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“Para uma conversação construtiva” (5)

2 comentários

Mas o que é realmente a proposta de contrato social?

“O SNS requer de nós: uma contribuição financeira socialmente justa (…); uma contribuição pré-paga quando estamos bem e podemos dar (não quando estamos doentes” – ou seja o SNS é um contrato de seguro, e falta concretizar a componente de seguro intertemporal.

“O que nos é prometido em troca: melhor saúde; acesso a cuidados de saúde de qualidade; justiça na contribuição financeira (pagar de acordo com os rendimentos) (….) um SNS que nos “preste contas”; “ – na parte de equidade no financiamento há uma repetição com o que foi expresso no que o SNS requer de nós. Não aparece nada que se refira à equidade no acesso, que estando provavelmente implícita deveria ter sido tornada explícita (acesso equitativo a cuidados de saúde de qualidade). Por outro lado, dado que a saúde não é um bem transaccionado e há incerteza nos resultados de utilização de cuidados de saúde em muitas circunstâncias, o SNS não pode prometer melhor saúde, pode prometer fazer o que for adequado (e é preciso definir o que é adequado) para gerar melhor saúde. Nalguns casos, como surgem nos cuidados paliativos por exemplo, não será tanto melhor saúde e sim acompanhamento digno e adequado em final de vida.

O elemento de prestação de contas é o primeiro ponto onde tenta ter uma maior definição dos aspectos operacionais – “esta prestação de contas pode ser objectivada e avaliada através de um painel de indicadores publicamente escrutináveis, respeitantes a 7 dimensões: a) acesso; b) equidade; c) efectividade/resultados intermédios; d) eficiência; e) segurança; f) ganhos em saúde e em bem-estar; g) satisfação dos utentes e dos profissionais – a nível nacional, regional e local e em cada instituição do SNS”.

Dois comentários a isto: um painel de indicadores só é útil se for indicada a relevância de cada um, qual o elemento de causalidade que pretende explicitar e que tipo de acção pode determinar. É também necessário evitar que haja contradições entre indicadores – por exemplo, se quiser ter mais pessoas a serem tratadas nos cuidados primários, sem serem referenciadas para os hospitais, então o custo médio por doente tratado no hospital irá aumentar por apenas os casos mais graves lá chegarem. Se houve um indicador que é número de consultas em cuidados de saúde primários e outro que é custo médio por doente tratado em hospital, então a mesma realidade irá levar a movimentos nos dois indicadores e numa visão apressada podia-se pensar que se melhorava num indicador e piorava noutro. Claro que o aumento do custo médio por doente tratado num hospital se pode dever a menor eficiência, a maior desperdício. Mas significa que uma mesma evolução desse indicador é compatível com diferentes justificações. Daí a importância de saber a causalidade em cada indicador.

Como segundo aspecto, a própria definição de indicadores pode ser uma tarefa enorme. A título de exemplo, deixo a sugestão da lista de indicadores que está no anexo do documento “Future EU agenda on quality of health care with a special emphasis on patient safety” e a lista no European Core Health Indicators.

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Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

2 thoughts on ““Para uma conversação construtiva” (5)

  1. Caro Prof. Pita Barros,

    Não sei se concordo com o termo “seguro”. Não por o termo não ser o adequado, mas porque o significado do mesmo é algo carregado, seja em termos económicos, seja em termos ideológicos. A noção que existe de seguro é que a contribuição (o prémio) é função do nível de risco individual. Ora no SNS o princípio é distinto: o prémio é função da capacidade financeira.

    Como tal, acho preferível o termo previdencial ou mutualista, à boa moda das antigas caixas de previdência, em que o risco é partilhado por todos (em função dos rendimentos).

    Quanto ao resto, de acordo. Suponho que o ideal em termos de custo não será o custo por paciente por tipo de cuidado prestado (exactamente para “normalizar” os gastos) em vez de por tipo de unidade, mas sinceramente é uma opinião meramente leiga.

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  2. Caro Carlos,
    por razões técnicas, gosto do termo seguro, pois seguro também tem risco partilhado por todos – a contribuição é definida com base no risco individual no seguro de saúde individual no risco de grupo no seguro de saúde privado de grupo, e dentro do grupo as contribuições podem ou não ser definidas de acordo com o rendimento, e no seguro de saúde público financiado por impostos as contribuições são via impostos directos e indirectos; por fim no seguro de saúde público financiado por contribuições especificas, estão são normalmente definidas com base no rendimento, ou no salário. Só os sistemas de contas de saúde não têm risco partilhado entre quem contribuiu, e sim entre diferentes momentos do tempo para cada pessoa.

    Compreendo o argumento da carga ideológica do termo seguro, mas é o que é em termos técnicos.

    Abraço
    Pedro

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