tendo-se iniciado mais uma avaliação da troika, surgiram novamente as discussões sobre se e onde cortar a despesa pública, desta vez envoltas num “embrulho” de espiral recessiva. Nessas discussões, há em geral mais a preocupação de marcar pontos políticos do que em ser tecnicamente rigoroso. Desde logo, definir o que é espiral recessiva.
Que é desejável crescimento económico não é disputado por ninguém. As diferenças estão no que é necessário para gerar esse crescimento, e no que possa ser suficiente para o sustentar a prazo.
A primeira pergunta que nos devemos colocar é se a estrutura produtiva da economia portuguesa de 2010 tem a capacidade de promover crescimento económico de forma sustentada. A resposta tem sido, parece-me, geral no sentido negativo.
A segunda pergunta é então como se induz uma mudança da estrutura produtiva. E aqui as diferenças são maiores, havendo os que defendem que será sobretudo da iniciativa privada que deverá surgir a procura de novos sectores de actividade económica, e os que apoiam uma acção mais interventiva do estado. No contexto actual, interessa saber se aumentar a despesa pública teria a capacidade de gerar essa mudança da estrutura produtiva. Aqui, a resposta mais plausível será que um aumento da despesa pública, mesmo que fosse possível em termos de financiamento da dívida pública, dificilmente teria um efeito de transformação da estrutura produtiva da economia.
A terceira pergunta, de resposta mais difícil, é qual a dimensão do estado que é compatível com induzir e sustentar a mudança na estrutura produtiva da economia portuguesa. A resposta é aqui mais complicada, pois a contribuição do estado para a situação económica não está apenas no que é contribuição da despesa pública para a despesa agregada (no sentido da contabilidade nacional), mas não é possível deixar de lado as regras, regulações, protecções, etc., em que o estado se envolve.
Por esse motivo, o papel do estado e a sua revisão não se pode limitar a uma questão de cortes e recortes. Até porque apenas esses cortes e recortes poderão nada alterar, por um lado, e não é evidente onde cortar, como se pode ver da despesa do estado de 2012 (no caso da saúde, há que ter em conta a verba de 1932 M€ para regularizar dívidas em 2012). O anunciado corte de 4 mil milhões de euros é mais do que a defesa nacional ou a segurança e ordem públicas, por exemplo. É mais do que as funções económicas.
A discussão deve incidir sobre o papel de cada função e como poderá ser desempenhado com menor despesa. E é neste quadro que se deve ter como primeiro passo uma fase de brainstorming, para perceber caminhos possíveis. Recuperar propostas recentes, como algumas das ideias no relatório do FMI, como indexação de pensões ao ciclo económico à semelhança da Suécia, ou menos recentes, como o imposto sobre a riqueza para abater directamente à dívida pública e com isso baixar a despesa com juros, de Miguel Cadilhe, ou pedir autorização para usar os fundos comunitários para reduzir a dívida pública e reduzir juros a pagar (e sempre se poupava os custos das estruturas para atribuir e fiscalizar os fundos, as manobras de lóbi para os obter, e as distorções de decisões a favor de investimentos que são apenas rentáveis se subsidiados), ou mesmo não pagar a dívida, poupando nos juros mas não tendo como financiar défices futuros, como sugerido por outros comentadores. Avaliar as implicações presentes e futuras de cada uma dessas opções, de forma séria e quantificada será o segundo passo. Ter uma escolha colectiva sobre essas opções será o terceiro passo.

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