Momentos económicos… e não só

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o impacto dos blogs

Qual o impacto dos blogs económicos?

Esta semana passou-me pela mão um artigo recente, The impact of economic blogs. Os autores partem de duas ideias base: os blogs económicos têm uma missão de informação, por um lado, e contribuem para a reputação do blogger, por outro. Olham apenas para blogs norte-americanos (os autores trabalham no Banco Mundial).

Na análise que realizam procuram dar resposta a três perguntas:

a) os blogs aumentam a disseminação da investigação produzida?

b) os blogs são um factor de reputação dos seus autores?

c) os blogs levam a maior conhecimento ou a mudança de conhecimento dos seus leitores?

As respostas são:

a) sim, no sentido de maior número de downloads de artigos científicos, quando referenciados em blogs que sejam muito visitados;

b) há um efeito pequeno em que os bloggers têm maior reputação do que os que não-bloggers, para igual registo de publicações científicas;

c) não há grande impacto.

Terminam colocando a questão de saber se há algum impacto nas políticas seguidas. Mais uma vez, não há conclusões muito fortes, e sim indicações que a influência sobre a política económica dos blogs (de economia e gestão) se traduz em chamar a atenção. Um leitor do trabalho deles indicou em comentário uma situação em que aparentemente um post num blog levou a uma política concreta no Reino Unido (ver aqui).

Sobre porque não há mais economistas a terem blogs, há aqui uma opinião: exige competências diferentes e específicas.

Para quem não quiser ler tudo, podem ver os aspectos principais aqui .

Não conheço avaliação similar para o papel dos blogs na academia e na influência sobre a discussão e política económica em Portugal.

As duas hipóteses que me parece fazer sentido serem testadas são:

a) blogs chamam a atenção para argumentos e problemas, que são depois “apanhados” pelos media tradicionais, e entram assim na agenda política;

b) blogs chamam a atenção de leitores ligados a partidos políticos, que pela sua intervenção nesses partidos os introduzem na discussão e na tomada de decisão política.

(obviamente, as hipóteses alternativas é a ausência de qualquer impacto).

Outra hipótese:

O facto de alguns dos actuais membros do Governo terem ganho notoriedade como bloggers é associação ou causalidade?

(aqui não haverá observações para análise estatística, pelo menos por agora, fica para a visão de cada um).

Complementar será saber o porquê de se lerem blogs económicos.

Enfim, ideias para desenvolver um dia e para se conhecer melhor o impacto que os novos meios de comunicação podem ter na profissão de economista.


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Documento de estratégia orçamental 2011-2015 (IV)

Continuando, após uns dias de pausa, a leitura do documento de estratégia orçamental.

É curioso que se avance o “congelamento dos salários no sector público, em termos nominais, naqueles anos, bem como o impedimento, a qualquer título, de consequências financeiras associadas a promoções e progressões” (p.39), a comparar com “Implementação de modelos de governação e organização funcional que promovam a flexibilidade de gestão, o envolvimento, motivação e desenvolvimento pessoal dos funcionários e a responsabilidade individual e coletiva pelos resultados alcançados” (p. 36). Não estou mesmo a ver como isto se faz, e a preocupação com a poupança imediata (congelando tudo o que seja despesa adicional de pessoa) pode criar situações curiosas – por exemplo, que interesse terá um director de um serviço público em sugerir uma alteração que permita reduzir a despesa global do serviço, fazendo o mesmo ou mais com menos pessoas, mas pagando mais a cada uma delas? como deixou de ter este último instrumento, dificilmente terá margem de gestão para fazer a proposta.

Sobre os números apresentados, não deixa de ser curioso como a forma de apresentação dos números continua a fazer diferença e a iludir – de acordo com o quadro, os grandes ministérios gastadores em pessoal são o ministério da administração interna e o ministério da educação e ciência. O ministério da saúde gasta menos em pessoal do que o ministério da defesa nacional e do que o ministério da justiça. Mas então a saúde não é onde gasta muito? e grande parte da despesa está em pessoas? a resposta é sim a ambas as perguntas, e razão pela qual as despesas com pessoal não aparecem aqui é porque para estas classificações, a transferência para o Serviço Nacional de Saúde é a fonte de pagamento dos salários do pessoa que trabalha no sector público da saúde, mas não aparece aqui porque é uma transferência; de modo similar, quando nas unidades de cuidados de saúde se paga a empresas que fornecem trabalho, a despesa não aparece em custos com pessoal, e sim em fornecimentos. Quando se fala em contenção das despesas com salários está-se a pensar apenas nas despesas com pessoal que integram o queadro III.5 deste documento de estratégia orçamental, ou em todas? se é em todas, não deviam ser apresentados os seus valores actuais e alvo para o futuro?


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Documento de Estratégia Orçamental (III)

Continuando a leitura do Documento de Estratégia Orçamental, chega-se ao capítulo III – Estratégia Orçamental.

Primeira dúvida, segundo é afirmado as transferências de fundos de pensões são actuarialmente neutras (são de facto? mesmo tendo em conta todas as incertezas? o valor esperado será o mesmo, mas o valor da incerteza foi acomodado?), mas não deixam de introduzir rigidez futura. Se criam rigidez futura, não facilitam a sustentabilidade de longo prazo das finanças públicas. Ou está-me a falhar alguma coisa?

Segunda dúvida, grande destaque dado à Racionalização dos Recursos das Administrações, Central, Regional e Local, mas o que significa exactamente “peso do Estado para o limite das possibilidades financeiras do País”? isto porque se todos estivessemos dispostos a pagar impostos sobre o rendimento a uma taxa única de 60% o limite será muito diferente de uma taxa única de 30% (exemplos hipotéticos para ilustrar a minha dúvida)? modelos de governação que promovam a motivação e o desenvolvimento pessoal, num contexto de salários congelados e promoções inexistentes, adiciono eu retirado de outra parte do documento. Dúvida, como é que isso se faz? como motivar só com outros factores, sabendo-se que o salário não pode ser usado para o efeito?

Desenvolvimento de Estado ágil e inovador  – aqui fico assustado, a sério. Basta fazer o seguinte exercício mental – quais são os principais exemplos de Estado inovador, onde vemos a sua criatividade?  se as palavras contabilidade e contas públicas surgiram nos cinco primeiros exemplos, fica a saber a razão do meu receio. Prefiro um Estado ao serviço das necessidades da sociedade e do cidadão, e que use as inovações necessárias para esse objectivo. A agilidade e inovação como instrumento e não como fim, se faz favor. E explorem bem as virtudes do que foi o Simplex (teve defeitos certamente, mas as virtudes mais do que compensaram).

e amanhã continuamos…


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Programa do Governo – Informação e Saúde

O programa do Governo contém dois blocos de medidas e/ou intenções relacionados com informação “melhorar a informação e o conhecimento do sistema de saúde” e “melhorar a transparência da informação em saúde”.

À semelhança de outros ponto do programa do Governo, a minha arrumação pessoal das medidas e intenções é distinta da adoptada. Desde logo parece-me útil separar instrumentos de objectivos.

Em instrumentos, temos:

– criação de um sistema de informação integrado (será desta que acontece? há mais de 10 anos que se fala da necessidade de um sistema informático a sério, mas normalmente é caro no momento inicial, e no contexto actual, pode-se ter dúvidas se sairá do papel).

– cartão (mais um?) e desenvolvimento do Registo de Saúde Electrónico (vai ter alguma relação com alguns dos cartões que já temos?)

– generalizar a prescrição electrónica de medicamentos e de meios de diagnóstico e terapêutica.

– desmaterialização crescente de todos os processos administrativos das entidades prestadoras de cuidados

Em objectivos, temos:

– informação de gestão para as unidades prestadoras de cuidados de saúde

– informação útil para a gestão do Serviço Nacional de Saúde

– informação útil para o cidadão

Caso o Governo consiga ser bem sucedido neste campo (e a dúvida é legítima, dados os diversos anúncios que foram sendo realizados nos últimos dez a quinze anos quanto a sistemas informáticos e transparência da informação), será produzido um “dilúvio” de informação que não deve ficar fechada e propriedade privada de um ou outro gabinete.

A tentação de o fazer será grande, para que se possa transmitir apenas as “boas notícias”, por um lado, mas também pela dificuldade que vai ser tratar de forma inteligente todo a informação que será gerada.

O que se vai fazer com a informação tem que ser pensado ao mesmo tempo que se tratam dos aspectos operacionais de gerar essa informação.

Quanto à transparência e informação ao cidadão, a leitura do parágrafo existente sugere que este último pouco ou nada beneficiará. Ao afirmar-se que ” a transparência na saúde enquadra-se no dever que o Estado assume de informar os cidadãos acerca dos serviços que prestam cuidados de saúde com qualidade e segurança, incluindo a prestação pública de contas, bem como de divulgação de informação simples, objectiva e descodificada”, o que se pretende? Deve-se ler que só será dada ao cidadão a informação que se acha que ele entende, ou seja, quase nenhuma, não vá o cidadão ter ideias de compreender ou analisar o sistema de saúde, e o serviço nacional de saúde em particular. Aliás, fornecer informação relevante é a melhor forma de promover a liberdade de escolha. Espero que nas decisões que venham a ser tomadas se tenha em conta a potencial contradição entre um objectivo geral de promover a liberdade de escolha e o pouco detalhe que é dado ao elemento fundamental para o cidadão fazer escolhas – informação.

No campo da produção de informação de gestão e sua utilização para de facto se gerir o sistema, devo dizer que me revejo mais no que a troika escreveu do que no programa do Governo. Transcrevendo directamente da “Tradução do Conteúdo do Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades da Política Económica”:

“3.57 Melhorar o sistema de monitorização da prescrição de medicamentos e meios de diagnóstico e pôr em prática uma avaliação sistemática de cada médico em termos de volume e valor (…). Será prestada periodicamente informação a cada médico sobre o processo (por trimestre, por exemplo), em particular sobre a prescrição os medicamentos mais caros e mais usados, com início no T4-2011. (…) Sanções e penalizações serão previstas e aplicadas no seguimento da avaliação [T3-2011].”

Diz que informação recolher, o que fazer com ela e que consequências deve ter. E calendariza quando tem de acontecer.

Neste contexto de transparência e informação ao cidadão, este também deveria ser informado dos resultados deste seguimento, mantendo-se naturalmente o anonimato quanto à identidade e localização dos médicos. A evidência pública de situações anómalas de prescrição é um dever de informação.

A análise da sua adequação tem que ser feita pelos pares, que detêm o conhecimento adequado para avaliar desvios excessivos. O conhecimento público da existência desses desvios obriga à sua análise, motiva a acção e pode mesmo exercer um efeito dissuasor de abuso do sistema.

Outro exemplo:

“3.75  Criar um sistema que permita a comparação do desempenho hospitalar (benchmarking) com base num conjunto abrangente de indicadores e elaborar relatórios anuais regulares, sendo o primeiro publicado no final de 2012. [T1-2012]”

O sistema tem que estar pronto no primeiro trimestre de 2012, para que os valores dos indicadores possam ser recolhidos ao longo do ano. Aqui, a solução mais natural será utilizar indicadores que já se encontram especificados nos contratos das parcerias público – privadas. Há várias boas razões para isso:

– tratar de forma igual todos os hospitais do Serviço Nacional de Saúde

– são indicadores úteis, de outro modo não teriam sido introduzidos nos contratos das parcerias

– são indicadores passíveis de ser calculados de forma regular, ou uma vez mais não teriam sido introduzidos nos contratos das parcerias

– permitem comparar todos os hospitais, já que a comparação com grupos de referência relevantes também é uma preocupação dos contratos das parcerias público privadas.