Momentos económicos… e não só

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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (9)

No ponto 1.9 há o desenvolvimento das ideias referentes à (fraca) participação dos cidadãos que estavam referidas no sumário inicial. Diz-se que o envolvimento destes parece estar limitado à revisão de propostas de legislação. O que significa que não é verdadeiramente o cidadão que o faz, mas alguém que alegadamente o representa (nuns casos será mais verdade do que noutros), e que mesmo esta contribuição será provavelmente ignorada – como não são conhecidos os prazos de consulta que são dados, não é possível avaliar, mas o que se vai conhecendo informalmente, estas “consultas” são apenas para cumprir outra legislação que a elas obriga e não num verdadeiro espírito de obter contribuições. Estas para serem efetivas têm que ocorrer num momento anterior. Numa visão mais geral, tenho alguma curiosidade sobre o que seria o resultado dos dirigentes na área da saúde almoçarem de vez em quando com cidadãos anónimos para conhecerem a sua experiência junto do Serviço Nacional de Saúde.

O desafio lançado, e coincidente também com o tom geral do Relatório Gulbenkian, é que os cidadãos (doentes, mas não só) devem ser levados a focar-se mais na gestão da sua saúde, das suas condições crónicas, procurando conselho e orientação junto do sistema de saúde, mesmo antes de procurarem cuidados de saúde formais.

Em termos de avaliação destes aspectos, é referida uma avaliação que seria feita em Janeiro de 2015 para os cuidados de saúde primários, e para os cuidados hospitalares referem inquéritos de satisfação que parecem ter parado em 2009 (há seis anos). Felizmente a Entidade Reguladora da Saúde tem mantido a regularidade das avaliações de qualidade (o SINAS – Sistema Nacional de Avaliação em Saúde).

É reconhecido que Portugal tem um sistema de reclamações que o cidadão pode usar, mas é dito que é um mecanismos relativamente fraco e que são necessários outros instrumentos para obter a visão do cidadão. Aqui, será, a meu ver, de ter cuidado para que os instrumentos não levem a cair na litigância para obter indemnizações. A sugestão de ter ratings dos doentes aos serviços (e até aos médicos) que é feita pela OCDE deverá acautelar a reacção aos ratings por parte dos visados. Será bom que se pense antes qual a forma pela qual cada prestador ou profissional de saúde poderá melhorar no seu rating e saber se isso tem algum efeito em aspectos não observáveis, e consequentemente não avaliados, pelo cidadão.


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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (8)

Depois do capitulo dedicado a avaliação e recomendações (que não tinha número), surge o capítulo 1, intitulado a políticas de cuidados de saúde em Portugal.

A apresentação do contexto português voltou a trazer as despesas em saúde, mas começando com os resultados, neste caso traduzidos pela esperança de vida à nascença. Se os resultados não são os mesmos, qual o significa de comparar despesa? E a restrição orçamental global não é a mesma, que sentido tem comparar despesa per capita e resultados? É preciso definir em que condições se define a despesa e que resultados se podem alcançar. Fora isso, não há muito a comentar quanto aos indicadores usados e às ilações retiradas.

O relatório torna-se mais interessante quando se discute a qualidade dos inputs do sistema de saúde português, nomeadamente quando se introduz a possibilidade de maior desenvolvimento da educação profissional permanente. O desafio da atualização dos profissionais médicos tem que ser pensado.

Uma outra secção é dedicada, como seria de esperar, ao tema do desenvolvimento das orientações clínicas, às variações de prática clínica numa formulação mais geral. Neste ponto, há um par de elementos interessantes – além do reconhecimento da produção das normas de orientação clínica, é referido que a avaliação dos seus efeitos está em curso, e esperemos que os resultados sejam publicamente conhecidos. A única informação prestada é a de haver maior utilização das mesmas nos cuidados de saúde primários do que nos hospitais, e de ser a região de saúde de Lisboa e Vale do Tejo a que mais segue as normas. Estes são referidos como sendo “early results”, seria bom conhecer a evolução, situação atual e diferenças, justificadas ou não, entre instituições.

Há uma crítica implícita às normas portuguesas, referindo que se limitam na sua maioria às medicamentos e aos dispositivos médicos, enquanto outros países da OCDE têm orientações que abrangem todo o percurso do doente e a definição da melhor prática. Nos casos em que em Portugal se tenham definido normas que tenham esta maior abrangência será relevante saber se estão a contribuir para melhores resultados e para menor variância de resultados entre locais de tratamento.

Numa outra linha, mas relacionada, o relatório da OCDE menciona a importância de ter instrumentos que facilitem a prestação de cuidados de saúde de elevada qualidade numa diversidade de locais a doentes com necessidades que implicam múltiplos prestadores de cuidados de saúde. Um desses instrumentos será registos de informação clínica que sejam portáveis entre prestadores, ou seja, interoperabilidade entre sistemas informáticos, sendo a posse da informação do cidadão e não de cada prestador / sistema informático. Há ano e meio, a Associação Portuguesa para a promoção e desenvolvimento da Sociedade da Informação produziu um documento sobre o tema, disponível aqui. Uma vez mais o problema não está em não se pensar no assunto, está em concretizar.


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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (7)

Uma das secções do relatório é dedicada à utilização mais eficiente dos recursos humanos, com vários aspectos: a) alteração do trabalho dos enfermeiros, também eles devem sair do hospital, participar na coordenação necessária a altas mais cedo de doentes, etc; b) pensar na figura do gestor de caso (aliás, já sugerida num relatório sobre integração de cuidados apresentado ao Ministério da Saúde); c) repensar o modelo de acompanhamento da doença crónica, o que se liga ao ponto anterior, e tendo como ponto de partida a diabetes.

Para organizar melhor esta evolução no papel das várias profissões de saúde, talvez uma possibilidade seja ter uma task-force, à semelhança do processo que criou e conduziu o processo das unidades de saúde familiar.

Outra reforma está associada às Administrações Regionais de Saúde (ARS) e ao que fazem. Em concreto, a proposta parece ser retirar alguma descentralização, para que as ARS se possam concentrar nas acções em que beneficiam do conhecimento local que possuem. Neste ponto, vale a pena pensar qual a dimensão adequada e se calhar encarar mesmo acabar com as ARS (ou pelo menos concentrar duas delas, Alentejo e Algarve, para ganhar escala de trabalho) ou então pensar na ação descentralizada com base noutra unidade geográfica. Ou seja, para o papel de maior proximidade da população e utilização de conhecimento local, não é clara qual é a unidade geográfica mais adequada – pode ser a ARS, pode ser mais agregada ou menos agregada.

Surge ainda, com maior detalhe, o problema das variações de prática clínica – neste campo é necessário não só conhecer essas variações, como identificar as alavancas a nível das instituições e saber como as aplicar para reduzir essas variações.


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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (6)

Há no relatório da OCDE uma discussão do que foi feito no campo do medicamento, com a pressão do Governo para redução da despesa pública nesta área. A dúvida que se pode ter é se haverá capacidade de manter esta pressão durante mais anos, e se haverá espaço para a utilização do “fiscal claw-back” – um imposto / taxa adicional se o objectivo de despesa pública em medicamentos não for alcançado.

O passo seguinte, segundo a OCDE, estará no padrão de prescrição de medicamentos. Depois de actuar no preço, há que actuar nas decisões de prescrição (quantidade). Em qualquer caso não há referência a alterar a parte do cidadão e a parte do Serviço Nacional de Saúde.

Para outras reformas estruturais, no caso dos cuidados hospitalares, há uma sugestão concreta, a de procurar processos de altas mais cedo quando se trate de próteses de anca ou AVC, segundo um modelo iniciado na Suécia – não é alta antecipada e ponto final, e sim um modelo de maior participação de cuidados domiciliários, permitindo que a pessoa saia mais cedo do hospital. Ou seja, retoma nesta sugestão a lógica mais geral de alterar a combinação de intervenções de diferentes níveis de cuidados dentro do sistema de saúde.


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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (5)

Sobre as iniciativas destinadas a melhorar os processos de garantia da qualidade, o relatório da OCDE é bastante positivo sobre o que se tem feito em Portugal. A melhoria dos processos de qualidade significa que o sistema de saúde – e o Serviço Nacional de Saúde nele incluído – terá boas condições para a adoptar a visão proposta no Relatório Gulbenkian de tomar a melhoria contínua da qualidade como um dos alicerces de transformação e de sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde (e de todo o sistema de saúde português).

Também deste relatório se ressalta a necessidade de foco na implementação, dado que as iniciativas chave já existem. Uma ideia possível será inverter a lógica atual e passar para, em lugar de premiar o que é bom ou bem feito, assumir que é essa a obrigação normal, e penalizar o que estiver mal, como forma de sinalizar o que deve ser o standard.

Há, ainda, uma referência ao tempo de internamento médio em Portugal para doenças cardiovasculares, que é mais elevado e é apontado como sinal de ineficiência que se deverá melhorar. Mas aqui creio ser necessário algum cuidado adicional. Se tivermos menos episódios de internamento mas mais graves, é normal que tenham maior demora média em dias de internamento. Sem ter o cuidado de ajustar para as condições concretas, e ajustar para a complexidade dos casos que têm de ser tratados, não se podem extrair conclusões tão rapidamente. A conclusão até pode ser verdadeira, mas é preciso mais cuidado.

Em termos de recomendação, a OCDE sugere o desenvolvimento de estruturas intermédias de cuidados de saúde como está a ser feito na Noruega como forma de passar cuidados intermédios, não agudos, do hospital para outras entidades.

No processo de melhoria de qualidade, a OCDE diz que “alcançar uma utilização mais eficiente dos recursos humanos será particularmente crítico uma vez que é onde a grande fatia da despesa está. O desafio não deve ser subestimado – alterar práticas e comportamentos poderá provar ser bem mais difícil que as reformas estruturais prévias”. Este é um aviso importante e daí ser igualmente importante saber como se pretende tratar esta questão (algo a ver nos programas políticos que venham a ser apresentados).


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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (4)

Continuando a leitura do relatório sobre a qualidade no sistema de saúde, é dado destaque (p.26) a “maximizar a contribuição de cuidados de saúde primários aproveitando de forma completa a informação disponível e os recursos humanos disponíveis, promovendo a prevenção da doença e a gestão das doenças crónicas”. O desenvolvimento do enfermeiro de família recebe também uma visão positiva, dando como referência evolução similar em países como a Inglaterra, a Dinamarca e a Suécia.

No campo da informação, é necessário levar a informação recolhida à gestão. Não é uma questão de mais informação e sim de como a utilizar. Exige treino dos profissionais a ler e usar essa informação e o ter interfaces que facilitem esse papel.

Como de costume fala-se sempre de prevenção e em associação aos cuidados de saúde primários. Em particular, falar-se de incentivos aos cuidados de saúde primários para terem mais actividades de prevenção, e em alterações de funcionamento que acompanhem as mudanças nas necessidades da população.

Passando à parte da qualidade nos hospitais portugueses (na verdade, a forma como está escrito sugere que se está a pensar sobretudo nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde, embora as ideias sejam realmente aplicáveis a todos os hospitais, públicos ou privados), há o reconhecimento de que se tentou intervir no ambiente hospitalar, e que há desafios que permanecem: conseguir processos clínicos mais eficientes, desenvolver mais cuidados de saúde fora dos hospitais, rever os incentivos associados ao desempenho hospitalar, e avaliar o impacto da reforma hospitalar nos resultados clínicos.

A reforma hospitalar é uma “never ending story” pois há sempre algo mais para fazer; parte do sentimento de insucesso poderá ser porque não se chegou ainda verdadeiramente à organização das actividades dentro do hospital; poderá também ser porque se pensa sempre num big-bang, em que de um dia para o outro se redesenha os hospitais, quando é provavelmente mais útil pensar em termos de processo de longo prazo. Apesar do que é dito sobre a reforma hospitalar, a OCDE não faz uma verdadeira avaliação da alteração na qualidade da gestão dos hospitais. Apesar de dizerem “based on available evidence” (p.29) não há indicação de qual o documento publicamente disponível onde essa informação possa ser consultada.


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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (3)

Ainda dentro do capítulo de avaliação e recomendações, a OCDE introduz o tema de envolvimento dos doentes e aprendizagem com base na experiência dos doentes como uma prioridade, aspecto em que é uma vez mais coincidente com o Relatório Gulbenkian. E aqui é apontada uma fragilidade ao sistema de saúde português: o envolvimento dos doentes nos processos de decisão do sistema de saúde aparenta ser fraca. “Aparenta” é a forma delicada de dizer que falta. Envolvimento dos doentes não é ter uma caixa de reclamações permanente, a tendência natural, e sim desenvolver uma parceria no processo de decisão.

Sobre a recolha da experiência dos doentes, há referência ao uso da internet para recolher opiniões dos cidadãos – é este um aspecto que será culturalmente aceite em Portugal pelos profissionais de saúde que têm contacto directo com os cidadãos (administrativos, auxiliares, farmacêuticos, enfermeiros, médicos)? Qual o grau de preparação de cada profissão para estes ratings pela população? Que informação terão realmente?

E a recomendação da OCDE surge em termos de solução por um portal único para os doentes.

Relativamente aos cuidados de saúde primários, é interessante a afirmação de que Portugal “quase tem um excesso de informação disponível sobre os cuidados de saúde primários”, ou seja, informação não falta ao nível dos cuidados de saúde primários, há que agir em função dessa informação. A inovação presente na criação das USF é reconhecida como um elemento positivo. E a heterogeneidade dentro dos cuidados de saúde primários é apresentada como uma questão que levanta preocupação. A recomendação é que todas as unidades de cuidados de saúde personalizados (os tradicionais centros de saúde) sejam transformadas em USF. Há duas formas de o fazer em formato de big-bang (forçar a mudança numa data), deixando de ser um processo voluntário para ser um processo administrativo. Quais os riscos que comporta e quanto dos resultados obtidos depende da mudança ser voluntária?


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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (2)

Depois do sumário executivo, há uma secção dedicada a avaliação e recomendações.

Como exemplos de áreas onde se deverá procurar melhor apresentam a mortalidade subsequente a AVC, infecção hospitalar e taxa de cesarianas. Pelo menos as duas últimas têm sido objecto de atenção. No caso da infecção hospitalar, constitui um dos “Desafios Gulbenkian”, estando em curso uma iniciativa para estimular processos que levem à sua redução. No caso da taxa de cesarianas, já o relatório do grupo técnico para a reforma hospitalar lhe dava destaque no final de 2011, e colocava objectivos para a sua redução.

Há, também nesta secção, uma referência que me parece no mínimo confusa – é dito que Portugal apresenta uma disponibilidade para usar o sector privado para obter ganhos de eficiência e responder melhor às necessidades dos doentes. Não creio que se possa retirar essa conclusão do que é dito antes, pois usar mecanismos do sector privado dentro do sector público é diferente de usar o sector privado. E utilizar PPPs da forma relativamente limitada, e aos soluços, dificilmente pode ser apresentado como uma aposta de fundo. Na verdade, tem havido uma certa indefinição neste campo – com Luís Filipe Pereira era mais clara essa intenção de utilização do sector privado para prestar cuidados de saúde, com Correia de Campos a aposta foi no sector público e na utilização de mecanismos do sector privado dentro do sector público, e a partir de 2011 a preocupação foi sobretudo com o cumprir dos compromissos com a troika e não com uma perspectiva ideológica público – privado na prestação de cuidados de saúde pelo Serviço Nacional de Saúde.

Os desafios explicitados para a melhoria dos cuidados de saúde em Portugal neste capítulo do avaliação da OCDE são:

  • expandir os cuidados de saúde primários, com recuo da actividade hospitalar
  • maiores parcerias entre o Serviço Nacional de Saúde e o sector social nos cuidados continuados (começando a já ser uma recomendação clássica de vários relatórios, tem que se ver o que significa exactamente)
  • forçar a passagem a USF de todos as unidades de cuidados de saúde primários que ainda não o são, com o alargamento do sistema de incentivos a todos. É importante saber se o que está aqui em causa é apenas uma questão de incentivos ou se há algo mais. Isto porque sendo a criação de USF dependente quer da vontade dos profissionais de saúde quer do Governo, é necessário conhecer qual o estrangulamento mais presente neste momento.

Numa avaliação geral, é dito que o sistema de saúde português presta bons cuidados de saúde com baixa despesa. Inevitavelmente falam na despesa per capita mais baixa que a média da OCDE, o que só é relevante se os resultados não forem diferentes, e sobre isso nada é dito (esta é uma deficiência comum em muitos relatórios).

A OCDE também reconhece que Portugal tem uma boa infraestrutura de informação, por comparação com outros países da OCDE. O que deixa apenas na nossa mão a capacidade de fazer melhor em termos de utilização de recursos e objectivos assistenciais à população.

Depois deste panorama geral, o relatório da OCDE tem uma secção dedicada à qualidade ao nível clinico. Têm o cuidado de dizer que não há áreas que sejam particularmente más, mas que ainda assim é necessário dar mais atenção a este aspecto. Na qualidade dentro das instituições, as referências para os hospitais são menos abonatórias que as referências para os cuidados de saúde primários, o que dada a “tensão cultural” que normalmente existe entre os dois lados é interessante de constatar.


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OCDE: relatório sobre a qualidade no sistema de saúde português (1)

O relatório sobre qualidade no sistema de saúde português produzido pela OCDE há um par de meses foi o primeiro de uma série de relatórios sobre a saúde e os cuidados de saúde em Portugal e será o último a ser aqui comentado (é também o mais volumoso!)

Logo no prefácio, e ainda antes do sumário executivo, vem a afirmação de que a abordagem à monitorização e melhoria da qualidade é “particularmente sofisticada” em Portugal. O desafio que colocam é o aprofundamento das iniciativas sobre a qualidade. Esta ideia central reforça, vários meses depois, o que foi avançado no Relatório Gulbenkian (apresentado em Setembro de 2014). E novamente há aqui uma preocupação com a implementação, mais do que com o quadro conceptual – linha coincidente uma vez mais com a preocupação base do Relatório Gulbenkian.

De seguida, há a referência aos cuidados de saúde primários e às USF, num aspecto em que se retoma temas de outros relatórios e onde há concordância entre os principais partidos políticos.

Relativamente aos hospitais, este prefácio, foca em três aspectos centrais, que serão certamente desenvolvidos, e que não estão associados com as “guerras de valências” e concentrações, mas que podem significar “encerramentos para dentro” e “aberturas” de outra natureza: adesão às orientações clínicas, transferir cuidados dos hospitais para a comunidade, e reforçar os instrumentos de melhoria de qualidade.

O sumário executivo repete várias destas ideias, em particular o forte ponto de partida em termos de monitorização e iniciativas de melhoria da qualidade. Nos cuidados de saúde primários há uma apreciação positiva, com uma referência às taxas de hospitalização evitável em doenças respiratórias (asma e doença pulmonar obstructiva crónica). Em termos de recomendações, é referida a necessidade de ter uma utilização óptima dos recursos humanos disponíveis e assegurar que os cuidados de saúde primários tomam a liderança na precenção de gestão das condições crónicas.

Sobre a reforma hospitalar, o sumário executivo vai colocar o seu início à década de noventa do século passado e é “um processo em curso” (e que na verdade nunca estará terminado, no sentido de parar a necessidade de ajustamentos e mudanças).

Como áreas a necessitar de atenção, são apontadas a variação de prática clínica, os padrões de prescrição de medicamentos, e períodos de internamento longos para algumas situações.

As prioridades sugeridas são duas: 1) focar nos processos clínicos e nos percursos dos doentes; 2) usar de forma mais efectiva os recursos humanos na saúde. Ou seja, menos atenção nos aspectos macro de despesa e de definições de sustentabilidade e mais nos aspectos organizacionais.


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Sobre o Relatório de Primavera 2015 (8)

O capítulo 6 dedicado ao “acesso aos cuidados de saúde mental”. Este é um capítulo relativamente longo, com uma revisão cuidada da evidência disponível e das barreiras existentes (incluindo custos com transportes). A documentação de que os tempos de crise afectam a saúde mental da população não é exactamente uma surpresa (embora fosse interessante ter um índice de qualidade de vida que pudesse ser avaliado, em vez do aspecto meramente qualitativo de se “sente um agravamento da vida” – ver aqui).

Globalmente, o Relatório de Primavera é, na informação que presta, menos negativo para o ajustamento do Serviço Nacional de Saúde do que transpareceu na imprensa. E as opiniões mais negativas, mesmo que correspondam a uma percepção que poderá ser correcta, não têm completo suporte nas análises produzidas, às quais falta sobretudo a capacidade de identificar explicações alternativas para a evidência básica e definir a informação que sirva para discriminar entre as várias hipóteses alternativas.