Momentos económicos… e não só

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da série “empresas portuguesas”: TAP

A greve dos pilotos da TAP, anunciada para mais de uma semana no início de maio, trouxe novamente a empresa para as luzes da atenção mediática. Esta decisão criou uma quase unanimidade de reacções negativas, desde os afectados directamente, passageiros do transporte aéreo, aos afectados indirectamente, como os operadores turísticos.

Como passageiro potencial da TAP neste período, para ir a uma sessão de trabalho no centro da Europa, pedi obviamente alternativas de operador. E não terei sido o único. Mas o lado dos passageiros, e até o lado das externalidades negativas sore o turismo têm sido tratados em detalhe.  Bem como a defesa baseada na noção de “empresa estratégica” (para que estratégia?) que seria defendida pela greve dos pilotos contra a privatização.

Menos citado tem sido outro aspecto – ao fazer esta greve, por este tempo, e com os argumentos usados, os sindicatos dos pilotos dão a entender que o assinado numa data não é necessariamente para respeitar depois, o que também dá espaço a que o outro lado negocial, a gestão da empresa e o Governo,  possa querer reabrir ou renegar aspectos acordados. Ou seja, passa-se a uma situação de renegociação permanente, que tem capacidade destrutiva sobre a empresa.

O propósito de qualquer greve é a reforçar o poder de negociação do lado que a faz, o que com que quanto maior o dano causado ao outro lado melhor seja. Mas esta visão, se presente, é limitada e limitativa.

A capacidade de negociar dentro da empresa acordos entre trabalhadores e gestão é um aspecto importante, e greves de pilotos não são raras (ainda há pouco tempo registou-se uma na companhia alemã  Lufthansa). E nessa greve, como provavelmente nesta da TAP, a opinião pública acabará por ficar contra os pilotos. O que a prazo é-lhes mais prejudicial em termos de capacidade negociação. Além de ser mais interessante menor poder negociar numa empresa com maior capacidade de distribuir excedentes do que maior poder negocial numa empresa que tenda a desaparecer. E os pilotos da TAP deveriam ter em atenção que a decisão de 2014 do Governo sobre o BES transmite-lhes também uma mensagem – não sendo o valor estratégico (?) da TAP maior que o risco sistémico do BES, porque pensam os sindicatos dos pilotos que o Governo não deixará falir a TAP?

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da série “empresas portuguesas”: PT

Ainda hesitei se a PT deveria figurar entre as empresas portuguesas, uma vez que a Oi é brasileira mas dado que a EDP foi alvo de atenção no post anterior, avancemos.

Saiu ontem um comunicado da Comissão Europeia sobre a compra da PT pela Altice, dando conta de duas decisões. A primeira de autorização da compra da PT pela Altice condicional ao compromisso da Altice vender as suas outras operações de telecomunicações em Portugal. Como os compromissos são propostos pelas empresas, não há dúvida que será este o caminho. Este compromisso mantém a actual estrutura concorrencial em Portugal se quem comprar não for outro operador de telecomunicações em Portugal. A frase usada pela Comissão Europeia, “The Commission concluded that the transaction, as modified by the commitments, would raise no competition concerns.”, não sei se é totalmente válida se for a NOS a comprar o que a Altice tem que vender. Veremos que surge como comprador. Em caso extremo, é até possível que a Altice prefira fechar a ONI e a Cabovisão a não poder comprar a PT.

A segunda decisão foi a de não aceder ao pedido da Autoridade da Concorrência portuguesa para ser esta última a fazer a avaliação da operação. Creio que esta decisão é sobretudo uma vontade da Comissão Europeia em afirmar a sua vontade de olhar para as operações de concentração nas telecomunicações, pois será de supor que os compromissos assumidos pela Altice com a Comissão Europeia fossem também assumidos se a entidade interlocutora fosse a Autoridade da Concorrência. A celeridade do processo parece estar presente nas intenções da Altice e este compromisso de venda das outras empresas no sector das telecomunicações que tem em Portugal é o mais óbvio e garante esse celeridade.

Sendo anunciado que a Altice terá uma estratégia de emagrecimento de custos na PT, veremos nos próximos tempos se essa estratégia se traduzirá também numa menor qualidade de serviço, técnico e de atendimento, ao cliente. A Vodafone e a NOS são as principais candidatas a beneficiar desse movimento.


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da série “empresas portuguesas”: EDP

A EDP é a tradicional empresa de electricidade em Portugal. Com a evolução dos tempos, foi havendo a separação entre as diferentes actividades – produção para um lado, transporte a alta tensão para outro, distribuição para cada ponto final de consumo em separado, e comercialização (contrato com o consumidor) outro lado ainda.

Com a liberalização do mercado, a venda de energia pode ser feita por quem não a produz diretamente, desde que a “compre” para revender (através de contratos sofisticados que asseguram que há produção de electricidade suficiente em cada momento). Significa também que hoje em dia há diversidade e concorrência em quem pode fornecer os serviços de comercialização (a empresa com quem o consumidor contrata o seu abastecimento). E é aqui que a confusão começa. Em particular, quando se tenta mudar de fornecedor. Como as diversas empresas de energia podem vender os vários tipos de energia, a EDP vende electricidade mas também gás natural, e a GALP vende gás natural mas também electricidade. E cada uma procura ganhar clientes à outra (e aos restantes participantes) em qualquer um dos mercados.

Tendo sido procurado primeiro pela EDP, por uma das calculo que imensas pessoas que colocaram a tocar às campainhas das portas, e depois de olhar para as diferenças de tarifas (que no final do ano não são assim tão grandes), decidi testar a capacidade da empresa em levar a cabo o que prometia – uma mudança de comercializador de gás natural sem confusões para o consumidor final, precisavam apenas que preenchesse umas folhinhas e depois mandavam o contrato por correio. Bom, as folhas não foram tão poucas assim, e exigiam informação que toda a gente memoriza como o código do local de consumo, código de cliente, etc. Tudo recolhido e enviado. Dias depois recebe-se os dois contratos, um de electricidade por mudança da EDP Serviço Universal para a EDP Comercial. Outro de gás natural. Leitura atenta de ambos, esforçando a vista mais do que desejaria. E dou conta que o contrato de gás natural não indica o tarifário. Contacto para a EDP a saber a pedir a folha em falta. Afinal era mesmo assim. O meu fornecedor de gás natural levantou um obstáculo qualquer. Creio que me tentaram explicar, mas eu não quero perceber, só pretendia mesmo que me dessem o prometido: mudança de comercializador sem complicação para o consumidor final (eu). A conclusão é que eu teria de ir falar com quem me vende o gás natural, para obter não sei o quê para depois entregar não sei onde (provavelmente um papel a declarar qualquer coisa, o costume), nesta altura já tinha desligado a atenciómetro. Conclusão, desistir por inércia.

Pensei que tinha tido azar. Mas nos últimos tempos os relatos de situações caricatas com a EDP e mudanças de contrato multiplicam-se com exemplos de outras pessoas. E não foi sempre assim, pois há mais de uma década tudo tratei por telefone para novos contratos, sem qualquer confusão ou problema.

A diferença parece estar no uso e abuso de call centers, com algoritmos mal desenhados, e com informação que não segue o cliente quando ele contacta mais de uma vez. Uma pessoa conhecida, numa compra de casa, já habitada, a mudança de comercializador para a EDP demorou pelo menos 3 meses, e o “pelo menos” é por desistência e procura de outro comercializador.

A imagem da EDP acompanhou esta evolução da economia e do mercado. Há anos atrás, a imagem era dada pela turbina estilizada – voltada para dentro e para a produção; depois passou para o “sorriso”, a dar o sinal de atenção ao cliente (?); e depois a nova imagem, provavelmente associada à ideia de grupo com várias actividades, mas que hoje em dia me faz lembrar a confusão que é lidar com a EDP que comercializa energia. Uma molhada, como os círculos vermelhos (de raiva?) sobrepostos.

Deixo a sugestão dos corpos sociais da empresa procurarem fazer uma mudança de comercializador, ajudando alguém seu conhecido, de forma anónima, para experimentarem o serviço que a sua empresa oferece. Ou, numa versão mais sofisticada, que os bónus salariais sejam indexados à qualidade de serviço prestado ao consumidor final, particular e industrial. Ou ainda, à atenção da concorrência, se quiserem ganhar clientes, mais do que tarifas complicadas e descontos que desaparecem, prestar um bom serviço de atendimento é uma área ainda passível de melhoria.

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estudo da ERS “Os seguros de saúde e o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde” (III)

Ainda sobre o estudo da ERS, agora acabado de ler, há algumas observações adicionais a serem feitas.

A primeira é de ordem técnica. A caracterização feita a partir da concentração de mercado como sendo de concorrência monopolística implica a existência de diferenciação de produto, não sendo claro qual a fonte dessa diferenciação aos olhos dos consumidores. Uma alternativa é pensar em termos de mercado com produto relativamente homogéneo (a cobertura oferecida não diferir muito entre companhias de seguros).

A segunda respeita à amostra de conveniência recolhida online para caracterizar o perfil do tomador de seguro. Torna-se muito claro que há uma auto-selecção enorme, mais acentuada nos que dizem ter seguro), com concentração numa faixa etária mais jovem e possivelmente também mais educada e com mais rendimento do que a média da população em geral, e provavelmente do que a média dentro de cada grupo etário. Estas observações são reconhecidas no relatório, mas não é demais assinalar as cautelas necessárias na interpretação dos resultados.

 

Na análise da satisfação com o seguro contratado, seria importante conhecer as respostas discriminadas com o ter ou não utilizado o seguro.

 

A dada altura, página 52, é realizada uma extrapolação sobre a capacidade de um sistema de seguro assegurar a universalidade do acesso a cuidados de saúde com base no que os seguros são hoje. A questão que se coloca é se os seguros seriam os mesmos, por um lado, e sobretudo se os preços seriam os mesmos. Corre-se o risco de estar a extrapolar para fora do domínio de estimação. Não que me pareça a conclusão inverosímil ou improvável. É normal que o seguro de saúde privado anual não consiga garantir a universalidade. Basta pensar que no caso de doenças crónicas, o risco desapareceu em grande medida, e a forma do seguro privado anual funcionar é com base na diversificação de risco. Se não há risco, não há diversificação. Em sistemas públicos de saúde, este problema não surge devido à redistribuição incluída no financiamento do sistema de saúde.

Os planos de saúde e cartões de saúde são tratados, e bem, como sendo sobretudo planos de desconto de preços, onde pela agregação de quantidades, o gestor do plano ou cartão tem capacidade de negociar melhores preços junto dos prestadores de cuidados de saúde.

A discussão sobre a ADSE tem que ser feita com grande cautela, pois houve alterações nos últimos 5 anos. O peso dos regimes convencionado e livre alterou-se em termos relativos mas muito pouco em termos nominais. A razão para isso foi a internalização no SNS do que eram despesas pagas pela ADSE ao SNS pelas quais a ADSE recebida uma transferência do Orçamento do Estado – esse valor passou a estar automaticamente dentro do orçamento do SNS. Também as despesas com medicamentos tiveram igual tratamento. Significa que as contribuições dos utentes têm agora que cobrir apenas essas despesas com prestadores privados. Contudo, só em 2014 se verifica uma situação em que não há dinheiro público canalizado para a ADSE pois antes dessa data os organismos públicos enquanto entidades patronais continuaram a pagar para a ADSE.


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o investimento público, uma vez mais a sair da sombra…

As discussões sobre investimento público e o seu papel para o crescimento económico seguem ciclos, e com o início da corrida para as eleições legislativas vão começar a surgir os apelos para a despesa pública. E claro que toda a despesa que se anuncie não é despesa, será investimento público, e investimento público é obviamente bom, sobretudo se for em infra-estruturas (logo, tudo será infra-estrutura de alguma coisa, naturalmente). Será?

O investimento público não é bom ou mau por si mesmo. Numa perspectiva macro associada com Keynes, a ideia de que qualquer despesa pública é boa para o crescimento económico, tem que ser vista nas respectivas condições em que foi defendida e se estamos a falar num curto prazo com excesso de capacidade ou a pensar num longo prazo com crescimento da produtividade e da capacidade produtiva da economia. Até porque aprendemos da forma mais dura que financiar despesa pública com dívida crescente tem os seus riscos (é preciso alguém tomar a dívida, naturalmente).

Pensando na capacidade produtiva da economia, interessa saber qual o retorno (social) do investimento que é realizado. E aqui Portugal não tem sido historicamente brilhante. Ou seja, em média, decide-se mal quais os projectos de investimento público que são realizados. Alguns dos projectos até terão uma boa taxa de retorno no investimento realizado, mas outros com maus resultados reduzem a taxa de retorno média.

Assim, quando se volta a falar de investimento público, será fundamental que se falem dos mecanismos pelos quais esse investimento público é seleccionado em termos de projectos concretos – em vez de falar de uns quantos milhões para estradas e/ou equipamentos sociais (e até às eleições isso vai surgir), que se refiram quais os projectos concretos, que se dê tanto quanto possível a base de evidência para a taxa de retorno desse investimento, e já agora o registo de projectos realizados e seus resultados dos proponentes  desse investimento – sei que talvez seja injusto, mas propostas de investimento de quem no passado apenas conseguiu falar de “elefantes brancos” em termos de investimento público devem ter aplicado um factor de desconto.

Mas não é só o investimento público que deverá ser escrutinado. Há igualmente projectos de investimento privado que têm de ser bem analisados, pois há alguma tentação de fazer com que os projectos privados sejam rentáveis desde que tenham apoio de fundos públicos.

Como leitura sugerida sobre a taxa de retorno do investimento público, António Afonso e Miguel St. Aubyn, Macroeconomic rates of return of public and private investment – crowding-in and crowding-out effects, European Central Bank, 2008. (publicado na revista The Manchester School, mas a versão working paper é gratuita), reproduzo abaixo a conclusão do artigo:

“Public investment can either crowd in or crowd out private investment. In strong crowding-out cases, it is possible that increased public investment could lead to a decrease in GDP. In our paper, by estimating VARs for 14 European Union countries, plus Canada, Japan and the United States, we estimated that, between 1960 and 2005:

– public investment had a contractionary effect on output in five cases (Belgium, Ireland, Canada, the United Kingdom and the Netherlands) with positive public investment impulses leading to a decline in private investment (crowding-out);
– on the other hand, expansionary effects and crowding-in prevailed in eight cases (Austria, Germany, Denmark, Finland, Greece, Portugal, Spain and Sweden).(In somewhat related work Zou (2006) reports that public and private investment have expansionary effects on Japanese economic growth, while in the US the relevance for economic growth of private investment is higher than the one from public investment.)

These effects correspond to point estimates and care should be taken in their interpretation, as 95 percent confidence bands concerning public investment effects on output always include the zero value.

When it is possible to compute it, the partial rate of return of public investment is mostly positive, with the exceptions of Finland, Italy, Japan and Sweden. Taking into account the induced effect on private investment, the total rate of return associated with public investment is generally lower, with the exception of France, and negative for the cases of Austria, Finland, Greece, Portugal and Sweden, countries where the increase in GDP was not sufficiently high to compensate for the total investment effort.

Private investment impulses, by contrast, were always expansionary in GDP terms and effects were usually significant in statistical terms. Public investment responded positively to private investment in all but three countries (Belgium, Greece and Sweden). The highest estimated return was in Japan (5.81 percent, partial), and there were very few cases of slightly negative private investment rates of return, either partial or total – Belgium, Denmark and Greece.”


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SATU – rest in pieces…

Esta semana soube da notícia da próxima extinção do SATU – Sistema Automático de Transporte Urbano, no concelho de Oeiras.

O SATU liga a estação da linha de Cascais de Paço de Arcos ao Centro Comercial OeirasParque. É uma obra do tempo de Isaltino de Morais na Câmara Municipal de Oeiras.

Tendo vivido muito tempo em Paço de Arcos, perto da estação, foi com algum carinho que vi nascer o SATU (apesar de já não beneficiar dele). E houve mesmo um ano em que tomei a resolução de andar pelo menos uma vez no SATU. Silencioso no deslocar, rápido, com pouca gente e uma vista magnifica sobre o Tejo. O mesmo sistema sem condutor do SkyTrain do aeroporto de Dusseldorf, só com menos passageiros.

E apesar da simpatia pelo SATU, as contas de exploração são terríveis. Ignoremos o custo do investimento, é custo afundado. Com base no relatório e contas de 2013, teve 170 586 viagens vendidas. As vendas de serviços prestados constantes da Demonstração de Resultados são 128 088 euros (menos de um euro por viagem vendida). Dá 467 passageiros por dia (incluindo feriados e fins de semana), com uma receita por viagem vendida de cerca de 75 cêntimos.

Os custos com pessoal são 161 950 euros, e a assistência técnica e manutenção do sistema, em regime de serviços especializados fornecidos à empresa, foram 846 796 euros. Juntando “custos das mercadorias vendidas e das matérias consumidas”, tem-se a soma de 1,056 milhões de euros. (O resultado líquido foi 2,27 milhões de euros).

Para cobrir apenas estes custos indispensáveis à exploração, ignorando todos os outros, seria necessário ao mesmo valor de receita média, multiplicar por 8,25 o número de passageiros diários, passar de 467 para 3854, o que não se afigura provável. É certo que nos transportes públicos podemos considerar alguns efeitos de externalidade de descongestionamento e até um certo subsídio público à exploração. Porém, o valor aqui envolvido para um subsídio de apoio é claramente excessivo.

A proposta de sobrevivência é chegar à estação do Cacém da linha de Sintra, o que não se afigura como sendo previsível num futuro próximo nem é claro que viesse a ter os passageiros necessários para tornar sustentável financeiramente.

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Da Comissão Europeia e de um comunicado da Lusa

Ontem deparei-me com uma notícia sobre uma “avaliação da Comissão Europeia”, com os habituais comentários contra e a favor. Por curiosidade, fui procurar os documentos originais, e na verdade um comité da Comissão Europeia produziu uma opinião sobre o que lhes foi dito estar em andamento – pois não se vislumbra no parágrafo produzido que do lado da grupo de trabalho tenham feito mais do que ler um documento que lhes tenha sido enviado. Interessante seria ter esse documento de base publicamente disponível, e não a opinião de um grupo de trabalho de um comité que num parágrafo emite uma opinião que é depois amplificada várias vezes na comunicação social. Deixo a cópia do que eu encontrei para que cada um faça a sua apreciação.

Da Lusa:

O Comité de Política Social da União Europeia (UE) elogiou as mudanças feitas em Portugal na saúde e nas pensões de reforma, mas contrapôs a necessidade de garantir uma adequada cobertura da assistência social. Um dos objetivos era o de melhorar a sustentabilidade do sistema de pensões, o que o Comité – um órgão consultivo do Conselho de Emprego e Assunto Sociais – considera feito. Por outro lado, da reforma do sistema de saúde diz-se que “continua a produzir resultados”. A avaliação decorreu nos dias 24 a 26 de março de 2015, na Comissão Europeia, em sede conjunta do Comité de Proteção Social e do Grupo de Alto Nível de Saúde Pública do Conselho Europeu. No entendimento dos analistas da situação portuguesa – Dinamarca e Comissão Europeia –, as “mudanças no setor hospitalar” e a “otimização de custos” permitiram poupanças. As principais medidas apontadas foram progressos na reforma hospitalar, racionalização de custos operacionais, centralização de aquisições, a publicação de Normas de Orientação Clínica que incluem análise de custos, a aplicação de um sistema de avaliação de tecnologias da saúde, o combate à fraude, o aumento de adesão dos médicos e doentes aos medicamentos genéricos, com a DGS a especificar o acordo celebrado entre o Ministério da Saúde e a indústria farmacêutica para baixar o custo dos medicamentos. No texto considerou-se também que a aplicação do programa de ajustamento trouxe “desafios crescente em termos de intervenção pública, em particular quanto ao alcance da proteção social e inclusão social”. (Lusa)

Notícia da Visão relacionada com o mesmo assunto, aqui

Da Comissão Europeia (original aqui)

The Social Protection Committee (SPC) & 

Working Party on Public Health at Senior Level (WPPHSL)

CSR #1: …/…

Develop by the end of 2014 new comprehensive measures as part of the ongoing pension reform, aimed at improving the medium-term sustainability of the pension system. Control healthcare expenditure growth and proceed with the hospital reform. 

On the health branch of the recommendation: 

Health system reforms in Portugal continue to produce results. Hospital-sector reforms and cost optimisation have contributed in recent years to savings in the healthcare sector. Progress has been made on hospital reform and other healthcare-related reforms. The authorities have also launched initiatives to increase and incentivise the supply of health professionals in areas where access to healthcare is particularly problematic. In 2015, there are two mechanisms to ensure the stabilization of public expenditure on pharmaceuticals: an agreement with the industry whereby the companies pay a contribution to observe the cap on public expenditure, and a claw back which is a compulsory tax on sales, for those companies that do not join the agreement. The main policy measures supporting the decrease in 2015 expenditure are linked to a further progress in hospital reform, a further rationalization of hospital operational costs, a centralized purchasing of goods and services, a new regime of conventions with private providers, a continued publication of clinical guidelines that include cost-effectiveness analysis, the implementation of a health technology assessment system and the creation of a system for patient electronic medical registers, combating fraud and targeting a share of generics of 60 %.

SPC and the Council WPPHSL welcome the progress made on the hospital care and other health related reforms in the areas of pharmaceutical spending, centralised procurement and development of eHealth, which are expected to produce important reduction in expenditure in the National Health Service. These are considered steps in the right direction. Further efforts and close monitoring of health expenditure growth are encouraged.


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Os dados do INE e o dia mundial da saúde

O INE publicou a propósito do dia mundial da saúde um destaque e dados referentes a 2013 (os dados encontram-se disponíveis para download para quem os quiser analisar em detalhe). O destaque cobre os anos 2002 e 2013, e merece alguns comentários, até porque várias análises foram surgindo ao longo destes dois dias. Dados podem ser lidos de várias formas, e frequentemente são usados mais como confirmação do que é o ponto de vista de quem os comenta do que para questionar o que é a realidade.

Antes de entrar nos números agora disponibilizados pelo INE é, pois, útil fazer alguma “arrumação mental” de ideias (sem preocupação de exaustividade).

Primeiro, sobre o que é o Serviço Nacional de Saúde: tem duas faces – 1) protecção que é dada, pela garantia de acesso a cuidados de saúde quando for necessário independentemente da capacidade financeira; 2) fornecer esse acesso, ou parte dele, por prestação pública directa desses cuidados de saúde (os equipamentos de saúde do SNS). A protecção pode ser dada incluindo a prestação privada e os pagamentos que o SNS faz para essa protecção. Esse aspecto não é suposto ser tratado aqui. Por isso, não podemos inferir daqui que o SNS não dá a protecção na doença. Dois exemplos: no caso de cuidados hospitalares de elevada tecnologia, a prestação pública está presente de forma dominante; no caso de medicamentos, é a prestação privada que domina – laboratórios farmacêuticos que produzem medicamentos – mesmo que a protecção seja pública (a parte que o SNS enquanto financiado paga dos medicamentos prescritos). Os números agora divulgados pelo INE nada dizem sobre a componente de protecção financeira quando se necessita de cuidados de saúde (o que normalmente se designa por financiamento da saúde). Quem estiver interessado pode encontrar essa informação na Conta Satélite da Saúde, também ela disponibilizada pelo INE.

O que estes números do INE traduzem é a prestação de cuidados de saúde, com a sua combinação público privado. Não se pode inferir automaticamente se o SNS está ou não a funcionar bem na protecção que dá. Apenas se pode analisar o que é a organização da prestação de cuidados de saúde.

Antes de olhar para os valores divulgados, vale a pena relembrar três políticas / evoluções tecnológicas da última década, e as suas implicações para o que devemos encontrar nos dados:

  1. reconhecimento de excesso de recurso às urgências e necessidade de encontrar outras respostas a essas necessidades – deveríamos ver baixar o número de urgências e aumentar o número de consultas programadas, mais consultas nos cuidados de saúde primários;
  2. concentração da actividade de atendimento de urgência para garantir a qualidade técnica no atendimento, e distinguir o que é urgência de consulta não programada – devemos ver uma redução das urgências em unidades de cuidados de saúde primários; uma parte substancial da utilização dos serviços de urgência são na verdades consultas sem marcação prévia e fora de horas.
  3. internamentos – com o aumento das cirurgias de ambulatório, mais convenientes para o doente, e a procura de mecanismos de resposta que evitem internamentos (ver por exemplo aqui a discussão no âmbito do Plano Nacional de Saúde) devemos ver redução do número de  internamentos, se o volume global de intervenções se mantivesse constante.

Os dados do INE o que nos dizem?

a) Redução dos episódios de urgência globalmente no sector público – se as políticas que procuram “desviar” da utilização das urgências para outras formas de atendimento estiverem a ter algum resultado, é o que se devia observar. Não se pode partir imediatamente para a conclusão da falta de resposta. Contudo, não se pode deixar de reparar que houve um aumento da utilização dos serviços de urgência em prestadores privados praticamente do mesmo montante que a redução na utilização dos sector público. Como houve abertura de hospitais privados e como a presença de mais serviços usualmente cria procura para os mesmos, não é claro, dos valores agregados, se houve uma transferência de casos do sector público para o sector privado, ou se houve diminuição nalgumas zonas de utilização das urgências do sector publico compensadas em termos agregados por maior utilização de urgências no sector privado. É provável que haja um pouco de cada efeito, a importância relativa de cada um não se pode retirar dos valores agregados. É igualmente relevante saber se o crescimento das urgências privadas corresponde a consultas não programadas ou a situações de emergência, para conhecer melhor a natureza da necessidade a que estão a dar resposta.

b) uma redução dos locais de atendimento de urgência nos cuidados de saúde primários.  Dadas as políticas anunciadas de concentração de atendimento de urgência, com base em propostas técnicas, estes números estão de acordo com o que seria expectável. O número total de centros de saúde, na contagem do INE, manteve-se praticamente inalterado, tendo-se reduzido o número de centros de saúde com serviços de urgência básica ou serviço de atendimento básico. É a evolução que se esperaria.

c) Foi dado grande destaque ao aumento do número de hospitais privados. Porém, os hospitais privados são, em média, cerca de um quarto dos hospitais públicos. Ou seja, são em média bastante mais pequenos. E nesse aspecto não mudaram muito, mesmo que tenha aumentado o número de hospitais privados a sua dimensão média é muito inferior à dos hospitais públicos. Por outro lado, os valores dos hospitais do sector público (hospitais oficiais na terminologia usada pelo INE) são na verdade estabelecimentos, pois com a criação de centros hospitalares ao longo da última década o número formal de hospitais diminui mas como não houve grandes encerramentos definitivos de estabelecimentos hospitalares e houve aberturas, o número destes manteve-se relativamente constante.

d) Redução de internamentos e redução do número de camas no sector público – temos que ver em conjunto com a cirurgia de ambulatório. Se não houvesse qualquer outro efeito, o desenvolvimento da “tecnologia”, com o aumento das intervenções em ambulatório a substituirem os internamentos (com vantagem para todos) bem como a redução dos tempos médios internamento, devem levar a um redução no número de internamentos, que se observa, e a uma menor necessidade de camas, o que também se observa.  Informação das cirurgias em ambulatório: proporção de casos operados em ambulatório – de 15,5% em 2006 para 53,3% em 2013; de 53 mil em 2006 para 290 mil em 2013 (retirados do último relatório da actividade do SIGIC disponível). Também é possível que haja outras actividades de ambulatório que tenham substituído internamentos além das cirurgias.

Calculo que a questão seja então porque cresceu o sector privado, em termos de hospitais? Há duas hipóteses que me parecem plausíveis, embora não tenha forma de as testar com a informação do destaque do INE. Por um lado, há uma transformação, nesta década, do que é o sector privado. Tem ocorrido uma passagem do consultório privado individual ou em pequenos grupos para a consulta dada a partir de uma actividade mais geral dentro de um hospital privado. Isto faz com que o crescimento da actividade de consultas nos hospitais privados possa ser em parte transferência de consultas que já eram realizadas no sector privado.

Por outro lado, no crescimento dos internamentos no sector privado, a vontade do quarto privado parece ser o factor determinante (são 60% dos internamentos nos hospitais privados, e menos de 1% nos hospitais públicos). Como é vemos essa utilização dos quartos privados?

Globalmente, a leitura do que se passou nos últimos anos pode ser diferente de simplesmente afirmar que o sector privado está a tomar o lugar do Serviço Nacional de Saúde. Há uma evolução do sector privado que tem elementos que o tornam mais visível neste conjunto particular de informação (por exemplo, não sabemos o que sucedeu às consultas nos consultórios privados de pequena dimensão). Há uma evolução do sector público de uma forma que o torna menos visível nestas estatísticas (desenvolvimento de actividade de ambulatório nos hospitais públicos que substituem anteriores episódios de internamento e necessidade de camas).

Relativamente aos recursos humanos, houve um aumento do número de médicos e de enfermeiros ao longo desta década. E esse aumento ocorreu sobretudo no sector público. Como o destaque do INE dá informação sobre emprego de médicos e enfermeiros nos hospitais, é possível calcular rapidamente o que sucedeu em termos de rácio enfermeiros – médicos nos hospitais, e o que sucedeu ao número absoluto de profissionais. E aqui apesar do aumento do número de hospitais privados, o número de médicos nesses hospitais reduziu-se face a 2002, efeito sobretudo dos últimos 5 anos de crise (de 2009 a 2013). Em 2013, os médicos oficialmente a trabalhar em hospitais privados são apenas 10% do total de médicos a trabalhar em hospitais, o que resulta provavelmente de outros vínculos de trabalho com esses hospitais que não a contratação a tempo inteiro. Em termos de recursos humanos, não é visível qualquer recuo do sector público, hospitais ou centros de saúde, apesar das saídas que houve por reforma ou outros motivos.

Se quisermos avaliar o sistema de saúde, ou o Serviço Nacional de Saúde, deveremos olhar para os resultados alcançados com os recursos que estão disponíveis, o que nestes número do INE estão associados à mortalidade infantil, que tem durante esta década uma evolução favorável.

Seria interessante que o INE também tivesse um indicador sobre mortalidade evitável, por exemplo (no site da Direcção Geral de Saúde existe um único estudo da ARS Norte sobre este tema, ver aqui).

E sobretudo saber qual o grau de necessidades não satisfeitas pelo Serviço Nacional de Saúde e reconhecidas como fazendo parte da cobertura (protecção) dada pelo SNS, e em que medida o sector hospitalar privado cobre essas necessidades.

Não deixou de ser também surpreendente que havendo um consenso relativamente geral sobre a necessidade do sistema de saúde português deixar de estar tão centrado no hospital que a discussão se tenha centrado quase exclusivamente sobre os hospitais!

 

 


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um blog que nasce,

de Nuno Palma, historiador económico, Portugal no longo prazo; como ponto de partida, sobre quando Portugal se tornou um país pobre (em termos relativos), numa perspectiva histórica (não, não é sobre os últimos 4 anos). A seguir com interesse.


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entrevista ao dinheirovivo & TSF,

que resume e junta alguns dos temas que têm sido discutidos neste blog, tem a vantagem de ter imagem e som além da escrita – aqui, e audio mais completo via TSF aqui.

Lisboa, 02/04/2014 - Entrevista Dinheiro Vivo / TSF : Tudo é economia com Pedro Pita Barros

Lisboa, 02/04/2014 – Entrevista Dinheiro Vivo / TSF : Tudo é economia com Pedro Pita Barros