Momentos económicos… e não só

About economics in general, health economics most of the time


14 comentários

BES passa a Novo Banco + BES – e depois?

Da leitura da resolução do banco de portugal, disponível aqui,  pontos chave

da motivação para a intervenção:

a) resultados negativos piores do que esperado

b) desobediência das determinações do Banco de Portugal pela anterior gestão

c) incapacidade de obter fundos privados necessários face à incerteza sobre os “buracos” que ainda possam existir

d) ameaça à estabilidade do sistema financeiro: “Dada a relevância da instituição no conjunto do sistema bancário e no financiamento da economia, estes problemas punham em causa a estabilidade do sistema de pagamentos e do sistema financeiro nacional”.

comentário/perguntas: qual a importância relativa de cada aspecto? a alínea c) significa a incapacidade de fazer aumento de capital, ou incapacidade imediata de obter financiamento no mercado interbancário? a alínea b) não deverá ter consequências criminais? os actos praticados em desobediência são integralmente válidas? qual o papel dos outros accionistas do banco? (afinal o grupo Espirito Santo controla(va) apenas uma parte do capital)

da solução

a) preservam-se os clientes e os trabalhadores – “Nada muda para os clientes. Os clientes podem realizar todas as operações como habitualmente e sem perturbações. O conteúdo das relações contratuais com os clientes permanece inalterado. Os balcões do Novo Banco, que manterão para já a marca e o logotipo do BES, e os serviços de banca telefónica e de homebanking continuarão a funcionar regularmente. Todos os colaboradores do BES passam a ser colaboradores do Novo Banco, com salvaguarda dos seus direitos.”

Ou seja quem tem depósitos continua a tê-los e a poder movimentar as suas contas; quem tem créditos à habitação continuará a ter que pagar as prestações, e por ai fora.

Os trabalhadores, de momento, não sofrem alteração na sua situação. Esta será provavelmente uma fase de transição para eles.

b) o contribuinte não vai ter que contribuir: “esta operação não envolve custos para o erário público.”

c) os accionistas suportarão as perdas: “as perdas relacionadas com os ativos problemáticos serão suportadas pelos acionistas e credores subordinados do Banco Espírito Santo, S.A.” e os activos problemáticos “correspondem a responsabilidades de outras entidades do Grupo Espírito Santo e às participações no Banco Espírito Santo Angola, S.A., por cujas perdas respondem os acionistas e os credores subordinados do Banco Espírito Santo, S.A.”

d) de onde vem o dinheiro? do fundo de resolução! quem financia o fundo de resolução? “Os recursos do Fundo de Resolução são provenientes do pagamento das contribuições devidas pelas instituições participantes no Fundo e da contribuição sobre o setor bancário, que, de acordo com o normativo aplicável, são cobradas sem pôr em causa os rácios de solvabilidade.” Sobre o fundo de resolução, ver aqui para mais detalhes. Mas o fundo de resolução tem cerca de 380 milhões de euros, são precisos 4 900 milhões de euros – os outros bancos irão contribuir até 500 milhões e o estado com 4 400 milhões de euros. O fundo de resolução pede um empréstimo ao estado: “Fundo contraiu um empréstimo junto do Estado Português. O empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução será temporário e substituível por empréstimos de instituições de crédito.” Afinal  o erário público poderá vir a ter custos? se o pagamento de juros pelo empréstimo pelo banco ao fundo e por este ao estado for superior aos juros da dívida pública, então o erário público poderá até beneficiar. Mas essa informação sobre as taxas de juro não está disponível.

 

O que fica ainda por saber:

a) quem vão ser os accionistas do Novo Banco e como vão ser determinados? (será uma venda do Novo Banco tão rápida quanto possível?)

b) quem vai gerir o BES que fica, com que mandato e durante quanto tempo? (vão os accionistas actuais ter capacidade de decisão sobre isso? não deveria ser eles a encontrar a solução? o “risco sistémico” supostamente estará associado com o NovoBanco, por isso qual o risco para o sistema financeiro de este BES emagrecido ser gerido pelos accionistas? – é que se não desapareceu o riso sistémico, porquê ter esta solução; se desapareceu, porque não serem agora os accionistas privados a tomar conta e encontrar uma solução?)

c) em que é que esta solução é diferente de uma falência do banco (e é)? rápida passagem dos activos e passivos produtivos para outra entidade para não ser perder o tempo das batalhas jurídicas de falência + accionistas a perderem todo e qualquer direito sobre a actividade com valor realizada pelo BES?

d) se for vendido o Novo Banco, qual o destino da respectiva receita? (pagar o empréstimo ao estado português?!)

e) quais os horizontes temporais dos próximos passos?

f) com esta solução evitou-se uma “corrida” ao BES, mas conseguiu-se mesmo devolver a confiança aos clientes? da resposta a esta pergunta dependerá o valor do que vier a seguir – se a confiança estiver perdida, a venda e integração noutra entidade bancária será a solução que resta, e mais vale adoptá-la rapidamente do que ter o estado a colocar dinheiro sucessivamente para no final ser essa de qualquer modo a solução.

g) e os accionistas que acorreram ao aumento de capital há pouco tempo? não se sentirão enganados? terão base legal para alguma acção e contra quem?

 

Tentações a evitar:

a) não vender pelo melhor preço tão rápido quanto possível

b) o Banco de Portugal fazer a gestão do Novo Banco de forma permanente, ainda que indirectamente

 

Por fim, dizer que não custa nada ao erário público só será possível se o empréstimo ao Novo Banco (e apenas este deve ser incluído) for reembolsado e pagar juros acima dos da dívida pública.


17 comentários

BES e economia de mercado

Estando de férias, tenho procurado não estar actualizado quanto ao caso BES. Mas acaba por ser impossível, pelas notícias que vão surgindo e pelas perguntas e anseios que se encontram um pouco por todo lado (amigos, familiares, desconhecidos na bomba de gasolina,…).

Diversos comentários têm incidido sobre o que significa o caso BES para a “superioridade” da gestão privada versus a gestão pública; ou em versões mais suaves sobre a relevância para a sustentar a privatização ou não da Caixa Geral de Depósitos.

Como ponto de partida, a gestão privada sempre fez erros; aliás, todos os dias há empresas que fecham por erros de decisão dos seus gestores. São é pequenas demais para chamar a atenção. Tal como muitas vezes o que se chama de sucesso de gestão privada é acaso da sorte. O que faz diferente o caso do BES é a dimensão do grupo, e a série de decisões (fraudes?) que foram tomadas.

Interessa-me aqui discutir não o que correu mal no grupo ou na supervisão (fica para os próximos dias), e sim como encaixar este caso no funcionamento de economia de mercado.

Sabendo-se que todos os dias há gestores e donos de empresas que cometem erros na condução dos seus negócios, como é que o funcionamento de uma economia de mercado os resolve? bom, deixa que essas empresas desapareçam do mercado; por vezes, tão rapidamente como surgiram. Outras  vezes desaparecem porque não acompanharam os anseios e desejos dos consumidores. A Maconde desapareceu, mas a Zara floresceu.

No caso do BES e do grupo Espirito Santo, o que sucede neste momento é poder haver receio (?) de que seja grande demais para desaparecer. Esse sentimento, de ser grande demais, elimina o “medo de desaparecer” como disciplina para a boa gestão. Aliás, não ter o “medo de desaparecer” é o que faz a gestão pública ter também problemas em muitas decisões. “Desaparecer” significa, no contexto de economia de mercado, que os donos – accionistas no caso de sociedades anónimas – tenham que suportar os custos das más decisões tomadas pelos gestores das empresas (que podem ser eles próprios, ou contratados), sem que isso signifique que as actividades realizadas deixem de ser feitas, ou que os activos produtivos (físicos, humanos e organizacionais) tenham que ser destruídos. A falência do grupo Espirito Santo não constitui uma prova de falhanço da gestão privada face à gestão pública, mas a forma como essa falência é tratada constitui um teste ao funcionamento de uma economia de mercado como a portuguesa.

Aplicando estes princípios ao caso BES e grupo Espírito Santo, a solução de economia de mercado é claramente a falência do grupo, com perdas a serem suportadas pelos accionistas, e com a rápida venda de todos os activos produtivos. Significa que a marca BES pode desaparecer? sim, claro. Basta que outro banco ou entidade compre o banco e lhe mude a designação (por integração  noutra estrutura já existente ou por redenominação). O mesmo sucederá com outras empresas do grupo (empresas que vão do turismo à saúde), sem que isso implique o encerramento dessas empresas. São claramente oportunidades de crescimento por aquisição  (e que vão igualmente exigir atenção da Autoridade da Concorrência, mas isso é num momento mais à frente, para evitar eventual aumento de concentração e poder de mercado).  Os clientes destas empresas do universo Espirito Santo não necessitam de ser afectados de forma substancial, desde que todo o processo seja célere, e não se procure formas artificiais de manter o grupo e o BES como estavam.

Centrando no banco, significa que o mesmo deverá ou receber novos accionistas (ou reforço dos actuais, o que não parece verosímil nesta altura)  ou ser vendido tão rápido quanto possível. Deve-se evitar a nacionalização (ou a sua compra pela Caixa Geral de Depósitos, não vá alguém ainda lembrar-se disso). Conseguir fazê-lo sem qualquer implicação para os contribuintes seria um sinal de maioridade da economia portuguesa e dos seus mecanismos de funcionamento enquanto economia de mercado.

Qualquer que seja a solução encontrada para o BES, será quase inevitável que venham a surgir alterações na forma como o banco se encontra organizado, e o encerramento de balcões e mudanças internas, incluindo saídas de pessoal, virá a estar no horizonte. E daí virá alguma pressão social, que terá de ser antecipada e minorados os custos de transição para as pessoas afectadas (mas não através de sustentação artificial de postos de trabalho).

As notícias que têm saído sobre o que são as intenções das autoridades económicas apontam no sentido de ser o normal funcionamento da economia a resolver esta situação. A penalização dos accionistas deverá ser clara. A manutenção produtiva dos activos do banco deverá ser assegurada, mesmo com mudança de accionistas. É bom que assim seja, pois de outro modo todos os grandes grupos económicos portugueses (e bancos) podem começar a sentir que também são demasiado grandes para falirem…

(actualizado a 3 de Agosto 2014)

Para discussão nos próximos dias: BES e regulação, BES e grupos familiares,… (sobretudo se continuar um Verão frio e ventoso)


5 comentários

juntar a REFER e as Estradas de Portugal?

de declarações oficiais transcritas nos media “a integração tendente à fusão das suas gestoras de infraestruturas de transporte ferroviário e rodoviário criando uma entidade que resulte da junção destas duas” e “procuraremos que as sinergias de natureza operacional que possam ser materializadas que o sejam o mais rapidamente possível”, fica alguma perplexidade, resultante provavelmente da minha completa ignorância das “tecnologias” em causa.

Quando se fala aqui em sinergias, gostava realmente de perceber do que se trata, se é de sinergias verdadeiras através do “processo produtivo” dos serviços prestados, ou se é “sinergias” por exercício de poder de mercado decorrente de ter duas infra-estruturas eventualmente concorrentes em alguns serviços nas mesmas mãos. É que se o primeiro tipo de sinergias permite reduzir custos e baixar preços ao consumidor final, o segundo tipo de sinergias permite aumentar preços ao consumidor final por redução das alternativas e concertarão de estratégias de preços. Logo, se em ambos os casos a noção de “sinergias” permite à empresa resultante da integração melhorar os seus proveitos, a forma como o faz não é indiferente para o consumidor final dos serviços que são prestados.

Em termos custos de produção, não é muito claro quais as sinergias de construção e manutenção que possam existir entre estradas e linhas de caminho de ferro. Não estou a ver que as matérias primas sejam as mesmas, ou que os equipamentos usados possam ser facilmente transferíveis de um tipo de obra para outro. Talvez a concepção e engenharia possam ser partilhadas (espero que algum engenheiro me esclareça se há aqui especificidades de cada área).

Parece-me ficar então sobretudo efeito do lado dos proveitos, sinergias que noutras áreas são chamadas de “poder de mercado”.

Da concessão das Estradas de Portugal, “Receitas -A concessionária tem direito a receber: a) O valor das taxas de portagem cobradas nas vias portajadas; (…)” (ver aqui), pelo que a coordenação de tarifas na infra-estrutura ferroviária (que ditarão indirectamente os preços ferroviários) e das portagens das auto-estradas é na verdade uma redução na concorrência entre modos alternativos de deslocação e transporte.

Até conseguir mais informação para perceber os diversos contornos da proposta, à primeira vista parece uma contradição com o princípio que a concorrência entre empresas é a forma de favorecer o consumidor final e promover novos produtos e alternativas. Enfim…

 

Nota: este comentário poderá ser revisto se houver informação que permita concluir que afinal há fortes sinergias do lado dos custos.


3 comentários

o sucesso das exportações, é mesmo assim?

Nas últimas semanas, o crescimento das exportações foi tomado como “o” sinal de sucesso das políticas dos últimos anos, e o relatório do FMI a aconselhar cautelas caiu como um balde de água fria. Face à troca de informação (e de desinformação), nada melhor do que ir ver o que os números dizem sobre a evolução recente – numa perspectiva agregada neste momento, deixando para mais tarde uma desagregação de sectores, e de crescimento consoante o valor acrescentado de cada sector.  De qualquer modo, é sempre melhor ter este crescimento das exportações do que não tê-lo. Não estará aí a divergência. Sobre o que significa sobre a saúde da economia portuguesa é que podemos ter diferentes interpretações. O meu objectivo é deixar que cada leitor forme a sua opinião sobre o sucesso/insucesso que está contido nos números das exportações.

A primeira figura mostra a evolução das exportações nos últimos anos, conforme publicado nos boletins periódicos do INE, e construindo duas linhas adicionais – uma contendo uma tendência dos últimos dez anos, incluindo a quebra verificada em 2009 (linha roxa); a segunda linha adicional é uma tendência baseada apenas nos valores até 2008 – antes da queda de 2009, e procura ver o que teria sido o crescimento das exportações na ausência dessa queda em 2009 (linha vermelha).

Estas três linhas permitem estabelecer:

a) que o crescimento dos últimos anos constitui uma recuperação face à queda grande de 2009;

b) que comparando ao longo de todo o período, e com o peso da queda, o valor dos últimos anos tem uma aceleração face a esse ponto de comparação de todo o período;

c) que se não tivesse ocorrido a queda em 2009, e tivesse permanecido a mesma tendência que se verificou de 2004 a 2008, então a recuperação ocorrida até agora ainda não terá atingido o que seria o resultado dessa evolução.

Screen Shot 2014-02-23 at 12.52.48

 

Ou seja, grande parte do crescimento recente das exportações foi recuperação face a uma queda muito grande em 2009.

É um sucesso importante, mas não ao ponto de podermos falar de milagre.

Claro que pode sempre haver a dúvida sobre qual a série exacta a utilizar, e na verdade entre diversas fontes, encontramos diferentes séries, que estão mais ou menos actualizadas, incluem mais ou menos bens e serviços. A figura 2 mostra a evolução das exportações segundo diferentes fontes, numa delas incluindo bens e serviços, com a característica de terem sido transformadas em número índice – isto é, para todas as séries, o ano de 2004 tem valor 1, pelo o que a figura regista é a evolução relativa face ao ano de 2004. Todas as séries passam forçosamente pelo ponto 1 no ano de 2004. E qualquer que seja a versão usada, tem-se uma imagem que é globalmente similar – o ano de 2009 foi um ano de queda, e os anos seguintes foram de recuperação, mas não de uma superação clara do que teria sido a continuação da tendência do período anterior a 2009.

 

Screen Shot 2014-02-23 at 13.08.46Podemos e devemos estar satisfeitos com a recuperação? sim;

podemos e devemos ficar descansados com essa recuperação, pois está garantido que as exportações serão o motor de crescimento? não, é cedo para poder ficar descansado.

Mas cada um faça o seu julgamento.

 


8 comentários

termina 2013, inicia-se 2014, Bom Ano Novo a todos

O fim do ano é sempre fértil em balanços do ano que acaba e previsões para o que se inicia. Sobre 2013 e para 2014, é complicado ser original na avaliação do que passou e na antevisão do que será a economia portuguesa. E há também os desejos que possamos ter.

O ano de 2013, no final, acabou por ser menos penalizador do que poderia ter sido. Não foi um ano fácil para a população portuguesa. Apesar disso, o emprego cresceu ligeiramente nos últimos seis meses, o que é um sinal positivo, e o consumo decresceu menos do que tinha sucedido um ano antes. Mas ainda se esteve longe de ultrapassar os problemas. Foi ainda um ano marcado pela acção do Tribunal Constitucional, que ainda assim não motivou uma discussão mais séria das opções disponíveis. Apesar de várias reflexões e propostas, de diferentes origens, a capacidade da sociedade e dos partidos políticos reflectirem e realmente argumentarem de forma sustentada sobre essas ideias esteve muito aquém do que é necessário e desejável.

Para 2014, as atenções estão todas focadas no final do programa de ajustamento, e na evolução das contas públicas e necessidade, ou não, de programa adicional, ou de rede de segurança (o dito programa cautelar). Como país, será quase inevitável que haja uma obsessão com o final formal do programa de ajustamento. O “quase” resulta de haver um campeonato do mundo de futebol no início do Verão que irá captar o interesse geral durante umas semanas.

A respeito dos desejos para 2014, um primeiro desejo referente ao ambiente político – que não se repita a crise do final da Primavera de 2013, que deitou fora, em imagem para o exterior, a reputação de estabilidade governativa. O segundo desejo, no campo da economia, é que a procura de produtividade seja um objectivo genérico na sociedade portuguesa, nas empresas e na administração pública, nas instituições públicas e nas instituições privadas com e sem fins lucrativos. O bom comportamento das exportações, forçado pela necessidade de sobrevivência de empresas que antes se centravam no mercado doméstico, terá limites se não houver aumentos de produtividade. A consolidação das contas públicas terá ficado aquém do que é preciso, no final do programa de ajustamento, se não motivar também um melhor funcionamento do Estado (e a reforma do Estado parece ter ficado “morta” num guião imediatamente votado ao esquecimento). Vai-se falar em competitividade e até no novo banco de fomento, mas se não houver aumentos de produtividade, seja por se desenvolverem com maior vigor  actividades mais produtivas seja por se realmente aumentar a produtividade no que é feito, pouco adiantará.

A noção de que todos os problemas de produção em Portugal se resume à falta de acesso a financiamento por parte das PME é até certo ponto perigosa. Poderá haver essas dificuldades, não contesto, mas resolver essa restrição não deve ser feito à custa da qualidade e da rentabilidade que os projectos financiados devem ter. O desafio da produtividade será pelo menos tão crucial para o futuro como o desafio político de estabilidade. A forma de responder ao primeiro destes dois desafios é porém muito menos clara, e sobretudo não será compatível com “planeamento central”, mesmo que que “gerido” com um banco de fomento.

2014 terá que ser um ano onde além da macroeconomia (temas como défice público, dívida pública, desemprego) se volte a dar atenção à microeconomia (produtividade, incentivos a investir em projectos com rentabilidade privada e social, distorções de funcionamento da economia que acarretem menor crescimento).

Objectivo de produtividade deste blog, atingir os mil posts no final de 2014 (actualmente: 749 contando com este)!

Ah, e já me esquecia da previsão favorita dos últimos anos, sobre o destino do euro: não será em 2014 que o euro se desintegra ou que Portugal sai do euro.

EUROrotated2


Deixe um comentário

“Portugal já saiu da recessão e apresenta o maior crescimento de toda a UE”

Esta afirmação é poderosa e perigosa. No momento actual da economia portuguesa é de esperar que realmente se tenha começado a alterar a situação. A queda na actividade económica nos últimos dois anos foi importante. A ter fundamento, a viragem de ciclo económico tem que ser “acarinhada” na sua evolução, sem descuidar a consolidação orçamental, que poderá ser feita com maior facilidade se ocorrer uma recuperação económica. A questão é que sinais existem dessa recuperação.

Por curiosidade, fui procurar dois indicadores – número de empregados (mais relevante nesta altura que a taxa de desemprego, que depende de factores como emigração, decisão de não trabalhar, etc…) e taxa de capacidade utilizada da indústria transformadora (em que maior valor significa que as empresas estarão a aumentar a sua produção). Ambos (ver gráficos abaixo) indiciam uma possível mudança de tendência. Talvez ainda seja cedo para um anúncio tão peremptório como o realizado, mas não deixam de ser boas notícias.

Do lado das preocupações, o constante aumento da dívida pública (gráfico abaixo), e a evolução da produtividade (sem ela, a recuperação económica não será duradoura).

(nota: todos os gráficos elaborados com base em informação do site conheceracrise.com)

Screen Shot 2013-10-01 at 22.25.19

Screen Shot 2013-10-01 at 22.28.01

Screen Shot 2013-10-01 at 22.41.16


Deixe um comentário

e o que pode resultar dos resultados das autárquicas?

ao contrário do que se possa pensar do título, não estou a pensar em leituras políticas a nível nacional, ou a nível local sequer, ou em política.

A questão mais interessante, do ponto de vista económico, e ligando à reforma do estado, é outra. Com as eleições realizadas, e com o decréscimo do número de câmaras municipais nas mãos dos partidos da coligação governamental, será que se conseguirá desbloquear uma verdadeira reforma da administração local. A união de freguesias foi uma resposta tímida ao desafio do Memorando de Entendimento de obter uma administração local mais eficiente. Dizer que se reformou a organização administrativa do país com essa união de freguesias não é razoável.

Mas com esta mudança no mapa autárquico, a resistência informal (via pressão interna dos partidos) será substituída por pressão pública, o que tornará mais claros os argumentos a serem usados nalguma tentativa de reforma.

Um segundo aspecto de interesse dos resultados é o aumento de casos em que cidadãos agrupados de forma não partidária ganham a presidência de câmaras municipais. Uma vez que existe literatura a demonstrar o efeito dos ciclos eleitorais na despesa pública feita pelas autarquias (ver aqui os diversos trabalhos de Linda Veiga e associados, Universidade do Minho), será interessante seguir se o comportamento destes novos eleitos irá seguir o padrão habitual e associado a presidentes eleitos em listas de partidos ou não.

 


Deixe um comentário

recuperação de empresas

Tem vindo a ser reconhecido que o programa revitalizar tem problemas. É salutar reconhecer que algo não está bem como primeiro passo para resolver. Resta agora concordar no que não está bem. Aparentemente o principal problema está na capacidade de decisão rápida. Ajudar empresas em dificuldades significa um julgamento de valor sobre a empresa e a sua gestão, e o potencial futuro. Como é fácil haver divergência resultam recursos e impugnações de decisões, que vão contra a necessidade de decisão rápida. A vantagem de decisões rápidas é evitar-se a “corrosão” da empresa, seja no seu capital físico (equipamentos) seja no seu capital humano. Frequentemente, mais do que revitalizar a empresa importa fazer com que os seus activos físicos, humanos e imateriais (a cultura da empresa, por exemplo) sejam utilizados de forma produtiva o mais rapidamente possível. Seja na mesma área de actividade ou transferidos para outra.

Assim, o ponto de partida de um programa de apoio à estrutura produtiva da economia (e não programa de apoio a donos de empresas e sua gestão) deveria ser venda tão rápido quanto possível da empresa, incluindo a possibilidade de compra pela equipa de gestão quando diferente dos proprietários da empresa ou pelos trabalhadores. O estabelecimento de programas de recuperação da empresas deveria ser encarado como a excepção. Vender rapidamente a empresa faz com quem compre tenha que possuir um “plano de recuperação” próprio e alinhado com o interesse do novo dono. Vender rapidamente garante também a “disciplina” de mercado sobre os donos/gestores das empresas, que deixarão de poder contar com o dinheiro público ou com renegociações prolongadas como forma de sustentar as suas acções.

Vender rapidamente estimula também o aparecimento de novos empresários, ou a entrada em novas áreas de negócio, e pára uma certa tradição nacional de alguns em deixarem falir as suas empresas e às escondidas levarem as máquinas e equipamentos para novas empresas onde irão repetir o processo.

Um dos pilares de intervenção pública deveria ser o de agilizar o mercado de empresas / activos produtivos que estejam em dificuldades e não sustentar a sua sobrevivência em vida artificial, que frequentemente não é mais do que uma lenta agonia (com o mesmo resultado final produzido apenas mais tarde). Tem também a vantagem de quem falhar numa empresa poder tentar noutra o sucesso, mas ter que demonstrar capacidade em o fazer.


11 comentários

e agora?

com a saída de V Gaspar e de P Portas momento de entrar em pânico sobre o que se vai passar a seguir? Se a ideia era agora criar condições para haver confiança para investir, esta parece ser a melhor forma de impedir que tal suceda. Estas mudanças desta forma não auguram nada de bom para a economia.

É o momento dos adivinhos…venham os palpites…


3 comentários

o relatório da OCDE (4)

O primeiro capítulo do relatório da OCDE tem como tema a produtividade e as reformas estruturais.

As primeiras linhas apresentam a visão da OCDE do que é preciso para conseguir aumentar o crescimento da produtividade em todos os sectores da economia: criar um ambiente para o funcionamento das empresas que leve a investimento, inovação e criação de emprego, com investimento em capital humano. Até aqui não há propriamente uma ideia nova. Sendo esta uma afirmação geral, os problemas surgem quando criar esse ambiente choca com outros interesses e objectivos, particulares ou públicos. O problema não está normalmente em objectivos genéricos, está depois no estabelecer de prioridades e de como gerir objectivos que não são mutuamente compatíveis embora cada um por si seja desejado.

De seguida, vem logo um exemplo dessas tensões. O relatório da OCDE expressa a opinião de ser necessário ter crescimento salarial ajustado ao crescimento da produtividade do trabalho e reduzir a tributação sobre o trabalho (o que implica aumentar a tributação nalgum outro ponto do sistema, caso não haja capacidade de reduzir impostos e manter o equilíbrio das contas públicas, como é actualmente a situação).

A moderação salarial, no sentido de acompanhar o crescimento da produtividade, é a forma de manter o equilíbrio dentro da economia, sendo que sectores com maior crescimento da produtividade tenderão ainda assim a ter crescimento salarial ligeiramente inferior ao da produtividade, e sectores com baixo crescimento da produtividade tenderão a ter salários a crescer mais rapidamente que a sua produtividade. Isto sucede quando os trabalhadores se podem movimentar de uns sectores para outros, como forma de resposta a diferentes aumentos salariais por sector. Assim, esta moderação salarial deverá ser vista no conjunto da economia, e não se poderá alinhar por aumentos salariais em todos os sectores que sejam similares aos aumentos nas áreas onde ocorre maior crescimento da produtividade. Daí que seja perigoso estabelecer aqui regras absolutas que sejam vertidas em acordos de concertação social, mas acompanhamento da evolução salarial, por sector, e sua compatibilidade com o crescimento da produtividade deverá estar presente como forma de aferir a evolução da economia portuguesa.

 

A OCDE apresenta ainda nesta parte inicial uma visão clara para o desenvolvimento da economia portuguesa – desenvolver não só o sector industrial, como ter um sector de serviços “vibrante” que apoie a competitividade das empresas portuguesas – ou seja, colocar o sector de serviços ao serviço da capacidade exportadora das empresas portuguesas. O que implica que o sector dos serviços tem que se inserir mais nas cadeias de valor internacionais – produzir mais bens e serviços intermédios, em Portugal e no exterior. O desempenho das grandes empresas de serviços tem que passar a ser avaliado também em termos de capacidade de ter bons serviços que atraiam outras empresas a estabelecerem-se em Portugal. Nos últimos dias, recordo-me de ter visto em vários jornais económicos notícias sobre outsourcing e grandes empresas. Normalmente, mais sobre como essas empresas recorrem a serviços externos. Mais interessante será perceber como essas mesmas empresas podem servir outras empresas (eventualmente maiores do que elas noutros países, servir as PMEs em Portugal). Um exemplo será o anúncio da Cloudpt, serviço da Portugal Telecom. Recordo-me de ter visto grande publicidade sobre ele, não me ficou na memória o comunicar a importância que o serviço pode ter para as empresas exportadoras (pode ter?). Até é possível que lá estivesse referido, mas não ficou na memória (talvez por eu não ter uma empresa exportadoras…). Mas é esse tipo de serviços que poderá vir a dar espaço para este papel de desenvolvimento da actividade económica. Exemplos similares devem ser procurados para as outras grandes empresas portuguesas: que fazem a GALP e a EDP em termos de serviços prestados que ajudem as empresas exportadoras portuguesas? Em termos de negócio rentável para ambas as partes e não em parcerias que tenham como objectivo ir buscar fundos comunitários.