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algumas perguntas e respostas sobre taxas moderadoras

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Como de vez em quando recebo perguntas sobre as taxas moderadoras, decidi colocar disponíveis algumas delas, as mais recentes, com ligeiras adaptações, bem como as minhas respostas:

1) O que lhe parecem estes aumentos para 20 e 9,60 euros das taxas moderadoras das urgências e centros de saúde? São compreensíveis, ainda têm essa função “moderadora”, ou são “exagerados”, como ontem se ouviu, passando a constituir já “co-pagamentos” e uma forma de financiamento do SNS?

Não são ainda valores que possam ser considerados uma forma de financiamento do SNS (o que seria difícil dada a previsão de serem no máximo 2% das necessidades de financiamento do SNS). Do meu ponto de vista, são valores compreensíveis. Não creio que alguém deixe de ser tratado em caso de urgência por causa das taxas moderadoras.

Para ter uma ideia dos valores de taxas moderadoras noutros países, ver aqui.
Estes valores colocam-nos entre os valores mais elevados da Europa, mas a Irlanda, que está num processo de ajustamento macroeconómico similar ao nosso, tem taxas moderadoras superiores. A diferença entre os valores nas urgências hospitalares e nos centros de saúde deverá levar as pessoas a utilizarem mais a primeira porta de contacto habitual, o centro de saúde e o atendimento telefónico do SNS.

2) O Ministério da Saúde confirmou a manchete do “Diário Económico” que diz que, em caso algum, poderá ser cobrado mais de 50 euros a um doente por uma ida à urgência, independentemente dos exames efectuados. Parece-lhe uma boa solução? É uma medida razoável ou apenas um “mal menor” para os aumentos?

É uma medida razoável no seguinte sentido. Como o nome indica, a taxa moderadora destina-se a evitar abusos de utilização, ao fazer o utente participar de uma pequena parte do custo financeiro do serviço que vai receber. Ora, no caso de exames complementares a decisão não está na mão do utente, pelo que a taxa moderadora por esses exames faz menos sentido, e servirá quando muito para que o utente tenha a percepção do que está a ser gasto com ele. O limite de 50€ evita que essas outras taxas, que de um ponto de vista lógico de organização de funcionamento do sector até poderiam ser zero, assumam valores demasiado elevados.
3) Defendeu no “Público” que não deviam ser cobrados aos doentes as taxas para exames e meios complementares de diagnóstico e que esta era a oportunidade para fazer essa alteração. Porque não deviam ser cobrados?

Porque se as taxas se destinam a moderar o consumo, interessa influenciar quem decide. Sendo esses exames solicitados pelo médico e não tendo o doente a decisão, não há motivo para ser ele a pagar parte do custo no momento de consumo. É quem tem a decisão nas mãos que deve ser sujeito a taxa moderadora. No caso de decidir ir a uma consulta, o cidadão tem essa decisão, logo deve ser “guiado” de alguma forma pela taxa moderadora nas suas decisões. O argumento deixa de ser válido para os exames complementares, em que o cidadão acata a decisão clínica.
4) Parece-lhe aceitável esta forma de ir anunciando às pinguinhas, e sempre de forma evasiva e pouco clara, estas alterações na saúde?

Não me parece que esteja a ser anunciado da forma que descreve. O Memorando de Entendimento em Maio já falava destes aumentos. Em Setembro fizeram parte de uma resolução do Conselho de Ministros. Foram agora publicados. Sabia-se por isso que iria haver aumentos nas taxas moderadoras. A escolha do momento cabe ao Ministro da Saúde. Estou certo de que se tivesse optado por publicar a portaria, estaria a ser criticado por não transmitir de forma mais abrangente a todos os portugueses. O único aspecto que me parece dever ser melhorado é a existência de mais informação, através de um documento de suporte à decisão que estivesse disponível no portal da saúde, como forma de orientar a discussão. Por exemplo, saber que evidência se tem em Portugal da evolução do recurso às urgências e aos centros de saúde, em que medida depende do preço, quantas urgências são susceptíveis de serem afectadas por esta medida, etc…
5) São estas, no seu entender, as medidas para tornar sustentável o SNS?

Não há uma única medida que torne sustentável o SNS, dentro do quadro actual. Assim, esta é uma das medidas que ajuda a tornar financeiramente sustentável o SNS. Não pelo valor da taxa moderadora que é paga, mas pela melhor utilização de recursos do SNS que origina. Por exemplo, se uma pessoa optar por telefonar para o Saúde 24, e se até conseguir resolver a sua situação desse modo – há casos de sintomas em que se deve esperar antes de recorrer a um médico – evitando uma ida desnecessária à urgência hospitalar de um hospital central, poderá estar a poupar mais de 150€ ao SNS (em média). A taxa moderadora, mesmo que venha a ser de 20€ é menos importante do que a poupança gerada por se evitar utilização desnecessária.

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Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

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