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PPPs e o estudo da Entidade Reguladora da Saúde (2)

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O estudo da Entidade Reguladora da Saúde olha para quatro grandes áreas: eficiência relativa, eficácia, qualidade clínica e custos de regulação.

A dispersão por estas quatro áreas, que não são depois agregadas explicitamente, não permite responder com um único indicador à pergunta sobre o efeito das PPP. Do ponto de vista de informação sumária, seria uma opção natural para responder à pergunta sobre se as PPP são ou não uma forma de gestão melhor do que os hospitais de gestão pública (no caso, formato EPE maioritariamente), sendo que todos são hospitais públicos do Serviço Nacional de Saúde.

Do ponto de vista metodológico, porém, é razoável olhar para várias dimensões, permitindo depois ao observador externo “juntar as peças” de acordo com as valorizações que fizer dos diferentes elementos.

Ainda no campo metodológico, há uma distinção a fazer: que dinâmica trouxeram as PPP, quer  nos hospitais que vieram substituir (em três dos casos) quer nos hospitais de gestão pública, que “ganharam” um ponto de comparação. Nesta linha, uma interpretação possível é ver qual a diferença de evolução nos indicadores entre o que seria cada hospital PPP se tivesse permanecido em gestão pública e o que se verificou como PPP, descontada a evolução que seja comum a todos os hospitais comparáveis. A segunda interpretação deveria procurar ver se os hospitais de gestão pública mudaram de alguma forma o seu desempenho por haver hospitais PPP, que servem de referencial ainda que informal. Estes aspectos poderão ser difíceis de concretizar, mas traduziriam também a ideia de vantagem de ter PPP (por exemplo, a concessão da gestão privada do hospital Amadora Sintra acabou por estar na base da transformação das regras da gestão pública para a criação dos hospitais SA, depois transformados em EPE por motivos de sinalização de manutenção no sector público da sua gestão).

A ERS adoptou uma interpretação distinta, a de procurar ver se os hospitais PPP são mais eficientes do que os hospitais EPE (a forma jurídica majoritária na gestão pública dos hospitais do SNS).

A noção de eficiência adoptada é a de eficiência tecnológica (“a eficiência em saúde pode ser definida como a relação entre os recursos utilizados e os resultados obtidos em determinada atividade”, p.5 do relatório ERS). Esta noção de eficiência é apenas um nível de eficiência possível – numa linguagem simples, significa não ter desperdício: retirar algum recurso implica não se conseguir alcançar o objetivo de produção desejado. Mas para o mesmo objectivo de produção podem existir diferentes formas de o alcançar com diferentes combinações dos recursos disponíveis. E então para escolher entre as alternativas eficientes tecnologicamente, a segunda noção de eficiência adiciona os preços/custos dos recursos utilizados para escolher a que tenha menor custo, seja tecnologicamente eficiente e alcance o objectivo de resultado pretendido. A terceira noção de eficiência determina qual o resultado a obter que é eficiente, ou seja, qual o nível de actividade adequado dado que o hospital tenha os menores custos para alcançar esse nível de actividade seleccionado.

A avaliação da eficiência é feita com recurso ao método DEA, que procura estabelecer um score de eficiência para cada hospitals, olhando para a comparação dos recursos que usa e dos resultados que tem com os restantes hospitais. A análise da ERS justifica e faz uma definição cuidado do grupo de comparação.

Em termos de resultados relevantes, considera 1) o número de doentes saídos do internamento ajustados pelo índice de case-mix de internamento; 2) número de sessões de hospital de dia sem hemodiálise; 3) número total de consultas externas médicas: 4) número de atendimentos no serviço de urgência e 5) número de cirurgias de ambulatório ajustado pelo índice de case-mix de ambulatório.

Como inputs, considera 1) camas de internamento (lotação praticada); 2) médicos equivalentes a tempo completo; 3) enfermeiros equivalentes a tempo completo; 4) técnicos de diagnóstico a tempo completo; e 5) custos diretos, custos com fornecedores e custos com funcionários.

Tem-se por isso 5 “produtos” e 5 “recursos”. Estas opções ditam desde logo dois aspectos da análise.

Primeiro, com 4 hospitais PPP a serem comparados com os restantes, o DEA de forma natural irá ter um número elevado de hospitais eficientes, para ajustar às diferentes formas de combinar 5 recursos para conseguir 5 produtos. Este é um aspecto técnico do DEA mas basicamente diz que o mais natural será ter muito mais do 4 unidades eficientes, pelo que a conclusão de que as PPP, por serem apenas 5, seriam mais eficiente do que qualquer outro hospital de gestão pública fica praticamente inviabilizada à partida pela dimensionalidade do problema de optimização que está na base do DEA. Poderia suceder que as PPP não estivessem entre as unidades eficientes, mas dificilmente poderia suceder que apenas as PPP fossem as unidades eficientes.

Segundo, ao utilizar como recursos pessoal medido em termos físicos e depois os respectivos custos incluídos num outro “recurso” há uma dupla contagem desses recursos – duplicar o número de médicos altera os custos (recurso 5) e o número de médicos (recurso 2). Um segundo problema é a mistura de elementos de preço/custo num recurso que deveria ser fisico. Por exemplo, se os salários forem mais baixos, então utilizando os mesmos recursos humanos para alcançar os mesmos resultados, o hospital aparece como mais eficiente. Mas a definição de eficiência tecnológica está unicamente expressa em termos de relação entre recursos fisico e resultados, e é essa relação que o DEA procura caracterizar.

Devido a estas duas limitações, teria sido adequado que a análise da ERS tivesse incluído na versão pública variantes adicionais que as acomodassem (e que provavelmente terão sido ensaiadas internamente, bem como outras possibilidades).

Sobre os resultados, a discussão continua amanhã.

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

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