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retomar o caminho, o tema do artigo de hoje no dinheirovivo.pt

1 Comentário

tem sido frequente que a “emergência do dia a dia” se sobreponha à “urgência do pensamento estratégico”; no Ministério da Saúde esse risco parece claro, e perigoso dados os desafios que foram traçados…

 

Retomar o caminho

26/03/2012 | 02:41 | Dinheiro Vivo

O roteiro da política económica está traçado em grande medida desde Maio de 2011. O Memorando de Entendimento com a Troika estabelece medidas a adoptar e metas a atingir, sendo particularmente activa na área da saúde.

Dado esse caminho claramente fixado, os primeiros tempos foram de concretização, mais ou menos rápida mas dentro dos prazos estabelecidos, desse acordo, com uma única importante excepção. Essa excepção relevante foi o problema dos atrasos nos pagamentos. Não só não se conhece ainda a solução para saldar a dívida antiga, como não está claro qual o mecanismo que impedirá a repetição futura do problema. Se há problema fundamental a resolver no campo do Serviço Nacional de Saúde é este. Até porque os números mais recentes não deixam grande margem – ou se consegue criar forma de eliminar a propensão para criar dívidas, ou esperar que apenas o ambiente geral o faça não produzirá efeitos.

Se fosse fácil e rápido resolver esta questão, já certamente teria sido solucionada. É por isso que se deve ter alguma preocupação com o arrastar da solução. Quanto mais tempo passa mais facilmente vai sendo o tempo dos dirigentes do Ministério da Saúde absorvido por outros aspectos. A rapidez com que outros problemas surgem na frente mediática desvia a atenção do caminho traçado. Assim de repente, surgem na memória dos tempos mais próximos assuntos como recolha de sangue e a pretensão dos dadores de sangue de continuarem a ser “pagos” com isenções de taxas moderadoras, vacinas contra a gripe A compradas pelo anterior governo e que não foram todas utilizadas, carta aberta dos médicos sobre o sector da saúde, a falta de médicos de família, o sector do medicamento em vários aspectos – medicamentos muito caros que se pretende ver introduzidos no mercado, alteração das regras de funcionamento do mercado – , picos de mortalidade e sua (ausência de) relação com o aumento das taxas moderadoras, acordos com prestadores privados de cuidados de saúde quando o sector público reclama capacidade disponível, protestos do sector privado quando o sector público utiliza a sua capacidade não utilizada, etc…

A capacidade do sector da saúde, público e privado, em criar picos de atenção mediática é brutal. Mas cabe ao Ministério da Saúde saber manter as prioridades de actuação, e não responder à agenda mediática. Assim, a principal exigência que deve ser feita é a de resolver a definição dos mecanismos adequados para evitar o problema de dívidas crescentes a fornecedores pelas instituições do Serviço Nacional de Saúde.

E a este respeito, parece útil fazer uma distinção entre controles imediatos, que atalhem as tendências de crescimento, e mecanismos de médio e longo prazo. Se no curto prazo, regras que limitam a despesa por via administrativa podem conter a despesa, podem também comprometer a capacidade assistencial. Significa que essas regras têm que ser completadas com mecanismos para o médio e longo prazo, que permitam o exercício da capacidade de gestão em reduzir a despesa sem alteração dos níveis de capacidade assistencial à população.

Dentro destes últimos, deverá ser dada atenção a dois aspectos: criar processos credíveis de orçamentos plurianuais, que sejam respeitados quando é elaborado e distribuído o orçamento do Serviço Nacional de Saúde, e não ter receio de reconhecer que a boa gestão deverá ficar com um “prémio” para a instituição, e a gestão que não consegue funcionar ser substituída.

O primeiro destes aspectos exige uma capacidade conjunta do Ministério da Saúde e do Ministério das Finanças cumprirem compromissos de disponibilização de fundos que estabeleçam com quem presta cuidados de saúde no Serviço Nacional de Saúde (em particular, os hospitais).

A agenda de prioridades do Ministério da Saúde tem de saber resistir aos factos mediáticos. Só com o pensamento centrado no retomar do caminho, com a comunicação para o exterior a reflectir essa situação, se conseguirá alcançar as metas propostas.

Desconhecida's avatar

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

One thought on “retomar o caminho, o tema do artigo de hoje no dinheirovivo.pt

  1. Jorge Bravo's avatar

    Na mouche! Correctíssimo.

    Mas, sendo Paulo de Macedo um gestor de reconhecido mérito, conhecedor do sector, racional e racionalista, a quem se tem pedido para reduzir custos, pareceria que a tarefa seria fácil.

    Mas como a grande parte dos custos da saúde são fruto de exames médicos securitários para a instituição e classe, por forma a afastar a possibilidade de erro dos prestadores de acto de saúde, não sei!

    Mais do que repetições de exames para tornar eterna a situação, é o pedido de exames “de certeza absoluta” que elevam os custos.

    Porquê fazer diagnóstico diferencial com base só numa boa história clínica, análises e exames de imagem mais económicos como Rx e ultra sons, por exemplo, admitindo tal seria o suficiente para o caso clinico, se ao pedir um Tac ou mesmo uma Ressonância e porque não mais análises especiais, a possibilidade de erro é menor e ainda temos um colega, o autor do relatório para nos apoiar?

    Não é?! Pelo menos não estamos sós!

    Aliás, nem sei mesmo porque ainda não se está em usar tabelas de entradas múltiplas para análise automática de diagnóstico diferencial, cujo ficheiro se anexe à ficha do doente?!

    Assim ainda ficávamos mais seguros e protegidos!

    Outro factor, e aqui não vou ser politicamente correcto, é o “esquecimento” do ensino da Medicina tendo por base a capacidade de diagnóstico diferencial assente nos sinais e sintomas e história clínica apoiado em exames complementares mínimos, o que exige muito mais skill e vocação quer de professores quer de alunos, do que o ensino baseado no uso de protocolos e exames exaustivos.

    Seria interessante fazer-se; e eu sei de quem tem esta arte para isso; um estudo em paralelo dos dois métodos, pois o resultado verá será deveras elucidativo.

    Já não estou a falar da protecção ao pleno emprego cooperativo (pela barragem de entrada pela nota e exigência de empregabilidade estatal) e o deslocamento da investigação em biologia e bioquímica avançada para dentro da Medicina, o que deu a ilusão que todos os médicos tinham que ser cientistas de ponta e que isso é que era Medicina, que isso ainda são outros problemas.

    Por isso é que tenho muitas dúvidas se existe o golpe de asa necessário para se libertarem da gestão do problema só baseada na contenção mais ou menos cega de custos.

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