Emigrem!?
19/12/2011 | 00:10 | Dinheiro Vivo
As declarações do primeiro-ministro sobre as oportunidades noutros países para os professores desempregados foram naturalmente polémicas. A primeira reacção, naturalmente emotiva, é a de desconforto – não é habitual ver-se um primeiro-ministro a sugerir a emigração como saída para o desemprego.
O desconforto surge por dar a sensação de inevitabilidade e de falta de soluções. Contudo, há a necessidade de olhar para além dessa primeira impressão e tentar perceber o que pode levar um governante a proferir esta afirmação.
Comecemos por recordar que, com a sua actual estrutura produtiva, Portugal não tem conseguido assegurar crescimento económico suficiente para sustentar as aspirações da sociedade. É bem conhecido que essa falta de crescimento económico está na base da necessidade de ajustamento da economia portuguesa. Necessidade que existiria mesmo na ausência de uma crise internacional, pois desde o início do milénio que a economia está a crescer a baixas taxas (quando cresce).
Ora, se é necessário ajustar a estrutura produtiva significa que a actual não responde aos desafios que se enfrentam. Ajustamento é sinónimo de que as actividades produtivas de futuro não são iguais às de hoje, na sua composição e intensidade. Haverá sectores económicos a crescer e outros que irão contrair a sua actividade.
Mas crescimento de uns sectores e definhamento (mesmo que parcial) de outros implica que haja recursos produtivos a transferirem-se dos sectores que irão contrair para os que estejam em crescimento. Se as competências exigidas nos sectores que venham a crescer forem similares às dos sectores em contracção a transferência de pessoas de umas posições de trabalho para outras será fácil. De outro modo, haverá que fazer uma reconversão de competências e conhecimento.
Quando a economia portuguesa voltar a crescer, em termos económicos, com base no desenvolvimento de novos sectores, haverá uma migração de factores produtivos, incluindo recursos humanos, entre sectores. Haverá emigração dos sectores onde exista excesso de recursos. Será um efeito inevitável da pretendida transformação da economia portuguesa.
Neste processo, o que sucede às pessoas que não tenham capacidade ou não queiram mudar de sector ou de tipo de actividade? Se não resulta a (e)migração entre sectores económicos, talvez mesmo entre regiões de Portugal, então a emigração poderá ser uma outra solução.
Com a integração europeia e a maior facilidade na mobilidade de pessoas dentro da União Europeia, com novas gerações que viajaram mais do que as anteriores, a emigração é hoje uma realidade relativamente comum. Quem faz carreira numa grande empresa portuguesa ou estrangeira também tem frequentemente um período de emigração. Outros emigrarão para encontrar empregos que os satisfaçam mais ou que não encontram em Portugal. Não é um fenómeno novo, nem deverá ser dramatizado.
Porquê então a reacção tão grande à declaração do primeiro-ministro? Porque a sugestão soma-se a um ano complicado, soma-se à perspectiva de outro ano complicado, soma-se ao conhecimento de que o processo de emigração já se iniciou há pelo menos dois anos e soma-se ao receio de que em lugar de emigração se venha a estar na presença de um êxodo.
O que há então a fazer, nesta linha?
Procurar alcançar dois objectivos: facilitar a transição profissional entre sectores, por um lado; e manter o ânimo da população, por outro lado. O primeiro depende de medidas concretas; o segundo depende da forma de comunicação do Governo, e do primeiro-ministro.
Nova School of Business & Economics
ppbarros@fe.unl.pt
Escreve à segunda-feira
