como este é um problema de fundo no serviço nacional de saúde, quanto mais informação melhor. Usando dados disponibilizados pela APIFARMA, referi há algum tempo as preocupações que o seu ritmo de crescimento geravam (ver gráfico aqui), e avancei até com algumas ideias (aqui).
Existe porém boa informação pública sobre estas dívidas através do que a Direcção-Geral do Orçamento disponibiliza sobre execução orçamental (síntese da execução orçamental, em ficheiros Excel facilmente utilizáveis – bom serviço), e que não indo tão atrás no tempo como os valores da APIFARMA, já tem dois anos de dados mensais para se olhar (os valores de 2011 parecem ter subjacentes uma definição diferente na sua contabilização). Aqui é usada a informação das dívidas por pagar há mais de 90 dias, Hospitais EPE e subsector da Saúde nas Administrações Públicas.
A primeira comparação é entre os valores que estão na APIFARMA e estes valores da execução orçamental. As dívidas totais deverão ser maiores que apenas as dívidas dos medicamentos às associadas da APIFARMA. Além disso, o ser mais de 90 dias fará também alguma diferença nos valores. O quadro seguinte mostra uma importante diferença entre as duas séries de valores depois do primeiro episódio de regularização de dívidas. A linha azul mostra a evolução das dívidas totais às associadas da APIFARMA, as outras duas linhas são as dívidas incluídas na síntese de execução orçamental, a vermelha o total e a verde os hospitais EPE. A mudança de posição relativa da linha azul é curiosa porque revela que a dívida mais recente ainda estará dentro dos 90 dias, mas contabilizada pela APIFARMA (explicação que encontrei para reconciliar as duas linhas). Em ambos os casos, vê-se que depois do episódio de regularização das dívidas em 2012, voltou-se a crescer a dívida a ritmos não muito diferentes dos anteriores. Mesmo o valor de Janeiro de 2014 tem uma subida na mesma ordem de magnitude do ritmo mensal médio quando se retiram os momentos de regularização.
Tomando de seguida apenas a série das dívidas constante da execução orçamental, testei se a evolução temporal antes e depois dos episódios de regularização era diferente. O resultado está na figura seguinte.
Nesta figura a linha azul é a séria real de despesa, e a linha vermelha é o valor previsto impondo que o acréscimo mensal fora dos períodos de regularização é idêntico. A linha verde permite que seja diferente (excepto para Janeiro de 2014, igual ao período antes de Junho de 2012, mas há apenas um valor para 2014). Estatisticamente, os valores de ritmo de crescimento não são diferentes, e estão nos 41 M€/mês, segundo a linha vermelha. Com a separação de ritmos de crescimento, o valor de ritmo de crescimento sobe para mais de 70M€/mês na primeira metade de 2012, e é ligeiramente menos de metade durante os primeiros nove meses de 2013 (cerca de 35 M€/mês). O crescimento em Janeiro de 2014 foi de 55 M€. Qualquer que seja a versão preferida, com ou sem separação entre períodos de crescimento, o valor de Janeiro de 2014 sugere que é preciso seguir com atenção a dinâmica. As regularizações extraordinárias que têm ocorrido baixaram o stock. Terá que se ver se as medidas que foram adoptadas tiveram a capacidade de alterar o ritmo de acréscimo.
E assim termino o descasque da análise sumária que estava no relatório do FMI da 10ª avaliação sobre as dívidas, a confirmação grosso modo dos valores indicados e o porquê da preocupação em criar mais mecanismos de controle da criação de dívidas em atraso.
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