(cópia do texto publicado no site dinheirovivo, original aqui)
Como seria de esperar foi dado o tiro de partida para a construção do próximo Orçamento do Estado, para o ano de 2012. Ainda é cedo para se saberem as opções que serão tomadas, e a retórica é facilmente antecipável – orçamento exigente, para cumprir, e que coloca Portugal no caminho certo. Vamos certamente assistir a cortes na despesa pública, bem como aumentos de fontes de receita. O cenário actual, interno e externo, não deixará margem para ser muito diferente. Há o guião dado pelo acordo com a Comissão Tripartida (vulgo troika, é tempo de passar a usar uma denominação em português).
Significa então que o Orçamento do Estado para 2012 será duro na substância mas relativamente fácil de elaborar? Infelizmente não.
Em termos de Orçamento do Estado, há sempre uma área particularmente difícil de gerir – a da Saúde. A natureza das actividades desenvolvidas são especialmente problemáticas para processos de natureza orçamental. Quando se faz um orçamento pretende-se ter uma ideia de despesa e de actividade a ser desenvolvida. Se o preço a pagar pela actividade está definido à partida, então ao definir o volume de actividade fica-se em grande medida com um grau de certeza sobre o orçamento. Por exemplo, com as escolas não há geralmente grandes surpresas de orçamento. A incerteza sobre o número de alunos de cada escola é relativamente pequena e facilmente gerível.
Noutras áreas, como as obras públicas, pode-se determinar um orçamento global, e quando este é atingido, simplesmente pode-se parar a adjudicação ou mesmo a execução de obras.
Mas na área da saúde juntam-se dois aspectos. Por um lado, o número e tipologia de doentes não é previsível antecipadamente nem é programável com exactidão. O seu custo pode também ter incerteza apreciável, basta atentar ao custos de novos medicamentos ou de novos procedimentos. Logo, neste aspecto é muito diferente da educação. Por outro lado, não é aceitável socialmente que quando se atinge o orçamento se pare de atender doentes. Neste aspecto, é muito diferente das obras públicas.
Estes dois aspectos significam que a capacidade de previsão de despesa no Orçamento do Estado por parte do Ministério da Saúde é menor do que noutras áreas, o que lança desafios diferentes. Não se deve tirar daqui a implicação de que não é possível controlar à priori e com toda a segurança a despesa e o orçamento do Ministério da Saúde (sobretudo devido ao Serviço Nacional de Saúde). Há é que reconhecer que são precisos mecanismos e processos adicionais.
Sem esgotar as possibilidades, cumprir o orçamento do Ministério da Saúde implica um acompanhamento permanente, mensal, com detecção precoce de desvios. Implica ter a capacidade de reafectar verbas de uns pontos do sistema para outros. Obriga a ter uma previsão plurianual dos orçamentos parcelares. Implica eventualmente vir ter a coragem de fechar serviços. Implica uma negociação permanente, para lidar com os aspectos de incerteza de execução do orçamento. Este é um desafio de gestão que se coloca permanentemente na saúde, e que porá também à prova os actuais dirigentes do Ministério da Saúde. A elaboração do orçamento do Ministério da Saúde não é apenas uma questão de valores, é também em grande medida uma questão de controle e acompanhamento.