Continuando nas garantias da coligação PSD + CDS, a quinta garantia é “as reformas na Segurança Social serão feitas por consenso e respeitarão a jurisprudência do Tribunal Constitucional. Lançaremos um novo programa ambicioso de redução da pobreza.”
Nesta garantia, há a mistura de dois aspectos diferentes, segurança social no aspecto pensões e segurança social acções contra a pobreza. Vale a pena tratá-las de forma separada.
A discussão sobre a segurança social no campo das pensões tem aspectos penosos pela opacidade que os argumentos propostos possuem. Tanto do lado da coligação PSD – CDS como do lado do PS isso sucede.
Tentarei ilustrar a minha perplexidade com um exemplo tão simples quanto conseguir. Pensemos numa economia sem comércio, porque simplifica a exposição sem sacrificar nada de essencial da discussão. Esta economia tem apenas dois grupos de agentes económicos – trabalhadores activos e reformados. Os trabalhadores activos têm um rendimento ligado ao seu trabalho actual. Os reformados têm uma pensão cujo valor hoje resulta das contribuições dos trabalhadores activos.
Suponha-se que há 20% de reformados e 80% de trabalhadores activos, e que há 10 milhões de pessoas nesta economia fictícia, distribuída pelos dois grupos.
Esta economia produz globalmente um valor de 100 mil milhões de euros em remunerações. A situação é tão igualitária que todos que trabalham têm igual produtividade. A taxa de contribuição para a segurança social é de 20%. O que perfaz 20 mil milhões de euros para distribuir pelos reformados. Que sendo 2 milhões, faz com que cada reformado receba 10 mil euros ano.
Os trabalhadores ficam com 80 mil milhões de euros, como são 8 milhões, cada um recebe 10 mil euros ano.
O que sucede se o número de pensionistas aumentar para 4 milhões e o número de trabalhadores activos baixar para 6 milhões, mantendo-se uma população total de 10 milhões de pessoas.
O que sucede às pensões nesta economia fictícia? Vejamos algumas possibilidades.
a) se a produção baixar porque há menos trabalhadores activos, então haverá menos para distribuir por todos; mantendo-se a taxa de 20% de contribuições, os pensionistas vão receber menos. Os trabalhadores activos poderão receber mais mesmo com uma redução global da produção (uma vez que a produtividade por trabalhador até pode aumentar).
b) se a produção se mantiver, e taxa de contribuição for igual aos 20% iniciais, então o mesmo volume global arrecadado tem que ser distribuído por mais pensionistas, recebendo cada um menos.
c) se a produção de mantiver e se quiser garantir a mesma pensão de 10 mil euros ano, a taxa de contribuição terá que aumentar, mas passando para 40%, todos, pensionistas e trabalhadores activos, continuam a receber os mesmos 10 mil euros da situação inicial. A única diferença é que o salário líquido não acompanha a produtividade.
d) se a produção global baixar, e o sistema garantir aos pensionistas que vão manter o seu rendimento, a taxa de contribuição tem que aumentar para mais de 40% e trabalhadores activos vão receber menos em termos líquidos face à situação de partida.
A terceira situação mostra que apenas o aumento do número de pensionistas e a redução do número de trabalhadores activos não coloca um problema se houver a mesma produção global e houver uma redistribuição diferente.
Admitindo que no pior cenário a economia portuguesa irá estagnar e não reduzir a sua capacidade produtiva, a questão da sustentabilidade da segurança social é sobretudo uma questão de distribuição.
Gostava de conseguir avaliar as diferentes propostas no quadro desta economia simples e fictícia, para conseguir depois perceber os seus efeitos na economia complexa e real que temos.