Decorreu no fim de semana passado a conferência Portugal Europeu. E agora?.
Como assisti a algumas sessões, creio útil relatar os principais pontos que me chamaram a atenção (até podem nem ser os mais relevantes). Houve uma considerável diversidade de temas (saudável), e de opiniões (também saudável), bem como de capacidade de prender a audiência e conseguir transmitir de forma clara ideias, novas ou não (alguma diversidade neste aspecto nas sessões em que estive a ouvir).
A primeira sessão envolveu Maria João Rodrigues, João Marques de Almeida e António Vitorino. Maria João Rodrigues muito focada na Comissão Europeia e no “medo” da hegemonia alemã (mas sem citar directamente o país, claro). João Marques de Almeida muito focado no “medo” da Rússia e dos desafios que essa fronteira coloca à União Europeia do ponto de vista militar (e para os quais conclui que não estamos preparados). António Vitorino com uma visão mais ampla da actual crise económica, à qual se junta uma crise de crescimento institucional da União Europeia, e no fim o “medo” da nova vaga de fundos estruturais não ser bem aproveitada.
Temos pois vários “medos” a vencer. Alguns deles serão retomados noutras sessões.
O que retive em bloco de notas das várias intervenções:
Maria João Rodrigues: necessidade de orçamento da zona euro; caminho para Eurobonds e outros instrumentos; risco de directório, com hegemonia de alguns países. Hegemonia é diferente de liderança para é para hegemonia que se caminha.
João Marques de Almeida: focou em três perigos: 1) cinismo político – incapacidade de transformar politicamente os países vizinhos por parte da União Europeia e daí passar para a indiferença sobre lutas envolvendo valores fundamentais. 2) falta de capacidade militar da União Europeia e recusa em usar o instrumento militar na política externa. 3) permanente neutralidade estratégica. Quem são os aliados? os adversários? quais são as ameaças? os interesses? da União Europeia. Sem responder a estas questões não há uma política externa. Adiar responder não substitui ter de responder e de fazer escolhas. Solidariedade europeia não é só económica é também política e de segurança (e alguns países da União Europeia têm fronteiras com vizinhos difíceis).
António Vitorino: Portugal construiu um perfil europeu, internamente e externamente, de país fiável e previsível. A adesão à CEE foi uma apólice de seguro para a democracia. Foi uma forma de gerir a relação com Espanha. Houve o participar num projecto de bem estar e prosperidade. Portugal esteve presente nos núcleos de decisão da União Europeia (mercado único, Schengen, euro). Perante as transformações europeias, o perfil de Portugal permanece válido? sim, há que adaptar às transformações. A integração não faz desaparecer os interesses nacionais. O alargamento para 28 países na União Europeia alterou equilíbrios e o risco da lógica protecionista. Há também um complexo do declínio europeu, por vezes mais imaginário que real.
O espaço lusófono é relevante mas não substitui o espaço europeu. A crise do euro alterou equilíbrios europeus, desfez-se o equilíbrio entre Alemanha e França.
Há uma mutação constitucional na União Europeia. O regime muda sem mudarem as regras do regime. Subverte-se a lógica das regras formais. É demasiado cedo para conhecer o resultado final.
Portugal não deve alinhar numa Europa à la carte. A “europa” é um pacote, fundamental para haver equilíbrio e solidariedade entre os estados membros. Como prioridade deve constar estar no núcleos de aprofundamento. Permanência no euro é pré-condição para a retoma económica. Exige recalibragem interna da agenda europeia. O debate sobre a convergência real deve voltar a ganhar peso.
A crise debilitou o papel das instituições europeias. Há sinais ambíguos: há mais decisão nacional mas também há o compacto fiscal. A crise tornou mais claro o problema de legitimidade democrática. O modelo do passado já não funciona. Fazer entrar os parlamentos nacionais no funcionamento das instituições europeias poderá ser uma via.
Os fundos europeus foram a apólice de seguro dos europeístas portugueses na defesa desta aposta. Hoje os fundos já não chegam para esse papel. Há que ter mais argumentos. Vai ser preciso mostrar a vantagem de estar no projecto europeu. A boa utilização dos fundos europeus depende da boa qualidade das instituições públicas e privadas. Não se pode pensar em taxa de execução. Deve-se pensar em efeito multiplicador. Introduzir princípio de concorrência no acesso aos fundos. Acompanhar de cultura de avaliação do efeito multiplicador dos fundos. É necessário lidar com proximidade versus centralização, conhecimento local versus “captura”.

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