Momentos económicos… e não só

About economics in general, health economics most of the time


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e o que pode resultar dos resultados das autárquicas?

ao contrário do que se possa pensar do título, não estou a pensar em leituras políticas a nível nacional, ou a nível local sequer, ou em política.

A questão mais interessante, do ponto de vista económico, e ligando à reforma do estado, é outra. Com as eleições realizadas, e com o decréscimo do número de câmaras municipais nas mãos dos partidos da coligação governamental, será que se conseguirá desbloquear uma verdadeira reforma da administração local. A união de freguesias foi uma resposta tímida ao desafio do Memorando de Entendimento de obter uma administração local mais eficiente. Dizer que se reformou a organização administrativa do país com essa união de freguesias não é razoável.

Mas com esta mudança no mapa autárquico, a resistência informal (via pressão interna dos partidos) será substituída por pressão pública, o que tornará mais claros os argumentos a serem usados nalguma tentativa de reforma.

Um segundo aspecto de interesse dos resultados é o aumento de casos em que cidadãos agrupados de forma não partidária ganham a presidência de câmaras municipais. Uma vez que existe literatura a demonstrar o efeito dos ciclos eleitorais na despesa pública feita pelas autarquias (ver aqui os diversos trabalhos de Linda Veiga e associados, Universidade do Minho), será interessante seguir se o comportamento destes novos eleitos irá seguir o padrão habitual e associado a presidentes eleitos em listas de partidos ou não.

 


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Sagrada Família em Barcelona,

faz-me pensar o que deve ter sido a construção das grandes catedrais europeias do passado, mas hoje em dia com antevisão em video e com participação de empresas portuguesas (aqui); a primeira vez que a visitei faz agora 20 anos, e vão-se vendo os progressos, mas ainda falta muito. Para quem tiver a curiosidade de ter mais informação, aqui fica.


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recuperação de empresas

Tem vindo a ser reconhecido que o programa revitalizar tem problemas. É salutar reconhecer que algo não está bem como primeiro passo para resolver. Resta agora concordar no que não está bem. Aparentemente o principal problema está na capacidade de decisão rápida. Ajudar empresas em dificuldades significa um julgamento de valor sobre a empresa e a sua gestão, e o potencial futuro. Como é fácil haver divergência resultam recursos e impugnações de decisões, que vão contra a necessidade de decisão rápida. A vantagem de decisões rápidas é evitar-se a “corrosão” da empresa, seja no seu capital físico (equipamentos) seja no seu capital humano. Frequentemente, mais do que revitalizar a empresa importa fazer com que os seus activos físicos, humanos e imateriais (a cultura da empresa, por exemplo) sejam utilizados de forma produtiva o mais rapidamente possível. Seja na mesma área de actividade ou transferidos para outra.

Assim, o ponto de partida de um programa de apoio à estrutura produtiva da economia (e não programa de apoio a donos de empresas e sua gestão) deveria ser venda tão rápido quanto possível da empresa, incluindo a possibilidade de compra pela equipa de gestão quando diferente dos proprietários da empresa ou pelos trabalhadores. O estabelecimento de programas de recuperação da empresas deveria ser encarado como a excepção. Vender rapidamente a empresa faz com quem compre tenha que possuir um “plano de recuperação” próprio e alinhado com o interesse do novo dono. Vender rapidamente garante também a “disciplina” de mercado sobre os donos/gestores das empresas, que deixarão de poder contar com o dinheiro público ou com renegociações prolongadas como forma de sustentar as suas acções.

Vender rapidamente estimula também o aparecimento de novos empresários, ou a entrada em novas áreas de negócio, e pára uma certa tradição nacional de alguns em deixarem falir as suas empresas e às escondidas levarem as máquinas e equipamentos para novas empresas onde irão repetir o processo.

Um dos pilares de intervenção pública deveria ser o de agilizar o mercado de empresas / activos produtivos que estejam em dificuldades e não sustentar a sua sobrevivência em vida artificial, que frequentemente não é mais do que uma lenta agonia (com o mesmo resultado final produzido apenas mais tarde). Tem também a vantagem de quem falhar numa empresa poder tentar noutra o sucesso, mas ter que demonstrar capacidade em o fazer.


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ainda a despesa com medicamentos e o acordo entre Governo e APIFARMA

De acordo com uma notícia da semana passada, e confirmada por declarações públicas,  ficou (finalmente) resolvido o acordo da despesa com medicamentos para 2013.

Segundo o que está relatado, consegue-se cumprir o compromisso assumido no Memorando de Entendimento, com uma redução da despesa pública em medicamentos compatível com esse objectivo, ainda que menor do que o inicialmente pretendido pelo Ministério da Saúde mas maior do que o valor que a indústria farmacêutica dizia ser capaz de suportar.

Interessante será saber qual o mecanismo que assegura a participação das empresas no acordo já que a devolução de despesa (“payback”) caso o limite acordado seja estabelecido não deverá afectar as empresas que decidirem não subscrever o acordo (e para 2012 nem todas subscreveram). Aqui, o poder de persuasão está do lado do Ministério da Saúde e a forma como for tratado o ano de 2012 será determinante para o ano de 2013.

Um mecanismo compatível com o objectivo e não discriminatório no sentido de ser aplicável a todos é decretar uma redução de preços global de x%, temporária para 2013, contra a qual podem ser abatidos os valores da “devolução” que seja realizada por quem tiver subscrito o acordo (para não ter que contribuir em duplicado para a redução da despesa). O valor de x% deveria ser tal que permita alcançar o objectivo pretendido de redução de despesa pública em medicamentos acrescido dos custos de verificação do mecanismo. Como estar dentro do acordo entre Governo e APIFARMA reduz esses custos de verificação, a contribuição de payback ao abrigo do acordo teria uma majoração para reflectir essa diferença no abatimento à redução de preços.

Além de saber se este mecanismo terá poder suficiente para induzir uma  participação muito alargada no acordo de forma voluntária, para o futuro será necessário perceber em que medida esta redução da despesa pública em medicamentos é, ou não, sustentável. Mudar o nível sem mudar a dinâmica não resolve o problema futuro.

Outro aspecto do acordo, tal como mencionado na imprensa, terá sido o compromisso do Ministério da Saúde em reduzir as dividas às empresas e ser mais célere na autorização de novos medicamentos; por fim, um compromisso de estabilidade legislativa.

Quanto às dívidas, para o Serviço Nacional de Saúde ser um parceiro fiável esse problema não deveria existir sequer e os pagamentos serem feitos a tempo e horas, até porque o tempo de espera pelo pagamento acaba por ser reflectido nos preços de venda aos hospitais e usar essa dívida a fornecedores como instrumento de pressão (primeiro pelos hospitais que a criam junto do Ministério da Saúde para obter mais verbas, e depois pelo Ministério da Saúde para obter descontos de preço) só cria disfunções na gestão das unidades de saúde (hospitais) e desresponsabiliza quem consegue gerir melhor e pagar mais cedo. Não é claro que o acordo para os medicamentos gere qualquer mecanismo que altere os incentivos a criar dívida à indústria farmacêutica.

Quanto à estabilidade legislativa, também deveria ser prosseguida independentemente do acordo, além de não existir forma credível (que eu esteja a ver) de como o Ministério da Saúde se compromete com essa estabilidade por um horizonte razoável (que vá além de 6 meses).

Por fim, a autorização de medicamentos inovadores. O Ministério da Saúde não se pode, realmente, comprometer com uma aprovação célere. Pode, e deve, comprometer-se com uma decisão célere, que será, ou não, de aprovação da comparticipação do medicamento pelo Serviço Nacional de Saúde. Ter que produzir uma decisão não obriga a que tenha de ser uma decisão positiva. E num contexto de restrição orçamental forte, o critério para inclusão de medicamentos novos que aumentem a despesa será mais apertado do que quando há maior disponibilidade financeira. Mas o mecanismo de introdução de novos medicamentos na cobertura do Serviço Nacional de Saúde é toda uma outra discussão.


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Sextas da reforma – primeira sessão

Na passada sexta feira, 20 de Setembro decorreu com a intervenção de Kristina Lundqvist,  “qualidade e utilidade da informação financeira na administração pública” a primeira sessão de um ciclo de conversas entitulado “sextas da reforma“, sobre a reforma do estado.

Para quem não teve a possibilidade de estar presente, deixo aqui as impressões directamente do meu bloco de notas:

Introdução prévia à apresentação, realizada por Teodora Cardoso: Parlamento português aprova mais de 40 000 dotações de despesa, muitas de pequeno montante; na Suécia o valor é de 540, no Reino Unido de 450 e em França 256. O nível de granularidade de informação tem que ser muito grande para estas aprovações todas. Não contribuem para a transparência nem para a disciplina orçamental. E as mais de 40 000 dotações de despesa estão sempre a ser alteradas (não por votação no Parlamento, mas envolvem um processo consumidor de tempo). Gastam-se recursos sem haver realmente gestão das despesas. Há um enviesamento deficitário no sistema orçamental uma vez que se baseia numa previsão de receita normalmente optimista, mas a despesa fica logo inscrita, mesmo que a previsão da receita não se venha a verificar. A autorização do limite de aumento da dívida pública é também bastante generoso, permitindo acomodar a redução da receita que gera défice face a uma despesa que se realiza na mesma. Este enviesamento é reforçado pela perspectiva anual das decisões, uma vez que muita despesa tem implicações para os anos seguintes. A situação sueca é radicalmente diferente. Na Suécia há pragmatismo e organização. Não há improvisação no orçamento e por isso tem-se algo a aprender com esta experiência sueca.

Apresentação de Kristina Lundqvist

Procuram ter informação financeira de boa qualidade a tempo e para múltiplos fins. O organismo sueco é o National Financial Management Authority, (SVE).

A Suécia tem dívida pública sobre PIB à volta dos 40%, resultado em parte do enquadramento orçamental estabelecido nos últimos 20 anos.

O orçamento de estado sueco tem 23 áreas de despesa, monitorização mensal da despesa e em 2000 houve a fixação de um objectivo de excedente orçamental. A informação financeira produzida pelo SVE inclui a monitorização mensal do orçamento do estado, a publicação trimestral de estatísticas financeiras e a publicação anual de contas consolidadas.

Os utilizadores da informação financeira são: Parlamento, Ministério das Finanças, entidades estatísticas, instituto para a investigação, bancos, etc.

Os relatório são tornados disponíveis publicamente. Publicam previsões actualizadas trimestralmente.

Têm rotinas de produção de informação estabelecidas para cada mês, envolvendo reporte dos organismos governamentais, processamento da informação e publicação mensal dos resultados.

As estatísticas financeiras incluem as receitas, as despesas por tipo de despesa e as despesas por objectivo.

O relatório de consolidação das contas do governo central é apresentado no Parlamento até 15 de Abril de cada ano.

A recolha e consolidação dos dados financeiros é feita a partir de 230 organismos com sistemas contabilísticos separados, a base de dados central agrega tudo. A ESV garante a qualidade dos dados. Dão depois informação financeira agregada nas várias dimensões.

A base de dados é parte de um sistema de informação de maior dimensão, usado para o estabelecimento do orçamento do estado. A ESV tem a seu cargo a gestão e manutenção deste sistema de informação.

Como assegurar a qualidade dos dados? Regras claras e divulgadas, treino e formação, auditoria e outros controles.

Sobre as regras contabilísticas, vão desde uma lei orçamental global até orientações e manuais, as regras são obrigatórias para os diferentes organismos governamentais. As excepções têm que ser solicitadas e adoptadas. O que não estiver dentro destas regras tem como referência as regras de contabilidade utilizadas no sector privado.

Oferecem formação, conferências e orientação – apesar das semelhanças com o sector privado, há a necessidade de promover informação e formação (cursos, seminários, conferencia anual, newsletter, FAQ colocadas no sítio de internet). Também respondem a emails e telefonemas que lhes sejam dirigidos.

As conferencias são financiadas por pagamentos dos participantes.

Há auditoria da informação financeira. Uma auditoria externa pelo Swedish National Audit Office, e uma auditoria interna (os organismos públicos de maior dimensão têm que possuir uma auditoria interna). As auditorias internas são apoiadas pelo ESV.

Produzem um rating da gestão financeira. Reflecte em que medida a prática de cada organismo está de acordo com os princípios contabilísticos. Têm 26 questões em práticas e rotinas de resposta dada pelos próprios e 17 questões respondidas pelo ESV.

As previsões trimestrais são sobre receitas e despesas, limita da despesa e objectivo de excedente orçamental. Os ministros não têm capacidade para intervir no ESV, fazendo com que as previsões tenham credibilidade. As previsões são realizadas até 2017 (neste momento) e envolvem 14 pessoas, com especialização numa área especifica para ter o conhecimento necessário para fazer a previsão.

Têm como objectivo de excedente orçamental 1% do PIB, calculo em média do ciclo económico, para evitar políticas pró-cíclicas. É difícil definir e medir o que é ciclo económico e sobre o valor de excedente de 1% tem havido discussão sobre ser demasiado elevado.

O sistema foi desenvolvido desde meados dos anos noventa e foi evoluindo gradualmente. Não sendo perfeito vai sendo aperfeiçoado com o tempo.

Comentários e debate; perguntas e respostas.

Há iniciativas em curso em Portugal para rever brechas no processo orçamental.

Revisão do processo orçamental: tem que se automatizar um bom processo. O nível de detalhe exigido dispersa a atenção e tem impacto na “qualidade de vida” dos organismos e na responsabilização da sua actividade.

A conta geral do estado tem 8000 páginas. Transferiu-se o foco prospectivo de gestão para o retrospectivo da inspecção.

Perspectiva de inicio de controlo: sistemas de informação – há passos a dar na integração desta função. Há diferentes níveis de agregação (atomização) para diferentes organismos. Há que melhorar.

Na Suécia a maioria das funções sociais está nas autarquias. Como é integrada a despesa das autarquias no orçamento do estado? As autarquias também têm uma regra de orçamento equilibrado que é verificada, apesar de serem um sector autónomo.

O governo central faz transferências para as autarquias? E que percentagem do PIB? Sim, o dinheiro é transferido para as autarquias. É um valor substancial.

Como é que a organização da administração pública está especificada? O que significa um organismo ser responsável perante o conselho de ministros? Um ministro não pode alterar dotações orçamentais? A reafectação de verbas de um organismo para outro dentro do mesmo ministério tem que ser aprovado em conselho de ministros. É uma decisão colectiva. Dentro do mesmo organismo não pode alterar dotações orçamentais com um fim específico.

Quem fornece as previsões macroeconómicas para que as previsões orçamentais sejam compatíveis com elas? O ESV faz as previsões macroeconómicas.

Qual a base para estabelecer o limite da despesa? Qual é a regra seguida? O limite é estabelecido em termos nominais e com três anos de avanço. É proposto pelo Governo, tendo em conta o objectivo de variação da dívida, o crescimento da economia, a inflação, bem como a tendência histórica.

Os limites da despesa cobrem toda a despesa, incluindo os financiados de outra forma? Apenas incluem o que é financiado por impostos.

Comentário: decorreram oito anos entre o início e o estabelecer do enquadramento orçamental. É um processo que leva muito tempo. É preciso uma visão partilhada entre governo, níveis de administração e actores políticos. É necessário um compromisso político durável e capacidade institucional para aplicar. Em Portugal tem-se falhado nas diversas tentativas. Falha-se na visão partilhada. Falha-se na capacidade do Ministério das Finanças.

Qual o grau de autonomia e independência na produção das previsões pelas várias instituições? Não existe coordenação entre instituições na produção de previsões.

Que grau de centralização existe e/ou é desejável na recolha a partir dos sistemas de informação dos vários organismos? É um problema ter tantos sistemas de informação. Muitos dos organismos têm sistemas similares. Organismos muito pequenos adquirem fora. Começaram há um ano a experimentar um serviço partilhado que fará a contabilidade de um universo alargado de organismos. Mas a responsabilidade permanece com o organismo.

É feita revisão dos limites de despesa? Os limites normalmente não sofrem alteração. Até agora só foram revistos uma vez e no sentido de os baixar, quando a atual coligação de direita iniciou funções governativas na Suécia.

(alterado a 25 de Setembro de 2013)


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Portugal e a Europa (7): a visão de Dani Rodrik

A conferência plenária final de Dani Rodrik  não desiludiu e levou-nos a uma viagem pela sua visão da crise europeia, e dos caminhos que se apresentam. A grande conclusão será que as políticas adoptadas para solucionar a crise – austeridade fiscal para a questão da dívida e reformas estruturais para o questão de relançar o crescimento económico, ou não estão a funcionar ou se estão a funcionar são demasiado lentas a produzir efeitos e implicam um enorme sacrifício das populações, que a prazo poderá resultar em problemas sociais e para liberdade da sociedade (como exemplo, o crescimento dos extremismos na Grécia). Daí que avance com medidas do lado de estímulo da procura, a nível europeu, conjuntamente com uma definição de limites de inflação para o Banco Central Europeu mais amplo, permitindo ajustamentos por variáveis nominais (introduzindo mais graus de liberdade na procura de soluções). Vai também ser necessário fazer escolhas, e deixar cair uma das três seguintes: união económica, soberania nacional, políticas democráticas. Fingir que não há escolha a fazer não leva a que o problema de incompatibilidade entre as três desapareça, segundo Rodrik.

Do bloco de notas: (apresentação original aqui)

Duas narrativa têm estado presentes:

–       a culpa é deles – mau comportamento dos países da periferia

–       a culpa é colectiva – falhas no projecto europeu, união económica incompleta, com problemas estruturais expostos quando os países foram atingidos por um choque financeiro externo

Há elementos de verdade em ambas as narrativas. Em larga medida, os elevados défices externos resultaram de um fraco desempenho em termos de produtividade; para cada endividamento imprudente houve um credor igualmente imprudente. De qualquer modo, as crises financeiras não são histórias de moralidade.

Numa verdadeira união económica, a solução dos problemas seria bastante diferente.

Porque é que a Florida não é uma unidade económica relevante e como tal ninguém se preocupa com o seu défice “externo” (e eventualmente interno aos Estados Unidos)? tem leis federais para o sistema bancário, tem um “lender of last resort”, os pagamentos de desemprego e de apoio social são federais, os interesses da Florida estão representados nos órgãos de decisão a nível federal (em Washington), os residentes podem-se mover facilmente para qualquer outro lado, a Florida não tem poderes de soberania.

A europa tem um problema de interdependência mal gerida. Os credores não devem aproximar a questão da dívida como um problema de moralidade.

É preciso ter cuidado com o optimismo das projecções oficiais. Mesmo com as hipóteses optimistas que usualmente são usadas, Portugal só irá recuperar ao fim de mais de 5 anos o nível de riqueza produzido em 2007.

Os fundamentos económicos subjacentes à crise não têm sido tratados. Existem dois problemas base: a elevada dívida (problema de stock) e a baixa competitividade (problema de fluxo).

A baixa competividade implica ou elevado desemprego ou défices externos elevados. Passamos do segundo para o primeiro.

A fragilidade financeira foi reparada? em larga medida, não. Continua a existir muita divida e a desalavancagem financeira das empresas ainda mal começou. A fragilidade financeira continua na periferia. Os mercados financeiros continuam segmentados.

Foi a competividade restaurada? as melhorias registadas são limitadas, e são largamente devidas a redução de emprego. A maior parte da descida nos custos unitários de trabalho resultaram de um colapso no emprego. E não está a acontecer no sector privado. A melhoria da produtividade não está a acontecer. Segundo o FMI apenas se ajustou ainda ¼ da perda de competitividade.

Podem as reformas estruturais levar a um novo surto de crescimento económico?

a lógica é reavivar as economias através de ajustamentos no lado da oferta. Em teoria poderia funcionar, com flexibilidade do mercado laboral, com desregulação de profissões, com privatizações

Mas é isso que vemos na prática? vê-se sobretudo redução no número de trabalhadores em sectores de baixa produtividade, mas não há uma expansão nos sectores com elevada produtividade para absorver esses trabalhadores

Com uma baixa procura agregada, este segundo mecanismo não tem grande força.

Fica-se preso num ciclo vicioso – austeridade fiscal resolve o desequilíbrio externo, mas agrava o desemprego, o que agrava as contas públicas

As reformas estruturais acabam por fazer pouco para compensar este movimento.

Além disso, o fraco crescimento de toda a zona euro também prejudica Portugal porque as nossas exportações são fortemente concentradas na zona euro.

Está a crise a acabar? não propriamente. As actuais políticas estão a produzir pouco efeito: austeridade fiscal para reduzir dívida, reformas estruturais para promover crescimento.

O que é necessário?

–       assumir que alguma dívida será perdoada,  parte dessa dívida já está perdida de qualquer modo, não se há vantagem em continuar a fingir que não está

–       politicas direccionadas para a despesa – maior despesa na Alemanha, reduzir os preços dos bens não transacionáveis, ter políticas sociais ajudaria

–       ter para o Banco Central Europeu um referencial de inflação mais elevado, para permitir ajustamentos da taxa de câmbio real através de variáveis nominais

Em termos políticos, ter uma narrativa diferente sobre a natureza da crise. Abordar o problema em termos de gestão de interdependências e não de moralidade.

É provável que se siga este caminho? há uma janela de oportunidade depois das eleições na Alemanha. Mas não se pode esquecer o papel da França, que não tem grande incentivo a formar uma coligação com o sul da europa.

No longo prazo, existe um trilema político: de três tem que se escolher apenas dois:

1)   união económica na zona euro

2)   politicas democráticas

3)   soberania nacional

As três opções ao mesmo tempo não são possíveis.

Uma união económica que funcione requere uma redução da heterogeneidade estrutural nos enquadramentos institucionais – restrições na soberania nacional e na diversidade.

No curto prazo, devem-se usar alguns remédios keynesianos.

A democracia exige que funcionamento da economia de mercado seja acompanhado pelo funcionamento das instituições políticas.


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que outra nacionalidade da União Europeia escolheria ter?

foi a pergunta que coloquei há uns dias, com base em 35 respostas, os resultados até este momento são uma clara preferência pelo norte da Europa, com o Reino Unido à cabeça, seguido da Escandinávia, portugueses à fuga do estigma de país do Sul?

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Portugal e a Europa (6): O euro tem futuro?

Desta sessão, com Ana Paula Dourado, Mário Centeno, Guillermo de la Dehesa e Paulo Trigo Pereira, duas conclusões de natureza muito diferente.

Primeira conclusão, o euro tem futuro, tem racionalidade mas tem exigências de instituições adicionais. E que deixar desaparecer o euro traria problemas a toda a Europa e possivelmente às economias de todo o mundo (a União Europeia é o principal importador mundial).

Segunda conclusão, Pedro Santos Guerreiro receberia o prémio de melhor moderador de todo o encontro se tal distinção existisse.

Do bloco de notas:

Ana Paula Dourado:

Há falta de liderança política a nível europeu. Os políticos não partilham com os cidadãos os desafios europeus. Vamos necessitar de federalismo europeu e de impostos europeus.

 

Mário Centeno

Olhar para o euro de forma positiva, mas também interrogativa. É necessário construir outras instituições à sua volta, sendo preciso uma acção política, mas baseada numa boa análise económica.

A dispersão salarial na eurozona é maior do que nos Estados Unidos. A gestão do euro precisa de maior integração europeia. É necessário ter mobilidade social dentro da área euro.

 

Paulo Trigo Pereira

O euro não serve para ter duas realidades económicas muito distintas dentro da sua geografia. O euro não acaba mas países com baixa competitividade poderão vir a sair do euro.

Dar passos decisivos para manter todos os países no euro terá que acontecer. Terminar rapidamente a união bancária é um desses passos. É necessário avançar com o pilar da garantia de depósitos a nível europeu. Tem de haver um orçamento da área euro. O orçamento comunitário não tem capacidade de absorver choques a nível comunitário.

Este orçamento poderia ser baseados nas taxas de desemprego e ter efeitos redistributivos. Maior integração política europeia.

Duvida se a europa consegue dar estes passos em tempo útil.

Hoje estamos em condição mais difícil do que no momento do primeiro resgate de Portugal.

 

Guillermo de la Dehesa

A probabilidade de o euro acabar é muito baixa porque todos perdem. O fim do euro seria também o fim da União Europeia. A desintegração da União Europeia criaria uma recessão mundial. A União Europeia é o maior importador mundial. Com a desintegração da União Europeia, nenhum país europeu faria parte do G8 (por população). O fim do euro seria um desastre para a economia mundial.

 

Mário Centeno

As propostas existentes exigem sempre algum tipo de mutualização. A maturação dessas propostas tem sido lenta mas tem havido progressos. A europa pode resolver os seus problemas. Como um todo tem menos desequilíbrios que os Estados Unidos, por exemplo. O euro é uma excelente ideia económica.

Não podemos culpar o euro de todos os problemas da economia portuguesa e da economia europeia.

Tem havido uma partilha dos custos da crise entre empresas e trabalhadores. A separação/despedimento tem disso menor que antes da crise. Os salários estão a cair. Há cortes salariais e racionalidade económica no ajustamento salarial.

É então necessário corrigir as instituições que prejudicam o ajustamento. O euro tem que ter um estado de soberania que é necessário construir.

 

Ana Paula Dourado

Não se pode fazer tudo ao mesmo tempo. A europa sempre foi construída por pequenos passos. Problemas: segmentação do mercado de trabalho. Ainda estão por concretizar as livres circulações A união económica e monetária foi pensada para todos os estados. A solução ideal é o governo da europa.

 

Mário Centeno

Temos que criar instituições que permitam viver na diferença. A persistência histórica das características de cada região é muito grande e não vai desaparecer.

 

Paulo Trigo Pereira

A união orçamental não implica subordinação dos orçamentos nacionais. Fazer o controle dos orçamentos nacionais é uma escolha e não decorre de uma federalização. Em termos de evolução ou se avança para a integração ou se cai na desintegração. Espanha, Grécia e Portugal não têm capacidade de acomodar mais dois anos desta trajectória, que é insustentável socialmente. A situação actual não se irá manter. Não se pode ter mutualização da dívida sem perda de soberania.

 

Guillermo de la Dehesa

Merkel está a favor da união política. Os franceses não gostam da ideia porque preferem maior centralização do estado. A solução que prefere é um “redemption fund” para dívidas acima de 60% do PIB. Irá haver progresso lento mas inevitável nessa direcção.

 

psg


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Portugal e a Europa (5): Há uma Europa a longo prazo?

Muito interessante a sessão com Anthony Beevor e Mazower, a obrigar a pensar nos movimentos das ideias a longo prazo (sobretudo Mark).  O principal tema para pensamento futuro que me ficou é como forjar uma identidade europeia que terá de algum modo também estar presente no projecto económico. Embora não tenham colocado dessa forma, pareceu-me que parte da mensagem dos dois oradores era essa, apenas o projecto económico será insuficiente no longo prazo.

Fiquei com vontade de fazer uma pequena pergunta geral, para ajudar a reflectir sobre o que significa ser europeu:

como seria se cada europeu fosse convidado a ter cidadania de dois países da União Europeia, qual seria a sua escolha?

Deixo directamente do bloco de notas, incluindo do período de discussão:

Anthony Beevor

Engenharia social produz um resultado diferente do antecipado, ou pretendido, em geral. A paz é uma questão de governação, não de unificação ou integração. O euro em vez de unificar, dividiu e com alguma amargura entre países. No projecto do euro a ideologia sobrepôs-se à realidade.

Forçar uma política pelo euro é fazer ao contrário e estava condenado a falhar. O problema central é a falta de legitimidade democrática.

Problemas do presente são o peso dos pagamentos de juros nos défices orçamentais de vários países, e também o receio de a economia alemã ser tomada como refém pelos países do Club Med.

O escrutínio pelos media coloca os políticos na defesa; os líderes surgem naturalmente da entidade económica mais forte, neste caso a Alemanha.

Será que se consegue ter uma associação de países e unidade sem ter uma língua comum a todo o espaço envolvido?

Mark Mazower

A europa está como uma jangada numa corrente de ideias, pelo menos nos últimos 200 anos. O início pode ser colocado na era napoleónica, com uma nova utilização da noção de europa. A europa como ideal de civilização para o mundo, deixando de ser apenas entidade geográfica. A europa como problema de paz e como ter paz entre as nações.

Duas ideias estiveram presentes: grupo de países que se junta para manter a paz, gerir a estabilidade; em alternativa, manter a paz pelas acções do povo, sendo que este último é uma entidade difícil de definir. Uma outra ideia foi sendo aplicada: comércio livre como forma de gerir estabilidade entre países. Também surgiram durante este período ideias como substituir políticos por cientistas (engenheiros, por exemplo). Na linha da segunda ideia, teve-se os trabalhadores do mundo – o socialismo como forma de garantir a paz.

Uma quarta ideia: a democracia. As democracias irão viver em paz umas com as outras.

Depois de um mundo centrado na Europa, os Estados Unidos e a União Soviética continuaram esta linha de ideias. A segunda guerra mundial foi o fechar deste ciclo. Foi também uma luta de ideias da europa – a Alemanha como entidade unificadora, modelo de organização do mundo.

Esta é a fonte das ideias que observamos na discussão pública sobre a evolução europeia. Estas ideias deram origem a crescimento económico e à reimplantação da democracia na europa de forma generalizada. Afastou o receio de uma nova guerra na europa.

Depois de 1989, volta-se a alterar a visão da europa e da integração europeia. A europa como centro do mundo deixou de existir. Nova versão da integração – como única forma de fazer da europa de novo um parceiro central da política internacional. Europa como meio entre a China e os Estados Unidos. Europa como forma de ter liberdade e desenvolvimento.

Outra posição:  o estado nação não era resposta geoestratégica a países como a China ou os Estados Unidos.

Implicações para a crise: integração teve um papel de salvar as democracias, por terem um menor papel em termos económicos;  a integração do euro oferecia uma apólice de seguro de paz e democracia. A crise alterou essa percepção. A europa deixou de ser associada com paz, desenvolvimento e democracia. Exemplo é o crescimento do partido nazi na Grécia e o associar dos partidos da democracia à crise. É uma crise para a identidade europeia. Tem a virtude de acabar com a ideia de que a Europa é um modelo para o mundo.

Parece que a união monetária gerou os problemas do projecto europeu, e que a sua separação seria uma forma de recuperar a ideia da europa como paz, desenvolvimento e democracia. É a extrema liquidez dos fluxos de capital que introduz grandes dificuldades na política económica, e esta é uma decisão política.

Os políticos dos anos 50-70 do século passado viveram numa guerra, dando-lhes a percepção da importância de uma visão de longo prazo.

A crise mostrou o pouco que conhecemos do resto da europa, o que tem efeitos devastadores sobre as questões da solidariedade. Queremos o impossível dos alemães, mas vão ter que se ajustar à sua nova posição de poder, e não poderá ser uma posição de apenas defender uma política de poupança, para depois de comprar um carro alemão.

beevor mazo


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Portugal e a Europa (4) – Portugal Europeu

Esta sessão foi usada por Augusto Mateus para retomar o seu trabalho sobre 25 anos de fundos estruturais, que trouxeram um conjunto de informação disperso, sobre o qual Augusto Mateus constrói a sua interpretação, mas que tem a vantagem de dar liberdade a cada um encontrar a sua interpretação, alternativa ou não, mais detalhada ou não. Os comentários estiveram a cargo de António Barreto e Manuel Villaverde Cabral.

O resumo de uma frase que retirei é simples: Há uma necessidade imperiosa de desta vez garantir uma utilização de fundos estruturais disponíveis (poucos) em aplicações que tenham efeito multiplicador, pois a competitividade deverá ser pré-condição da coesão.

Pelo meio da discussão houve uma passagem breve por um aspecto focado várias vezes noutras sessões, a qualidade dos actuais líderes europeus, o que me deixou uma pergunta no ar: o que fez reduzir-se a qualidade da gestão política europeia? (ou sempre terá sido fraca e apenas se notava menos quando havia crescimento económico regular?).

Outro ponto singular surgiu na discussão, sobre o século XX português, com António Barreto a rematar com uma afirmação emblemática sobre esse passado, “Eu prefiro um erro em liberdade que uma certeza em ditadura”. E apesar dos muitos erros que temos para corrigir, incluindo eventualmente a qualidade dos líderes europeus, ainda assim a liberdade em democracia é um valor imprescindível. Foi a única vez, nas várias sessões em que assisti, em que se colocou, mesmo que tangencialmente a questão de liberdades.

Do bloco de notas:

Estamos numa profunda crise: crise financeira do Estado, endividamento excessivo das famílias e das empresas, crise da construção e governação europeias.

Transformações em curso: queda do muro de Berlim muda a configuração da Europa; distribuição bimodal do crescimento económico a nível mundial, sem convergência entre países e zonas geográficas – a economia mundial a duas (ou mais?) velocidades. Todo o emprego se tornou precário.

Mudança radical da Europa desde que Portugal entrou para a CEE – quando entramos tínhamos os salários mais baixos. Portugal e Espanha eram então sítios interessantes para o investimento directo estrangeiro. Com os sucessivos alargamentos da UE esta característica mudou.

Europa está em auto-negação das suas dificuldades e desafios. Há um falhanço dos pactos europeus e das políticas económicas europeias.

Exemplo de erro nas políticas europeias: utilização da política cambial (apreciação do euro) para garantir a estabilidade de preços. A Europa deixou-se cair numa moeda forte, mas sem tratar de realizar investimentos noutras áreas do mundo (que se tornaram mais baratos de fazer em euros).

O que temos de fazer?

1)   escolher aplicações de fundos com base em resultados e não em meios;

2)   não atribuir fundos apenas a clientes conhecidos;

3)   os fundos devem ser usados para assegurar a competitividade que irá garantir a coesão e não gastar directamente em coesão sem cuidar da competitividade

4)   não atribuir fundos em fatias de fiambre muito finas para que todos tenham uma; ou seja, reconhecer a importância da escala mínima para ter sucesso

5)   deixar de dar relevância a projectos individuais

Temos uma misteriosa tranquilidade com o problema e um misterioso medo com a solução do problema.

A sociedade deve focalizar-se mais no médio prazo, acelerar a nossa participação na globalização. O nosso problema de competitividade não é custo, é procurar ter maior valor acrescentado. Deve-se mobilizar a cultura e a criatividade, além da mera componente tecnológica.

António Barreto: A União Europeia e os fundos foram condição de estabilidade económica e política. Perdemos muito tempo, mesmo em comparação com outros países com transições do mesmo tipo (Espanha e Europa de Leste). O euro era esperado funcionar como factor de disciplina importada da Europa, mas afinal resultou o contrário, via crédito. Para o futuro, vamos fazer diferente, mas como? Estado perdeu capacidade técnica e científica de avaliar as políticas que quer seguir.

Manuel Villaverde Cabral: Ninguém sabe realmente o que se irá passar. O que temos é resultado da impreparação, incompetência, cinismo da classe política que não deixou votar, discutir, sobre os fundamentos da nossa alegada democracia na participação europeia. É difícil mudar o sistema societal, e não será o sistema político que o fará. Importância do envelhecimento, pois 1/3 do eleitorado são pensionistas. Distorce as escolhas. Pensa-se menos no longo prazo. E se admitirmos um crescimento de reposição da população como objectivo atingir?

mateus