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Gabinete de Crise #62

Ao longo de 14 meses e 62 programas, numa parceria da Rádio Observador com a Universidade Nova de Lisboa (obrigado Pedro Castro e José Fragata pelo desafio), fomos discutindo, analisando, procurando manter uma visão positiva sobre os caminhos da pandemia, com convidados que muito contribuíram para um melhor entendimento do que se passava e do que nos esperava.

Não sabemos se a pandemia acabou, ou está para acabar em breve. Neste momento, chegamos ao ponto em que deixou de se justificar o Gabinete de Crise, pelo que termina aqui esta etapa – A Carla Jorge de Carvalho conduziu-nos nestes programas (na maior parte deles, nalguns tivemos a Vanessa Cruz a manter-nos na linha).

O programa de hoje, o último, teve como convidados Adalberto Campos Fernandes e Constantino Sakellarides, podem ouvir aqui, além da companhia habitual da Sónia Dias.

Deixo as minhas notas deste programa.

Número da semana: 36% – nesta semana que passou tivemos 36%, um pouco mais de um terço, do número de internados com covid-19 em comparação com o que se passou há um ano (228 internados esta semana em média, eram 636 há um ano). Estamos com 15% dos óbitos (2 em média por dia esta semana, 13 há um ano). Mas, por outro lado, estamos com 400 novos casos diários em média, face aos 228 de há uma ano atrás – são mais casos positivos com menos consequências negativas. 

Análise da Semana:

A grande questão da semana é qual foi o efeito dos festejos do Sporting. Mas temos que recuar um passo. Vou tomar o valor médio de novos casos nos 7 dias anteriores a cada dia. É uma forma de ter em conta o ciclo semanal de registos de casos. A 3 de maio iniciou-se a última fase da reabertura gradual da sociedade. Cinco dias depois, a 8 de maio, a descida de novos casos de covid-19 interrompe a descida que vinha a ter seja na região de lisboa e vale do tejo seja no resto do país. Começa uma ligeira subida. A 11 de maio temos os festejos do título do Sporting, já num contexto de subida do número médio de casos. Cinco dias depois, a partir de 16 de maio tem-se uma aceleração no número de novos casos em Lisboa e Vale do Tejo, o que não sucede no resto do país, que estabilizou ou retomou mesmo uma tendência de descida. Não sei se podemos estabelecer relação causa – efeito direta, até porque suspeito que as pessoas não queiram dizer que provavelmente ficaram infetadas nesse dia. Em termos globais, os casos médios diários subiram +13 por dia há duas semanas comparando com a semana anterior, e +41 por dia nesta última semana (onde já devemos estar a sentir os efeitos dos festejos). Por enquanto ainda é cedo para ver efeitos nos internamentos (precisamos de mais uma a duas semanas, se houver algum efeito).

A figura seguinte contém os valores em média móvel de sete dias do número de novos casos. A primeira linha vertical corresponde ao dia 11 de maio, ponto de corte associado com os festejos do titulo do Sporting, e cinco dias depois a segunda linha vermelha.

Média de novos casos diários por semana (semana “Gabinete de crise”, de 6ª a 5ª seguinte)

 Lisboa e Vale do TejoResto do PaísTotal nacional
8 a 14 de maio119110229
15 a 21 de maio15969228
02 de outubro a 08 de outubro371505876
09 de outubro a 15 de outubro5459301443
16 de outubro a 22 de outubro69616242321
5 de março a 11 de março281450731
12 de março a 18 de março200297497
19 de março a 25 de março178273451
26 de março a 01 de abril184249443
02 de abril a 08 de abril186288474
09 de abril a 15 de abril165366532
16 de abril a 22 de abril156349505
23 de abril a 29 de abril133316449
30 de abril a 6 de maio96249345
7 de maio a 13 de maio109242351
14 de maio a 20 de maio151249400

Nota: valores arredondados à unidade

Média de valores diários por semana (semana “Gabinete de crise”, de 6ª a 5ª seguinte)

 ÓbitosInternadosInternados em UCI
8 a 14 de maio11763114
15 a 21 de maio13636104
02 de outubro a 08 de outubro10718106
09 de outubro a 15 de outubro11873128
16 de outubro a 22 de outubro171165169
5 de março a 11 de março251342330
12 de março a 18 de março15948228
19 de março a 25 de março10745165
26 de março a 01 de abril6603138
02 de abril a 08 de abril6509120
09 de abril a 15 de abril5461117
16 de abril a 22 de abril3421107
23 de abril a 29 de abril334992
30 de abril a 6 de maio230986
7 de maio a 13 de maio226273
14 de maio a 20 de maio222867

Nota: valores arredondados à unidade

Mito/Alerta: evitar de euforias no turismo. Pode voltar a fazer correr mal se todos, nos e turistas, acharem q está tudo terminado.

Nota de esperança: a forma como ao longo deste ano nos habituamos ao vírus- as escolas andam abertas sem problemas, a restauração também, os testes vão sendo feitos, a vacinação decorre a bom ritmo. A esperança de que tenhamos encontrado o equilíbrio delicado no caminho q nos devolva a vida normal em grande medida, juntando vacinas, testes, rapidez de atuação das autoridades de saúde, cuidados e precaução de cada um (é provável que alguns cuidados tenham vindo para ficar)


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Sporting campeão e covid-19, porquê correr riscos desnecessários?

Primeiro ponto de ordem, parabéns ao Sporting e aos adeptos do clube, pela vitória no campeonato nacional de futebol.

Dito isto, tudo o resto que esteve à volta do jogo correu muito mal. Num momento em que se vive uma pandemia ainda não totalmente dominada, ter situações que potenciam a transmissão do virus é perigoso, e poderá colocar em causa o esforço realizado desde janeiro. Não tenho pretensão de apresentar previsões catastróficas. Deixo apenas a referência a um trabalho que procurou avaliar, com os dados do inicio da pandemia, os efeitos de transmissão associados com jogos de futebol em Inglaterra. O resumo pode ser encontrado aqui, e a análise completa aqui. E no início da pandemia em Itália e em Espanha em 2020, no que foi o pior período destes países, os jogos de futebol foram apontados como tendo tido papel relevante nesse espalhar do virus. Claro que agora sabemos mais, sobre a transmissão e sobre o tratamento. Porém, o virus é o mesmo, e a biologia não se preocupa com os nossos estados de alma.

O problema não é apenas ter pessoas nos estádios, mas toda a movimentação de pessoas, em transportes e em aglomerações à volta do estádio, geram potenciais contactos. O não ter pessoas dentro do estádio do sporting, mas deixá-las juntarem-se à porta do estádio, e em cafés e restaurantes nas redondezas, com total ausência de distanciamento fisico, sem uso de máscara e com venda de álcool, é um contra-senso. E de certo modo, era antecipável que esta vontade de festa ia estar presente.

Agora, depois do sucedido, há olhar não só para o que falhou, mas também ter uma atenção muito especial ao que se vai passar em termos de contágios nos próximos dias. As pessoas que estiveram presentes nestes festejos deverão ter atenção a sintomas, usar os testes rápidos se sentirem algo fora do normal e contactar um profissional de saúde se tiverem sinais que possam indicar contágio com covid-19. As autoridades de saúde deverão estar preparadas para atuar rapidamente, seja no acompanhamento clinico seja no apoio a isolamento (por doença ou por precaução). Não deverão colocar de parte a possibilidade de cercas sanitárias, decididas rapidamente e de preferência sem as confusões criadas desnecessariamente como sucedeu em Odemira. Se houver sinais de reaparecimento acelerado da covid-19, a antecipação e a decisão rápida são parte da solução.

Claro que pode ter sucedido que todos os que participaram nos festejos fizeram um teste rápido em casa, antes de saírem para a rua, que deu negativo. E que os que não fizeram teste é porque estavam vacinados e não transmitem de forma significativa. Só que não estando muito confiante nisso, é preferível preparar desde já uma resposta rápida, mesmo que não anunciada publicamente, utilizando os instrumentos, incluindo legais do estado de calamidade, à disposição.

Estando em bom curso a vacinação e antecipando-se que o verão pudesse ter já alguma normalidade, esperando que suceda o melhor (não houver um aumento descontrolado de novos casos, a que se seguirão internamentos e mortes), é preciso preparar para o pior. O ter que voltar atrás, para algum tipo de confinamento no pior dos casos, seria dramático a nível social e a nível económico.

créditos da foto: observador aqui (FILIPE AMORIM/OBSERVADOR); à direita, multidão de adeptos reunida à porta do estádio (JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR)