliminar atrasos de pagamentos no sector público – ainda uma questão…

  1. Garantir recursos adequados aos reguladores nacionais e à Autoridade da Concorrência. Pensar na “accountability” das respectivas acções; nomeações mais clara nas escolhas e nos mandatos recebidos pelos reguladores.
  2. Modernização da Administração Pública (Central, Regional e Local) – a habitual aposta nas TICS; e integração de serviços públicos no contacto com o cidadão.
  3. Melhorar a eficácia do sistema judicial e aumentar a transparência. Novamente só se fala em códigos e organização judiciária, não da prática da justiça. Remeter para a sessão do Nuno Garoupa nas Sextas da Reforma é o mais natural.
  4. Falam em contratar uma Universidade para avaliar as reformas… nem merece mais comentários. Esperemos que seja uma universidade fora de Portugal, para não haver problemas de conflitos de interesses.

(continua)


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sobre “uma década para Portugal” (15)

Por fim, dentro da Administração Pública, olhemos para “o papel das privatizações e concessões e a regulação do mercado do produto”. O que é chamado de proposta é um texto demasiado longo e difícil de resumir, onde se misturam alguns princípios base com a crítica à actuação do actual Governo.

No caso das privatizações, a discussão de princípio é relevante: a privatização deve maximizar o encaixe financeiro – caso em que o Estado pode criar as chamadas “rendas excessivas” para “engordar o pouquinho”- ou deve contemplar outros objectivos, e neste último caso quais?

De um ponto de vista económico, o melhor standard de julgamento será o que gere maior valor social para os cidadãos / consumidores. É uma versão diferente da usada no relatório que fala em “incorporação tecnológica que beneficie o funcionamento eficiente da economia”. Podem até resultar no mesmo, mas focar nos cidadãos e não na tecnologia ou na empresa é importante.

Quando há alguma concretização de ideias, refere-se “maior poder e independências do supervisores e reguladores sectoriais e da Autoridade da Concorrência”. A sério? mesmo depois da revisão que foi feita durante o período da troika? Os estatutos das entidades reguladoras acabaram de ser revistos. A bem da estabilidade institucional (também é defendida noutros pontos do relatório), é melhor deixar, de momento, as instituições existentes funcionarem. E a independência do regulador depende mais da tentação dos governantes em telefonarem, formal e informalmente, para os reguladores, e de estes estarem mais ou menos ao serviço desses telefonemas, do que de regras.

Já agora, podem-se igualmente evitar algumas frases que parecem mais fortes mas que não são exactas. Por exemplo “Um monopólio privado, sem uma regulação eficaz é seguramente pior do que a manutenção de um monopólio público”, O “seguramente” significa sempre, o que não é verdade, embora geralmente se possa pensar que assim sucede. Um contra-exemplo para esta afirmação é dado pela ineficiência de custos que frequentemente um monopólio público tem. Numa toada mais técnica, se num mercado em que a elasticidade procura – preço é 4 (aumento de 1% no preço significa redução de 4% na procura), então um monopólio privado é equivalente a um monopólio público que faça preços iguais a custos mas tenha custos 33% superiores (nota técnica: custo marginal constante).

Outro ponto que merece um comentário é a proposta de “aumento de poder dos supervisores e reguladores sectoriais e da Autoridade da Concorrência na imposição de medidas preventivas do abuso de posição dominante com base regulamentar”. Ora, se no caso dos reguladores sectoriais, esse tipo de actuação faz parte natural das suas atribuições, por intervirem por antecipação, no caso da Autoridade da Concorrência, em que a grande parte da actuação é monitorização e verificação (sendo a única excepção o controle de operações de concentração), não há forma de ter essa prevenção por regulação em todos os mercados que existem e que não estão sujeitos a regulação sectorial. E o que é proposto é abandonar o princípio de que é sancionado o abuso de posição dominante e não a sua construção.

Problema similar surge quando se apresenta outra proposta “possibilidade dos supervisores e reguladores sectoriais e da Autoridade da Concorrência determinarem separação e venda de actividades de uma empresa, quando esta tenha adquirido uma posição dominante no mercado por integração vertical ou horizontal do processo produtivo” – à partida, se a integração gera preocupações de posição dominante, a Autoridade da Concorrência deveria ter detectado no momento dessa integração. As fusões de empresas são de notificação obrigatória à Autoridade da Concorrência portuguesa (ou à própria Comissão Europeia) quando se ultrapassam determinados critérios (que essencialmente definem que é uma operação importante). E parece pouco provável que a cisão obrigatória de empresas seja um instrumento fácil de usar. Não há casos frequentes disso a nível internacional.

É também proposta “a criação de uma ou várias instâncias arbitrais especializadas em questões de concorrência”, ora existe já um tribunal especializado para questões de concorrência, e talvez de começar por avaliar o quem tem sido ex. experiência.

Se o objectivo geral das diversas intervenções propostas neste campo é o de facilitar o funcionamento da economia, uma sugestão é a de procurar a venda com rapidez dos activos produtivos das empresas que entrem em falência, para estimular entrada de empresas mais eficientes do que aquelas que vão falindo, baixando-lhes o custo de equipamento. Relembro aqui a discussão tida num post inicial sobre este relatório a propósito das empresas nacionais que fecham venderem as suas máquinas no exterior. Aliás, seria interessante saber quantas empresas em recuperação acabam por se salvar e se não seria melhor terminar muitas delas rapidamente.


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“Hepatite C e o meganegócio farmacêutico”, por António Ferreira

Nem de propósito, depois de três textos sobre o livro de António Ferreira, surge um artigo no Jornal de Notícias, aqui, no seguimento de outras declarações recentes duras, e que de caminho trazem um exemplo de avaliação económica extrema, para caricaturar a utilização desse instrumento, o leite em pó que salva a vida de recém-nascidos.

Passando além do estilo, próprio para captar a atenção, e a verdade é que captou na medida em que de várias pessoas recebi mensagens sobre o artigo, há que olhar para os vários aspectos em que toca.

Primeiro, embora não dito dessa forma, há a diferença entre preço e valor, neste caso de um medicamento. Os dois conceitos não são a mesma coisa. Tomando uma qualquer transacção em abstracto, esta gera valor sempre que a valorização ganhar por quem adquire o produto ou serviço é maior que a valorização de quem cede (ou produz) o bem ou serviço. Isto é verdade para medicamentos como é verdade para uma “bica” ao balcão ou um jantar, sempre que a transacção for voluntária.

O preço tem o papel de dividir este valor entre os dois lados da transacção. Se o preço for mais próximo do valor atribuído de quem recebe o bem ou serviço, quem cede fica com quase todo o valor. Se, de forma oposta, o preço for mais próximo do valor atribuído de quem vende o bem ou serviço, é comprador (beneficiário do serviço) que fica com a maior parte do valor.

Assim, em qualquer transacção, há estes dois elementos: qual o valor gerado, qual a forma como esse valor é dividido entre as partes.

Normalmente, numa grande parte dos produtos e serviços, são as decisões voluntárias que determinam a existência de transacções, e a forma como esse valor se distribui. Quando quem vende (ou presta o serviço) possui o que se denomina poder de mercado, tende a estabelecer preços elevados, e mesmo que passem a haver transações com valor criado positivo que deixam ser realizadas, como a transferência de valor compensa à empresa, tem-se uma perda social de valor. Há, normalmente, maior valor social total quando os preços se aproximam dos custos de produção (em rigor, quando se aproximam do custo adicional da última unidade produzida do bem ou serviço), e, também normalmente, a existência de pressão concorrencial é uma forma de com pouca informação sobre as estruturas de custos de quem produz o bem ou serviço e de forma descentralizada alcançar essa situação.

Chegado aqui o leitor começa-se a perguntar o que tem isto a ver com o artigo de António Ferreira, e com os preços do medicamento para a Hepatite C.

O primeiro ponto é simples. Os novos medicamentos para a Hepatite C são (a crer no que é dito pela classe médica) são uma inovação importante, permitindo taxas de cura de um problema que não existiam antes e que tinham muitos mais efeitos secundários adversos. Ou seja, é uma nova opção terapêutica que cria valor social.

Para este aspecto, a avaliação económica do medicamento, com uma perspectiva de valor social gerado, tem a utilidade de vir dizer que este novo medicamento traz algo de novo e com valor elevado. A avaliação económica do medicamento, a análise custo-efectividade, é um instrumento útil para determinar o valor. Note-se que se dissesse que o medicamento não trazia valor social, não haveria discussão sobre a sua utilização.

Até aqui tudo bem, e não creio que tenha sido disputado o valor gerado.

O passo seguinte é a determinação do preço. E é aqui que os problemas surgem. Idealmente, na ausência de outras considerações, o melhor preço seria determinado pelos custos de produção. Contudo, um preço que fosse igual ao custo de produção não consegue pagar os custos de desenvolvimento do produto, que inclui também as tentativas falhadas de inovação. Aceita-se assim um mecanismo que permite à empresa que tem uma inovação recuperar esses custos – é a protecção de patente, atribuída de forma genérica para todos os sectores com uma certa duração temporal.  A existência de patente impede concorrência muito directa (impede que outros produzam o mesmo produto) embora não impeça toda a concorrência (outros medicamentos que tenham o mesmo fim terapêutico podem, e estão no caso da Hepatite C, presentes no mercado). Quanto mais diferenciado for o produto, menos essa pressão adicional se faz sentir.

Em qualquer caso, para medicamentos que são salvadores de vidas, deixar à livre decisão das empresas o preço praticado é susceptível de gerar preços elevados, pois à situação de protecção de patente junta-se a pressão dos doentes para serem tratados, qualquer que seja o custo (embora na verdade cada vez mais o cidadão sente que a despesa pública, num sistema como o Serviço Nacional de Saúde, também é paga por ele, mas ainda não é uma sensibilidade muito forte).

É aqui que neste momento se joga a discussão dos medicamentos para a hepatite C. Não havendo livre funcionamento do mercado para a determinação do preço, têm que ser encontrados outros mecanismos. E para isso existem diversas alternativas – a primeira é desde logo procurar o preço mais baixo que vigore internacionalmente. Mas a utilização desta regra leva a que as empresas farmacêuticas em geral tenham interesse em estabelecer acordos que levem a que o preço efectivo seja diferente do preço publicamente conhecido, como forma de evitar que um preço mais baixo num mercado seja usado como referência noutro mercado.

Para a solução de negociação, que acaba então por ser utilizada, a questão central é qual a âncora usada – e é aqui que entra novamente em  campo a avaliação económica como forma de determinar o valor. A implicação que se procura retirar é que o preço deve reflectir o valor do medicamento. Porém esta afirmação aparentemente simples e aparentemente razoável tem a implicação de fazer com que o preço tenda a transferir o valor gerado, ou seja, é um preço muito diferente do que surgiria num mercado concorrencial, em que o preço tende a aproximar o custo de produção (em que o preço tende a aproximar o valor mínimo que o produtor está disposto a aceitar e não o preço máximo que beneficiário está disposto a pagar).

Ou seja, utilizar os estudos de custo-efectividade para justificar preços alinhados pelo valor gerado tem como consequência preços elevados quando o benefício é elevado.

E como o preço é elevado então haverá menos casos tratados do que se o preço fosse próximo do custo de produção. A indignação (?) de António Ferreira deverá ser dirigida contra a decisão de usar os estudos de avaliação económica para este fim, determinação de preços, e não para o seu papel de determinação do valor gerado.

O segundo aspecto relacionado com a fixação de preço é a utilização de mecanismos de “pay for performance”. Ou seja, em vez de pagar sempre o medicamento, é apenas pago o preço quando o tratamento dá resultado. Este é um sentido de “pay for performance” também conhecido como “risk sharing” (embora também seja um mau nome porque o que faz é transferir risco, não partilhar, mas isso será outra discussão). A lógica de pagar apenas quando funciona, apesar de atractiva, não é ela própria tão adequada como parece. Em particular, pode levar a que possam ser tratados casos em que apesar de se esperar que o medicamento não tenha resultados, se essa decisão for tomada de forma totalmente independente pelo pagador, o que é apenas custo desnecessário. Claro que há um “pay for performance” noutros contextos que é mais interessante – se conseguir produzir ou prestar um mesmo tratamento com igual resultado e menor custo, então essa poupança é partilhada entre as partes. Mas não desse aspecto que se está aqui a tratar.

Dito isto, o que é desejável que suceda? em primeiro lugar, se o medicamento tem valor social, então deverá conseguir-se encontrar um acordo razoável para ambas as partes; e quanto mais depressa melhor. Em segundo lugar, o referencial para estabelecer o preço não pode ser o valor máximo que a sociedade esteja disposta a pagar. Terceiro elemento desejável, de uma forma genérica, o preço pago deve remunerar o custo do processo de inovação, embora aqui Portugal esteja numa posição ligeiramente mais confortável – o que quer se que se passe aqui não afectará as decisões de inovação das companhias farmacêuticas (a repartição mundial do custo da inovação é também ela uma outra discussão – por exemplo, se houvesse coordenação internacional, uma vez que o lucro consolidado da empresa cubra os custos de investimentos acrescidos de uma remuneração de 4 ou 5%, então a patente cai). Quarto, o preço que seja praticado provavelmente terá que possuir um elemento de desconto “secreto” para que um preço baixo não seja usado como referencial para outros países de maior importância e que tenham estabelecidos preços mais elevados (é uma espécie de condição de participação para as empresas farmacêuticas).

Claro que uma regulação agressiva do preço deveria simplesmente determinar o custo de produção do medicamento, adicionar uma margem ou melhor fazer um pagamento fixo extraordinário à empresa, e aproximar o preço desse custo de produção.

A indignação de António Ferreira se dirigida contra preços que reflectem exercício de poder de mercado é perfeitamente justificada, mas a culpa não está na dita avaliação económica como instrumento, e sim na forma de determinação do preço. Nos Estados Unidos, onde a tradição é de ter preços livremente determinados, mas com acção das autoridades de defesa da concorrência em geral, surgiu a notícia de uma queixa contra uma das empresas que tem medicamento para a hepatite C, ver aqui, precisamente por causa do preço elevado.

Até aqui não houve qualquer referência à questão de onde surgem os fundos para fazer estes pagamentos. E é claro que essa questão terá que ser colocada, mas apenas depois de estabelecido o mecanismo de determinação do preço, pois este não pode ser pensado em termos de quanto é o orçamento permite. Há duas razões para isso: por um lado, esgotar o orçamento se houver folga não é propriamente boa ideia. Por outro lado, se perante preços que reflictam o custo “adequado” se excede o orçamento, então deverá reduzir-se a despesa noutro qualquer ponto do Serviço Nacional de Saúde (ou eventualmente mesmo fora do Serviço Nacional de Saúde, olhando para toda a esfera pública). E nesse caso, a lógica de custo – efectividade volta a ser útil numa comparação entre utilizações alternativas de fundos disponíveis.

Estabelecido este ponto, há, num ponto de vista global, o aspecto de incentivo ao desenvolvimento da inovação, quanto se deve pagar por essa inovação, quando, e qual o aproveitamento de investimento público em conhecimento que é apropriado depois de forma privada por parte da indústria, num conjunto de problemas que não é apenas específico da indústria farmacêutica, mas sendo neste especialmente sentido.

Ficou um texto longo, talvez demasiado longo, mas o problema não é simples, e soluções aparentemente simples e apelativas na sua formulação podem ter consequências inesperadas e não desejadas.

 

 


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trocas de palavras

entre o vice-Governador do Banco de Portugal e o responsável da KPMG sobre quem disse o quê e com que vigor sobre as contas do BES fizeram lembrar um livro, “O atiçador de Wittgenstein“, em que a dificuldade de reconstruir o que se passou em 10 minutos de discussão foi patente. A consequência mais recente poderá estar na reorganização de pelouros no Banco de Portugal.

Ou seja, provavelmente ambos estão certos nesta discussão – do lado do Banco do Portugal ficou a sensação de a chamada de atenção não ser suficientemente forte, do lado da KMPG ficou a sensação de ter dado a importância devida ao aviso – e como ambas são percepções, podem ser correctas enquanto tal, com ambos os lados genuinamente convencidos da sua razão.

Significa que se for necessário fazer uma avaliação de onde o aviso falhou se terá de ir além destas percepções dos intervenientes. Mas se não houve registo do que foi dito (mesmo que haja testemunhas da conversa, e não sei se foi uma conversa a dois, não é certo que se consiga reconstruir fielmente – regresso ao livro referido), ficará apenas o que de escrito se tenha feito antes e depois para suporte da reunião. Insistir no jogo de palavras e no que cada parte se lembra do que terão sido as reuniões relevantes pouco trará de clareza, e nenhum ganhará com a troca de acusações.

 


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fusões e concorrência

A notícia da manhã de hoje, ouvida na rádio no meio do trânsito, é a fusão da PT com a Oi, criando uma empresa luso-brasileira.

Esta fusão é interessante por vários motivos.

Primeiro, mostra como um gestor, Zeinal Bava, constrói a sua carreira de forma segura, e convencendo sucessivamente os accionistas das empresas por onde passa. Acabará certamente a escrever as suas memórias como Jack Welch.

Segundo, mostra como o mercado português não é suficiente para o desenvolvimento actual das principais empresas nacionais. A internacionalização, seja investindo fora, seja adquirindo empresas fora, seja fundindo-se com outras empresas, é o caminho que teremos de estar preparados para ver, e com algumas das empresas emblemáticas a deixarem de ter sede em Portugal a prazo.

Terceiro, mostra como as empresas em sectores com barreiras à entrada tendem a encontrar formas de reduzir a concorrência depois de períodos de alguma intensidade nessa concorrência. A fusão Zon/Optimus e agora esta fusão, ao contrário do que as empresas argumentam, dificilmente irão criar mais concorrência. Criar uma empresa de telecomunicações exige uma dimensão mínima que torna a entrada difícil, basta ver que mesmo tentativas de facilitar essa entrada como a criação de condições de acesso a redes para operadores virtuais tem um sucesso muito limitado. Assim, reduzir o número de empresas no mercado, num movimento que é internacional de vaga de fusões em telecomunicações, a prazo não irá aumentar a concorrência. Aliás, suspeito que nos próximos dias ambas as fusões anunciem diversas sinergias, mas nenhuma delas anunciará compromisso firme de reduzir preços dos serviços que oferecem.

Quarto, se a PT aproveitou o anúncio da fusão Zon/Optimus para lançar a oferta quádrupla e ganhar alguma vantagem durante o período de (re)organização da concorrência, com esta fusão será a Zon/Optimus que irá ganhar tempo enquanto a PT internamente se “entretém” com a fusão. Resta saber se o outsider no mercado nacional, a Vodafone, terá interesse e capacidade em aproveitar a convulsão, ou se entrará numa espécie de pacto de não agressão informal.

Estes factores reanimam o interesse da “economia das telecomunicações” e sua regulação para os próximos tempos.


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sobre as “rendas” da energia

muito tem sido dito, e hoje, certamente por acaso, recebi uma carta da EDP, juntamente com a conta, tendo como assunto “Esclarecimento sobre a composição dos preços da eletricidade, incluindo os custos de interesse económico geral”.

O que diz a carta (que prevejo deva estar a chegar a muitas casas por estes dias):

26% do custo é redes de transporte e distribuição (actividade regulada)

43% do custo é preço da energia (actividade desenvolvida em mercado livre)

31% do custo são custos de interesse económico geral (determinados por políticas passadas – últimos 10 a 15 anos).

Em cima disto temos ainda que colocar 23% do IVA (o que até faz com que seja bom aumentar os custos de interesse económico geral).

Dos 31% de custo de interesse económico geral, tem-se

21% para rendas de municípios

9% para sobrecusto das energias renováveis – e deve ser este o objectivo da carta, mostrar que menos de 3% do custo da energia vem das renováveis

11% para sobrecusto associado com energias não renováveis

13% para sobrecusto das regiões autónomas – solidariedade do continente com as ilhas

7% para outros custos

40% de sobrecusto da produção em centrais térmicas e hidricas – são cerca de 12% do custo total – ok, devemos daqui inferir que a EDP sugere que se olhe para a questão das rendas excessivas através deste sobrecusto? o que são estes sobrecustos? “Sobrecusto dos contratos de aquisição de energia, custos para a manutenção do equilíbrio contratual e garantia de potência” . Numa nota da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos de 2011 (aqui) estes sobrecustos não eram muito diferentes, e em agosto de 2012 a garantia de potência já foi revista. Mas como estes custos continuam a ser ainda uma parte importante, seria interessante conhecer melhor como podem ser reduzidos de forma apreciável – por exemplo, eliminar completamente a garantia de potência.

Mas também pode valer a pena olhar para as duas outras componentes – no caso das redes de distribuição e transporte, revisitar as taxas de remuneração asseguradas aos activos das empresas, e eventualmente eliminar completamente o sobrecusto nas energias renováveis e das não renováveis (cogeração e microgeração) – até porque o peso das energias renováveis no total da factura energética sugere que já não devam ser tratadas como energia emergente. Quanto à cogeração e microgeração, nas actuais condições económicas do país, ou são capazes de subsistir por si, ou demonstram que têm grande valor social, ou acabe-se com o respectivo sobrecusto.

Além disso, como se tem criticado muito as “rendas excessivas” na área da energia, demonstrando alguma falta de confiança nas decisões do Governo e do próprio regulador, porque não pedir a três reguladores de outros países que produzam uma apreciação da situação actual em Portugal – a pergunta a colocar seria simples, face às condições de mercado e de economia, que regulação escolheriam se a situação se passasse no respectivo país, com o objectivo de baixar o custo das energias (electricidade e gás natural)? as opiniões individuais de cada regulador até poderiam ficar secretas quanto à autoria respectiva – e por isso serem três, para lhes dar maior liberdade de pensamento.

Uma solução destas só teria vantagens – se corroborarem integralmente as opções até agora tomadas em Portugal, acabava-se a discussão sobre tema e passava-se a concentrar esforços noutro lado; se tiverem ideias novas, ficamos a ganhar com o poder aproveitá-las.