A conferência plenária final de Dani Rodrik não desiludiu e levou-nos a uma viagem pela sua visão da crise europeia, e dos caminhos que se apresentam. A grande conclusão será que as políticas adoptadas para solucionar a crise – austeridade fiscal para a questão da dívida e reformas estruturais para o questão de relançar o crescimento económico, ou não estão a funcionar ou se estão a funcionar são demasiado lentas a produzir efeitos e implicam um enorme sacrifício das populações, que a prazo poderá resultar em problemas sociais e para liberdade da sociedade (como exemplo, o crescimento dos extremismos na Grécia). Daí que avance com medidas do lado de estímulo da procura, a nível europeu, conjuntamente com uma definição de limites de inflação para o Banco Central Europeu mais amplo, permitindo ajustamentos por variáveis nominais (introduzindo mais graus de liberdade na procura de soluções). Vai também ser necessário fazer escolhas, e deixar cair uma das três seguintes: união económica, soberania nacional, políticas democráticas. Fingir que não há escolha a fazer não leva a que o problema de incompatibilidade entre as três desapareça, segundo Rodrik.
Do bloco de notas: (apresentação original aqui)
Duas narrativa têm estado presentes:
– a culpa é deles – mau comportamento dos países da periferia
– a culpa é colectiva – falhas no projecto europeu, união económica incompleta, com problemas estruturais expostos quando os países foram atingidos por um choque financeiro externo
Há elementos de verdade em ambas as narrativas. Em larga medida, os elevados défices externos resultaram de um fraco desempenho em termos de produtividade; para cada endividamento imprudente houve um credor igualmente imprudente. De qualquer modo, as crises financeiras não são histórias de moralidade.
Numa verdadeira união económica, a solução dos problemas seria bastante diferente.
Porque é que a Florida não é uma unidade económica relevante e como tal ninguém se preocupa com o seu défice “externo” (e eventualmente interno aos Estados Unidos)? tem leis federais para o sistema bancário, tem um “lender of last resort”, os pagamentos de desemprego e de apoio social são federais, os interesses da Florida estão representados nos órgãos de decisão a nível federal (em Washington), os residentes podem-se mover facilmente para qualquer outro lado, a Florida não tem poderes de soberania.
A europa tem um problema de interdependência mal gerida. Os credores não devem aproximar a questão da dívida como um problema de moralidade.
É preciso ter cuidado com o optimismo das projecções oficiais. Mesmo com as hipóteses optimistas que usualmente são usadas, Portugal só irá recuperar ao fim de mais de 5 anos o nível de riqueza produzido em 2007.
Os fundamentos económicos subjacentes à crise não têm sido tratados. Existem dois problemas base: a elevada dívida (problema de stock) e a baixa competitividade (problema de fluxo).
A baixa competividade implica ou elevado desemprego ou défices externos elevados. Passamos do segundo para o primeiro.
A fragilidade financeira foi reparada? em larga medida, não. Continua a existir muita divida e a desalavancagem financeira das empresas ainda mal começou. A fragilidade financeira continua na periferia. Os mercados financeiros continuam segmentados.
Foi a competividade restaurada? as melhorias registadas são limitadas, e são largamente devidas a redução de emprego. A maior parte da descida nos custos unitários de trabalho resultaram de um colapso no emprego. E não está a acontecer no sector privado. A melhoria da produtividade não está a acontecer. Segundo o FMI apenas se ajustou ainda ¼ da perda de competitividade.
Podem as reformas estruturais levar a um novo surto de crescimento económico?
a lógica é reavivar as economias através de ajustamentos no lado da oferta. Em teoria poderia funcionar, com flexibilidade do mercado laboral, com desregulação de profissões, com privatizações
Mas é isso que vemos na prática? vê-se sobretudo redução no número de trabalhadores em sectores de baixa produtividade, mas não há uma expansão nos sectores com elevada produtividade para absorver esses trabalhadores
Com uma baixa procura agregada, este segundo mecanismo não tem grande força.
Fica-se preso num ciclo vicioso – austeridade fiscal resolve o desequilíbrio externo, mas agrava o desemprego, o que agrava as contas públicas
As reformas estruturais acabam por fazer pouco para compensar este movimento.
Além disso, o fraco crescimento de toda a zona euro também prejudica Portugal porque as nossas exportações são fortemente concentradas na zona euro.
Está a crise a acabar? não propriamente. As actuais políticas estão a produzir pouco efeito: austeridade fiscal para reduzir dívida, reformas estruturais para promover crescimento.
O que é necessário?
– assumir que alguma dívida será perdoada, parte dessa dívida já está perdida de qualquer modo, não se há vantagem em continuar a fingir que não está
– politicas direccionadas para a despesa – maior despesa na Alemanha, reduzir os preços dos bens não transacionáveis, ter políticas sociais ajudaria
– ter para o Banco Central Europeu um referencial de inflação mais elevado, para permitir ajustamentos da taxa de câmbio real através de variáveis nominais
Em termos políticos, ter uma narrativa diferente sobre a natureza da crise. Abordar o problema em termos de gestão de interdependências e não de moralidade.
É provável que se siga este caminho? há uma janela de oportunidade depois das eleições na Alemanha. Mas não se pode esquecer o papel da França, que não tem grande incentivo a formar uma coligação com o sul da europa.
No longo prazo, existe um trilema político: de três tem que se escolher apenas dois:
1) união económica na zona euro
2) politicas democráticas
3) soberania nacional
As três opções ao mesmo tempo não são possíveis.
Uma união económica que funcione requere uma redução da heterogeneidade estrutural nos enquadramentos institucionais – restrições na soberania nacional e na diversidade.
No curto prazo, devem-se usar alguns remédios keynesianos.
A democracia exige que funcionamento da economia de mercado seja acompanhado pelo funcionamento das instituições políticas.