Momentos económicos… e não só

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à descoberta

de uma base de dados sobre desigualdades de rendimento  (mais exactamente índice de Gini) no mundo, a propósito de um post facebookiano de Pedro Magalhães (a quem agradeço a chamada de atenção para esta base de dados); resulta daqui um texto “nerd” (mais do que o usual).

Assim, de repente, e acreditando que os valores para Portugal são correctos (não fui verificar, comparando com outros cálculos do índice para Portugal), quando se compara desigualdade (valor maior do índice)  com rendimento (PIB ou rendimento disponível), não se encontra relação; quando se compara a redistribuição realizada por impostos e transferências com taxa de crescimento do PIB per capita, quando se cresceu mais foi quando se redistribuiu menos e aumentaram as desigualdades, mas olhando para o perfil temporal, vê que é por conta do que sucedeu nas décadas de oitenta e noventa do século XX; desde o inicio do século XXI que a redistribuição se manteve a níveis elevados; não infiro daqui qualquer causalidade, fica para reflexão a explicação destes valores. (os dados sobre PIB, rendimento disponível e taxa de crescimento do PIB per capita foram retiradas do site PORDATA).

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Screen Shot 2014-02-28 at 10.47.21Screen Shot 2014-02-28 at 10.26.59Definições (copiadas do texto original do autor)

gini_net: Estimate of Gini index of inequality in equivalized (square root scale) household disposable (post-tax, post-transfer) income, using Luxembourg Income Study data as the standard.

gini_market: Estimate of Gini index of inequality in equivalized (square root scale) household market (pre-tax, pre-transfer) income, using Luxembourg Income Study data as the standard.

redist: Estimated percentage reduction in market income inequality due to taxes and transfers: the difference between the gini_market and gini_net, divided by gini_market, multiplied by 100.


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voltando ao consumo privado,

em Novembro de 2012, num outro post, os dados mostravam um ajustamento no consumo, com especial destaque para o consumo de bens duradouros. Os últimos valores conhecidos (no site conheceracrise.com), desde o final de 2012 parece estar a ocorrer uma inversão dessa tendência, suave, mas a ter lugar. De momento ainda não é um efeito grande, mas claramente estabilizou o consumo privado.

Esse aspecto será bom para o crescimento por impulso do consumo privado, mas também irá aos poucos colocar pressão sobre as importações,  o que irá reduzir o “sucesso” nas contas externas. A seguir com atenção. E sobretudo evitar tomar em ano de eleições medidas que levem a um aumento de consumo de bens duradouros importados.

Bens alimentares Bens duradouros Outros bens
3ºT2012 5380,4 1683,8 19222,7
4ºT2012 5399,1 1584,2 18795,6
1ºT2013 5444,6 1656,5 18525,9
2ºT2013 5491,7 1731,2 18514,7
3ºT2013 5564,7 1778,4 18815,5

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o sucesso das exportações, é mesmo assim?

Nas últimas semanas, o crescimento das exportações foi tomado como “o” sinal de sucesso das políticas dos últimos anos, e o relatório do FMI a aconselhar cautelas caiu como um balde de água fria. Face à troca de informação (e de desinformação), nada melhor do que ir ver o que os números dizem sobre a evolução recente – numa perspectiva agregada neste momento, deixando para mais tarde uma desagregação de sectores, e de crescimento consoante o valor acrescentado de cada sector.  De qualquer modo, é sempre melhor ter este crescimento das exportações do que não tê-lo. Não estará aí a divergência. Sobre o que significa sobre a saúde da economia portuguesa é que podemos ter diferentes interpretações. O meu objectivo é deixar que cada leitor forme a sua opinião sobre o sucesso/insucesso que está contido nos números das exportações.

A primeira figura mostra a evolução das exportações nos últimos anos, conforme publicado nos boletins periódicos do INE, e construindo duas linhas adicionais – uma contendo uma tendência dos últimos dez anos, incluindo a quebra verificada em 2009 (linha roxa); a segunda linha adicional é uma tendência baseada apenas nos valores até 2008 – antes da queda de 2009, e procura ver o que teria sido o crescimento das exportações na ausência dessa queda em 2009 (linha vermelha).

Estas três linhas permitem estabelecer:

a) que o crescimento dos últimos anos constitui uma recuperação face à queda grande de 2009;

b) que comparando ao longo de todo o período, e com o peso da queda, o valor dos últimos anos tem uma aceleração face a esse ponto de comparação de todo o período;

c) que se não tivesse ocorrido a queda em 2009, e tivesse permanecido a mesma tendência que se verificou de 2004 a 2008, então a recuperação ocorrida até agora ainda não terá atingido o que seria o resultado dessa evolução.

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Ou seja, grande parte do crescimento recente das exportações foi recuperação face a uma queda muito grande em 2009.

É um sucesso importante, mas não ao ponto de podermos falar de milagre.

Claro que pode sempre haver a dúvida sobre qual a série exacta a utilizar, e na verdade entre diversas fontes, encontramos diferentes séries, que estão mais ou menos actualizadas, incluem mais ou menos bens e serviços. A figura 2 mostra a evolução das exportações segundo diferentes fontes, numa delas incluindo bens e serviços, com a característica de terem sido transformadas em número índice – isto é, para todas as séries, o ano de 2004 tem valor 1, pelo o que a figura regista é a evolução relativa face ao ano de 2004. Todas as séries passam forçosamente pelo ponto 1 no ano de 2004. E qualquer que seja a versão usada, tem-se uma imagem que é globalmente similar – o ano de 2009 foi um ano de queda, e os anos seguintes foram de recuperação, mas não de uma superação clara do que teria sido a continuação da tendência do período anterior a 2009.

 

Screen Shot 2014-02-23 at 13.08.46Podemos e devemos estar satisfeitos com a recuperação? sim;

podemos e devemos ficar descansados com essa recuperação, pois está garantido que as exportações serão o motor de crescimento? não, é cedo para poder ficar descansado.

Mas cada um faça o seu julgamento.

 


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o que diz a Comissão Europeia sobre a saúde na 10ª revisão…

O relatório da Comissão Europeia saído há dias, no que diz directamente respeito à saúde, tem algumas novidades, discretas mas mesmo assim novidades face ao que estava na versão do Memorando de Entendimento da 8ª e 9ª avaliações. O facto de ser publicada agora, Fevereiro, a avaliação realizada em Dezembro, faz com que algumas medidas que deviam ser analisadas no final do ano de 2013 ainda não o estejam neste relatório (serão com certeza objecto de atenção na revisão que está neste momento em curso).

Como tem sido regular, houve medidas que saíram do Memorando, por estarem finalizadas (de uma forma ou de outras), e há também medidas adicionais que não estavam presentes na versão anterior.

A primeira das novidades é a extensão para 2014 do objectivo de conter a despesa pública com medicamentos num texto de 1% do PIB. Suponho que esse valor percentual continue a ter como referência o valor do PIB antes da intervenção, e que tem servido de base às referências dos anos anteriores. Como o valor do PIB nominal ainda não recuperou para valores de antes da crise (quer a taxa de crescimento real da economia quer a taxa de inflação têm sido baixas), mantém-se assim o mesmo objectivo de 2013. O objectivo de 2013 foi atingido com base em acordo de payback  e não por dinâmica natural de mercado. Isto é, a evolução da despesa pública em medicamentos foi crescente no mercado hospitalar e globalmente decrescente durante o ano no mercado em ambulatório. Mantendo-se a distinção entre os dois mercados no objectivo final de despesa pública, será sobretudo no mercado hospitalar que se deverá fazer sentir a pressão para redução da despesa efectiva (para que de futuro seja a dinâmica de mercado a garantir estes objectivos, e não acordos de devolução de despesa). A resolução desta pressão pode ser feita por via da quantidade – melhor utilização do medicamento em ambiente hospitalar – ou/e por via do preço – redução dos preços dos medicamentos. A redução da quantidade idealmente deveria decorrer no menor número de doentes, e também de uma utilização adequada do medicamento (definição da melhor prática de prescrição), embora tanto uma como outra sejam difíceis de alcançar.

Mantém-se o objectivo de receita das taxas moderadoras até final de 2013.

Para a ADSE e subsistemas militares, é referido o aumento da contribuição dos beneficiários para 3,5%, assinalando-se que é uma forma de acelerar para o auto-financiamento. Na verdade, vai gerar um excedente que reverte a favor do Estado, em termos formais, pois a contribuição do “empregador” não se altera.

Nos aspectos relacionados com prescrição, monitorização da prescrição e orientações, não há alteração substancial, apenas o refrasear da aplicação das regras de prescrição do SNS a todos os subsistemas públicos. Creio que haveria vantagem em existir um relatório público sobre as auditorias realizadas às normas de orientação clínica, não num sentido de punição, mas num sentido de evidência dos desvios existentes e das implicações que tal acarreta. Os desvios também pode ser no sentido de tratar a mais, como no de tratar a menos. Ambos têm custos para a sociedade, embora de natureza diferente.

No campo das compras centralizadas, a novidade é a indicação de constituição de um observatório de preços e aquisições. Isto levanta o aspecto interessante de saber qual o grau de transparência de preços que se pretende ter no que fizer esse observatório e qual a implicação para o comportamento dos agentes económicos nas suas ofertas de serviços e preços ao Serviço Nacional de Saúde.

Surge também aqui a indicação de ser necessário trabalhar na aplicação de orientações de melhor prática para reduzir variações de prática clínica e assegurar que se segue a melhor prática. Este aspecto não sendo de natureza administrativa, pois implica alterar comportamentos na prescrição, não será fácil de garantir o “enforce the implementation” que surge no Memorando. Apesar de tudo é uma mudança para um conceito de mais longo prazo, pois desejavelmente deveria levar à criação dos mecanismos e da cultura que adaptem as decisões à melhor prática e a uma revisão regular do que é essa melhor prática. Ou seja, o que outros têm designado como processo de melhoria contínua da qualidade.

No campo dos cuidados de saúde primários, não há qualquer alteração face ao que estava escrito na anterior versão do Memorando de Entendimento.

Relativamente aos serviços hospitalares, não há também novidades, apenas um resvalar da apresentação dos planos estratégicos dos hospitais do último trimestre de 2013 (como estava na 8&9ª avaliações) para o primeiro trimestre de 2014, o que provavelmente também fará deslocar o objectivo de ter os contratos programa assinados até final do primeiro trimestre de 2014 para mais tarde, pois será desejável que os contratos programa tenham ligação ao que for estabelecido no plano estratégico (até para dar credibilidade a este último como instrumento).

Globalmente, as novidades são repetir para 2014 os objectivos de 2013 com despesa pública em medicamentos, criar um observatório de preços e aquisições e dar maior atenção explícita à redução das variações de prática clínica para levar à utilização da melhor prática. Tudo o resto mantém o rumo, e muitas das medidas com o estatuto de [ongoing], isto é, em curso e aparentemente bem.


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e agora o relatório da Comissão Europeia

ainda mal acabado de ler o relatório do FMI sobre a décima avaliação da troika, eis que se encontra disponível  aqui o relatório da Comissão Europeia sobre a 10ª avaliação, para leitura nos próximos dias.


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Ainda sobre o documento do FMI sobre a 10a. avaliação

Alguns comentários adicionais sobre a avaliação feita pelo FMI:

É feita menção à revisão do IRC – embora com a preocupação única de não implicar despesa fiscal adicional (ou menores receitas). Como argumentei noutro texto, a minha preocupação é saber se será compatível com uma reorientação do investimento e interesse empresarial para o sector transacionável – sendo as margens maiores e os lucros mais elevados no sector não transacionável, a redução do IRC torna sobretudo interessantes as actividades deste sector e não as do sector transacionável. Não vejo como possa ser de outro modo, e não vejo como esta revisão irá tornar mais atractivo o sector transacionável face ao não transacionável.

Sobre o controle das dívidas em atraso, o relatório do FMI explicitamente refere a preocupação do FMI com os mecanismos de controle, e afirmam que o Governo português terá acordado o estabelecimento de uma unidade especial dedicada à monitorização e à produção de recomendações para resolver problemas que existam com os mecanismos de controle orçamental. A ver se esta equipa dedicada consegue estancar os canais pelos quais se cria dívida, nomeadamente no caso dos hospitais.

Uma outra característica do relatório, presente em vários parágrafos, é a referencia sistemática à visão das autoridades portuguesas, sempre mais favorável que a visão do pessoal do FMI, e sobretudo nem sempre ancorada em evidência inequívoca. A “fadiga” da reforma revela-se também nesta necessidade de ver que há resultados positivos, e mais positivos do que serão na realidade, pese ainda assim a dificuldade em fazer uma real avaliação das reformas realizadas. A necessidade de continuar reformas, num contexto de consenso político, é igualmente mencionada como ponto central da construção do futuro da economia, independentemente da forma como a saída financeira do programa de ajustamento seja construída.

Como fonte dos problemas de crescimento apontam as elevadas margens no sector não transacionável, o que favoreceu o investimento neste sector, com menor crescimento da produtividade, durante este milénio. A questão central para a economia portuguesa a prazo é em que medida as reformas realizadas se traduziram numa alteração desta posição relativa? E se em cada medida adoptada pelo Governo português se avalia qual o efeito sobre os fundamentos dos desequilíbrios que levaram aos actuais problemas?


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Avaliação #10 da Troika – a visão do FMI

O relatório da avaliação do FMI sobre a 10ª revisão tem vários elementos interessantes.

Um primeiro é o reconhecimento de que foram cumpridas as metas do programa para Setembro e que embora os dados mais recentes ainda não estejam disponíveis tudo indica que no final do ano também se atingiram as metas. É bom sinal, face ao esforço que foi realizado pelos portugueses no pagamento de impostos.

Sobre a economia portuguesa mencionam diversos aspectos.

  1. a atenção a ser dada ao desemprego jovem, preocupação europeia aliás; neste aspecto, o conseguir manter o capital humano dos jovens até a economia recuperar o suficiente é o principal desafio – e não sei se as medidas tradicionais de apoio ao emprego são suficientes para assegurar que não há perdas; provavelmente há que agir mais directamente sobre a manutenção desse capital humano, de forma diferente e imaginativa.
  2. Importância de reduzir rendas e aumentar a produtividade no sector não-transaccionável da economia, através de maior concorrência e reformas no funcionamento dos mercados. Sobre este aspecto há diferentes considerações a serem apresentadas: condições para ter concorrência em alguns sectores, “captura” da decisão de política económica e credibilidade intertemporal das medidas que sejam adoptadas. No que respeita ao papel das autoridades de regulação económica,  que têm como missão assegurar o bom funcionamento do mercado – reguladores e autoridade da concorrência além da revisão das leis respectivas têm que ter capacidade de atrair os recursos humanos qualificados necessários, e retê-los. Falam também na necessidade de manter o seguimento das melhores práticas internacionais, incluindo a organização de exercícios de comparação internacional com reguladores congéneres.
  3. Sobre o crescimento mais recente, duas observações de cautela que fazem do lado do FMI – compressão das importações e o papel das exportações de combustíveis, por um lado, e o forte efeito do turismo poder ser temporário, devido ao que se passa no Norte de África, o que naturalmente lança o desafio de fidelizar os turistas “desviados” que cá chegam. Quanto ao ajustamento nas contas externas, apontam a fragilidade de depender da redução das importações e do aumento das exportações de combustíveis – ora, aqui podiam ter dado mais informação – qual a elasticidade das importações ao rendimento, para saber quanto aumentarão as importações quando houver crescimento do rendimento disponível, e no caso das exportações de combustíveis, estando a operar num mercado internacional com margens baixas, o valor acrescentado gerado será menor do que sugere o peso que ganham nas exportações (até porque a matéria prima é importada).
  4. Sobre a dívida pública, é referido que a sua trajectória depende fortemente do esforço de consolidação orçamental, incluindo o canal da credibilidade e das taxas de juro de mercado, bem como nas reformas estruturais para aumentar a competitividade da economia e conseguir crescimento no longo prazo.


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saúde e troika, a preparar a próxima avaliação

A propósito da próxima revisão da troika, no campo da saúde surgiram algumas informações na imprensa. A primeira diz respeito às taxas moderadoras e à sua subida de acordo com a inflação, aspecto que o ministério da saúde no passado rejeitou em declarações públicas.

Numa perspectiva de receita, as taxas moderadoras são, e serão, apenas marginais ao serviço nacional de saúde. Não são as taxas moderadoras que vão resolver os problemas de financiamento das instituições que as cobram. O papel que as taxas moderadoras possuem está, como o nome diz, ligado à moderação da procura, que tem como aspecto complementar as isenções atribuídas.

Aliás, como detalhei noutros contextos e discussões, ter simultaneamente um objectivo de moderação de procura e um objectivo de receita pode ser incompatível – se se modera a procura desnecessária de cuidados de saúde então não se tem a receita das taxas moderadoras que essa procura evitada geraria. E em geral os custos evitados por uma utilização mais racional dos serviços de saúde é superior ao valor da taxa moderadora recebida por esse serviço.

O outro lado da preocupação com as taxas moderadoras é saber se afastam a utilização desnecessária de cuidados de saúde, aspecto sobre o qual se sabe surpreendentemente pouco. Apesar dos opositores das taxas moderadoras focarem sempre na redução da utilização como sendo um problema de acesso, na verdade esse problema só existe quando há utilização necessária que deixa de ocorrer ou é adiada com custos para a saúde da pessoa (e até em termos de custos para o sistema de saúde). Conhecer essas situações é complicado, pois correspondem a ausência de contacto com o sistema de saúde, quando normalmente o que registamos é os contactos que existem.

O segundo tema presente na imprensa é o da das dívidas vencidas (“arrears”). Aqui retomo os valores mais recentes indicados pela APIFARMA no seu site, como indicador, na ausência de uma série publicamente disponível sobre o total das dívidas vencidas do Serviço Nacional de Saúde. Deste passado recente, ressalta que após um período de regularização de dívidas em 2012, voltou-se a partir de 2013 a registar-se uma subida em ritmo aparentemente similar ao anterior à regularização, excepto nos últimos dois meses antes de se entrar num novo período de regularização. Só para este componente da dívida do SNS, o ritmo de crescimento médio fora dos períodos de regularização é de 32 milhões de euros por mês (com dados até dezembro de 2013).

Para o final do ano de 2013, observa-se novo período de regularização de dívidas que não permite inferir ainda sobre uma alteração dos fundamentos, da tendência, ou não. Mais relevante que o valor do stock de dívida no final do ano de 2013, interessa saber como está a ser o fluxo e a sua evolução (isto é, que stock está a ser constituído, depois de eliminado o efeito da regularização).

 

dividas2013apifarma


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saída português suave?

Peter Praet, economista chefe do BCE, sugeriu durante uma conferência realizada em Cascais que existem mais soluções que as duas que têm estado na discussão públicas (pelo menos, assim terá sido segundo o que foi reportado no Diário Económico de 19.02.2014). A citação chave é “encontrar uma forma de sinalizar o compromisso com as reformas”.

Na verdade, relevante mesmo é encontrar os mecanismos de governação interna que impeçam que se volte a ter o mesmo problema.

Ora, pensando desta forma, há duas questões a serem resolvidas:

a) o que é um sinal inequívoco?

b) o que são mecanismos que funcionem no sentido de evitar a repetição dos problemas?

Para a primeira questão, a resposta é simples – só é sinal credível o que tiver custos se não for cumprido. O exemplo estafado de sinal não credível é a promessa eleitora, tem custos demasiados difusos se não for cumprida, e frequentemente não o é. Significa que meros anúncios ou plataformas de consenso terão sempre pouco valor. É melhor naturalmente ter um consenso do que não ter, e é certamente melhor ter um consenso a dizer que não se vai voltar aos processos anteriores, mas é claramente insuficiente como sinal credível. Promessas dos dirigentes políticos terão sempre menor valor do que a criação de mecanismos que gerem um custo de não seguir o caminho traçado. Ou seja, “conversa” não chega.

Para a segunda questão, que mecanismos utilizar, a resposta é menos óbvia. Claro que estimular o crescimento económico é necessário, mas mais uma vez, não será suficiente a prazo. Mais cedo ou mais tarde é natural é que surja um novo ciclo económico negativo, e tem que se acautelar desde já não cair no mesmo tipo de problemas que tivemos.

Até agora, as opções discutidas têm sido colocadas em termos de “saída limpa” ou “programa cautelar”. A dita “saída limpa” tem como custo a incerteza do que possa ser uma interpretação menos boa da evolução da economia portuguesa num futuro próximo. Por exemplo, se por uma razão qualquer, justificada ou não, uma agência de rating tiver uma visão negativa poderá lançar uma espiral que torne novamente difícil ao estado português financiar a sua dívida nos mercados internacionais, recriando o problema financeiro. O “programa cautelar” tem os seus custos próprios, mas protege contra a incerteza de uma “saída limpa”.  E permite à partida maior (mas não completa) previsibilidade sobre os aspectos de capacidade de financiamento do estado.

Mas que outros mecanismos existem (o que se possa chamar uma saída português suave)?

A lógica de um consenso alargado entre os principais partidos só funciona se houver um custo de negarem no futuro aquilo que acordarem hoje. É divicil ver o que possa ser esse custo se repetidas vezes os dirigentes políticos fazem num momento o contrário do que afirmaram antes, sem penalização evidente. Não estou a dizer que não tenham existido “razões objectivas” para essas mudanças (as afirmações iniciais podem ser desajustadas), apenas que é possível mudar sem grande custo. Logo, qualquer consenso político, mesmo que alcançado, não tem um grande valor como sinal a menos que estabeleça mecanismos concretos.  Sendo necessário, não será suficiente.

Há por isso que encontrar um mecanismo (ou mecanismos)) mais automático e que gere um custo elevado se não for seguido.

A criação de regras de tecto de despesa pública nominal a três anos, como tem sido usado noutros países é um desses mecanismos. Deixa liberdade na escolha da composição da despesa às opções políticas, mas ao mesmo tempo cria uma limitação com custos se for ultrapassada.

Poderão existir outros mecanismos, mas têm que possuir esta característica de imporem custos quando não são cumpridos.

Para construir esse(s) mecanismo(s) é preciso primeiro identificar qual é o problema exacto a resolver, e aí também não é certo que haja um entendimento comum.

As opiniões oscilam entre a situação de resgate financeiro pela troika ter sido originada apenas por factores externos (caso em que não seria necessário qualquer mecanismo adicional) e as que só encontram responsabilidade interna das políticas seguidas. Como haverá um pouco de ambas, no futuro o(s) mecanismo(s) encontrado(s) precisa(m) de ter flexibilidade para ajustar a choques externos e de ter poder de limitar erros de política interna.

Teremos capacidade, engenho e arte para identificar e construir esses mecanismos de uma saída português suave em tempo útil?


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reportagem público sobre ADSE

no fim de semana passado, o Público fez uma grande reportagem sobre a ADSE, que complementa os posts que fui colocando. Os links para o público:

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/ministerio-assume-que-fim-da-adse-levaria-a-aumento-das-listas-de-espera-no-sns-1623848

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/governo-admite-abrir-adse-a-trabalhadores-do-estado-com-contrato-individual-1623896

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/retratos-de-utilizadores-jaime-ribeiro-funcionario-publico-que-saiu-da-adse-1623812

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/retratos-de-utilizadores-da-adse-joao-funcionario-publico-com-adse-e-elisabete-funcionaria-publica-sem-adse-1623811

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/privados-elogiam-mas-dizem-que-os-utentes-pagam-mais-do-que-o-estado-1623804

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/seguradoras-acreditam-que-ha-espaco-para-novos-clientes-sem-mudarem-a-oferta-1623806

http://www.publico.pt/sociedade/noticia/adse-um-sistema-com-50-anos-1623864