mesmo depois de muita discussão, continua a ser apresentado por alguns o “argumento económico” para a instituição da taxa sobre os equipamentos que potencialmente possam servir para gravar para uso privado o que foi adquirido legalmente (e portanto pagou os respectivos direitos de autor).
Tomemos o argumento económico a sério – o que quer dizer exactamente? Pensando em termos do que os economistas chamam “eficiência estática”, como o custo de uma reprodução adicional é zero, em termos eficientes para a sociedade, é eficiente que o “preço” venha a refletir esse custo adicional e portanto devia ser zero. Ok, não é pelos custos de reprodução da cópia privada que deve haver um preço adicional. Vamos então ao argumento de “eficiência dinâmica” – neste argumento, é necessário atribuir maior retribuição aos artistas para que estes mantenham a intenção criativa, dando-lhes o que em economia se designa por “apropriação dos ganhos da sua actividade”. Ou, numa versão mitigada, dar mais ganhos para que criem mais, o que trará benefícios para todos. Ora, aqui surge um problema básico – como há grande heterogeneidade nos artistas (e cada vez mais, para cada um de grande sucesso haverá muitos de pouco sucesso), a criação de uma taxa sobre o “processo” (o meio de guardar a cópia” e não sobre o “resultado” (o valor do que é criado), significa que uma distribuição acrítica dos fundos recolhidos recompensa todos por igual – o que será manifestamente ineficiente do ponto de vista social. Mas como esta taxa para a cópia privada pretende dar o incentivo para a criação, não é claro porque a existir não deva estar incluída no preço da “obra” vendida legalmente (relembre-se, a pirataria continua ilegal). Neste caso, quem mais sucesso tiver também tem mais “incentivo à criação”. De outro modo, resta apenas a situação de “procura de rendas” e por parte de quem vai gerir o sistema, como bem aponta André Azevedo Alves.
Ainda em termos económicos, há a questão crucial de saber qual é o modelo de rentabilidade económica da criação artística. Por exemplo, a principal fonte de rendimento de músicos é a venda de CDs ou a realização de espectáculos? é que se for esta última, a disseminação gratuita das suas obras, com quanto mais cópias melhor, poderá ser mais interessante como forma de depois vir a realizar espectáculos. Se estivermos a falar de filmes poderá ser diferente, mas o aspecto central é que o próprio modelo de negócio e de retribuição da actividade criativa poderá estar a mudar.
Admitamos ainda que se quer esta redistribuição de rendimento ad-hoc e arbitrária. Então devemos discutir qual é a melhor forma de a realizar. E se estamos a falar de pagamentos que são realizados devido ao poder coercivo do Estado, porque não ser este a tratar dessa redistribuição? Assim, esta verba deverá ir para a Secretaria de Estado da Cultura que depois a atribuirá diretamente aos artistas registados para o efeito (registo que pode ser feito numa plataforma informática simples). Talvez mesmo ter um subdirector geral com essa competência atribuída.
Ou caso esta missão seja atribuída a uma entidade externa, então os salários e as despesas praticadas nessa instituição deverão seguir as mesmas regras da administração pública, com equiparação do presidente da instituição a sub-director geral para efeitos de vencimento, e a partir daí estabelecer a cascata de remunerações. Obviamente acompanhando as regras da função pública neste campo. As receitas e despesas deverão ser auditadas regularmente por entidades públicas, tendo o Tribunal de Contas também possibilidade de intervenção.
Ou podemos ainda tentar uma solução de “mercado” – colocar a concurso a gestão deste imposto (mais vale usar o nome correcto), em que as entidades externas interessadas apresentam as suas propostas de custo para essa gestão. (Depois deste impulso criativo, vou-me registar algures, para ter também acesso a qualquer coisita da lei da cópia privada, pois a partir de agora conhecidos e desconhecidos podem copiar este texto para os seus computadores e telemóveis, o que irá limitar a minha criatividade futura).
Ah, falta ainda o argumento da Directiva Europeia obrigar a esta taxa – bom, não obriga a um valor da taxa segundo percebi, pelo que pode ser instituída uma taxa de valor zero.
(nota adicional: indispensável leitura para formar opinião sobre este tema http://jonasnuts.com)
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