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Sustentabilidade financeira nos sistemas de saúde (8)

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Continuando com a análise do documento da OCDE sobre sustentabilidade financeira dos sistemas de saúde, capitulo 2 de J White, sobre os desafios de orçamentação de programas de cuidados de saúde.

É referido que se a qualidade dos sistemas de saúde melhorou substancialmente, tal não ajuda em termos de orçamento, pois o problema passa a ser redefinido como resistir ou pagar por essa “qualidade”, em lugar de combater a ineficiência. Ora aqui há que saber se “qualidade” significa apenas tecnologia, que tem levado a maior despesa, ou se “qualidade” pode significar “fazer bem à primeira”, no que seria uma redução do desperdício e ineficiência, reduzindo a despesa (que é o sentido de “qualidade” que é explorado no Relatório Gulbenkian de 2014 sobre o sistema de saúde português).

De uma forma mais geral, este capitulo defende a necessidade de prestar mais atenção do que é definido como “necessidade” de cuidados de saúde, sendo cada vez mais medicalizados pequenos desvios: falta de atenção das crianças na escola é hiperactividade e medicada; tristeza é depressão e medicada; etc.

A questão central, embora não colocada dessa forma, acaba por ser definir-se como “necessidade de saúde” e logo sujeito a protecção financeira que retira a sensibilidade ao preço, criando procura a preços potencialmente elevados, a tudo o que possa ser fornecido aos cidadãos. Ou seja, temos uma versão das questões de indução de procura por parte dos prestadores de cuidados de saúde. Sendo aliás mais fácil “induzir” a necessidade no campo da saúde do que no campo da educação ou da defesa nacional (exemplos de J White).

Resulta daqui que as necessidades orçamentais acrescidas resultam não de factores totalmente inelutáveis mas de decisões que explicitamente ou por omissão são tomadas quanto à cobertura (o que são as necessidades apercebidas em cada momento) e quanto aos preços/custos de novas “tecnologias” (entendidas de forma ampla).

White tem também a visão de que os esforços para ligar o orçamento do desempenho (budget for performance) apresenta diversas limitações:

  • dificuldade de medir o que é desempenho (necessário medir antes, depois e eliminar a influência de outros factores)
  • indicadores simples tipicamente vão apanhar muitas influências
  • comparações entre o valor de diferentes intervenções não são fáceis, dado que umas podem ser mais importantes para uns e outras para outros
  • o nível de desempenho não dá informação sobre a adequação do financiamento – se o mau desempenho for devido a falta de fundos, então é necessário mais fundos; mas adoptar esse princípio como regra significaria que se estava a estimular mau desempenho como forma de obter mais fundos;

Em termos de formas de determinação da despesa pública em cuidados de saúde, White distingue duas formas fundamentais: por departamentos ou áreas – em que é atribuído um orçamento à entidade; e por programas em que a despesa depende das regras de pagamento e da procura desses serviços (e como tal não há uma determinação exacta do montante a ser gasto à partida). Ambas as opções têm vantagens e desvantagens a ser consideradas, em termos das intervenções que podem ser usadas.

A atribuição de orçamentos exerce maior controle sobre a despesa, mas resulta mais facilmente em subfinanciamento e subprovisão dos serviços relevantes. A utilização de pagamento por serviços prestados torna mais fácil utilizar prestadores privados como forma de tentar conseguir mais eficiência. Mas também gera o problema de como lidar com a incerteza quanto ao que possa surgir ou possa ser necessário. A escolha entre prestadores públicos e privados tem também associada uma escolha entre instrumentos para lidar com factores incertos.

Interessante é a forma como avalia a transposição de um conjunto de ideias que têm sido defendidas conceptualmente mas cujos efeitos ainda não se encontram demonstrados: “In the theory of managed competition, informed patients would recognise skimpy performance, risk adjustment would eliminate incentives to avoid sicker patients and market forces would prevent organisational shirking; but this has yet to be demonstrated in practice.” Não há por isso regras absolutas no desenho institucional que se tenha a certeza que produza os resultados desejados de menor despesa em cuidados de saúde para melhores cuidados de saúde, obrigando em cada caso a uma avaliação cuidada de todas as situações.

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

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