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como vender equipamentos e dispositivos de saúde me tempos de crise?

5 comentários

Um problema interessante que me foi recentemente colocado é o de como os serviços de saúde podem adquirir dispositivos de elevado custo. Tradicionalmente, esses equipamentos são comprados com pagamento à cabeça, com esforço elevado nesse momento.

A questão que naturalmente se coloca é a possibilidade de fazer essa aquisição com pagamento faseado ao longo do tempo, sabendo-se que o equipamento tem uma vida média determinada, digamos 5 anos.

Num contexto de funcionamento normal da economia e do sistema bancário, a resposta mais simples seria quem adquire contrair um empréstimo, pagando depois o equipamento ao longo do tempo. O juro envolvido seria o custo para quem compra de fazer esse deferimento do pagamento. Sendo uma questão de alisamento de despesa ao longo do tempo, é uma operação financeira que deveria ser facilmente coberta pelo sistema financeiro.

Contudo, no momento actual, as dificuldades de acesso ao crédito dificultam, ou tornam mesmo inviável, este caminho.

Será então que os vendedores de equipamentos podem ou devem optar por sistemas de pagamento com faseamento ao longo da vida útil do equipamento? Financeiramente, corresponde a uma prática que já existe em muitas áreas, com instituições próprias.

Se houve vantagem meramente financeira, então esse sistema já deveria ter emergido como forma de venda de equipamento uma vez que seria uma oportunidade de negócio não explorada.

Colocando-se agora a questão, há que perceber com mais detalhe os custos e os benefícios que estejam envolvidos.

Numa situação de ausência de crédito, esta pode ser uma forma de realizar a venda para quem tem o equipamento para venda, aceitando-se que o vendedor conceda implicitamente crédito ao comprador. O custo dessa concessão de crédito acabará por ficar incluído no preço do equipamento, embora possa existir uma certa partilha desse custo entre vendedor e comprador. Não será muito claro, uma vez que as características da operação financeira implícita não serão facilmente distinguíveis na transacção.

Esta solução apresenta o risco, para o vendedor, de não ser pago tudo, ou de ser pago tardiamente. Obriga à elaboração de um contrato plurianual.

Se o contrato for credível no sentido de a instituição de saúde não ter a capacidade legal ou de facto de negar pagamento a tempo e horas, então será uma forma de contornar as restrições financeiras do comprador, embora as colocando do lado do vendedor pois este terá de possuir a capacidade financeira de produzir e pagar os custos do equipamento, mas só receber ao longo do tempo. Será sobretudo uma solução possível para grandes empresas, para as quais o mercado nacional seja apenas uma pequena parte das suas operações.

As soluções de “renting” e “leasing” estão testadas noutros ambientes, mas não é claro que sejam facilmente transportáveis para a área da saúde (nomeadamente, a credibilidade que possa ter manter a utilização de um equipamento quando existe a pressão para adopção de outro mais moderno, e mais caro normalmente).

 

Agora, pode ser que existam outras soluções. Fica à discussão o tema.

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

5 thoughts on “como vender equipamentos e dispositivos de saúde me tempos de crise?

  1. O leasing financeiro está também testado e é utilizado em muitos financiamentos no sector da saúde (para grandes, médias e pequenas empresas), permitindo uma gestão mais eficiente das disponibilidades de tesouraria do fornecedor e respectivas necessidades de equipamento por parte do cliente final (locatário).
    No entanto, o risco associado à operação de leasing depende não só do risco de crédito do locatário como da evolução do preço de mercado para um determinado equipamento.

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  2. Olá Nuno,
    Estava mesmo à espera que pudesses contribuir, as duas questões que me parecem de mais difícil resolução com os mecanismos habituais são:
    a) risco da tecnologia fica obsoleta, e do hospital (ou quem for) querer deixar de pagar
    b) risco de simplesmente não ter verba para pagar, por falta de orçamento – não havendo planeamento pluri-anual no Serviço Nacional de Saúde, cortes de orçamento podem ditar incapacidade de respeitar estes compromissos.

    Ficam estes riscos com a empresa que faz a operação ou com o vendedor? há forma de os mitigar?

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    • A instituição financeira não tem interesse em assumir o risco tecnológico. Assim, caso um equipamento fique obsoleto existe a possibilidade do hospital formalizar acordos de recompra com os fornecedores em estes são executados sob determinadas condições. Este tipo de contratos pode ser interligado com as operações de leasing financeiro quando o acordo de recompra é activado na data de vencimento e pelo valor residual do contrato.
      Os acordos de recompra são formalizados em simultâneo com o contrato de leasing e podem inclusive diluir o risco do financiamento entre locatário e fornecedor. Ou seja, sob determinadas condições previamente definidas, caso o locatário deixe de cumprir o cash-flow do contrato de locação, a divida é transferida para o fornecedor.
      Num contexto de dificuldade em vender equipamentos é uma solução que pode ser explorada mas que não é isenta de risco para os fornecedores (pelo contrário).
      Uma outra hipótese serão os chamados leasings operacionais que podem ter ou não intervenção de instituições financeiras e cujas clausulas contratuais poderão ser menos exigentes.
      De qualquer forma, a inexistência de orçamentos plurianuais no SNS é um factor limitativo a qualquer destes tipos de financiamento de médio prazo. Ainda assim, caso existisse uma linha de financiamento utilizada apenas para cumprimento das responsabilidades assumidas em operações de leasing, os custos do financiamento seriam optimizados ao longo da maturidade dos contratos sempre que não houvesse disponibilidade financeira (vantagem para os locatários) e as instituições financeiras teriam o seu risco de crédito controlado (vantagem para os locadores). As vantagens para os utentes estão implícitas!
      Como os fornecedores têm também interesse em colocar os seus equipamentos, qualquer solução que lhes permita facturar e ter garantia de receber os valores em tempo útil será sempre vantajosa, ainda que tenham de conceder descontos ou assumir acordos de recompra, partilhando o risco tecnológico, operacional ou mesmo risco de crédito com os seus clientes.

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  3. Caro Prof.Pita Barros

    Na area dos dispositivos implantaveis, como por exemplo um CRT-D, ou seja um CDI, que para além de converter um fibrilhação ventricular (coração praticamente não bombeia), permite sincronizar os dois ventriculos(cavidades inferiores do coração), este dispositivo tem indicação 1a (aceite por todos os especialistas na area), para doentes refractarios à terapeutica farmacologica optimalizada.

    está comprovado cientificamente que dos 30% que respodem a esta terapeutica reduzem o numero de internamentos numa UCIC em cerca de 70%, ora os custos por dia numa unidade desta são altissimos.

    Contudo torna-se dificil demonstrar a um administrador esta poupança que é real, com base na sua experiencia de um economista enfocado na saude, na sua opinião, quais poderiam ser os passos a dar?

    obrigado

    joao rocha

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  4. @João Rocha,
    sugerir ao administrador que faça a experiência – escolha alguns doentes em que usa a terapêutica habitual, aplique a nova terapêutica a outros, e faça o respectivo seguimento em termos de custos durante um horizonte de tempo razoável. Pode até sugerir que a empresa paga os custos adicionais do novo dispositivo se excederem os custos da alternativa e na medida do que exceder.
    Ou de uma forma mais, o cepticismo combate-se levando a que a informação seja recolhida pelo céptico ou por alguém em quem ele tenha confiança.

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