Momentos económicos… e não só

About economics in general, health economics most of the time

Comentários ao Plano Costa Silva (10)

Deixe um comentário

O elemento seguinte na discussão do Plano Costa Silva é o “modelo geopolítico”, onde se retoma José Saramago e a “Jangada”, com a ideia da projeção de “softpower” para o mundo. Neste aspecto geo-politico, ao contrário da discussão das vantagens competitivas, há a enumeração de instrumentos. Contudo não há qualquer referência a quem paga, quanto se paga e que se retorno se pode esperar. Num documento que se propõe ser de visão estratégica para a recuperação económica, faria sentido ter essa informação. Sendo esta parte voltada para o posicionamento político de Portugal no mundo, abstenho-me de comentar, por não ser do meu campo de conhecimento (mesmo que como cidadão possa ter opinião sobre o assunto).

A subsecção que surge depois tem como título “Transformar a crise em oportunidade”. A primeira parte é dedicada ao potencial da exploração económica do mar como elemento para a recuperação económica tendo dois pontos fundamentais: recursos minerais estratégicos e conhecimento sobre o mar. Mas além da criação de “uma grande Universidade do Atlântico”, não há propriamente uma indicação ou sugestão de como a restante parte da visão pode “arrastar” os setores tradicionais. E a criação de uma universidade demora mais tempo do que o necessário para poder contribuir para a recuperação económica. É uma ideia para o médio e longo prazo – colocar Portugal na linha da frente da produção do conhecimento científico sobre o mar – e vai exigir investimento em recursos que não terão logo efeito, e definição clara de como o valor do conhecimento gerado será depois transformado em valor económico. Dizer apenas, com muitas palavras, que as empresas portuguesas não podem ficar de fora dos mercados internacionais, sobretudo querendo usar a inovação como essencial para o seu crescimento é retomar ideias que já tinham sido apresentadas.

Logo de seguido, e de uma forma que aparece um pouco “caída do céu”, entra-se numa discussão sobre a estrutura produtiva, onde se recuperam aspetos que há pelo menos 25 anos estão em todas as discussões sobre o desenvolvimento da economia portuguesa: mais investimento privado, mais emprego, mais qualidade do trabalho (mais capital humano), mais investimento em inovação, mais investimento público em infraestruturas e menos custos de contexto (regulação, justiça, energia), e com preocupações de “redistribuição”. Só que nada se diz sobre que prioridades, se é de apostar em tudo um pouco, ou se algum elemento deve ser tratado primeiro (por exemplo, vale a pena procurar atrair mais investimento privado nacional e estrangeiro se não se reduzirem os custos de contexto? Ou como aumentar a qualidade do trabalho? – uma possibilidade é facilitar a mobilidade de trabalhadores entre empresas para que consigam encontrar os pares empresa-trabalhador mais produtivos (rever a sugestão de ler o livro de Mário Centeno sobre o mercado de trabalho é automático aqui). E mesmo nos programas de “combate às desigualdades”, quais são os que vale a pena manter e os que vale a pena mudar ou eliminar? Quaias as necessidades de redistribuição que ainda não estão cobertas e precisam de programas adicionais? Estes programas de redistribuição ajudam também na criação de riqueza, ou na procura da redistribuição reduz-se a riqueza para redistribuir? É natural que nem toda esta discussão conseguisse ser colocada neste documento, mas sendo assunto tratado em vários documentos e trabalhos ao longo de décadas em Portugal, seria pelo menos adequado haver aqui uma síntese das principais dificuldades e equilíbrios entre diferentes objetivos. Se não aprendermos melhor com o que correu bem e correu mal nos, pelo menos, últimos 25 anos, então o mais provável é que se faça desaparecer os fundos (ou que nem cheguem a aparecer, por falta de ideias válidas e que não repitam erros passados), e daqui a 10 anos haverá novo Plano de Recuperação Económica. 

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

Deixe um momento económico para discussão...

Preencha os seus detalhes abaixo ou clique num ícone para iniciar sessão:

Logótipo da WordPress.com

Está a comentar usando a sua conta WordPress.com Terminar Sessão /  Alterar )

Facebook photo

Está a comentar usando a sua conta Facebook Terminar Sessão /  Alterar )

Connecting to %s