Foi agora anunciado um novo aumento da contribuição para a ADSE por parte dos seus beneficiários, e segundo declarações atribuídas à ministra das finanças “por uma questão de facilidade de tratamento orçamental, nós vamos manter esse 1,25% [que é pago pela entidade patronal – serviço do Estado – ] que se traduzirá em saldo dos subsistemas que reverte a favor do Orçamento do Estado”. O valor pode ir até 3,75% do ordenado.
Estas declarações revelam mais do que parece. E é de separar duas situações: a) os 3,75% de contribuição correspondem realmente ao auto-financiamento da ADSE; b) os 3,75% de contribuição geram receitas que ultrapassam as despesas da ADSE, criando um excedente, mesmo que a contribuição do departamento do estado onde se encontra o trabalhador seja reduzida a zero.
Nesta segunda alternativa, a contribuição de 3,75% ser suficiente para gerar uma receita superior às despesas efectivas da ADSE em cuidados de saúde, funcionará como um imposto adicional sobre os funcionários públicos beneficiários da ADSE. O “preço” do “seguro” estabelecido é superior às necessidades, revertendo o “lucro” para o “accionista” (o ministério das finanças).
Na primeira alternativa, como o aumento da contribuição dos beneficiários ainda não é suficiente para cobrir todos os custos da ADSE, a não redução da contribuição do serviço do estado do beneficiário corresponde a uma forma de distribuição do “corte orçamental”.
Em qualquer destas situações, um aumento para 3,5% ou 3,75% poderá começar a alterar o equilíbrio financeiro da ADSE por saída de beneficiários – a minha expectativa é que sejam os mais novos e mais saudáveis, com rendimentos médios / elevados, a ganhar com essa saída.
O grande atractivo actual da ADSE é a cobertura acima dos 65 anos e a extensão dessa cobertura nalgumas áreas (como a oncologia). As vantagens dessas coberturas serão menos evidentes para os grupos etários mais novos.
Mas há um outro grupo que poderá ser afectado, os beneficiários reformados – para os quais a subida da contribuição para a ADSE se adiciona aos cortes de pensões. Por uma questão de mera restrição financeira, alguns destes beneficiários poderão deixar a ADSE, levantando um de dois problemas: a) ou são relativamente saudáveis, e como tal contribuintes líquidos, e a sua saída contribui para agravar o desequilíbrio financeiro da ADSE; b) ou são utilizadores frequentes dos serviços disponibilizados pela ADSE, e neste caso a sua saída favorece o equilíbrio financeiro, em detrimento do tratamento e do estado destas pessoas, que terão de recorrer apenas ao Serviço Nacional de Saúde.
Pode ainda dar-se um outro efeito – com um aumento das contribuições, passar a existir uma maior utilização por parte dos beneficiários – dado que pagam e sentem que pagam, então vão usar “para valer a pena”. Mas se houver maior utilização, o equilíbrio financeiro poderá voltar a ser um problema.
Devido à presença de diferentes motivos para deixar a ADSE, o efeito líquido sobre o seu equilíbrio financeiro é difícil de prever, uma vez tomadas decisões de saída por alguns dos actuais beneficiários.
Nas declarações públicas sobre as medidas adoptadas para o ajustamento da taxa de contribuição para a ADSE não é referido, que eu tenha reparado, o aspecto de qual o ajustamento de comportamento dos beneficiários. Aparentemente, a hipótese subjacente aos cálculos é a de que as saídas serão negligenciáveis, e se for de facto esta hipótese, seria bom conhecer que base de evidência é usada para a estabelecer.
11 \11\+00:00 Janeiro \11\+00:00 2014 às 20:04
(só por curiosidade, até às 20h00 de dia 11 de Janeiro de 2014, os resultados correspondiam a 33 respostas)
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15 \15\+00:00 Janeiro \15\+00:00 2014 às 11:56
Caro Prof. Pita Barros,
Como tive oportunidade de lhe dizer por Facebook, sou (ou melhor, a minha mulher é) uma pessoa nessa situação e, salvo algo de muito extraordinário que ainda não apareceu, ela irá dispensar a ADSE.
Quando ela aceitou o serviço (final do ano passado, quando ingressou na função pública), a taxa era de 2,5%. o que dava um prémio anual um pouco inferior a 1000 euros. Esse valor é o que pagamos actualmente por um seguro de saúde para os quatro (dois adultos, duas crianças pequenas) mas, mesmo tendo em conta que eu teria de manter o seguro privado, o acréscimo total anual seria compensado por uma segurança “extra” de ser um serviço do Estado e de não agravar com a idade.
No entanto, considerando a taxa “futura” de 3,75%, estamos a falar de um valor anual de 1.500 euros, o que torna a ADSE absolutamente não competitiva nos tempos mais próximos, senão vejamos:
– Os nossos médicos não têm acordo com a ADSE, pelo que apenas funcionaria o reembolso, que está limitado a 20 euros por consulta. Com o seguro apenas dois médicos (de consulta regular) não têm acordo com a seguradora e o reembolso (“Fora da Rede”) nesse caso é de 30 euros por consulta. Todos os outros (também de consulta regular) pertencem à rede.
– É verdade que a ADSE não tem limite de capital, mas consideramos que em Portugal capitais muito elevados fazem pouco sentido. Vemos o seguro como algo para assegurar serviços médicos não-urgentes e não situações graves. Nesse último caso o recurso (com o sem seguro) será ou o SNS ou clínicas especializadas no Estrangeiro (que o Seguro cobre e a ADSE não, aliás).
– O contrato de seguro não tem limite de permanência por idade, apesar do agravamento dos prémios.
– Pelo que se nos dá a ver – e mesmo admitindo que tal represente uma quebra de acordo com a ADSE – os segurados privadamente têm melhor acesso aos serviços que com a ADSE (temos tido informações interessantes e “não-oficiais” sobre o porquê da pergunta sobre que sistema vamos usar, quando marcamos consultas em hospitais privados).
Ora, admito que não sejemos os únicos a pensar assim e, tendo em conta que a minha mulher é (e, espero, seria) uma contribuinte líquida para a ADSE por muitos anos, se estas medidas não resultaram numa diminuição da apregoada “auto-sustentabilidade” da ADSE.
Eu compreendo e concordo com a necessidade de tornar a ADSE sustentável, mas tal não me parece que passe por estas medidas. Parecia-me mais racional acompanhar um aumento de taxa contributiva (que acho legítimo) pelo estabelecimento de plafonds máximos e mínimos contributivos e, se calhar, por uma progressão da taxa em função da idade do aderente ao sistema. Ou seja, por tornar a ADSE mais “próxima” do modelo privado de seguro, mantendo no entanto alguma componente redistributiva.
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