Momentos económicos… e não só

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Pagamentos em atraso dos hospitais, segundo Mário Centeno

De acordo com notícia da Agência Lusa, de 31.01.2018, sobre os pagamentos em atraso,  “O governante afirmou que, para este ano, estão já previstos 1.400 milhões de euros para saldar dívida e pagamentos em atraso na Saúde, sendo que 500 milhões de euros são referentes à capitalização dos Hospitais EPE (Empresa Pública Empresarial) feita já em 2017 e que será usada em 2018.

No final de 2017, os pagamentos em atraso na saúde ficaram nos 1.075 milhões de euros, acima dos 854 milhões de euros de 2016, ou seja, mais 221 milhões de euros.

O governante justificou o facto de os pagamentos em atraso terem aumentado com mais investimentos na saúde, dizendo que estas despesas são reflexo da “melhoria do Serviço Nacional de Ambulatório”, com mais tratamentos e cirurgias, em 2016 e 2017.”

Há nesta noticia um lado bom e um lado mau. O lado bom é que o Ministério das Finanças decidiu preocupar-se com o assunto, e procurar ativamente uma solução. O lado mau é a forma como parece estar a ser encarado o assunto. O problema dos pagamentos em atraso não é decorrente da necessidade de investimentos e da sua execução – é uma tendência longa, que acelerou no último ano. Parece um problema menor do que é devido à injeção extraordinária de verbas nos hospitais. Se não for tratado como um problema de gestão dos hospitais, onde se misturam orçamentos tradicionalmente pouco realistas e incapacidade de ação nos casos de maior criação de dívida, não será resolvido. E é um problema que não se resolve com “verbas para saldar dívidas”, que serão certamente “o maior reforço de sempre!”. Como tem ficado patente de cada vez que surgem estes reforços financeiros.

(ps. fica para amanhã a nova edição do observatório mensal das dívidas dos hospitais EPE)


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na Rádio Renascença, “Raio-X à Saúde”

Numa interessante troca de ideias com Franscisco George, na Rádio Renascença: Raio-X à saúde, dá para fazer download como podcast ou apenas em ficheiro mp3.

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Observatório mensal da dívida dos hospitais EPE, segundo a execução orçamental (nº 43 – Dezembro de 2017)

Apesar de alguns dias em atraso face ao habitual, aqui volto ao observatório mensal da dívida dos hospitais EPE. Os valores foram pontualmente divulgados pelo Ministério das Finanças, conforme anunciado. O atraso em fazer este número do Observatório deveu-se à ocupação típica da época de festas natalícias, por um lado, e à pouca vontade de retomar más notícias.

O valor referente ao mês de novembro de 2017 traduz-se num aumento da dívida acima da tendência do ano de 2017, que é ela própria mais acentuada do que no passado recente – o valor médio mensal de crescimento da dívida está agora em cerca de 48 milhões/euros por mês. O usual gráfico abaixo mostra claramente que a tendência de crescimento do último ano (a vermelho) é mais acentuada do que antes (linhas crescentes a preto e a azul).

Este aumento das dívidas registadas pode ser apenas má ou pode ser muito má noticia. Se for uma reacção de registar dividas de despesas já realizadas com o objectivo de receber uma parte maior do reforço de verbas anunciado pelo Governo, é má noticia mas é o reconhecimento de despesa que já lá estava (pode até nem ser mais despesa, basta não pagar para entrar como pagamento em atraso). Se for uma reacção de uma vez que se vai receber mais dinheiro nos hospitais EPE então vamos fazer mais despesa para usar essas verbas, deixando de pagar as dívidas mais antigas que passam a pagamentos ema atraso, então a evolução cai na categoria de muito má.

Em qualquer dos casos, pensar que anunciar reforço de verbas e que será feita a “mãe de todas as transferências” para levar a dívida no final do ano de 2017 a ser mais baixa até do que no final de 2016 não levaria a um aumento da própria dívida é pouca capacidade de antecipação.

Num contexto em que há clara pressão para aumentar despesa (reposição de salários e investimentos de reequipamento e/ou manutenção), a incapacidade de ter orçamentos realistas e bem geridos, fazendo com que a criação de dívida continue a ser a habitual válvula de escape da pressão financeira não é bom sinal.

Aliás, este último “pula e avança” dos pagamentos em atraso sugere uma hipótese para teste futuro nos dados: cada vez que há um anúncio de mais verbas, há a criação de mais dívida. Fica para análise futura. Veremos entretanto que mudanças o final do ano traz.

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“Deve o Governo pagar para as universidades continuarem a acumular generosos excedentes?”

Este foi o titulo de uma  noticia do fim de semana, e juntando esta a outras notícias que têm surgido no braço-de-ferro entre Governo e Universidades, o “generosos” que figura no título motiva naturalmente uma reação de quem lê. Diferente para quem está dentro do dia a dia das universidade e  para quem vê de fora. E o “Governo pagar” também merece neste momento um comentário.

Primeiro, declaração de interesses: trabalho numa Universidade pública, onde este ano houve um excedente, que muitos classificarão como generoso, e que vem mencionado na notícia, e por funções exercidas até Setembro de 2017 acompanhei a evolução da situação económica e financeira das universidades.

Segundo, o “braço-de-ferro” tem duas componentes para discussão – por um lado, o que serão, pelo menos nalgumas instituições e nalguns casos, estes excedentes, e por outro lado, o que é a palavra dada e escrita pelo Governo.

Vamos então à primeira parte. Cada vez mais tem sido pedido às universidades portuguesas que participem em atividades cientificas internacionais e que ganhem bolsas de investigação atribuídas de forma competitiva. Essa atividade de projetos científicos significa que os investigadores, quando ganham essas bolsas e desenvolvem os projetos subjacentes, recebem nas suas instituições de origem financiamento adiantado, mas que se encontra consignado a despesas – por exemplo, se receber um milhão de euros para o funcionamento de um laboratório por um ano (recursos humanos e equipamento)  em novembro, então haverá muitos meses desse fundo que serão “excedente generoso” mas que já se encontra comprometido. O problema está em que a contabilidade desses fundos não reflete desde logo o compromisso com a despesa, e como tal o excedente realmente não existe. O Governo, os vários ministérios envolvidos, sabe desta natureza de parte dos saldos, pelo que dificilmente compreendo como se continua a insistir no mesmo argumento. Se se pretende usar seriamente a existência de “generosos excedentes” então estes excedentes, ou saldos, deveriam ser calculados de forma a eliminar despesas que se sabe terem que ir ocorrer por conta destes compromissos. Por curiosidade, no caso da Universidade Nova de Lisboa, que veio explicitamente citado, a grande maioria do valor do saldo (“generoso excedente” decorre da venda de imobiliário para financiar (parcialmente) o novo campus da Faculdade de Economia – Nova School of Business and Economics, pelo que rapidamente desaparecerá esse “generoso excedente”, conforme consta de uma Resolução do Conselho de Ministros de 9 de Maio de 2016. Surpresa será que o ministério das finanças tenha surpresa com o saldo da Universidade Nova de Lisboa.

A segunda parte é de natureza diferente. O Governo assinou com as universidades um compromisso de legislatura, denominado “Contrato de confiança”, onde assumia a obrigação de fazer o pagamento dos encargos salariais adicionais decorrentes de alterações legislativas – ou de outra forma, a reposição de salários no ensino superior seria paga por reforço de verbas do orçamento do estado, e não por diminuição de outras despesas que as universidades tenham. O que aqui interessa é que um compromisso que se julgava credível por parte do Governo para um acordo de legislatura (palavras usadas se não me engano por pelo menos um ministro do Governo) afinal não pretende ser respeitado, ou apenas respeitado de acordo com o que for a vontade do ministério das finanças. Tal transforma qualquer contrato de confiança em qualquer área governativa em contrato de desconfiança. O ministro que tem a seu cargo o ensino superior, pelas noticias reportadas, teve a noção clara da importância de manter o compromisso assumido.

O que me surpreende é que no ministério das finanças, ao nível dos seus responsáveis, há economistas que conhecem bem os conceitos de “credibilidade” e “reputação” e sua importância para evitar os problemas da denominada “(in)consistência intertemporal de políticas” – ou em linguagem comum, mudar de ideias a meio e não cumprir o que se prometeu altera a capacidade de estabelecer politicas de longo prazo. O que se fica a saber é que o Governo assumir compromissos não significa que os mesmos venham a ser respeitados. Que destruir a palavra dada seja escondido debaixo da pergunta que deu origem à noticia e ao titulo deste post é o que mais custará a prazo, e não os poucos milhões que estarão aqui a ser poupados. Ainda assim antecipo que se possa argumentar que esta posição de força perante as universidades servirá de exemplo para outros, que esses casos sim trarão reais poupanças para as contas públicas. Até admito que possa haver algum desse efeito positivo de curto prazo, mas receio que o efeito negativo de longo prazo acabe por ser mais danoso. Será possível estabelecer contratos de confiança, pactos de regime, ou outro nome para qualquer compromisso de longo prazo, quando se sabe, por observação das ações passadas, que não há certeza que o Estado o cumpra?