Momentos económicos… e não só

About economics in general, health economics most of the time


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aviso: este post contém publicidade – momentos económicos torna-se também canal de televisão

Desde esta noite que passou a existir também um canal, ou melhor um kanal, de televisão com conteúdos associados com o blog momentos económicos.

Para saber o que é um kanal MEO, ver aqui

Como descrição breve de promoção da ideia, a melhor que encontrei é a do Tao of Mac:

“As of today, and in a worldwide debut, every Meocustomer can create his/her own TV channel, powered by SAPO. Nobody’s done this before, as far as I can tell.

Now you have an inkling of what I’ve been involved with for a year and a half (there’s more stuff going on, but this was the main event). The traditional TV business model is long overdue some disruption, and this is just the beginning…

Also, more here, in Portuguese (try to spot me in the top photo, took me a while to realize it myself).

A little more background: This means a million customers can create their ownTV channel, on a platform where roughly 2/3rds make heavy use of the interactive features. It’s going through the roof as I type this…”

Por hoje, coloquei apenas dois vídeos antigos, um sobre a profissão de economista e outro sobre o futuro da União Europeia. São quase-história. Have fun!


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eficiência nos custos hospitalares

decorreu ontem a apresentação dos resultados de um estudo sobre os custos e a eficiência no sector hospitalar do Serviço Nacional de Saúde (a eficiência dos hospitais privados não foi analisada).

A notícia sobre o estudo surgiu em diferentes pontos, um deles aqui, o resumo do estudo pode ser visto aqui.

O estudo, realizado utilizando uma metodologia que avalia a eficiência de cada episódio de internamento – excluem-se as urgências e as consultas como grandes agregados de “produção”, aponta para um limite máximo de cerca de 800 milhões de euros de poupança, conforme refere a noticia.

O estudo considera diversas fontes de falta de eficiência, procurando captar as diferentes faces da realidade da actividade hospitalar de internamento de doentes: falta de eficiência pura, complicações evitáveis, readmissões, admissões precoces, dias de internamento excessivos, admissões tardias e cesarianas em excesso.

Há um conjunto de comentários que vale a pena fazer quanto à notícia e aos resultados do estudo. Os 800 milhões de euros são um limite superior, pois como os próprios autores referem a contabilização de cada linha de potencial ineficiência é calculada independentemente das restantes, e como tal é possível, e provável, que existam duplicações num montante considerável.

Só que mesmo descontando essas duplicações os valores de poupança potencial vão continuar a ser significativos – suponhamos, sem qualquer base, que as duplicações seriam 50%, então ainda haveria um potencial de 400 milhões; ou se forem 25%, haveria um potencial de 600 milhões de euros. Em qualquer dos casos, valores importantes. Naturalmente, um próximo passo dos autores será estabelecerem um limiar inferior às poupanças possíveis, e avaliar se esse limiar inferior tem os mesmo elementos determinantes do limiar superior.

Para os tais 800 milhões de euros contribuem com mais de metade as situações associadas com complicações evitáveis e com dias de internamento excessivos. Dentro destas duas, será provavelmente na segunda categoria que haverá maior capacidade de intervenção.

Cabe agora aos profissionais, de saúde e de gestão, retirarem as suas conclusões, e olharem para dentro dos seus hospitais.


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conversas com ritmo…

…este foi o título dado a uma sessão do congresso Arritmias 2012, organizado pelo Instituto Português do Ritmo Cardíaco e pela Associação Portuguesa de Arritmologia, Pacing e Electrofisiologia, a 10 de Fevereiro. Foi uma conversa que decorreu informalmente, e em que o tema principal foi o momento do Serviço Nacional de Saúde, num contexto de dificuldades financeiras.

Alguns aspectos podem ser salientados, uns habituais outros novos.

– no momento de publicação do memorando de entendimento com a troika, houve em 90% das pessoas uma concordância em 90% (mais coisa menos coisa) com o roteiro traçado. Cerca de 8 meses depois, não se mantém o mesmo optimismo sobre o caminho a seguir.

– adicionada à preocupação de falta de fundos (subfinanciamento), embora na saúde seja raro ouvir alguém dizer que não precisa de mais recursos e por isso é uma preocupação a ser tratada com cuidado, surge agora a preocupação com a chamada lei dos compromissos – como é que vai ser exercido um controle orçamental estrito sobre a despesa pública em saúde – que mecanismos e com que consequências, para profissionais e para os cidadãos.

– o problema da dívida dos hospitais, que tem de ser equilibrada com a discussão da dívida do próprio estado aos hospitais; a ausência de boas relações financeiras entre estado e entidades fornecedoras e dentro do próprio estado é um problema também com fortes implicações para a qualidade da gestão que é praticada

– os desafios dos centros de referência num quadro de mobilidade europeia de doentes – a capacidade de Portugal ter alguma relevância neste mapa europeu tem que ser pensada desde já, e sobretudo tem que se agir desde já, nomeadamente em termos de certificação europeia

– a importância da gestão intermédia como elemento crucial do funcionamento do Serviço Nacional de Saúde; não é só nas nomeações da administração que a qualidade da gestão se joga.

– o modelo de formação profissional, e quem pode e ou deve apoiar essa formação, em particular capacidade para o fazer

Um conjunto de preocupações que são certamente partilhadas de forma mais geral no sector, e para as quais importa ir dando informação e soluções.

 


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para o dinheirovivo.pt de hoje

de repente parece que o único problema é os “mercados” (financeiros internacionais) acreditarem em Portugal (o que quer que isso queira dizer). Ora, esse é apenas o reflexo do problema, capacidade de crescer, e corremos um risco – de uma vez mais nos dispersarmos pelo acessório – e a discussão das conversas de Vitor Gaspar com o ministro alemão são um exemplo disso mesmo

Desfocados

13/02/2012 | Dinheiro Vivo

Uma conversa informal entre o ministro das finanças português e o ministro das finanças alemão ganhou um grande protagonismo na semana que passou. O que sendo compreensível é provavelmente menos relevante para o nosso futuro colectivo do se poderia supor das diferentes reacções.

Para perceber porque é pouco relevante essa conversa, comecemos por responder a algumas perguntas.

A falta de capacidade de crescimento da produtividade na economia portuguesa é um problema a resolver? Creio ser consensual que a resposta é sim.

Resolver o actual problema financeiro das contas públicas sem resolver o problema do crescimento da produtividade é suficiente?

A resposta é não, acaba-se por voltar a ter o problema, ou ter que fazer o ajustamento para consumo compatível com o valor da capacidade produtiva do país.

Uma alteração das condições do apoio financeiro, para dar mais tempo à economia portuguesa, poderá ser nociva?

A resposta é que não podemos excluir que haveria a tentação de adiar também os aspectos de “transformação estrutural”, para usar a expressão adoptada pelo actual governo. Há assim que comparar as vantagens de mais tempo para ajustar a economia portuguesa, com a desvantagem de eventualmente não o fazermos.

Uma questão final, corresponde a troca de impressões entre os dois ministros a um compromisso? Creio que a resposta será negativa. Não há qualquer garantia ou presunção de que a posição alemã daqui a uns meses (ou se calhar uns dias) seja realmente esta. Além de que o ministro alemão ao falar, formal ou informalmente, não compromete as posições das três instituições, Comissão Europeia, FMI e Banco Central Europeu.

Algumas dos comentários, nacionais e internacionais, produzidos conseguiram distrair ainda mais as atenções ao referirem os mercados financeiros internacionais. O regresso de Portugal aos mercados financeiros internacionais para financiar a sua dívida pública, frequentemente tomado quase como o único objectivo, é apenas um objectivo intermédio. É por ser um objectivo intermédio que poderá ser, ou não, flexibilizado, consoante o progresso da economia portuguesa e das medidas adoptadas pelo Governo.

Convém não estarmos desfocados do verdadeiro objectivo, conseguir que a economia portuguesa tenha a capacidade de ter maior produtividade. Ciclicamente é preciso ir relembrando que maiores salários só poderão ser pagos se houver maior produtividade. E maior produtividade depende de uma maior capacidade de inovação e de uma melhor utilização dos equipamentos produtivos.

Repito, convém não ficarmos desfocados do que é central: produtividade.


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o mito do estado empresário

O mito do estado empresário está mesmo enraizado no pensamento político português, e é desses “instintos profundos” que resulta grande parte da nossa paralisia em geral.

Hoje, no trânsito, com a rádio ligada, estava a ser dada uma notícia sobre a linha do Vouga, que aparentemente irá ser encerrada. Um deputado de um dos partidos da coligação governamental era referido como tendo afirmado que “achava” que a linha era viável e urgia o Governo a olhar para o assunto. Eram focadas as ligações entre Aveiro e Águeda e entre Águeda e Espinho, se não estou enganado.

Desconheço, confesso, qual a verdadeira viabilidade económica dessas linhas e de que condições depende essa viabilidade.

O que me assusta é a ideia de que deve ser o Governo a fazer essa avaliação.

Pelos vistos, não cabe às empresas de transportes fazer essa avaliação, tem que ser o estado empresário, ao mais alto nível.

Pelos vistos, não passou pela mente do deputado ir para além do “achar” e fazer um business plan demonstrando essa viabilidade económica, ou incentivar alguém ou alguma empresa a fazer esse plano e a candidatar-se a explorar as ditas ligações sem apoios do estado.

Nada disso, cabe ao Governo avaliar a viabilidade económica da linha! Apesar de toda a retórica continua no fundo da alma a querer-se um estado que esteja presente em tudo, que tudo pague. E vindo do grupo político de apoio ao Governo, demonstrando o enraizamento desta ideia.

Se fosse um pedido para o Governo avaliar a componente de serviço público que pudesse estar presente – que externalidades existem? efeitos de redistribuição por apoio à mobilidade de população sem outras alternativas? coesão social na área? – ainda poderia caber dentro da esfera que se espera para o Governo. Não sendo assim, a pergunta deve ser devolvida à comunidade empresarial, que deverá mostrar, pela acção e gestão concreta, se as linhas em causa são ou não economicamente viáveis.


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O percurso da saúde: Portugal na Europa (2)

Sobre a contenção de custos, como tipologia de medidas, Correia de Campos e Jorge Simões, apontam os seguintes (e coloco a minha visão do que cá se passa entre parêntesis rectos)

Limitação de recursos públicos:

* crescimento dos co-pagamentos [feito]

* redução do número de situações de excepção aos co-pagamentos [foi alargado o número de isenções]

* racionamento com base em decisões explícitas [não se usou até agora]

* papel crescente dos seguros voluntários de saúde [?? desconheço o que esteja a suceder aqui]

* desenvolvimento de formas alternativas à hospitalização [intenção de aumentar a capacidade de respostas dos cuidados de saúde primários, está a resultar? irá resultar?]

Formas de controlo

* controlo sobre os honorários [feito]

* controlo sobre os inputs [feito, na medida de redução dos preços dos medicamentos, barreiras à contratação]

* controlo das camas hospitalares [?? encerramentos ainda por anunciar]

* introdução de guidelines na medicina [está a ser feito]

* introdução do sistema de preços de referência [já estava em vigor nos medicamentos, será que é extensível a outras áreas?]

* controlo do tempo de internamento [?? como]

Correia de Campos e Jorge Simões apontam, no final da secção, “A efectividade das medidas de contenção de custos é muito debatida. Em resumo poder-se-á dizer, com Abel-Smith, que se se aceitar que o principal problema é a tecnologia, então dever-se-á lidar directamente com este tema”. Ora, nenhuma das medidas acima diz “limitar a tecnologia”, ou “controlar a tecnologia”, mas também deve ser claro que o preço da tecnologia faz diferença para a decisão. O desafio é saber se se pode vir a ter tecnologia que seja geradora de menores custos!

 

 


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O puzzle, saído no Diário Económico de ontem

O puzzle (no Diário Económico de 06.Fev.2012)

Há mais de meio século que a Europa Ocidental procura construir um espaço comum, político e económico. Nos dias que correm, o económico tem peso considerável, A falta de crescimento económico e o desemprego estão na frente das preocupações.

A criação de uma identidade europeia levará, sem ignorar as raízes de cada um, à capacidade e disponibilidade para circular no espaço europeu, como turista e como trabalhador.

O Primeiro-Ministro italiano falou sobre mobilidade entre postos de trabalho (e na quebra de monotonia), gerando reações que se assemelham às vistas em Portugal a  propósito de se sair da “zona de conforto” (eventualmente mesmo emigrar).

As reações observadas nos dois países, Portugal e Itália, traduzem o muito que ainda falta fazer em termos de construção europeia, em particular na facilidade em encarar a mobilidade dentro do espaço da União Europeia, em termos de emprego e dinâmica económica. Daqui é fácil saltar para a conclusão de que parte da solução dos problemas do emprego a nível europeu tem que passar pela mobilidade dos trabalhadores. Mas essa é a parte mais evidente, e, até certo ponto, mais contestada. Há contudo outra parte, mais ignorada no debate público.

Para que um país (uma região) possa integrar o espaço económico europeu é necessário que pense em como atrair trabalhadores de todo esse espaço. As políticas de emprego em Portugal não podem ser apenas pensadas para os desempregados portugueses. É muito mais interessante pensar em que políticas de emprego permitem atrair trabalhadores, empresários e empresas, de toda a União Europeia. E se formos capazes de definir ambientes de trabalho e regras de funcionamento do mercado de trabalho português que sejam apelativas globalmente, então também serão atrativas para os portugueses.

Os desafios da mobilidade internacional e da mobilidade entre postos de trabalho, que tanta discussão têm gerado em Portugal e Itália, têm de ser vistos como um elemento de um desafio mais geral: como tornar Portugal um local de trabalho interessante para qualquer europeu. Pensar desta forma implica encaixar muitas peças de um puzzle complicado: mercado de trabalho, mas também mercado da habitação, segurança social em diferentes países, assistência da doença, educação para filhos, relação com a administração pública, etc… É este puzzle que temos de montar, se quisermos futuro para além dos tempos da troika. Teste simples para saber se cada peça encaixa: é amiga de trabalhadores “europeus”, portugueses ou não?


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a contribuição do dia no dinheirovivo.pt

A discussão sobre a lei da cópia privada tem gerado alguma discussão sobre se serão os consumidores ou os fabricantes a pagar, a situação é um exemplo perfeito das diferenças entre incidência legal e incidência económica de impostos e taxas, é este o tema do artigo de hoje:

Quem paga quando se cria uma taxa?

06/02/2012 | 00:00 | Dinheiro Vivo

Nas últimas semanas foi emergindo a discussão sobre uma nova lei sobre cópia privada, em que se tributa ao giga de cada meio de reprodução digital (projecto de lei nº118/XII). No meio dessa discussão, surgiu a questão de ser mais um aumento de preços para os consumidores, e que poderia onerar substancialmente o preço dos meios digitais de armazenamento.

A defesa apresentada contra esse argumento, e aliás constante do texto do projecto de lei, baseia-se em serem os valores pagos pelos fabricantes e importadores, não prejudicando os consumidores. Textualmente: “Os devedores principais do pagamento das compensações equitativas são os fabricantes e importadores de equipamentos e suportes de reprodução de obras intelectuais”. Ora, é esta visão que importa rever.

Existe, desde há muito, uma distinção entre o que é a incidência legal de um imposto ou taxa – quem legalmente tem o dever de entregar o valor desse imposto ou taxa à autoridade tributaria – e o que é a incidência económica associada. A incidência económica de uma taxa é a forma como o valor da mesma é repartida entre consumidores e fabricantes, depois de todos ajustarem os seus comportamentos.

O efeito económico de um imposto ou uma taxa não é determinado pela disposição legal de quem tem de entregar esse valor. Não é determinado pelo boa (ou má) vontade de um legislador.

Tomemos este caso deste projecto de lei. Se os consumidores não tiverem qualquer alternativa a esses meios, e se não puderem deixar de os adquirir, será relativamente fácil aos fabricantes aumentarem os seus preços sem perderem vendas consideráveis, como resposta à obrigação de terem de entregar o imposto. Neste caso, a incidência económica recai sobre os consumidores.

Porém, se os consumidores tiverem à sua disposição outras soluções de aquisição, ou se facilmente prescindirem destes meios de gravação digital, então um aumento de preço reduz drasticamente as vendas. Neste caso, será mais favorável aos fabricantes não alterarem preços e a incidência económica desta taxa recai, de facto, sobre o lado da produção.

De uma forma mais técnica, um dos factores que determina quem no final efectivamente paga a taxa é a sensibilidade da procura ao preço, quem quer que tenha a obrigação de entregar o valor e qualquer que seja a intenção do legislador.

Outro dos factores relevantes é a sensibilidade dos fabricantes aos preços. Normalmente, preços mais elevados chama mais produtores e distribuidores ao mercado, enquanto preços mais baixos os afasta.

Assim, a incidência económica desta taxa sobre os meios de reprodução digital pode acabar por ter efeitos muito distintos da incidência legal e da incidência pretendida (ou não, na verdade não foi trazida para a discussão informação suficiente para se poder tomar uma posição sobre a repartição do custo da taxa entre consumidores e fabricantes).

Este é aspecto que me parece ser crucial ser esclarecido quanto a quem pagará de facto a taxa, e que sendo técnico é independente de se saber se este tipo de compensação é de facto equitativo ou não, ou se é ainda razoável num mundo em que o próprio “modelo de negócio” dos autores se tem reinventado. O sucesso das lojas de música online, de que o iTunes abriu caminho, mostrou que pode ser preferível um preço muito baixo e grande volume. A criação de direitos de tributação e de monopólio de recolha desses direitos também pode ser discutida em termos de princípios e efeitos (de eficiência, com redução das compras e do valor gerado, e de redistribuição, bem como de incentivos, ou não, à criação artística). Mas ainda antes de chegar a essa discussão convém que pelo menos a análise de efeitos ao instrumento que é proposto seja tecnicamente correcta. A lei da cópia privada é apenas o exemplo mais recente desta confusão entre incidência legal e incidência económica de impostos e taxas.


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Carnaval

(post gémeo com No Reino da Dinamarca)

A decisão de não dar tolerância de ponto no Carnaval, e a forma como foi anunciada não deixa de ser curiosa.

Num período de dificuldades evidentes, num período em que o desânimo se vai instalando, em que a emigração como solução começa a ser assumida pela negativa – por não haver futuro em Portugal – a não atribuição da tolerância de ponto surge como mais uma “punição”, e não como um esforço adicional.

A concessão da tolerância de ponto teria a vantagem de permitir uma certa descompressão, a manutenção de um ar de normalidade em tempos exigentes, a capacidade de deixar algum divertimento, ou de descanso.

Precisamente por se retirarem feriados, por se retirarem dias de férias, é que permitir uns dias de distracção, habituais, teria feito sentido.

A lógica subjacente às declarações do primeiro-ministro correspondem a uma lógica workaholic – não perder uma oportunidade de trabalhar um pouco mais para fazer Portugal sair da crise, e de mostrar esse compromisso nacional interna e externamente. Até se compreende. Mas no balanço, teria preferido ouvir dizer que esta ano há tolerância de ponto, que para o ano se veria consoante os resultados dos esforços desenvolvidos pelos Portugueses durante este ano, ou no limite que se fosse mesmo necessário no dia 17 de Novembro, Sábado, se trabalharia como se fosse dia de tolerância de ponto.

E só por curiosidade, e reflexo desta tradição de paragem no Carnaval, no site do Ministério da Educação, aqui, tem-se no calendário escolar uma interrupção entre 20 e 22 de Fevereiro.

Não está aqui em causa uma questão de “direitos adquiridos”, ou de tradição que não pode ser alterada; está em causa em conseguir manter ânimo para continuar o caminho difícil que nos espera, colectivamente. A mobilização da população vai assim aumentando de dificuldade, e por inteira responsabilidade das decisões do Governo e da forma como são comunicadas, em questões onde o respeito pela “sensibilidade social” seria certamente uma forma de ganhar as pessoas para o que é preciso fazer.

ps: não sou adepto do Carnaval, nem usualmente festejo.


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continuando a leitura de “O percurso da Saúde: Portugal na Europa”

No capítulo 1, A Correia de Campos e Jorge Simões dão uma visão histórico do nascimento dos dois principais modelos de organização de sistemas de saúde, com referência um a Bismarck e final do século XIX e outro a Beveridge e final da Segunda Guerra Mundial.

O Serviço Nacional de Saúde inglês é claramente a inspiração do Serviço Nacional de Saúde português, e é interessante por isso atentar aos cinco aspectos* nucleares:

1- responsabilidade do Estado pelos encargos com a saúde dos cidadãos, que deve proporcionar cuidados gratuitos no momento em que a necessidade se efectiva. => no SNS português, há as taxas moderadoras, que têm em alguns casos a sua razão de ser, como forma de controlar utilização abusiva.

2- princípio da compreensividade – abrangência de um leque alargado de cuidados – prevenção, diagnóstico e tratamento

3- princípio da universalidade – não há residentes excluídos

4- princípio da igualdade – padrão de qualidade dos serviços para todos os cidadãos, sem qualquer discriminação económica, social ou geográfica

5- autonomia profissional e em especial a autonomia clínica: os médicos seriam livres de prescrever e de referenciar os seus doentes para outros níveis de cuidados, apenas de acordo com o seu melhor entendimento profissional.

Tomando estes cinco aspectos nos dias de hoje, constata-se que a grande omissão é a referência à necessidade de fundos e recursos para os fazer cumprir. A sua enunciação, em abstracto, não levanta hoje problemas. Contudo, não é hoje possível passar ao lado de que cumprir estes princípios obriga a escolhas dentro das disponibilidades de recursos. Como estamos então perante estes princípios iniciais? no caso da responsabilidade do Estado, há necessidade de reconhecer onde e quanto se deve solicitar um pagamento no momento de necessidade, e aqui o principal problema actual não me parece estar nas taxas moderadoras (apesar da serem muito discutidas, e como já referi noutros posts, desproporcionadamente discutidas face ao seu verdadeiro papel no SNS), e sim nos co-pagamentos exigidos no consumo de medicamentos, que assumem já uma fatia importante da despesa privada em cuidados de saúde, e com carácter permanente no caso de muitos cidadãos, no caso de doenças crónicas.

Também a autonomia profissional e clínica tem que ser hoje entendida num sentido mais amplo, em que o “melhor entendimento profissional” tem que olhar para o requisito ético de boa utilização dos recursos disponíveis.

A discussão da evolução e alteração destes princípios iniciais, e a inclusão explícita de princípios associados com boa utilização de recursos, é algo que poderia ser feito para completar esta secção do livro. É uma discussão que falta na sociedade portuguesa, pois se acordarmos nos princípios fundamentais, será depois mais fácil procurar as soluções que melhor os respeitam.

(*nota: escrevo aqui com a antiga ortografia, Correia de Campos e Jorge Simões adoptam por inteiro a nova ortografia, há por isso aqui aspectos e no texto do livro aspetos !)