Foi tornado público um manifesto sobre a banca portuguesa (ver noticia aqui, ver documento aqui). A notícia do DN tem como título “Manifesto contra espanholização”, embora o título oficial seja “Reconfiguração da banca em Portugal – Desafios e Linhas Vermelhas”.
Ao contrário do titulo da noticia do DN, o arranque do documento é contra as entidades europeias que tiveram intervenção no caso BANIF, “obrigando” à sua venda ao Santander, e colocando o destaque final na capacidade de Portugal ter um sistema bancário com autonomia, em lugar de uma subordinação dentro do espaço ibérico (a Espanha, obviamente).
A preocupação com o sistema bancário, e com a concentração crescente num pequeno número de entidades bancários, é adequada. O que não é claro é o caminho a seguir para evitar essa concentração por um lado, e a aversão à concentração em mãos accionistas espanholas, por outro lado.
Devemos ter a capacidade de perceber que os accionistas portugueses desapareceram. Não tiveram a capacidade de escolher gestões que gerassem resultados e que permitissem dar salto qualitativo. Tomemos o Banco Santander. Não foi sempre um banco com a dimensão que tem hoje. E não teve problemas em ter nos seus quadros mais importantes portugueses (como terá de outras nacionalidades que se mostrem igualmente competentes no que fazem). Mesmo no caso do Banif, não sabemos o que teria sido o cenário contrafactual de não ter sido vendido ao Banco Santander.
Quando se funciona em economia de mercado, a “nacionalidade” dos accionistas (e dos gestores) deve seguir a capacidade de gestão. E não assumir que a “nacionalidade” por si assegura o bom caminho. Gostava aliás de saber se há evidência sobre a capacidade de selecção de bons projectos para financiamento, nos últimos dez anos, do BES e do SantanderTotta, como exemplos de dois bancos com accionista nacional (no primeiro caso), e accionista espanhol (no segundo caso). Talvez olhando para a carteira de crédito mal parado que o BES legou ao Novo Banco e para a carteira de crédito mal parado do Banco SantanderTotta se possam tirar algumas conclusões (fica para os especialistas do sector bancário darem a informação).
Neste momento, e face à experiência recente da banca em Portugal, é mais importante ter bancos que consigam fazer uma boa selecção dos projectos de investimento que financiam do que olhar à nacionalidade dos accionistas e dos gestores. E se com uma banca que não tenha accionistas de referência de nacionalidade portuguesa houver melhores decisões, toda a economia sairá a ganhar (talvez não seja verdade para os que seriam os “accionistas” de referência nacionais, em condições preferenciais, mas não é algo que valorize).
Tirando o aspecto da “nacionalidade”, a preocupação com a concentração em poucas entidades bancárias a funcionar em Portugal deve estar presente, e se de um ponto de vista de regulação prudencial se compreenda a preferência por alguma consolidação no sector bancário português, então assegurar um grau de concorrência entre instituições bancárias necessite que se procure ter facilidade de entrada no mercado nacional. A ver se a recente entrada do Bankinter, por saída do Barclays Bank, se traduz numa experiência positiva.
(ps: seria interessante recuperar a periodicidade de manifestos sobre centros de decisão, accionistas, etc, nacionais ao longo dos anos, e os resultados dos mesmos)