Ontem, na Fundação Calouste Gulbenkian, cheia como raras vezes terá sucedido, Joseph Stiglitz trouxe a sua visão sobre o crescimento das desigualdades económicas, suas origens e as implicações que daí retira. A análise estatística incidiu sobretudo sobre os Estados Unidos.
Pontos chave da apresentação:
- a desigualdade na riqueza é maior que a desigualdade nos rendimentos
- a desigualdade que tinha permanecido constante no pós-segunda guerra mundial cresceu significativamente nos últimos 30/40 anos
- neste período de crescimento da desigualdade o crescimento dos salários foi inferior ao crescimento da produtividade
- o crescimento da desigualdade não é decorrente de crescimento diferencial das empresas, pois a desigualdade entre o topo da gestão e os trabalhadores comuns dentro das empresas aumentou muito significativamente
- não é o mecanismo de acumulação de riqueza apontado por Piketty que está a gerar esta desigualdade (o efeito desse mecanismo é pequeno comparado com o crescimento observado da desigualdade).
Para Stiglitz, a principal razão para o crescimento da desigualdade está nas políticas adoptadas, a nível macroeconómico – a austeridade – e a nível macroeconômico – a regulação e definição de regras de funcionamento para a economia.
Em consequência, a resposta aos problemas da desigualdade terá que passar sobretudo por decisões políticas, micro e macroeconômicas. Sem abandonar a lógica de funcionamento de uma economia de mercado, a proposta de Stiglitz, que está exposta no seu último livro, é a de olhar para as regras de funcionamento das economias, a forma como estruturamos os mercados. A este respeito, teve uma posição bastante crítica dos novos tratados internacionais, nomeadamente o TTIP -Transatlantic Trade and Investment Partnership.
Em termos de intervenção pública, no aspecto microeconómico, a proposta é rever as regras que dão excessivo poder de mercado às empresas, em particular às grandes empresas. Aqui podemos relembrar um outro prémio Nobel da economia, George Stigler, que chamou a atenção para a regulação como uma actividade onde também há procura e oferta, e onde as empresas podem procurar protecção de concorrência via regulação, ou via regras de funcionamento do mercado em geral. Claramente, as regras de defesa da concorrência que temos, e que levam à existência de uma Autoridade da Concorrência em Portugal, e entidades similares nos outros países, não evitam que as empresas desenvolvam outras formas de poder de mercado, nomeadamente influenciando a produção de legislação.
No aspecto macroeconómico, Stiglitz propõe uma expansão orçamental financiada por impostos sobre os lucros das empresas, como forma de proteger a classe média de mais impostos sobre o rendimento (de outro modo, a expansão serviria para aumentar as desigualdades e não diminuir). A necessidade de olhar para os efeitos de impostos sobre as empresas e o seu efeito nas desigualdades mas também na própria orientação do investimento é para mim evidente, como argumentei há dois anos (aqui) quanto ao conhecimento que precisamos de ter a propósito da redução do IRC como mecanismo de estímulo ao crescimento da economia portuguesa.
Algumas partes da intervenção de Joseph Stiglitz tiveram um cunho panfletário, de intervenção política, e menos de análise económica. A essa parte cada um dará o valor que quiser. Os elementos económicos invocados são relevantes, e o deslocar da atenção para o campo das escolhas políticas na definição das regras de funcionamento das economias de mercado é uma proposta válida e importante.
2 \02\+00:00 Dezembro \02\+00:00 2015 às 18:39
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[1] Infelizmente so vi parte da conferência nas escadas do atrio mas ao ler o artigo fiquei com a duvida quanto ao impacto estimado de um aumento ou redução do imposto sobre os lucros das empresas. Por um lado esse aumento de impostos potenciaria a redução das desigualdades mas teria um impacto negativo na capacidade de investimento. Terá sido analisado que esse aumento poderia levar a uma deslocação da sede social das empresas para paises mais amigos dos lucros das empresas?
Pedro Pita Barros: não creio que alguém tenha feito essa análise; nem sequer vi analisado sobre que empresas mais beneficiariam da redução de IRC e se se situam nos sectores de bens transaccionáveis.
[2] Caro Professor
Sou médico não economista . Digo-lhe da minha sensatez : a minha mãe ou alguns vizinhos da minha aldeia, analisariam de modo mais eficaz e simples a questão . Mais, proporiam soluções de mais fácil compreensão .
As assimetrias sociais, o desemprego, a sobrecarga da segurança social, resolve-se simplesmente se em lugar de pensarmos macro, pensarmos micro .
Uma das preocupações que os decisores políticos deverão ter nas próximas décadas, em meu entender, é a harmonia da estrutura social .
Aquilo que ocupa a mente de um pequeno ou médio empresário é muito diferente do que preenche a de um operário, mais ou menos diferenciado , colarinho branco ou azul ; nos objectivos, na ambição, na motivação e, até, na felicidade .
Pedro Pita Barros: O seu comentário reclama por uma análise dos factores estruturais das desigualdades e de como actuar para as resolver em lugar de ter políticas sociais que mitiguem os seus efeitos. De acordo que essa actuação deve ser nos aspectos micro.
[3] A importância da interligação entre o económico e o político…
[4] Pedro, alguém estimou o impacto do desemprego no crescimento das desigualdades em Portugal?
Pedro Pita Barros: está a ser estimado pelo Carlos Farinha Rodrigues, deverá ser tornado público daqui a poucos meses.
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8 \08\+00:00 Fevereiro \08\+00:00 2017 às 10:54
Quanto à redução do IRC que Stilgitz propõe, pare-me bem. Uma fez que a carga fiscal diminui vai implicar a deslocalização de empresas da UE e do resto do mundo para cá.
Apesar de a receita do estado numa primeira fase diminuir, depois com o efeito de o IRC menor, as empresasvão ter um alavancagem no autofinaciamento, que vai provocar mais investimento e mais emprego e talvez nos bens e serviços um pouco mais baratos.
Ireneu Santos
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