As tensões económicas base na relação médico doente são naturalmente identificadas por JLA, quando afirma:
“A cultura empresarial – um conflito de interesses surge quando o médico tem um compromisso primário –, acima de tudo o bem-estar do seu doente -, e um compromisso secundário – como o ganho financeiro – que pode anular o outro.”
O importante é reconhecer que esta tensão já lá está mesmo antes do aparecimento do que é chamado de “cultura empresarial”, entendida como a contratação de médicos por parte de organizações de prestação de cuidados de saúde com fins lucrativos. Mesmo na ausência dessas organizações, se o doente pagar directamente ao médico a assistência que receber deste, o mesmo conflito de interesses está presente.
O que é diferente não é tanto o que está na base do conflito de interesses e sim a forma como esse conflito de interesses é resolvido. Tradicionalmente, esse conflito de interesses, essa tensão entre os dois “compromissos” referidos por JLA, era controlado por via do código deontológico dos médicos. As novas versões deste conflito de interesses também terão de receber alguma forma de controle ou monitorização, adequadas aos novos tempos.
20 \20\+00:00 Abril \20\+00:00 2012 às 14:03
O conflito do médico com o doente individual vs o colectivo de doentes está, esteve e estará presente em qualquer acto médico. Quando está terminada a relação individual – médico doente e o acto é avaliado pelo médico, seu orientador, o director ou o gestor do sistema, vemos que doentes diferentes têm tratamentos iguais e doentes iguais tem tratamentos diferentes, por mais equidade que friamente tentarmos fornecer. Os ganhos individuais e o tempo alocado para cada doente é sempre obtido à custa de menos gastos ou menos tempo dedicado a outros ou a outras actividades. O tempo é um dos recursos escassos na equação do fornecimento de cuidados. E já não falo dos outros recursos monetarizáveis.
Esse conflito em última análise até está presente com o desvio do recurso tempo das actividades de lazer ou das actividades familiares. Na arte de ser médico existirá sempre uma tensão, uma sensação de viés quando avaliamos o Sr. António ou a menina Ana e sentimos emoção ou comoção pela sua situação clínica particular e lhe damos mais atenção, prioridade, tratamento mais caro, referência a um colega particular, etc.
Felizmente acreditamos que o código deontológico é sempre aplicado e tratamos todos os doentes o melhor que podemos e conseguimos no momento da prestação e que é o acaso que faz a selecção e não nos questionamos porquê.
Avelina Moniz
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