Quando se fala em despesas de saúde e do seu crescimento, um dos argumentos mais usados é que esse crescimento é inevitável devido ao envelhecimento da população.
Dado que não se pretende travar que as pessoas atinjam idades avançadas como forma de poupar despesas em cuidados de saúde, a implicação retirada é a necessidade de aumentar os recursos destinados à saúde.
Contudo, a premissa inicial está errada.
O envelhecimento da população não provoca, por si só, um crescimento significativo dos custos com cuidados de saúde.
Esta conclusão encontra-se presente em trabalhos académicos de diversas proveniências (países e áreas – economia, saúde pública, etc…) e em relatórios de organismos como a Comissão Europeia e a OCDE.
Aliás, o argumento de que o envelhecimento por si só não pode ser um factor preponderante no crescimento das despesas com saúde ressalta dos valores portugueses.
Em 1990, as despesas per capita com cuidados de saúde eram 628 USD (fonte: oecd health data, ajustado PPP) e a fracção da população com mais de 65 anos era de 13,4%. Em 2008, a população com mais de 65 anos residente em Portugal era 17,5%.
Admitindo que a população com mais de 65 anos gasta 4 vezes mais recursos per capita que a restante,(1) o valor decorrente para as despesas per capita com saúde é de 638 USD. O valor real foi de 2508 USD para 2008, o que significa que apenas o envelhecimento foi responsável por cerca de 3% desse crescimento.
Que outros factores estiveram então envolvidos? inflação, nalguma medida, mas sobretudo novas tecnologias, em sentido lato, e maior procura de cuidados por parte de uma população que ao longo do tempo foi ficando mais rica.
Esta afirmação não significa que o envelhecimento não traga desafios do sistema de saúde e podemos identificar pelo menos dois desses desafios ligados à economia e gestão:
a) adopção, ou não, de novas tecnologias de saúde, novamente entendidas em sentido amplo, destinadas à população idosa;
b) complexidade da resposta que é preciso dar, obrigando a uma reorganização da prestação (mais cuidados continuados, menos hospitais, por exemplo; aumento da componente de apoio social, e menos de componente medicalizada).
Assim, a atenção deverá focar-se na resposta, como deve ser organizada, às diferentes necessidades da população idosa, e não nos custos do envelhecimento.
Nota
(1) de acordo com números do internamento hospitalar, os custos com pessoas acima de 65 anos serão cerca do dobro (e não 4 vezes) os custos com pessoas abaixo dessa idade. A hipótese usada é mais favorável a encontrar-se efeito do envelhecimento nos custos.
28 \28\+00:00 Outubro \28\+00:00 2011 às 16:53
Segundo http://ec.europa.eu/economy_finance/publications/european_economy/2011/pdf/ee-2011-4_en.pdf (pg. 294) em 2050 em Portugal a população com pelo menos 65 anos representará 31.4% da população total, sendo que o peso do grupo 80+ na população total será 11.1%. Isso quer dizer que de um ponto de vista de economia política, o lobby cinzento será muito muito mais poderoso, e irá reivindicar um desvio de recursos públicos por exemplo da educação para a saúde.
Ou seja, é provável que a elasticidade-pop65+ da despesa pública com saúde varie ao longo do tempo.
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28 \28\+00:00 Outubro \28\+00:00 2011 às 17:05
Sem dúvida que esse efeito pode vir a existir, e que até já possa estar de alguma forma presente.
No caso da segurança social, os trabalhos da Paola Profeta dão uma ideia desses efeitos via “political economy”. Obrigado por o adicionares à lista de efeitos do envelhecimento.
Embora não os tenha quantificado, como o aumento da população idosa, em termos demográficos, é lento quando comparado com a evolução das despesas per capita em cuidados de saúde, é muito provável que alterem pouco a “evidência” de que o envelhecimento por si não é fonte de custos assinaláveis.
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30 \30\+00:00 Outubro \30\+00:00 2011 às 21:22
Estes dados desmistificam uma falácia política comum, que pretende muitas das vezes mascarar erros de gestão na saúde.
É premente a necessidade de desenvolvimento de metodologias para avaliação do custo/benefício versus investimento nas “tecnologias”, estas sim justificativas de grande parte da despesa, por vezes sem evidência estatística na melhoria dos cuidados de saúde.
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