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Fadiga política

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Na semana passada, no Gabinete de Crise da Rádio Observador, falamos da componente de gestão política, a propósito de uma reunião no Infarmed um pouco mais tens, e falamos em “fadiga política”. De uma semana para a outra, transformou-se em “implosão política” das reuniões do Infarmed.

Deixo aqui as minhas notas do Gabinete de Crise da semana passada, sendo que o próximo é já amanhã.

Número da semana: 19 freguesias da zona de Lisboa, que estão com tratamento diferenciado em termos de regime. É a dança do vírus em ação. Iremos provavelmente andar a fechar e a abrir zonas que experimentem surtos localizados, sobretudo quando não se consigam isolar logo as cadeias de transmissão. Desta vez está a ser na zona metropolitana de Lisboa. No futuro poderá ser em zonas de turismo, por exemplo. Até ter uma vacina será provável que se vá tendo esta dança de fechar e abrir em várias zonas. 

Em termos de evolução da situação, depois de duas semanas de alguma melhoria no número de novos casos, voltou-se a ter um certo crescimento em Lisboa (de 256 novos casos diários em média há duas semanas para 270 esta semana). Globalmente também o número de internados subiu na última semana. Por isso, as preocupações com a situação são justificadas, embora não seja ainda uma situação de alarme.

Ganhou destaque esta semana a componente política. Começou com o reporte de alguma tensão na reunião do Infarmed. A necessidade de certezas para a decisão política é difícil de obter com a atual informação – o “respirar” da sociedade não segue uma mecânica que seja fácil de modelizar de forma matemática com todo o rigor. E da mesma forma que assistimos a uma fadiga da população com o confinamento em geral, e uma fadiga dos mais jovens com a falta de socialização, é natural que possa haver uma “fadiga política” – a necessidade de ter boas novidades para apresentar não é necessariamente compatível com uma “maratona” de resposta ao vírus – que será tanto mais maratona quanto mais bem sucedida for sendo essa resposta. Não é só cá em Portugal que temos essa “fadiga política” – na Nova Zelândia conseguiram ter vários dias sem novos casos de COVID-19, para voltarem a casos importados de nacionais que regressaram ao país, e que criaram, para números baixos, um desânimo também visível nas autoridades de saúde. É aliás uma pergunta para a qual gostaria de resposta – será que se pode falar da COVID-19 também como um teste à paciência da classe política?

Aliás, parece aplicável de forma geral um anúncio da Câmara Municipal de Lisboa, Farto do Vírus? Cuidado, ele ainda não se fartou de si. Sinal de oficialmente se reconhece o cansaço das pessoas com o vírus, mas também a fadiga política, em que a CML se substitui a um anúncio da DGS, mais genérico sobre os conselhos de proteção.

Numa perspetiva mais geral, o incidir a pressão política apenas sobre o Ministério da Saúde não é correto, nem justo, a meu ver. Os desafios de desconfinamento envolvem questões de mobilidade das pessoas, que não são algo que caiba ao ministério da saúde tratar, envolvem questões sociais e de trabalho, que também não são do ministério da saúde, envolvem questões de condições de habitação para se poder ter isolamento, que mais uma vez não são do ministério da saúde. Se é certo que na resposta de acompanhamento de casos o ministério da saúde poderia e deveria fazer melhor, a crer em declarações do presidente da associação portuguesa dos médicos de saúde pública, Ricardo Mexia, em termos políticos colocar apenas o ministério da saúde no centro das atenções parece-me exagerado. De qualquer modo, estas tensões são normais em democracia.

Média de novos casos diários por semana (semana “Gabinete de crise”, de 6ª a 5ª seguinte)

 Lisboa e Vale do TejoResto do PaísTotal nacional
8 a 14 de maio118110229
15 a 21 de maio15868227
22 a 28 de maio20634240
29 maio a 4 junho25925285
5 de junho a 11 de junho28942331
12 de junho a 18 de junho25852311
19 de junho a 25 de junho25675332
26 de junho a 2 de julho27068338

Nota: valores arredondados à unidade

Média de valores diários por semana (semana “Gabinete de crise”, de 6ª a 5ª seguinte)

 ÓbitosInternadosInternados em UCI
8 a 14 de maio11762113
15 a 21 de maio13636103
22 a 28 de maio1353275
29 maio a 4 junho1247061
5 de junho a 11 de junho740361
12 de junho a 18 de junho342771
19 de junho a 25 de junho442770
26 de junho a 2 de julho547873

Nota: valores arredondados à unidade

Mito da semana: devemos andar de máscara mesmo quando fazemos exercício físico? Não. 

Este é um dos poucos casos em que não é recomendado. Deve-se em geral andar de máscara em locais públicos e fechados, e sempre que não for possível assegurar a distância física recomendada de dois metros. Mas quando se faz exercício, as máscaras diminuem a capacidade de respirar de forma normal e confortável. Também leva a que as máscaras favoreçam o crescimento de micro-organismos nocivos. Por isso, a atividade física em locais fechados tem que ser bem planeada. O melhor mesmo é fazer exercício físico ao ar livre, ou em locais arejados, com distância física adequada para com o resto das pessoas, mesmo que seja num contexto de exercício coletivo ou individual. Esperança da semana: baseado apenas em observação de fotos de jornais e reportagens televisivas, a sensação da população estar a retomar a normalidade possível das suas vidas, com atenção e proteção em geral. Encorajador a ministra da saúde ter dito que não encontraram ainda cadeias de transmissão nos transportes públicos – resultado certamente dos cuidados que todos andam a ter. Não é impossível que tenha havido algum caso que tenha passado sem ser detetado, mas a ter sucedido não foi uma situação generalizada. É um passo importante para continuarmos a aprender a viver com a COVID-19 e o seu coronavírus, pelo menos até termos uma vacina.

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

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