No meio da discussão sobre as fundações e o seu financiamento, surgem as universidades que passaram a fundação há cerca de três anos. Essas universidades não pretendem deixar de ter o estatuto de fundação, argumentando que quando se assumiram esse estatuto houve o compromisso do estado em ter um período inicial de 5 anos no final do qual se avaliariam as vantagens e desvantagens desse modelo.
Esta situação é um exemplo perfeito da incapacidade de os governos portugueses conseguirem ter políticas consistentes e duradouras o suficiente para produzir resultados.
Quando o governo anterior lançou a ideia de as universidades poderem ser fundações, para serem geridas de forma diferente, incluindo na sua forma de financiamento (contrato plurianual), optou e bem por uma evolução voluntária. Em lugar de forçar todas as escolas a terem o mesmo modelo, permitiu que cada universidade escolhesse se queria ou não aderir à nova modalidade. Três universidades avançaram, outras não.
Na altura, a minha opinião era simples, o modelo em si mesmo era interessante, a contratação plurianual permite um planeamento a mais longo prazo, dando maior consistência a projectos de desenvolvimento das universidades que se queiram lançar. Tinha uma grande dúvida: a capacidade do estado se conseguir comprometer com a lógica de relacionamento que está associada. Embora não tivesse participado em nenhum processo de decisão, não sabendo por isso os motivos pelos quais se escolheu um ou outro rumo, fiquei satisfeito por a minha universidade não ter avançado para o estatuto de fundação. Devido à incerteza sobre o parceiro da relação (o governo), pareceu-me ser claramente preferível não ser um first-mover e aprender com a experiência das universidades que avançassem primeiro. A actual discussão só vem dar razão a essa prudência nas decisões. As actuais universidades que são fundação vão perder tempo e gastar energia a defender a sua permanência num modelo de governação institucional que lhes deveria dar estabilidade.
Infelizmente, estas situações são frequentes. No início de 2010, as universidades assinaram com o governo de então o chamado “Contrato de Confiança“, em que para um financiamento adicional de 100 milhões de euros, as universidades assumiam o compromisso de formar com qualificação superior mais 100,000 pessoas nos quatro anos seguintes. Havia também o compromisso do governo não baixa o financiamento das universidades (com a curiosa e afinal necessária ressalva de ser apenas na legislatura em curso). Ora, o cumprimento deste contrato de confiança por parte do governo desapareceu já. Na altura da sua assinatura, colocava-se a questão às universidades se deveriam criar programas e estruturas especiais para cumprir o objectivo dos 100,000 qualificados no ensino superior adicionais em 4 anos. Face ao historial de compromissos não cumpridos pelos sucessivos governos, tudo apontava para que fosse mais sensato não mudar muito. E o curso dos acontecimentos veio confirmar essa visão.
Destas experiências, e de outras semelhantes que certamente existirão a diversos níveis, desde projectos mais pequenos a outros maior envergadura, resulta que se a universidade tem muitas vezes incapacidade de se reformar e adaptar às exigências da sociedade, a falta de um relacionamento com o estado financiador da universidade pública que seja credível em termos de estabilidade de regras, conduz a que mesmo os esforços de mudança da universidade sejam derrotados dessa forma.
Como não acredito que haja um preconceito particular do estado e dos sucessivos governos para com o ensino superior, só posso pressupor que o mesmo se passa noutras áreas. E o estado e a sua incapacidade de cumprir os compromissos que assume são um problema ainda por resolver. O que será certamente dificultador do desenvolvimento da actividade económica.
Aparentemente, até agora apenas as empresas privadas com contratos de parcerias público-privadas conseguiram encontrar forma legal de obrigar o estado a cumprir (infelizmente, a um preço muito elevado para todos os contribuintes, dadas as taxas de remuneração garantidas que conseguiram assegurar). Deverão as universidades fundação ir estudar como esses contratos foram estabelecidos e pedir para passarem do estatuto de fundação para uma parceria público-privada se querem estabilidade de regras?
nota: sou professor numa universidade pública que não é fundação.
10 \10\+00:00 Outubro \10\+00:00 2012 às 10:19
Excelente artigo. É preocupante a discriminação que existe na hora de assumir as responsabilidades contratuais. Com alguns cumpre-se, com outros, revogam-se por decreto compromissos assumidos…. Triste futuro, o nosso.
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