a tentação de usar responsabilidades futuras como se tratasse de bilhetes premiados de lotaria é grande, o que me levou a escrever a contribuição de hoje para o dinheirovivo.pt (original aqui),
Velhos vícios que custam a desaparecer
05/12/2011 | 15:56 | Dinheiro Vivo
Nova School of Business and Economics
A “novidade” da semana foi a declaração do primeiro-ministro de um excedente de 2000 milhões de euros, que logo muitos se apressaram a querer gastar aqui ou ali. Ou a encarar este valor como uma folga orçamental.
Não deixei de ficar completamente baralhado com as reacções e os diversos anúncios. E de relembrar a frase emblemática da semana imediatamente anterior, “viciados em crédito”.
Mas vamos por passos. Este “excedente” resultou de uma medida extraordinária e irrepetível, e foi a forma encontrada de satisfazer o objectivo de défice orçamental para 2011. Mais uma vez, é a utilização de mecanismos extraordinários que permite colocar as contas públicas nos valores de compromisso internacional. Melhor assim do que não cumprir, mas pior do que cumprir sem necessidade destas medidas.
Sendo uma medida extraordinária tem uma contrapartida: a Segurança Social fica responsável por um pagamento futuro de pensões. Segundo o que foi dito, é um pagamento fixo, não suportando os riscos associados com o aumento dessas pensões. Ou seja, recebe-se a verba hoje a troco de pagamentos futuros. Ou ainda de outro modo, contrai-se um “empréstimo” hoje que será pago no futuro. Estas transferências de fundos pensões são apenas uma outra forma de o Estado continuar “viciado em crédito”, e de onerar os orçamentos futuros. Na impossibilidade de aumentar mais a tributação hoje, está aqui uma forma de usar já aumentos futuros de impostos.
Claro que há a esperança que a economia retome o crescimento, e que isso seja suficiente para trazer mais receita fiscal sem alterar taxas de imposto, mas não deixa de ser mais uma fonte de inflexibilidade futura da despesa pública (neste caso, transferências da Segurança Social).
Ora, nestas condições, o dito excedente conforta-me muito pouco. Não se adicione aos encargos futuros uma utilização dessa verba que não traga retorno que os ajude a pagar. Em lugar de serem usados para efeitos distributivos, este valor deveria ser usado para efeitos reprodutivos.
É este o desafio que se coloca, saber usar bem estes “impostos futuros”, embora o início de discussão pouco augure de bom. Nesta linha, o pagamento de dívidas do Estado (que além do mais têm juros de mora) é bem mais relevante nesta perspectiva do que aliviar a tributação adicional de 2011 (o equivalente a meio subsídio de Natal). Contribui também para resolver uma das exigências do Memorando de Entendimento que tem sido mais difícil de cumprir, apesar de só de vez em quando chegar às luzes da ribalta: os atrasos nos pagamentos a fornecedores do Estado. E temo que só o regularizar das dívidas leve bem mais do que os 2000 milhões de euros.
Medidas extraordinárias como esta transferência de fundos de pensões só alimentam os velhos vícios de um Estado “viciado em crédito”, mas pelo menos usemos esses fundos da forma que mais desonere os futuros orçamentos.
Nova School of Business and Economics
Escreve à segunda-feira
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5 \05\+00:00 Dezembro \05\+00:00 2011 às 22:18
Comentário recibido vía facebook:
Manter 3,3B€ é sempre complicado, mesmo quando não existem. Basta que se pense que existem. Mas alguém consegue explicar a esta gente o que é uma política orçamental procíclica?
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