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Sobre o Relatório de Primavera 2015 (6)

2 comentários

O terceiro capítulo do Relatório de Primavera intitula-se “Acesso ao medicamento por parte do cidadão no ano pós-troika”. Antes de passar ao comentário propriamente dito, vale a pena explicitar que a variação de condições de acesso deve ser vista em vários planos: a) alteração dos preços dos medicamentos para os mesmos consumos; b) introdução, ou não, de novas opções terapêuticas (novos medicamentos); c) alteração da cobertura financeira oferecida pelo Serviço Nacional de Saúde; d) capacidade de encontrar os medicamentos disponíveis nas farmácias (no caso dos consumos em ambulatório).

É contra estes quatro aspectos que devem ser confrontados os dados disponíveis. Por isso, a importância dada aos ensaios clínicos como fonte de acesso parece-me desproporcionada. A existência de ensaios clínicos é importante para o desenvolvimento do sector da saúde em Portugal, mas fazer disso uma questão de acesso central do Serviço Nacional de Saúde surge como exagerado.

O segundo tema tratado é o acordo entre o Ministério da Saúde e a Associação Nacional das Farmácias para a definição e criação operacional de programas de saúde com intervenção das farmácias. Não é claro em que sentido o Relatório de Primavera vê estes acordos – aparentemente, há uma simpatia para com eles, embora não haja mais referência à capacidade da sua implementação.

No restante, sobre o ponto a) há uma referência à descida dos preços dos medicamentos, mas sem análise efectiva sobre o acesso ao medicamento. Sobre o ponto b) há a referência esperada à introdução de inovação, que deve ser vista atendendo aos benefícios terapêuticos que traz realmente; Sobre o ponto c), há incidência sobre medicamentos associados com saúde mental, este foco de atenção acaba por resultar de não se ter mais alterações generalizadas de taxas de comparticipação; sobre o ponto d), há referência às dificuldades das farmácias na gestão de stocks e disponibilidade de produtos.

Pelo meio e a propósito da saúde mental há uma referência à discussão sobre os suicídios, liderada pelo grupo de Martin McKee and David Stuckler, embora tenha escapado à atenção o que parece ser uma maior capacidade protectora face a estes efeitos em Portugal e Espanha (da sociedade? Dos sistemas de saúde? Está em aberto a causa).

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

2 thoughts on “Sobre o Relatório de Primavera 2015 (6)

  1. Em relação aos ensaios clínicos, a questão prende-se com a “gratuitidade” dos medicamentos. Assume-se que é uma forma barata de ter acesso à inovação, quando na realidade se trata de investigação clínica, i.e., os medicamentos ainda são experimentais ou muitos recentes e, portanto, com bastante incerteza associada à sua segurança e eficácia.

    Mais um sintoma da fixação nos ensaios clínicos ou programas similares no acesso ao medicamento é o Regulamento do Acesso Precoce ao Medicamento (http://www.infarmed.pt/portal/page/portal/INFARMED/MEDICAMENTOS_USO_HUMANO/AUTORIZACAO_DE_INTRODUCAO_NO_MERCADO/AUTORIZACAO_DE_UTILIZACAO_ESPECIAL/Delib_139_2014.pdf), que “obriga” a indústria farmacêutica a fornecer gratuitamente os medicamentos no âmbito do acesso precoce, com possibilidade de se estender até depois de concedida a autorização de introdução no mercado (AIM).

    Percebo o impacto em termos mediáticos (as notícias falam sempre no acesso aos medicamentos mais inovadores), mas em termos reais e globais, duvido do impacto destas medidas nos ganhos de saúde da população em geral.

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  2. Pingback: Reforma do SNS e coordenadores nacionais | Momentos económicos... e não só

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