a informação no Público sobre reforço de capital nos hospitais em 300 milhões de euros. Sorry, esta medida, mesmo que necessária, não é resolver o problema. Como há uma tendência de crescimento da dívida permanente, é adiar o problema por um ano – ao ritmo de 25 milhões de euros por mês (em média) de crescimento da dívida, basta um ano para esgotar este reforço de capital. Actuar sobre o crescimento da dívida implica outras medidas, complementares, que discuti em posts anteriores (aqui e aqui, entre outros). Seria importante saber se os orçamentos destinados aos hospitais são realistas, ou se vão também obrigar a continuar o processo de criação de dívida. Realistas não significa atribuir o orçamento que os hospitais dizem que querem, e sim o que seja adequado para cumprir os objectivos assistenciais que lhes são dados. Uma primeira pergunta simples é saber se com este reforço de capital também vai a assinatura do contrato programa para 2015. De outro modo, o reforço desaparece, a dívida reaparece, nem que seja apenas depois das eleições. Note-se que estes 300 milhões estão abaixo do que é reconhecido como dívida na execução orçamental do SNS, como publicado pela Direcção-Geral do Orçamento.
Monthly Archives: Outubro 2014
“Para uma conversação construtiva” (9)
Há uma secção dedicada a alternativas ao SNS, mas honestamente pareceu-me construída para que a pergunta implícita fosse “quer uma coisa boa ou uma coisa má?”. Todos os sistemas têm vantagens e desvantagens. Elencar alternativas deveria proceder ao levantamento de umas e de outras, deixando depois a ponderação dos aspectos bons e maus de cada alternativa para a decisão. Confrontar o que se espera serem os aspectos bons de um sistema com os aspectos maus de outro sistema é apenas uma forma de apresentar o que se favorece e não uma forma de estimular o debate.
Por exemplo, o cenário 1 “Um SNS português, em actualização e transformação permanentes, em colaboração aberta e transparente com o sector social e privado, atento e participante no contexto europeu e global” é uma situação ideal, já alguma vez a tivemos? Como é que temos a certeza que se consegue assegurar esta alternativa? Já tivemos problemas de listas de espera para cirurgia com tempos muito longos, crescem tempos de espera para consultas nos hospitais, há variabilidade nos cuidados de saúde prestados, etc… Mas só se focou na utopia. No cenário 2, tem-se a visão privada, sem seguros de saúde e “financiados directamente”, com centros de decisão fora do país, e um “sector público residual e limitado em dimensões e qualidade”, mas não se fala do que seria a qualidade do sector privado neste caso, ou de como o sector privado poderá ter mais inovação. Ou seja, procurou apresentar os aspectos mais negativos.
Também se pode cair no extremo oposto, como por vezes sucede, de apresentar apenas os aspectos negativos do SNS para evidenciar os aspectos positivos de maior intervenção privada.
Um balanço e mais soluções mistas podem fazer parte das alternativas. Dá trabalho elencar essas alternativas de forma equilibrada e realista? Certamente, mas é esse desafio que se exige se há pretensão de falar em alternativas ao SNS.
Sobre escolhas, é afirmado “Poder escolher é um valor inestimável”. Devemos tomar daqui que há a defesa de um sistema com concorrência entre prestadores, ou se não é isso, que tipo de escolha de se está a fazer? Como é que a escolha se articula com a existência de planeamento no SNS? Note-se que há o cuidado de dizer que “A escolha como um absoluto não deve ser o cavalo de Tróia dos interesses particulares [privados?] na praça do interesses públicos”. Ou seja, quer-se escolha mas sem “mercadização”, mas então quem oferece as alternativas de escolha? E como se garante que essas alternativas de escolha correspondem a diferentes opções que os cidadãos pretendem ter e não às preferências de quem oferece essas escolhas a partir do sector público? A que nível se coloca essa importância da escolha? E a possibilidade de voluntariamente se querer limitar as escolhas – optar por um sistema em que o acesso ao médicos especialistas tem que ser precedido por uma referenciação de um especialista em medicina geral familiar faz sentido, mas implica uma limitação de escolha – é aceitável?
Na secção sobre “Aquilo que favorece e desfavorece o desenvolvimento do SNS”, é fácil concordar com tudo (ou com grande maioria) que se encontra escrito em duas páginas; a questão que coloco é saber se é possível alcançar tudo ao mesmo tempo, se não haverá que estabelecer prioridades e balanços, escolhas entre que objectivos atingir face às restrições existentes, de recursos materiais e de recursos financeiros. Não vejo qualquer problema em se começar por definir quais os objectivos e ideais que se procuram, mas depois não nos podemos esquecer de pensar nas restrições que se defrontam e em como atingir os objectivos definidos dentro dessas restrições.
“Para uma conversação construtiva” (8)
No campo do modelo de governação, não há nada de especialmente novo que mereça destaque. Pareceu-me apenas que se poderá levar um pouco mais longe a ideia de “conhecer as agendas dos seus atores”, que numa visão mais económica da organização do sector pode ser lido como reconhecer que cada actor age no seu melhor interesse, face ao enquadramento que defronta, e não no interesse colectivo. Pelo que o enquadramento tem que ser criado de modo a alinhar os interesses individuais com os interesses colectivos (por exemplo, a famosa contratualização é o que tenta fazer através de um sistema de objectivos e recompensas).
No modelo de governação volta-se a falar no cidadão, mas não na perspectiva do cidadão, e mais na perspectiva do que os serviços dizem que o cidadão deve querer ter.
Em termos de informação, a ambição mínima para o futuro próximo deverá ser conseguir seguir no sistema de saúde o cidadão desde o primeiro contacto até este ter a sua situação resolvida, e o próprio cidadão conhecer esse percurso e o que nele esteve envolvido. Remete para registos electrónicos, interoperabilidade de sistemas de informação dentro de todo o sistema de saúde e propriedade dessa informação pelo cidadão.
Sobre liderança e empresas portuguesas,
pensando numa grande empresa em particular, uma leitura recomendada – Carlos Marques – Liderar é Motivar. Para ler e interiorizar. Provavelmente aplicável a muitas empresas deste país. Provavelmente vou abrir uma série de crónicas sobre o funcionamento interno de uma empresa visto de fora. Deste artigo, ver a parte final que reproduzo “… as chefias devem ouvir os seus colaboradores e afetar as tarefas de acordo com o perfil de cada um, se querem atingir altos níveis de motivação e satisfação”. Duvido que gritar alto e humilhação correspondam a esta noção de liderança…
Leitura recomendada, quando estiver a liderar pessoas.
“Para uma conversação construtiva” (7)
Há uma breve secção dedicada ao valor do SNS, mas que foca apenas no que correu bem (e algumas coisas terão corrido mal), e a comparação correcta não é com o que era antes de 1974 e sim com o que teria sido a sua evolução alternativa, a menos que se considere que nada teria mudado. No entanto, algumas mudanças, tem sido reconhecido, já estavam em marcha desde 1971. Provavelmente não se teria o SNS como foi criado em 1979, mas algo teria existido em termos de evolução. É difícil articular o que teria sido essa evolução, e mais ainda tentar quantificar o que teriam sido os resultados em termos de indicadores de saúde. Mas simplesmente comparar antes e depois não é metodologicamente adequado.
Saltando um pouco adiante, quando se fala de agentes económicos, é dito “o SNS também cria riqueza contribuindo para a inovação em saúde em múltiplos domínios. O SNS necessita de um projecto explícito “SNS inovação” para tirar o melhor partido possível dessas potencialidades”. Aqui fiquei sem perceber se afinal se quer a “mercadização” da inovação que o SNS produza. O que parecia ter sido proposto como princípio genérico (não à “mercadização”) surge aqui afinal como sendo algo de que o SNS se deve aproveitar. Então o princípio não é genérico, e a utilização de mecanismos de mercado é aceitável pelo menos em alguns casos? É que a discussão passa então do nível dos princípios absolutos para o nível dos instrumentos. Tendo o livro tido contribuições de muitas pessoas, e daí não ter um autor ou conjunto de autores específico, estas diferentes visões (?) poderiam ter tido mais destaque em termos de argumentação e contra-argumentação. O livro como local de debate tinha mais possibilidades do que as que foram exploradas.
Quando se fala das profissões de saúde, cai-se numa visão que por várias vezes já considerei profundamente errada: a de olhar para a formação de profissionais de saúde pelos olhos do SNS empregador. Tenho uma forte preferência para olhar para a formação de profissionais de saúde (ou de qualquer outra área) como uma responsabilidade da sociedade para com os seus membros mais jovens, de lhes dar os instrumentos para uma vida plena (e não apenas dar-lhes a formação para serem recrutados depois seja pelo SNS ou por qualquer empresa ou organismo público). Colocando de forma mais clara, se o SNS precisar de 1000 profissionais de saúde por ano (o leitor pode escolher que profissão de saúde considerar), e houver 1500 pessoas que por ano se querem formar nessa área, então a nossa responsabilidade para com essas pessoas é dar-lhes a formação, sendo que algumas delas não serão recrutadas pelo SNS. É investimento perdido? Não é, porque a avaliação desse investimento não tem que ser feita na óptica do SNS – afinal, só faria sentido ser na óptica do SNS se este pagasse as propinas da universidade e todos os outros custos da educação dos profissionais de saúde. Alguns terão que emigrar? Bem, qual é o leque de escolhas: a) ficar em Portugal e ser outra coisa qualquer de que não se gosta; b) exercer a actividade profissional de que se gosta mas noutro país? Deve ser o Estado centralmente a tomar essa decisão no momento de entrada para a Universidade, ou deve ser uma decisão individual tomada com informação e liberdade de escolher o rumo que se quer?
(sobre as entradas em medicina no ensino superior e para desenvolvimento destes argumentos ver estes post mais antigos, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, e aqui).
Sextas da reforma: território e descentralização orçamental
Decorreu no dia 24 de Outubro de 2014 mais uma sessão, a penúltima, das sextas da reforma, com o tema:
Território, desenvolvimento económico e descentralização orçamental
Um país tem território e a organização deste último provoca efeitos sobre as finanças públicas, cria também desafios, como a descentralização orçamental. As finanças locais envolvem despesas e receitas.
As apresentações de Linda Veiga e Rui Nuno Baleiras encontram-se disponíveis no livestream da Fundação Calouste Gulbenkian.
Várias questões resultam, a meu ver, das apresentações:
- uma maior descentralização das receitas gera, ou não, maior despesa pública local?
- Resolver o problemas das dívidas das autarquias resolve o problema das finanças públicas em Portugal?
- O ciclo eleitoral na despesa pública local é mau, ou corresponde à concretização de projectos? Se for mau, qual é a alternativa que se deseja e é essa alternativa alcançável?
- O que determina a dimensão mínima eficiente de um concelho?
- Os resultados do investimento feito localmente devem ser avaliados pela actividade económica que geram, pela qualidade de vida da população, ou por outra métrica (qual?)?
- Noutras sessões das Sextas da Reforma falou-se de muitos assuntos, desde processos de controle orçamental até políticas de recursos humanos. Como é que a organização do território limita ou potencia esses outros aspectos?
- Como é que o processo de construção do orçamento deve ter em conta o papel do território?
- Qual o papel do capital humano da administração pública local no desenvolvimento regional?
E, num pequeno resumo pessoal, para quem prefere ler a ver as apresentações e discussão que se seguiu.
Linda Veiga:
Identificou três tópicos para discussão: racionalidade económica para a descentralização, a situação financeira dos municípios e a gestão “eleitoralista”.
Sobre o processo de descentralização, avaliado pela proporção da despesa pública feita a nível local, houve uma evolução no sentido de maior descentralização, com retrocesso nos tempos recentes, devidos à crise. Os ganhos da descentralização apontados centraram-se na aproximação dos decisores aos cidadãos e às suas preferências. Estes ganhos são maiores quando há maior heterogeneidade entre cidadãos de diferentes localizações. Também aumenta a concorrência entre governos locais. Pode promover maior eficiência. [Comentário: mas também se pode ter mais free-riding se as receitas que financiam a despesa resultarem de fundos comuns, com baixo custo de oportunidade para quem faz a despesa]
Igualmente necessário considerar a escala óptima de uma região e a relevância das externalidades entre regiões. Áreas demasiado pequenas tendem a ser subóptimas. Reforçada a importância da responsabilização da administraçãoo local, nomeadamente reduzir a dependência das transferências centrais e ter recolha local de impostos é desejável [comentário: o que reduz como factor de “sucesso” junto das populações locais o conseguir obter fundos do Governo central].
Com a recente crise, ocorreram reformas para redução do número de entidades locais em vários países; em Portugal, houve uma redução significativa do número de freguesias mantendo-se os concelhos. A dimensão média dos conselhos em Portugal é maior do que na União Europeia, sem prejuízo de haver municípios muito pequenos [comentário: não é claro se o que determina a dimensão “eficiente” é o elemento geográfico ou a população abrangida, ou uma combinação de ambos]
Para responder à questão de qual o impacto da descentralização, a informação resultante de estudos com painéis de países diz que aumenta o peso das despesas locais em educação e ensino. Em contexto internacional, foi referido o estudo de Ivanyna e Shah (2014), em que Portugal, avaliando pelo peso da despesa local e estadual, é dos países menos descentralizados [comentário: não é claro qual o papel das regiões autónomas dos Açores e da Madeira nesta análise]
A evolução em Portugal teve um pico em 2002, depois volta reduzir-se [comentário: se a descentralização levasse a menor despesa, não se teria forças de movimento contrário? Como realmente interpretar este indicador?]
Em termos do que é feito, despesa pública local sobre despesa pública total é elevada na protecção do ambiente e serviços de habitação e desenvolvimento colectivo, mas estão muito longe do valor de referência dado pela média da OCDE na educação e protecção social [comentário: porque é a média da OCDE um bom ponto de referência?]
Em termos da composição da despesa, os serviços gerais da administração pública são o grande elemento e a crescer.
Na estrutura das receitas, nas transferências intergovernamentais, Portugal é dos países com menor valor, tal como nas receitas próprias. Impostos e taxas têm vindo a aumentar e as transferências intergovernamentais a descer. [comentário: será interessante estabelecer a associação com o volume global de despesa?]
Quanto às dívidas dos municípios, há crescimento de 2003 a 2010, com redução posterior, em resposta às medidas de reacção à crise (lei dos compromissos e programa de apoio à economia local).
A regra de endividamento excessivo é excedida por um terço dos municípios. É um desafio difícil de ultrapassar em contexto de consolidação orçamental. Como factores determinantes do endividamento: governos locais fracos estão associados a mais dívida, há uma gestão eleitoralista em que o investimento gera mais défice, o desemprego gera pior desempenho orçamental local, também há um saldo negativo maior nos concelhos com mais população acima dos 65 anos [comentário: o desafio é saber que factores levam a mais despesa de forma justificada e quais correspondem a mais despesa não justificada]
De uma forma global, conclui-se que a administração local contribuiu para a consolidação das contas públicas, e que tem vindo a aumentar a informação em geral quanto à política orçamental local.
O que é necessário? 1) transparência na gestão da política orçamental; 2) interiorização do interesse público [comentário: o que significa operacionalmente?] 3) aceitar recomendações das entidades fiscalizadoras; 4) aumentar a capacidade da administração local em obter receitas locais; 5) maior envolvimento dos cidadãos nas decisões das autarquias locais.
Rui Nuno Baleiras:
Território e desenvolvimento económico: o estado do desenvolvimento é reflexo do enquadramento, que tem algumas forças de bloqueio.
Duas ideias fortes: a) todos os territórios contribuem para o crescimento; o território é onde as pessoas e as políticas públicas se encontram. b) a acção política para as regiões “não-core” não tem que ser assistencialista, pode e deve ser um elemento indutor do crescimento num pacote de políticas estruturais. Negligenciar regiões “não-core” significa que se perdem oportunidades de crescimento.
[comentário: estes são dois pontos importantes, e concordo que são frequentemente esquecidos, é bom recuperá-los, boa chamada de atenção de Rui Nuno Baleiras]
Como referência para alguns números e discussão: OECD (2014) how’s life in your region?
Alguns factos: a dispersão do PIB per capita entre 1995 e 2010 aumentou na Europa, o afastamento relativo das regiões de Portugal; com a apresentação de um índice sintético de desenvolvimento regional observa-se que as regiões com melhor qualidade ambiental são as que têm menor competitividade [comentário: o crescimento é mau para o ambiente? O crescimento foi mau para o ambiente? O crescimento será compatível com qualidade ambiental no futuro? Que trade-offs defrontamos aqui e que escolhas queremos fazer?]
Causas de desenvolvimento regional, revisitando várias teorias económicas: factores de produção, base de exportação, economias de escala no sector exportador, economias de aglomeração, economias de rede, custos de transporte, tensões centro-periferia, factores intangíveis de desenvolvimento – qualidade das instituições, criatividade, capital humano, infra-estruturas e inovação.
[comentário: o que se sabe sobre o papel do capital humano da administração pública no desenvolvimento regional?]
Os factores de bloqueio de crescimento não estão apenas nas regiões desfavorecidas. Há diversos bloqueios institucionais em Portugal. Um dos evidenciados é a percepção dos cidadãos sobre as políticas sectoriais sem conseguirem ter uma visão transversal. As questões de desenvolvimento estão demasiado longe do cidadão comum.
Como pistas de solução: mecanismos de governação horizontal, explicitação de visão territorial por parte do governo; responsável político de valor reforçado; agência para favorecer a coordenação intersectorial de políticas baseadas no território (a agência para o desenvolvimento e coesão poderá ser aproveitada para isto), reforço do peso dos círculos eleitorais com menor densidade territorial.
Discussão da audiência:
Sobre a evidência de ciclo eleitoral na despesa local, o ciclo de programação inicia-se com os mandatos, é esse aspecto que cria o ciclo e não a procura de reeleição; há os ciclos próprios dos fundos estruturais.
Os termos vigilância e eleitoralismo têm uma carga pesada que pode ser excessiva.
O orçamento participativo como instrumento de dirigir despesa local é uma falácia em Portugal.
Como se consegue a descentralização orçamental funcionalmente? Ao nível regional não existe componente orçamental, deveria pensar-se numa lei das finanças regionais como instrumento [comentário: quantos níveis de decisão de despesa se deve ter? Seria apenas para obras públicas de natureza regional?]
Como articular heterogeneidade dos benefícios, homogeneidade das competências, heterogeneidade das realidades. A descentralização orçamental ou é uma atitude ou não é, implica uma revolução cultural.
Há ver o papel da incapacidade de dar continuidade ao que está em curso quando se fala em ciclos eleitorais no investimento local.
Os eleitores raramente têm uma noção de um desígnio seja regional seja nacional, e por isso focam a sua atenção nas políticas sectoriais e seus efeitos.
Não há uma visão territorial de longo prazo para o país, como desenvolver o território nestas condições.
sobre BES, Novo Banco e reformas milionárias
Tem circulado na internet uma notícia sobre um ex-ministro também funcionário do BES que pediu e agora processou para receber uma reforma milionária (notícia aqui).
Apesar de muita indignação com o valor em causa, lembrei-me foi de outra coisa – não acredito que este ex-ministro tenha recebido um tratamento excepcional dentro do grupo ES, pelo que o que me preocupa é quantas reformas milionárias estão garantidas pelo Novo Banco e quantas ficaram no “velho” BES – de repente passou o “suor frio” de o contribuinte ainda vir a pagar essas reformas todas… que deveriam ficar de fora do processo de recuperação do ex-BES, agora Novo Banco. Não consegui encontrar informação pública que me sossegasse.
observatório mensal da dívida dos hospitais EPE, segundo a execução orçamental (nº7 – Outubro 2014)
Saíram, pontualmente, os valores da execução orçamental referentes a Setembro de 2014, na passada sexta-feira, pelo que é devida a actualização deste observatório mensal da dívida dos hospitais EPE. A novidade deste mês é a redução em Setembro do valor em dívida (em vez do habitual aumento). O valor para Setembro altera os valores médios mensais, e sai fora do que é o intervalo de previsão baseado nos períodos de evolução sem regularização extraordinária de dívidas. Não consegui encontrar menção a uma regularização extraordinária em Setembro, pelo que adopto como hipótese de trabalho (até confirmação do contrário) que não houve qualquer regularização extraordinária (mas que a recuperação resultou do normal funcionamento das instituições hospitalares). Claro que pode ter ocorrido alguma circunstância de funcionamento que faça com que a dívida surja depois em Outubro, embora nos outros anos não se encontre evidência dessa sazonalidade. Esta possibilidade é levantada pelo crescimento da dívida à apifarma em setembro, conforme reportado pela própria apifarma, quando em agosto tinha tido um decréscimo, o que poderá subir algum desfazamento temporal. Por isso, o número sobre a dívida dos hospitais EPE a ser divulgado daqui a mês deverá ajudar a dissipar estas dúvidas.
Esta evolução faz com que o ritmo médio de crescimento desde Janeiro de 2013 caia, tal como o ritmo médio de crescimento da dívida em 2014 ficou agora em cerca de 25 milhões de euros por mês.

Intervalo de confiança para a evolução da última observação (excluída da estimação para o cálculo do intervalo)

Tend3= tendência em 2013 (34 milhões de euros por mês), tend4 = tendência em 2014 (25 milhões de euros por mês)
“Para uma conversação construtiva” (6)
Na secção dedicada à qualidade da governação, a discussão começa pelas despesas em saúde em percentagem do PIB. O primeiro comentário é logo que olhar para nível ou crescimento das despesas sem olhar aos resultados gerados contraria o que se diz noutros lados do texto sobre custo – efectividade (não que eu goste do termo, mas é importante que quando se fala de despesa se tenha em conta os benefícios que são, ou não, gerados).
Há também uma referência ao financiamento privado das despesas de saúde, embora aqui a análise tenha que ser mais fina. Há pelo menos três tipos de financiamento privado que têm de ser distinguidos pois têm propriedades e implicações diferentes:
- pagamentos directos determinados pelo próprio SNS – o SNS ao ter taxas moderadoras para alguns serviços e sobretudo por ter co-pagamentos nos medicamentos força a uma despesa privada elevada mesmo para quem só recorra ao SNS. A protecção financeira dada pelo SNS não é integral.
- Pagamentos directos feitos por escolha dos cidadãos em serviços privados – de decisão própria, e não envolvem protecção financeira.
- Financiamento através de seguros de saúde privados – que dão por definição protecção financeira, e cuja única redistribuição presente é de sãos para doentes durante o período do contrato de seguro.
Nos dois primeiros casos, tem-se um problema sobretudo de falta de protecção financeira, sendo por isso qualitativamente distintos do terceiro tipo de financiamento privado.
(ainda se pode acrescentar que o mesmo o financiamento público assenta num esforço privado, através do pagamento de impostos pelas famílias)
“Para uma conversação construtiva” (5)
Mas o que é realmente a proposta de contrato social?
“O SNS requer de nós: uma contribuição financeira socialmente justa (…); uma contribuição pré-paga quando estamos bem e podemos dar (não quando estamos doentes” – ou seja o SNS é um contrato de seguro, e falta concretizar a componente de seguro intertemporal.
“O que nos é prometido em troca: melhor saúde; acesso a cuidados de saúde de qualidade; justiça na contribuição financeira (pagar de acordo com os rendimentos) (….) um SNS que nos “preste contas”; “ – na parte de equidade no financiamento há uma repetição com o que foi expresso no que o SNS requer de nós. Não aparece nada que se refira à equidade no acesso, que estando provavelmente implícita deveria ter sido tornada explícita (acesso equitativo a cuidados de saúde de qualidade). Por outro lado, dado que a saúde não é um bem transaccionado e há incerteza nos resultados de utilização de cuidados de saúde em muitas circunstâncias, o SNS não pode prometer melhor saúde, pode prometer fazer o que for adequado (e é preciso definir o que é adequado) para gerar melhor saúde. Nalguns casos, como surgem nos cuidados paliativos por exemplo, não será tanto melhor saúde e sim acompanhamento digno e adequado em final de vida.
O elemento de prestação de contas é o primeiro ponto onde tenta ter uma maior definição dos aspectos operacionais – “esta prestação de contas pode ser objectivada e avaliada através de um painel de indicadores publicamente escrutináveis, respeitantes a 7 dimensões: a) acesso; b) equidade; c) efectividade/resultados intermédios; d) eficiência; e) segurança; f) ganhos em saúde e em bem-estar; g) satisfação dos utentes e dos profissionais – a nível nacional, regional e local e em cada instituição do SNS”.
Dois comentários a isto: um painel de indicadores só é útil se for indicada a relevância de cada um, qual o elemento de causalidade que pretende explicitar e que tipo de acção pode determinar. É também necessário evitar que haja contradições entre indicadores – por exemplo, se quiser ter mais pessoas a serem tratadas nos cuidados primários, sem serem referenciadas para os hospitais, então o custo médio por doente tratado no hospital irá aumentar por apenas os casos mais graves lá chegarem. Se houve um indicador que é número de consultas em cuidados de saúde primários e outro que é custo médio por doente tratado em hospital, então a mesma realidade irá levar a movimentos nos dois indicadores e numa visão apressada podia-se pensar que se melhorava num indicador e piorava noutro. Claro que o aumento do custo médio por doente tratado num hospital se pode dever a menor eficiência, a maior desperdício. Mas significa que uma mesma evolução desse indicador é compatível com diferentes justificações. Daí a importância de saber a causalidade em cada indicador.
Como segundo aspecto, a própria definição de indicadores pode ser uma tarefa enorme. A título de exemplo, deixo a sugestão da lista de indicadores que está no anexo do documento “Future EU agenda on quality of health care with a special emphasis on patient safety” e a lista no European Core Health Indicators.