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Sessão “Novo Pacto para a Europa”

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Decorreu na semana passada uma sessão dedicada a “Novo Pacto para a Europa”, na Fundação Calouste Gulbenkian (ver programa aqui), e dinamizado por Maria João Rodrigues nesta sessão. Corresponde a um esforço europeu, com site aqui.

Aqui fica um breve resumo dessa discussão, que se afigura como o início de um caminho importante para a União Europeia e onde fará todo o sentido que Portugal tenha uma participação activa, com contributos sérios e de afirmação. São as minhas notas da sessão, ligeiramente editadas (o que significa que vai em estilo resumo e sem preocupação de estilo).

Abertura por Maria João Rodrigues que introduziu o objectivo final deste processo de discussão: elaborar proposta de pacto para a União Europeia. Desafios identificados: desemprego, estado social, como competir; divergências internas; sistema político europeu distante dos cidadãos, problemas de liderança; Desafios culturais: identidade colectiva europeia? Falta de projecto comum; Desafios externos: alteração da ordem global, risco de declínio da europa.

Três questões chave para a discussão: Outros desafios? Opções, há mais? Dentro das opções, qual a melhor para Portugal?

As opções apresentadas, com os seguintes titulos: 1-Regresso ao essencial; 2-Consolidação do acervo do passado; 3-Progressão ambiciosa; 4-Salto em frente; 5-Mudar a lógica do mais/menos europa.

(Comentário: É deixada a pergunta de qual a opção preferida de cada um: depois de ler os documentos, a minha preferência vai 3+ (societal dimension e  external dimension da opção 5). Mas a opção como cidadão ou como técnico pode ter algumas diferenças. E sobretudo fica uma questão: Condições para cumprir as opções?)

Do painel convidado, o moderadora Seixas da Costa, introduziu alguns tópicos e a sua visão: Urgência financeira retirou capacidade de pensar nas questões europeias; Esquecem desequilíbrios interinstitucionais gerados pelo tratado de Lisboa; Diferenciada capacidade dos diferentes estados membros de gerirem a sua participação; Capacidade dos parlamentos europeus em controlar o processo europeu

O primeiro comentador convidado, Viriato Soromenho-Marques: Falta engenho e cultura política, conhecimento. 1ª cenário – não é possível pelos custos de transição; cenário existe porque não há suficiente centralidade; seria preciso mais coordenação para funcionar do que avançar. Falta a coordenação que o cenário pressupõe. 2º cenário – fazia sentido nos anos 50, hoje esta lógica é irrelevante; o vulcão da divida soberana pode acordar a qualquer momento; 3º cenário – junta o melhor de duas hipóteses contraditórias e consegue irritar toda a gente. Super-comissário das finanças dá demasiado poder à CE. Não resolve o problema do orçamento comum. Lista transnacional é um erro. Federalismo de nações e não apenas de cidadãos. A CE faz parte do problema e não faz parte da solução. 4º cenário – direcção certa, mas corre risco de tropeçar, apostar na sua melhoria. Tem potencial de gerar hostilidade. Deixar cair exército europeu e política de segurança comum. Referendo é erro, tratado constitucional a ratificar estadualmente é correcto. Ignora duas questões centrais: mudança de estatutos do BCE (duplo objectivo: estabilidade de preços e emprego), capacidade de emissão de dívida europeia. Limitar o poder dos “engenheiros” da UEM. 5º cenário – pós-moderno, quem é limpa a casa desarrumada; passa ao lado dos desequilíbrios dentro da UE. Balanço que faz: número de actores limitado; uma crise sem sujeito; assimetria entre poder e democracia; quem defende a europa neste momento com posição de poder; ausência de sujeitos transformadores; grande défice de competência democrática – as elites europeias não estão à altura dos desafios europeus; falharam os governos, os partidos, as universidades.  A resposta que está a ser dada é monstruosa. Há um discurso de insensibilidade nos dirigentes que mistura ignorância com arrogância ideológica, cada órgão puxa para o seu lado; trivialidade sistémica; só um milagre poderá salvar a europa de cair definitivamente numa nova balança do poder e seu derradeiro suicídio .

O segundo comentador foi Vitor Martins: “Impossível unir a europa no quadro da desconfiança dos cidadãos” – citação; desconfiança como problema central; opção preferida: 2-3-4 é onde se consegue focar; não consegue pensar à volta da 5, e a opção 1 não é opção; coração na opção 4, racionalidade atira para a opção 3. A apresentação “back to basics” não é correcta. O “passado” tinha uma visão política aprofundada e consistente. Tinha um método, o método comunitário. O fracasso do euro será o fracasso do mercado único. O centro de gravidade europeia está no euro. 2º cenário – é preferida por políticos europeus por significa gerir com o mínimo custo possível e máxima aparência política. Contribui a prazo para a desconfiança dos cidadãos. Euro foi salvo do colapso por medidas pontuais. Não se tem certeza sobre a sustentabilidade do euro. Retira aos líderes e políticos a necessidade de se assumirem com uma visão. É uma opção sem visão. 3º cenário – temos que olhar para as respostas do Euro; colocar o euro no mapa de uma zona económica e monetária consistente e credível; há a questão central do BCE;  relações entre parlamentos nacionais e instituições comunitárias; provavelmente exige revisão de tratados, mas como fazer isso num quadro de desconfiança dos cidadãos. 4º cenário – sentiu-se a ler o projecto de constituição de 2003; no quadro de desconfiança não há forma de andar em frente; 5º cenário – não consegue lidar com esta opção.

O terceiro comentador, João Ferreira do Amaral: Dois aspectos que não assinalados: disparidade de poderes entre estados membros. Acabou a igualdade entre estados. Houve desproporcionado aumento do poder alemão. É um problema para a Europa lidar. Estreitaram-se os leques de opções políticas. Ou é política ultra-conservadora ou não é política. Não há uma grande diferença entre as opções 3 e 4. Opção 5 não é incompatível com nenhuma das outras. Importante reforço das questões relativas aos direitos humanos. Discordância face à opção 1.  Não se trata de regresso ao passado. A UE nunca fez o que era básico, e fez várias coisas que não eram básicas (exemplo: PAC). Opção deve ser fazer o essencial, independente do passado. O que é fazer o essencial? Estados com interesses comuns, a actividade da EU deveria incidir sobre os interesses comuns. Esta expressão é ambígua: interesses comuns colectivos vs interesses em todos os estados e por isso são comuns. Focar-se nos interesses comuns colectivos: cooperação monetária mas não moeda única; defesa; ambiente; comércio livre; recursos naturais transfronteiriços. Adepto da Europa à la carte. Tudo o que não sejam estes interesses comuns colectivos devem ser facultativos. Disparidade de interesses com 28 países não é possível fazer de outra forma. A UE deve existir para proteger os estados da globalização, e que a melhor forma de o fazer é transferir poder para o centro da UE. É uma visão errada reduzir as autonomias nacionais. Globalização reforçou o papel das nacionalidades e a coesão nacional como resposta a essa globalização. Federalismo não é estado federal, mas era isso que se pensava. Ter moeda única obriga a ter estado único, de outro modo não funciona. É preciso ter os mecanismos próprios em termos monetários e em termos orçamentais, Preservar autonomia nacional versus união de estados federados. Autonomia como gestão de interdependências, com instrumentos próprios: moeda própria e orçamento.

Da audiência surgiram os seguintes comentários:

[1]: PAC foi básica e essencial, mas depois transformou-se num instrumento perverso. De resto não está de acordo com o J Ferreira de Amaral.

[2]: Nunca encontra discurso optimista sobre a Europa. Como e com quem implementamos as opções estratégicas? Hoje qual é a coligação política, geográfica, o método e a forma, de aplicar cada uma das estratégias.

[3] Novo pacto precisa de ser esclarecedor quanto à nova visão. O mundo mudou imenso desde a época dos fundadores. Qual a visão que mobiliza as novas gerações. Continuamos a tentar responder a uma crise, mas será possível ter o conhecimento dos interesses genuínos que não sejam apenas reactivos.

[4]  Não sabe o que é o federalismo republicano. Vive as angústias das empresas portuguesas. Posiciona-se entre o 2 e o 3. Hoje fala-se na reindustrialização na europa, essencial para a europa no mundo.

[5] Para questões complexas não há respostas simples. Será que a política tradicional tem os instrumentos para encontrar as respostas. Fazer política com outras regras. O maior problema identificado é o que é o projecto europeu. Não há um pensamento orgânico. Grande política só se pode fazer com grandes compromissos. É possível gerir esse compromisso entre as grandes famílias políticas europeias (PPE e Socialistas). O pacto deverá encerrar um desafio às famílias políticas europeias para dar confiança aos cidadãos. Está entre a 3 e a 4.

[6]  Distinguir entre o que desejamos e o que podemos esperar alcançar. Evitar exercícios agressivos de engenharia social. Pensar em soluções compatíveis com processos democráticos nacionais. Elimina a 4 e 5 como opções razoáveis, por muito que sejam desejáveis. Identifica-se com muito do que disse o J Ferreira do Amaral. Mas hoje não é possível retroceder. Não se sabe onde se pararia, e pode-se deitar o essencial fora. Opção 2 é o status quo. A actual construção teve resiliência suficiente. Está entre a 2 e 3, não é excessivamente critico para a actual situação (abanou-se mas resistiu-se). Introduzir mecanismos de coordenação macroeconómica. Necessário ter mecanismos de ajustamento simétrico.

[7] Não é favorável ao cenário 1, mas é necessário discutir por causa da Inglaterra. As próximas eleições podem trazer muitos eurocépticos para o parlamento europeu. 2º cenário – não é necessário ter preocupação com ele. Tende a fundir 3º e 4º cenários. Entre aquilo que se pode pensar e o que as populações querem pode ter uma diferença grande. A UE tem a ganhar com alargar algumas das suas políticas (exemplo, política europeia de imigração). Política europeia de combate à exclusão social. O grande problema é a zona euro. Tal como está não vai funcionar. Funciona hoje com regras ditadas pelos alemães, mas não tem mais nada. É preciso alguma integração fiscal. Problema da soberania fiscal dos estados membros. Cria distorções no mercado interno. Necessário ter harmonização fiscal. Não acredite que se mude facilmente. Tem que haver simetria no ajustamento.

Maria João Rodrigues explicitou um pouco o que tem sido a discussão noutros países: Cenário 5 – não é opção integral, mas pode valorizar outras opções; Cenário 1 – Reino Unido, mas não só. Maioria divida entre 2 como suficiente, ou não, para lidar com a crise. E nesse caso avançar para 3 ou 4. Países do Norte: maioria para 2 como suficiente; resto com 3 e 4.

Continuando com a audiência:

[8] Portugal tem mostrado capacidade de identificar o interesse comum. Podemos dar um contributo real.

[9] Pontos chave:

–       restaurar acesso mais normal ao crédito, tem que se ter supervisão bancária mais forte e solução que não penalize os contribuintes

–       se os estados membros querem uma perspectiva de crescimento sustentado, com policy mix para crescimento e protegidos de choques macroeconómicos, exige orçamento da zona euro; mas para caminhar nesse sentido tem que haver mais coordenação de políticas económicas, sociais e orçamentais

–       reduzir peso da dívida pública, é necessário instrumentos europeus, mas requer maior coordenação orçamental incluindo impostos, e imposto europeu.

–       Em termos políticos, é necessário funções de governo da zona euro, com capacidade de responder politicamente perante um parlamento europeu.

–       Sequência política é chave para poder resultar, passar da 2 para a 3 pensando na 4.

[10] Sobre países do Leste, estas opções têm impacto sobre a integração diferenciada. A europa a la carte está minimizado, a diferenciação é entre os que são da zona euro e os que se querem juntar. Não acredita numa revisão do tratado de Lisboa. Seria utilizado pelo Reino Unido para voltar atrás. Mas será preciso rever algumas coisas para orçamento e governo da zona euro.

[11] Vamos fazer as contas das opções. Para saber os custos de cada opção/cenário. É preciso conhecer os benefícios e custos porque isso pode alterar as visões. Humildade de reconhecer que a realidade é mais rica. Estamos sempre a trabalhar em contextos de incerteza. Cépticos na inteligência e optimista na vontade. Não podemos separar da questão quem vai fazer isto e da desconfiança quanto a quem vai fazer isto.  Federalismo republicano: o modelo americano é o exemplo. Os estados são responsáveis pelas suas finanças públicas. Mutualização das regras de independência e da guerra 1812-1815.

(e mais foi dito, mas tive que sair)

Li o resumo que estava disponível, e depois da apresentação e da discussão, a leitura do documento principal fica agendada. Quem quiser o documento, está aqui.

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

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