Momentos económicos… e não só

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sobre o “Programa Nacional de Reformas 2015” (7)

e chegando ao fim.

Os quadros do capítulo 6 são impossíveis de ler se não forem (muito) ampliados. Tem um resumo com uma coluna de implicações orçamentais, em que apenas numa minoria há referência ao que possam ser essas implicações. Há alguma coisa no mercado de trabalho, há referências a situações que não têm implicações orçamentais porque usam fundos estruturais e há alguma coisa na despesa social. Em 17 páginas de letra muito miudinha, há 104 entradas das quais 22 tiveram direito a um comentário (nalguns casos quantificação) sobre efeitos orçamentais.


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sobre o “Programa Nacional de Reformas 2015” (5)

(continuando)

  1. Reforçar a cooperação entre a investigação pública e o sector empresarial e impulsionar a transferência de conhecimentos. Não há aqui uma ideia nova. Na verdade achei muito similar em espírito ao documento “Centeno” para o PS. (ou vice-versa)
  2. Estabilidade do sistema financeiro, com atenção à detecção precoce de endividamento excessivo.

Porque não deixar os mecanismos económicos funcionar? Nem todas as empresas são viáveis, e tentar recuperar empresas a todo o custo poderá ser pior a prazo do que ter formas de apoiar de modo eficaz quem perde emprego a encontrar outro.

  1. Aplicar medidas no sector da energia, atuar sobre as regras que distorcem o funcionamento do mercado: neste ponto, o aspecto central, que é difícil de especificar, é como se vai lidar com as empresas do sector com um historial de forte poder de negociação.
  2. Aplicar plano de longo prazo dos transportes, investimentos e fusões, ajustamento das regras de regulação neste campo.
  3. Assegurar a sustentabilidade financeira das empresas públicas no sector dos transportes, com redução dos custos operacionais. E deixar de as usar como instrumento de investimento público ou de intervenção política junto das populações, também seria um passo acertado.
  4. Reforçar a eficiência e a concorrência no sector ferroviário: mas a descrição da experiência de outros países seria útil para saber o que funciona e o que não funciona. Nem todas as alterações neste sentido noutros países podem ser classificadas como rotundo sucesso.

(continua…mas será interrompida por uns dias para dar lugar aos comentários sobre a proposta de programa do PS para a saúde)


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sobre o “Programa Nacional de Reformas 2015” (4)

(continuando…)

  1. Reforma das políticas activas de emprego – há a referência a publicação de diplomas e programas, mas não são reportados dados sobre efeitos esperados e porque esses efeitos são esperados. O mesmo se passa quanto ao emprego jovem.
  2. Garantir cobertura adequada da assistência social, incluindo o rendimento social de inserção e a ativação efetiva dos beneficiários das prestações sociais. Volta aqui a questão da economia social e solidária, com as parcerias com o sector social. A utilização dos parceiros do sector dito social poderá ser útil, mas também poderá, se as parcerias não forem bem construídas, resultar em instituições que ficam dependentes exclusivamente do apoio público para as suas actividades.
  3. Melhorar a qualidade e relevância do sistema de ensino, tendo como objectivo a redução do abandono escolar precoce e das baixas taxas de desempenho do ensino. O que deveria levantar a discussão do que é “desempenho do ensino” em primeiro lugar, e do contributo dos vários factores que o determinam. Só assim se perceberá que “alavancas” faz sentido utilizar e com que resultados (e em que prazo se esperam esses resultados).
  4. Eficiência das despesas com educação, e atender às competências relativamente ao mercado de trabalho. Neste campo há diferentes acções, que procuram antecipar necessidades e dar informação sobre oportunidades de emprego. Mas há também uma multiplicidade de programas e organismos que parecem ter subjacente uma pretensão de descobrir a “solução”, quando provavelmente a intervenção pública deve procurar sobretudo criar as condições para que as decisões individuais, com base na informação disponível, gerem os melhores caminhos. Parece haver uma produção massiva de documentos que têm como objectivo determinar as decisões “correctas” da população, o que normalmente não se traduz em muito.

(continua…)


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sobre o “Programa Nacional de Reformas 2015” (3)

(continuando)

  1. Examinar o regime fiscal e torná-lo mais favorável ao crescimento. Surge aqui o combate à evasão fiscal e a redução do IRC. No caso da redução do IRC, não é nada óbvio que seja a forma de promover o crescimento de sectores competitivos internacionalmente. Basta pensar que se os sectores de bens não transacionáveis forem os que têm maiores lucros (por terem uma situação protegida), então também terão maiores ganhos desta redução do IRC e poderão continuar a investir nas suas áreas, quando seria mais interessante direcionar o investimento para sectores de bens transacionáveis.
  1. Reforçar a gestão das finanças públicas – com a reforma abrangente da lei de enquadramento orçamental, com cumprir a leis do compromissos e pagamentos em atraso. Mas têm tudo um tratamento legalistico, quando pouco se sabe e pouco se diz sobre os efeitos que possa produzir.
  1. Aplicar tabelas únicas de salários e suplementos no sector público. Isto é, até haver a criação de excepções. Seria interessante saber como o Governo pretende estabelecer um compromisso duradouro de não subverter essa tabela única face aos pedidos nesse sentido que certamente irão surgir.
  1. Evolução do salário mínimo coerente com os objectivos de promoção do emprego e da competitividade. Significa isto ligação à produtividade? (há alguma referência a isso mas não aparenta ter sido transformada em regra mesmo que informal)

Ou apenas que cada ano, caso a caso se verá consoante o ambiente político?

  1. Apresentar até março de 2015 uma avaliação independente das recentes reformas do sistema de protecção do emprego, que segundo o texto “… o Governo solicitou à Comissão Europeia o estudo das reformas do sistema de proteção do emprego referenciado na Recomendação”. Isto parece ser de uma circularidade espantosa – a Comissão Europeia quer ver uma recomendação sobre uma avaliação independente, e o Governo “chuta” para os serviços da Comissão Europeia fazerem essa avaliação (independente?).

(continua…)


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sobre o “Programa Nacional de Reformas 2015” (2)

(mais algumas das “recomendações”)

  1. Prosseguir com a reestruturação das empresas públicas – fusões, privatizações e renegociação das PPP – tal como em muitas outras descrições de medidas, algumas delas terão o potencial para reduzir o ritmo de crescimento da despesa pública para o mesmo serviço prestado, enquanto outras poderão ter apenas efeitos num momento,
  1. Medidas que melhorem a sustentabilidade a médio prazo do sistema de pensões, onde cabem diversas coisas: a aplicação transitória da Contribuição Extraordinária de Solidariedade, que desaparece em 2017, o congelamento transitório do indexante dos apoios sociais e do regime de actualização do valor das pensões, o aumento da idade normal de acesso à pensão de velhice, a alteração das regras de acesso à pensão antecipada a partir de 2015 (que mudam em 2016, “para melhorar as possibilidades de entrada dos mais jovens no mercado de trabalho”, no que parece ignorar resultados de análises noutros países que indicam não haver essa causalidade de reforma antecipada = mais emprego para jovens, ver aqui e aqui).
  1. Controlar o crescimento das despesas de saúde e prosseguir a reforma hospitalar, não contendo nada de novo. E não vou repetir aqui várias das análises realizadas noutros textos deste blog.


2 comentários

sobre o “Programa Nacional de Reformas 2015” (1)

Este documento é um longo listar de “recomendações”, sendo difícil perceber o que são compromissos assumidos pelo Governo “no coração” e o que são imposições da Comissão Europeia a Portugal.

Este é um documento que é “irmão” do documento intitulado “Proposta de Programa de Estabilidade”. É um documento longo (128 páginas) e só a leitura do cenário macroeconómico é de matar qualquer insónia.

É um documento que tem pouco de opções económicas e muito de programas que impliquem produção de legislação.

Vejamos então o que contém na parte das recomendações:

  1. Atingir objectivos orçamentais e evitar a acumulação de novos pagamentos em atraso. Há mesmo a referência ao stock de pagamentos em atraso dos hospitais EPE, mas sem referências às diversas formas pelas quais se colocou dinheiro nos hospitais para regularizar dívidas sem que daí tenha ocorrido uma redução sensível do ritmo de crescimento da dívida (remeto desde já para os posts de observatório da dívida dos hospitais neste blog).
  1. Para 2015, a recomendação de défice orçamental é de 2,5% do PIB, mas a opção do Governo é de 2,7% do PIB. Central mesmo é estar abaixo dos 3% do PIB, mas vamos a ver se é isso que acontece.
  1. Consolidação orçamental baseada na despesa – utilizando os anos de 2010-2015, há uma redução da despesa de 2,3%, mas os anos de 2013 e 2014 mostram já um aumento, será uma inversão de tendência (comparar a linha vermelha com a linha recta)? Para 2015, com eleições no final do ano, dificilmente haverá contenção da despesa pública;
Fomte: Programa Nacional de Reformas 2015 (linha vermelha adicionada)

Fomte: Programa Nacional de Reformas 2015 (linha vermelha adicionada)


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sobre o “Programa de estabilidade 2015 – 2019”

Tentando corresponder a pedidos de comentários, hoje faço uma breve revisão do documento do Governo “Programa de estabilidade 2015 – 2019

É um documento pouco amigável do leitor. A descrição das condições macroeconômicas segue um padrão seco, e onde são descritas as restrições decorrentes da participação na zona euro da União Europeia. É apesar de tudo informação útil para mais tarde avaliar em que medida todas as propostas eleitorais  se encaixam nessas restrições.

O texto encontra-se permeado de muitas afirmações de intenções, com alguma frequência com pouco conteúdo concreto. Por exemplo, a frase introdutória na página 37: “A estratégia orçamental apresentada mantém o mesmo sentido de responsabilidade dos últimos quatro anos – respeitando o enquadramento europeu aplicável e o princípio de sustentabilidade das finanças públicas –, e permite o desagravamento gradual dos sacrifícios exigidos aos Portugueses” não transmite qualquer compromisso.

As iniciativas da política orçamental podem ser agrupadas em a) redução de cortes; b) introdução de uma medida para a sustentabilidade da segurança social (mas não é especificada); c) poupança nos juros (dão previsão de valor acumulado); d) continuação do processo de reforma e racionalização dos serviços públicos; e) substituição do IMT por imposto de selo.

Introdução de uma medida para a sustentabilidade da segurança social – é apenas dito que a medida deve poupar 600M€ (de uma vez). É demasiado vago. Se não houver acordo ou se o Governo pudesse escolher livremente o que faria? Qual é o problema exacto que a medida pretende resolver? Porquê 600M€?

Quanto à “continuação do processo de reforma e racionalização dos serviços públicos”, seria interessante saber que exemplos passados que permitam acreditar neste objectivo, ou é simplesmente motivo pra contratar em ano de eleições?

Referem-se a propósito deste ponto e a título exemplificativo as medidas de política na área do medicamento, medidas que não vai ser possível continuar ao mesmo ritmo (a esperança é que se tenha conseguido estagnar a dinâmica da despesa com medicamentos e não se ganhe agora uma nova tendência de crescimento, “escondida” por debaixo dos acordos com a indústria farmacêutica para contenção da despesa pública com medicamentos).

Outro ponto que chamou a atenção é a afirmação que as despesas com pessoal diminuem como resultado de uma política de racionalização do emprego público, com a “hipótese de manutenção do volume do emprego”, logo o salário médio tem que descer – está-se a pensar em saída de funcionários mais antigos (e logo de salários mais elevados) substituídos por contratações novas (de menor custo)?

O documento tem ainda uma longa descrição de medidas adoptadas debaixo do título “qualidade das finanças públicas”, sendo que muitas das medidas não têm qualquer informação além do que foi feito. Sobre impactos observados, quase sempre nada se diz.

No campo da saúde, há um aspecto interessante, embora não esteja muito sistematizado. Para este período de 4 anos é dito é que as medidas adoptadas reduziram a despesa pública em medicamentos em 469 milhões de euros, que a redução das despesas com pessoas foi de 150 milhões de euros, e grosso modo a diminuição do orçamento do SNS foi cerca de 1000 milhões de euros, o que faz com que quase metade do ajustamento tenha vindo pela política do medicamento, e outros 25% pelos recursos humanos. Dos outros cerca de 25%, fica-se sem saber quanto terá sido a contribuição das medidas no âmbito hospitalar e quanto nas restantes áreas (cuidados de saúde primários, cuidados continuados e cuidados paliativos), cujas medidas são elencadas mas a contribuição não é especificada quantitativamente.

O aspecto relevante daqui é saber quantas destas alterações foram permanentes e se traduzem menos gasto e quantas foram contenção.


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acompanhamento pós-troika

Apesar de formalmente ter acabado o programa de ajustamento, a Comissão Europeia continua a acompanhar de perto a evolução da economia portuguesa.

Produziu “Country specific recommendations”, que se encontram presentes no Relatório do Orçamento do Estado (página 220 e seguintes).

Para saber que desempenho temos tido nestas country specific recommendations, quatro grupos de alunos de economia da Nova dedicaram parte do seu tempo a procurar e a analisar informação. O resultado desse trabalho é agora apresentado, como um contributo para o conhecimento da economia portuguesa, numa parceria com a Representação da Comissão Europeia em Portugal, no âmbito do Semestre Europeu.

A apresentação terá lugar dia 25 de maio, a partir das 14h00 na Nova School of Business and Economics, Anfiteatro 102. O programa está aqui.

Fizemos a gravação do sumário das conclusões de cada um dos quatro grupos formados, que estão disponíveis aqui:


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e mais um documento do PS

agora que estou a acabar os comentários do documento “Centeno” do PS, eis que fica disponível novo documento do PS, de projeto de programa eleitoral (aqui). Segue para a lista de documentos a comentar. E assim contribuem para manter em actividade este blog 🙂


3 comentários

sobre “uma década para Portugal” (15)

Por fim, dentro da Administração Pública, olhemos para “o papel das privatizações e concessões e a regulação do mercado do produto”. O que é chamado de proposta é um texto demasiado longo e difícil de resumir, onde se misturam alguns princípios base com a crítica à actuação do actual Governo.

No caso das privatizações, a discussão de princípio é relevante: a privatização deve maximizar o encaixe financeiro – caso em que o Estado pode criar as chamadas “rendas excessivas” para “engordar o pouquinho”- ou deve contemplar outros objectivos, e neste último caso quais?

De um ponto de vista económico, o melhor standard de julgamento será o que gere maior valor social para os cidadãos / consumidores. É uma versão diferente da usada no relatório que fala em “incorporação tecnológica que beneficie o funcionamento eficiente da economia”. Podem até resultar no mesmo, mas focar nos cidadãos e não na tecnologia ou na empresa é importante.

Quando há alguma concretização de ideias, refere-se “maior poder e independências do supervisores e reguladores sectoriais e da Autoridade da Concorrência”. A sério? mesmo depois da revisão que foi feita durante o período da troika? Os estatutos das entidades reguladoras acabaram de ser revistos. A bem da estabilidade institucional (também é defendida noutros pontos do relatório), é melhor deixar, de momento, as instituições existentes funcionarem. E a independência do regulador depende mais da tentação dos governantes em telefonarem, formal e informalmente, para os reguladores, e de estes estarem mais ou menos ao serviço desses telefonemas, do que de regras.

Já agora, podem-se igualmente evitar algumas frases que parecem mais fortes mas que não são exactas. Por exemplo “Um monopólio privado, sem uma regulação eficaz é seguramente pior do que a manutenção de um monopólio público”, O “seguramente” significa sempre, o que não é verdade, embora geralmente se possa pensar que assim sucede. Um contra-exemplo para esta afirmação é dado pela ineficiência de custos que frequentemente um monopólio público tem. Numa toada mais técnica, se num mercado em que a elasticidade procura – preço é 4 (aumento de 1% no preço significa redução de 4% na procura), então um monopólio privado é equivalente a um monopólio público que faça preços iguais a custos mas tenha custos 33% superiores (nota técnica: custo marginal constante).

Outro ponto que merece um comentário é a proposta de “aumento de poder dos supervisores e reguladores sectoriais e da Autoridade da Concorrência na imposição de medidas preventivas do abuso de posição dominante com base regulamentar”. Ora, se no caso dos reguladores sectoriais, esse tipo de actuação faz parte natural das suas atribuições, por intervirem por antecipação, no caso da Autoridade da Concorrência, em que a grande parte da actuação é monitorização e verificação (sendo a única excepção o controle de operações de concentração), não há forma de ter essa prevenção por regulação em todos os mercados que existem e que não estão sujeitos a regulação sectorial. E o que é proposto é abandonar o princípio de que é sancionado o abuso de posição dominante e não a sua construção.

Problema similar surge quando se apresenta outra proposta “possibilidade dos supervisores e reguladores sectoriais e da Autoridade da Concorrência determinarem separação e venda de actividades de uma empresa, quando esta tenha adquirido uma posição dominante no mercado por integração vertical ou horizontal do processo produtivo” – à partida, se a integração gera preocupações de posição dominante, a Autoridade da Concorrência deveria ter detectado no momento dessa integração. As fusões de empresas são de notificação obrigatória à Autoridade da Concorrência portuguesa (ou à própria Comissão Europeia) quando se ultrapassam determinados critérios (que essencialmente definem que é uma operação importante). E parece pouco provável que a cisão obrigatória de empresas seja um instrumento fácil de usar. Não há casos frequentes disso a nível internacional.

É também proposta “a criação de uma ou várias instâncias arbitrais especializadas em questões de concorrência”, ora existe já um tribunal especializado para questões de concorrência, e talvez de começar por avaliar o quem tem sido ex. experiência.

Se o objectivo geral das diversas intervenções propostas neste campo é o de facilitar o funcionamento da economia, uma sugestão é a de procurar a venda com rapidez dos activos produtivos das empresas que entrem em falência, para estimular entrada de empresas mais eficientes do que aquelas que vão falindo, baixando-lhes o custo de equipamento. Relembro aqui a discussão tida num post inicial sobre este relatório a propósito das empresas nacionais que fecham venderem as suas máquinas no exterior. Aliás, seria interessante saber quantas empresas em recuperação acabam por se salvar e se não seria melhor terminar muitas delas rapidamente.