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Memorando – quinta revisão (1)

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Bom, vou procurar fazer uma apreciação da quinta revisão do Memorando de Entendimento no que diz respeito à parte da saúde, ao que no Memorando de Entendimento vem na sequência do subtítulo “Health Care System”.

A impressão da primeira leitura é que não há alterações fundamentais, mas alguma coisa mudou, com adiamento de alguns pontos e de introdução de precisão adicional noutros. Os elementos novos não parecem ser muitos.

Os objectivos continuam a ser organizados em três grandes itens:

1) uso mais racional dos serviços e controlo da despesa

2) redução da despesa pública com medicamentos

3) poupanças adicionais nos custos hospitalares e eliminação do problema dos pagamentos atrasados e consequente dívida gerada.

A quantificação do objectivo de despesa pública com medicamentos mantém o “cerca de 1% do PIB” em 2013 nesta parte, mas no ponto 3.45 é dito exactamente “1% do PIB”, o que deixa alguma ambiguidade no ar. O acordo com a APIFARMA (tratado noutro texto a propósito do Orçamento do Estado 2013) permite pensar no processo pelo qual este objectivo da troika será nominalmente alcançado. Mas dadas as tendências de crescimento da despesa com medicamentos em ambiente hospitalar, é de esperar um depois de terminado o objectivo de 2013, se observe novo aumento da despesa pública com medicamentos. O mecanismo de protocolo não é uma garantia de controlo futuro da despesa, apenas garante estes dois anos. Há, por isso, que perceber que mecanismos serão colocados em prática para se conseguir alcançar esse controlo da despesa, ou pelo menos crescimento controlado.

Um dos instrumentos, utilização de mecanismos de avaliação económica, está já em uso há alguns anos, e tem sido criticado por limitar a entrada de medicamentos inovadores. Aspecto que tem sido rebatido com o argumento que muitos medicamentos não são verdadeiramente inovadores. Há aqui claramente a necessidade de fazer uma avaliação do que tem sido essa experiência, em termos de contributo para contenção orçamental e em termos de efeito sobre a saúde dos doentes e sobre as oportunidades de tratamento perdidas.

Outro instrumento é a aplicação e utilização generalizada de orientações de prática clínica que incorporem os aspectos de custos nessa decisão. Só que a dificuldade de fazer essa discussão no que se refere aos medicamentos em ambiente hospitalar esteve bem patente no alarme e exaltação que surgiram com o recente parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. Talvez um ponto de partida seja a mera identificação das situações em que a aplicação de medicamentos não se traduz em qualquer benefício para o doente, pois mais do que tratar ou não tratar os doentes, há uma questão do valor adicional em termos terapêuticos. A incorporação dos elementos de custo deve ser feita a um nível de orientação (que não é lei, e à qual pode haver desvios justificados), e não ao nível de cada doente – não é face a um doente concreto que se terá de decidir se o preço compensa o benefício ou não, e sim numa apreciação genérica sobre as propriedades terapêuticas e custos do medicamento nas situações clínicas em que o mesmo possa ser usado.

Para este caminho, da chamada utilização racional do medicamento – que não é contestada em geral – o Memorando de Entendimento nada diz nem nada obriga, pelo que nos cabe escolher o que fazer. Neste campo, o desafio é olhar para lá do objectivo de despesa em 2013.

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Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

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