Momentos económicos… e não só

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continuando a discussão sobre as entradas em medicina

Num comentário ao post anterior, ” Na Medicina, no entanto, existe um efeito pernicioso do desemprego médico que é a indução da procura de actos médicos fúteis de forma a alvancar os escassos doentes que caberão a cada um. A forte assimetria de informação e a relação de agência neste sector tornam este um perigo real. Esta situação já acontece nos dias de hoje nos seguros de saúde, sobretudo os públicos como a ADSE, que por remunerarem de forma baixa os actos básicos, como a consulta, incentivam o consumo de actos de diagnóstico (que geram novas consultas) e terapêutica (nomeadamente cirúrgica). ”

Por já ter surgido noutras ocasiões, e pela sofisticação que envolve, este argumento merece uma discussão separada.

O argumento da indução da procura foi usado não nesta sessão, mas numa outra, e tenho algumas dúvidas sobre a sua pertinência real, e compatibilidade lógica com outros dos argumentos – se o problema é evitar desemprego médico, então não vejo porque os médicos empregados irão “induzir” mais procura apenas por haver médicos desempregados.

A indução da procura pode surgir se com mais médicos, todos repartirem de alguma forma a sua presença no sector, e nesse caso face à diminuição do rendimento individual poderão realizar mais indução de procura dos seus serviços – mas este argumento assenta sobretudo num exercício de medicina privada em que o segurador/pagador não exerce qualquer papel activo. Ora, nos seguros actuais, um médico induzir mais procura só tem qualquer efeito se o doente não tiver esgotado os plafonds de utilização (admitindo que acima do plafond, o próprio doente reage a essa indução) e se as seguradoras não fizerem revisão de utilização.

A nossa experiência actual, segundo a informação que vai saindo, é a de esmagamento de preços por parte das seguradoras, e se entretanto a utilização encostar aos plafonds, não será por haver mais médicos que haverá depois mais despesa neste campo.

De qualquer modo, uma análise que merece ser feita é ver se face à redução de preços de consultas (por exemplo) imposta por seguradoras se verifica uma indução de procura significativa, ou não.

Efeito diferente é pelo facto de haver mais médicos, haver uma maior capacidade de quem contrata a sua actividade conseguir impor preços cada vez mais baixos, e para remunerações muito baixas o desempenho médico baixar correspondentemente – falta de qualidade no acto médico. A resposta a esta questão está na chamada teoria de “efficiency wages”, que me parece poder ser aqui facilmente adaptada – o salário ajusta-se de forma a reflectir este aspecto, e a consequência é que existirá desemprego médico, precisamente para não fazer baixar mais os salários para não eliminar o incentivo ao bom desempenho profissional. Dá-me por isso a sensação de que não será um efeito quantitativamente importante (mas reservo a opinião final para depois de um tratamento “formalizado” da questão).

No sector público, não vejo qual o mecanismo que fará que com a existência de mais médicos se dê início a um processo de indução de procura.


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entradas em medicina

estive ontem numa sessão organizada pela associação dos estudantes da faculdade de medicina da universidade de Lisboa, e se os oradores falaram sobretudo sobre a relação médico doente, a discussão que mais envolveu os alunos foi sobre as admissões e o numerus clausus, que segundo a generalidade dos presentes, incluindo director da faculdade e bastonário da ordem dos médicos, deveria ser reduzido, tendo surgido como principais argumentos:

a) garantir emprego aos novos médicos

b) assegurar a qualidade formativa

c) evitar o desperdício de custos de formação envolvidos na presença de médicos que não encontrem emprego (é ligeiramente distinto do a) )

Pessoalmente, destes três argumentos apenas o b) poderá, a meu ver, justificar restrições de admissão numa escola de medicina, mas não necessariamente a nível global: as faculdades de medicina podem aumentar a sua dimensão, podem-se abrir mais faculdades –  mas estas duas últimas possibilidades também não eram do agrado da plateia.

Não sei se fique surpreso ou preocupado, ou se é simplesmente diferenças na formação, ou diferenças de visão que se reflectem nas escolhas dos cursos.

Mas é um tema suficientemente importante para voltar a ele em breve.