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miopias

1 Comentário

O Relatório do Banco de Portugal divulgado ontem (aqui) revela que a taxa de poupança aumentou no último ano e que os pensionistas são dos que mais poupam (p.125 do Relatório). E surgem logo alguns comentários de que esta informação poderia servir de argumento político para tributar mais os pensionistas, mas creio que é apenas e unicamente como alerta para o absurdo que seria tributar a poupança, e logo apenas a poupança de alguns. Esperemos que não se entre sequer nessa discussão, uma vez que esse é o tipo de erro fatal para a economia.

Por um lado, do ponto de vista macroeconómico, quer-se ter mais investimento privado. O financiamento desse investimento tem que ser feito preferencialmente a partir de poupanças privadas, e com mecanismos diversificados de fazer o encontro entre a poupança e o desejo de investir, ou seja, não ser sobretudo e quase apenas por intermediação bancária (depósito das poupanças, empréstimo dos bancos). Logo tributar a poupança é contrário a esse objectivo.

Por outro lado, do ponto de vista individual, o aumento da poupança privada em 2012, acima do que seria previsível com base nos elementos normais (ver o relatório do banco de portugal para mais detalhes), deveu-se muito provavelmente ao clima de incerteza gerada, as poupanças estão a ser feitas não por disponibilidade de rendimento e sim por precaução. Se essa poupança passar a ser tributada, seja por que via for, e aumentar impostos sobre os pensionistas é uma forma de tributar a poupança destes, então a reacção normal será passar essa poupança para consumo (que até pode ser de bens duradouros que possam ter papel similar) – se quanto mais se poupa mais se paga de imposto presente ou futuro, então poupar de forma visível perde interesse.

Mais do que tributação dos pensionistas, a discussão tem que ser colocada de outra forma. Tributar tem sempre um ar de penalização. Será preferível colocar a discussão num plano de justiça intergeracional e até mesmo de justiça intrageracional (mesmo entre os actuais pensionistas, pensões iguais podem ter correspondido a contribuições muito diferentes – a questão não será de legalidade, mas de equidade). Mas para fazer essa discussão é preciso muito mais informação. Não é da taxa de poupança dos pensionistas que se vai conseguir inferir algo sobre justiça intergeracional, e muito menos intrageracional.

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

One thought on “miopias

  1. Hoje em dia as palavras “intergeracional” e “intrageracional” são tabu para não dizer que são proibidas de proferir.

    O Dr. Silva Lopes disse o palavrão intergeracional ontem (sob a forma de metáfora da geração grisalha) relativamente à contribuição dos atuais pensionistas. E foi metaforicamente colocado na cruz em alguns jornais Portugueses por quem lá parou para comentar.

    http://www.jornaldenegocios.pt/economia/seguranca_social/detalhe/silva_lopes_acho_muito_bem_o_corte_nas_pensoes_pois_nao_ha_outro_remedio.html

    Mas sem dúvida é algo que tem que ser discutido e ser discutido já, paralelamente às reformas do Estado e aos incentivos ao investimento na economia Portuguesa. A OCDE publicou nos últimos dias mais um estudo que revela que a pobreza está a aumentar nas franjas geracionais, o que vai de encontro ao indice de dependência Português.

    Daqui surge a necessidade de perguntar porque é que não existe atualmente equidade no cálculo das reformas de todos os Portugueses; reformas atribuidas ao fim de meia dúzia de anos contributivos, reformas pagas a 100% relativas ao último salário, 90% dos melhores 10 dos últimos 15 anos, 80% da média da contribuição e por aí a fora. Tem que se quantificar quem está dentro de cada um destes grupos, unificar rapidamente uma fórmula de cálculo igual para todos e aplicá-la. Independentemente de o tribunal constitucional dizer que tal unificação fere direitos adquiridos, é emergente fazer tal exercício de pensamento.

    Concomitantemente temos que perceber onde está o melhor “value for money” para aplicar este dinheiro: a nível dos apoios da segurança social ? Na promoção da natalidade? Na educação e no investimento em I&D nas universidades e na promoção da sua ligação às PME Portuguesas e internacionais? Na contribuição para aumentar as reformas mais baixas e melhorar a equidade nos apoios sociais? Na promoção do envelhecimento ativo e na empregabilidade de pessoas com mais de 50 anos?

    Quanto à tributação da poupança privada, já ocorreu um aumento de 3% de 2012 para 2013, situando-se a tributação em 28% atualmente. É importante baixar tal tributação como forma de incentivo à poupança privada nos tradicionais depósitos e em fundos de investimento / ETF’s, como forma de complementar a reforma de cada cidadão que sinta necessário complementar a sua reforma.

    Por outro lado, poderemos, ao baixar a carga fiscal, atrair depósitos de cidadãos estrangeiros, alargando a nossa base tributária e efetuar emissões de obrigações Portuguesas com um juro mais baixo do que foi atualmente pago para os 10 anos e exclusivamente voltado para a poupança de particulares, no mercado secundário.

    Mas parece que a palavra de ordem nos dias que correm é o empobrecimento generalizado intergeracional com o argumento de ganhar competitividade à custa da velha rábula dos baixos salários e do estado magrinho e eficiente.

    Espero que não acabemos todos em pele e osso… afinal a desnutrição mata mais que a obesidade!

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