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Uma prenda de Natal vinda China, no dinheirovivo.pt.

3 comentários

A venda da EDP a capitais chineses pode ser o início de uma relação mais aberta ao mundo, com implicações na própria gestão, o que me levou à reflexão de hoje no dinheirovivo.pt,

Uma prenda de Natal da China

26/12/2011 | 02:48 | Dinheiro Vivo

A venda de 21,35% da EDP à empresa China Three Gorges Corporation constituiu um sucesso deste Governo, e por diversos motivos. Uns gerais, outros particulares a esta opção.

Primeiro, a receita financeira é importante. Numa situação como a actual, não se liga à cor do dinheiro, neste caso à nacionalidade de quem compra. O ter-se tomado uma decisão com base em quem paga mais é um saudável princípio, face a alternativas como a qualidade do projecto industrial ou promessas futuras. Nada como um compromisso claro com o pagar hoje, em lugar de promessas futuras, em geral raramente concretizadas. Claro que a pergunta sobre qual o projecto industrial e de desenvolvimento é importante, mas é precisamente quem mais dinheiro está disposto a meter quem mais acredita que tem a ganhar com o desenvolvimento da empresa. Não creio que se possa pensar que a decisão da empresa chinesa tinha como base ajudar a Portugal, sem pensar no retorno que vai querer retirar do seu investimento. E esse é o maior incentivo a que a empresa seja bem gerida.

Segundo, a ausência de discussão sobre o papel dos centro de decisão nacionais. No passado, essa discussão levou a que empresas portuguesas fossem vendidas a accionistas de outros países, por intermédio de portugueses que tiveram como única função facilitar o processo e no caminho realizaram importantes mais valias. Desde a banca à energia assistiu-se repetidamente ao mesmo padrão. Por não se ter entrado nessa discussão desta vez, seja qual for o motivo que lhe esteja subjacente, foi também um sucesso da operação. A prazo, interessa pouco quem é o proprietário, interessa sim que sejam empresas bem geridas.

Terceiro, aparentemente as questões políticas, mesmo que afloradas de vez em quando – por exemplo, nas notícias sobre conversas de Angela Merkel com o primeiro-ministro português – acabaram por não ter influência decisiva no processo (a atender às informações públicas sobre a venda).

Quarto, não é esperar que a empresa chinesa tenha comprado a EDP com o objectivo de a gerir melhor por trazer consigo melhor capacidade tecnológica ou de gestão. É antes uma situação em que é a empresa chinesa que pode beneficiar da capacidade e conhecimento tecnológico nacional, trazendo quem compra apenas a capacidade financeira que poderá potenciar desenvolvimentos futuros. Creio ser natural pensar-se que o mercado português é pouco relevante para uma empresa chinesa, país em que cidades são maiores, em termos de população, que Portugal inteiro. Será uma empresa com ambições globais. Assim, há a oportunidade de colocar tecnologia portuguesa num mercado globalizado.

Quinto, tem sido referido por vezes que é uma venda que não deixa de ter riscos para Portugal. Afinal, a energia é um sector sensível em qualquer país. Mas Portugal participa já num mercado ibérico de electricidade, a EDP é apenas um dos produtores nesse mercado. A distribuição de energia, como actividade, é por seu lado uma actividade regulada, e não deixará de o ser. Como a venda seria feita de qualquer forma a uma empresa estrangeira, é até provavelmente melhor a prazo que quem compra não tivesse já instalado na Península Ibérica (situação dos alemães).

Sexto, sendo conhecido que muitas outras empresas portuguesas têm hoje importantes accionistas estrangeiros, e que provavelmente outras ainda verão iniciada ou reforçada a abertura a capitais oriundas de outros países, não deixa de ser salutar uma diversificação da origem geográfica desses capitais.

Concorrência pelas empresas nacionais entre capitais internacionais é a melhor forma de obter o máximo valor por essas empresas.

Sétimo, não deixará de ter riscos ter como grande accionista uma empresa cuja propriedade é de outro Estado. Mas aqui temos que confiar que o quadro institucional português, europeu e o enquadramento regulatório cumprirão o seu papel.

Em suma, a venda do capital da EDP aparenta ter sido um sucesso financeiro e político, tem o potencial de a prazo ser um sucesso económico, e constitui uma mudança de regime na forma de Portugal encarar o capital estrangeiro na economia portuguesa. Esta prenda de Natal vinda da China vale pelo dinheiro que traz mas também pelo que é uma mudança de atitude de Portugal face ao capital que vem de fora e sua origem.

Nova School of Business & Economics
ppbarros@novasbe.pt
Escreve à segunda-feira

 

Desconhecida's avatar

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

3 thoughts on “Uma prenda de Natal vinda China, no dinheirovivo.pt.

  1. Daniel Ribeiro's avatar

    Olá Pedro,
    Concordo que parece ter sido de facto uma boa venda. Só ainda não consegui perceber (necessidade à parte) se a decisão de vender foi, em si, boa. Era, talvez, o melhor activo…
    Um abraço
    Daniel

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  2. Luis Melo Gonçalves's avatar

    Boa tarde Pedro
    Em termos gerais concordo com o que escreves sobre o assunto. A minha experiência de lidar com os chineses (e fi-lo durante 15 anos em Macau) leva-me a pensar que eles são extremamente cuidadosos nestas abordagens. Admito que não queiram o controlo efectivo da EDP mas sim uma plataforma para a europa, áfrica e américa latina.
    Registo que após a transferência de soberania de Macau para a China, a concessão atribuída à CEM (Cª Electricidade de Macau – gerida maioritariamente por portugueses-EDP e franceses-Lyonnaise des eaux) não foi beliscada embora legalmente os chineses pudessem ter denunciado o contrato de concessão a partir de 2000. Mesmo quando o contrato expirou em 2010,, a concessão foi renovada embora em moldes mais limitadaos. Se calhar esta postura de abertura em relação à CEM era um prelúdio da sua estratégia em relação à EDP que era accionista da CEM em Macau.
    Aguradamos o desfecho do processo de privatização da REN onde, provavelmente a State Grid (chinesa) seguirá os passos da Three Gorges.
    Um abraço.,

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