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Comentários ao Plano Costa Silva (1) – novidade, deceção e equívoco

1 Comentário

O Governo disponibilizou no internet o Plano Costa Silva, de seu nome completo “Visão estratégico para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020 – 2030”. E até 21 de agosto é possível enviar comentários para plano.recuperacao@pm.gov.pt

Uma vez que está colocado a discussão pública (o que desde já aplaudo), farei uma leitura comentada do texto (ou seja, os comentários seguirão em geral a ordem do texto).

Depois de uma primeira leitura, três comentários gerais, que podem ser resumidos em três palavras: novidade, deceção e equivoco. 

A novidade é a introdução na discussão de 3 grandes linhas, uma das quais tradicional em documentos de “visão estratégica”: 1) a ligação da costa atlântica ao interior ibérico e ao resto da europa, dos portos de mar à ferrovia; 2) a exploração (extração) de minérios e 3) o “mar”, os oceanos, como motivador de novos projetos. Estas linhas recebem bastante atenção e detalhe, havendo uma ideia clara e conhecimento do autor sobre o assunto. 

A deceção é a ausência total de uma visão sobre o papel de Portugal na União Europeia. Apenas se encontra uma perspetiva de “mão estendida”, a União Europeia como fonte de fundos. É pouco e é injusto para a construção europeia. É além disso um abdicar de uma participação portuguesa na liderança conjunta de um projeto europeu comum. Haverá muito a ganhar de conseguir fazer vingar uma participação portuguesa na União Europeia que também desenvolva as ideias das três grandes linhas que assinalei. Não será possível, a meu ver, uma liderança internacional de Portugal nas questões dos oceanos se não houver a capacidade de fazer uma mobilização a nível europeu na qual Portugal seja dinamizador. A conjugação de uma veia atlântica com a construção europeia deverá fazer parte de uma visão estratégica para o Portugal 2020-2030.

O equívoco está no papel do Serviço Nacional de Saúde. Desenvolverei porque considero que há nesta visão estratégica de Costa Silva um equívoco num texto futuro. Neste comentário geral assinalo apenas que o investimento no SNS não teve, não tem, não terá nem poderá ter, como um dos seus objetivos centrais o desenvolvimento de um cluster produtivo da saúde em Portugal. O papel do Serviço Nacional de Saúde (SNS) não é o de desenvolver a atividade económica em saúde. Esta atividade económica é potencialmemte importante, deve ser discutida, mas pertence à política industrial e não ao papel do Serviço Nacional de Saúde. E duas razões concorrem para esta minha posição: primeiro, os objetivos centrais do SNS são de proteção da saúde da população residente em Portugal; segundo, o SNS só por sí não tem capacidade para desenvolver um cluster produtivo da saúde em Portugal, para ter escala de forma a que possa sobreviver as empresas que estejam neste cluster da saúde terão de conseguir operar numa escala pelo menos europeia. Logo, o pensamento e a ação de dinamização deste cluster da saúde tem que considerar aspetos que não estão na mão do SNS. A questão que fica, e a que voltarei, é em que medida a prossecução dos objetivos centrais do SNS podem contribuir para dinamizar um cluster nacional na área da saúde. Mas esses aspetos são muto diferentes de “Investimento no SNS”.

Um comentário geral final, ligado à análise económica – falta uma noção de equilíbrio geral da economia em todo o documento. Cada área é tratada e discutida como se fosse completamente separada, o que sendo útil para perceber com algum detalhe o que se pretende para essa área, tem a desvantagem de ignorar o quadro geral da economia – se há recursos que vão para uma área, não irão para outra, e apresentar ideias como se todas elas fossem simultaneamente possíveis poderá esbarrar na realidade de ter de estabelecer prioridades e de encontrar efeitos cruzados entre áreas importantes (na discussão mais detalhada nos próximos posts, também voltarei a este tema).

Globalmente, acaba por ser um documento que poderia ser mais equilibrado, tendo porém o mérito de permitir uma discussão aberta sobre opções.

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

One thought on “Comentários ao Plano Costa Silva (1) – novidade, deceção e equívoco

  1. Como e todo e qualquer documento deste tipo (compare-se com outros do Jose Felix Ribeiro por exemplo) tem uma abordagem qb “de engenheiro”. O que me parece bem para principio de debate. A ver vamos como se materializam os contributos da Sociedade para alem das “polémicas`nas capas dos jornais (tgv, novo aeroporto, hidrogeno…). Porque a analise económica esta muito por fazer aqui é que a “porca vai torcer o rabo”.
    Quanto á tua afirmaçãp “O equívoco está no papel do Serviço Nacional de Saúde” concordo totalmente.O debate sobre o papel economico da Saude é uma “zona de debate excessivamente SNS”. Para o bem (valor económico de um Povo saudável) e para o mal (a parte industrial é deficitária desde há muito)

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