Momentos económicos… e não só

About economics in general, health economics most of the time

Da semana passada: Learning by doing com o ChatGPT

Deixe um comentário

Em dois artigos recentes, Luis Aguiar-Conraria (Learning by doing, Expresso, 20 de setembro de 2024) e Paulo Trigo Pereira (Ensaios escritos pelo ChatGPT, Observador, 22 de setembro de 2024) falaram sobre o uso de instrumento de inteligência artificial (IA) por parte dos alunos no ensino superior. Ambos falam do ChatGPT, e existem outras ferramentas de IA que podem ser usadas (há uma que vai gerando parágrafo a parágrafo o texto de um trabalho científico que se queira fazer, por exemplo; outra, ajuda a encontrar referências bibliográficas ligadas a um tema que se escolha ou uma referência que se dê inicialmente; outra ainda, ajuda a sumariar textos científicos fornecidos em formato pdf, com mais precisão do que o ChatGPT). E estou certo que muitas mais vão surgir.

Quer para o Luís Aguiar-Conraria quer para o Paulo Trigo Pereira, a questão não é se os alunos vão usar estas ferramentas – vão, e já usam; e sim como as devemos usar no ensino (universitário, no caso). Tenho total concordância com essa posição, é inevitável que sejam usadas, e em versões sucessivamente mais sofisticadas. O verdadeiro desafio é descobrir como as usar da melhor forma no processo de ensino.

E para isso, experimentar, como ambos referem, é o elemento central, sendo que será muito cedo ainda para sabermos o que será a estabilização na utilização destas ferramentas (como foi no passado o uso da calculadora, do computador e da calculadora científica). 

Tal como em muitos avanços tecnológicos nas mais diversas áreas vamos ter três grandes tipos de mudança:

1) haverá tarefas que serão mais facilmente e mais precisamente feitas por estas ferramentas – não valerá a pena pedir aos alunos que vão ler textos completos nas revistas e livros das bibliotecas universitárias. Esses recursos vão passar a estar disponíveis de outra forma. Não dispensará de ler a fundo os textos que venham a ser cruciais para compreender uma matéria, mas muitos outros serão abreviados. Ganha-se tempo e conveniência.

2) haverá tarefas que passarão a ser realizadas de outra forma – a elaboração de trabalhos passará a ser feita de forma diferente, e como tal a forma de ajudar os alunos nesse processo e depois os avaliar também terá de ser diferente. Provavelmente, dando menor peso ao que vem escrito e mais atenção à discussão que os alunos façam. O que poderá trazer uma evolução curiosa de regresso à oralidade com presença física em vez de leitura de documentos escritos.

3) será possível pedir e realizar trabalhos com estas ferramentas que não era possível pedir antes. Por exemplo, em termos de análises estatísticas, a utilização destas ferramentas como “mentores” e “construtores de código” pode acelerar o seu uso e sofisticação. A sua utilização para garantir que todos os elementos essenciais são cobertos nos trabalhos. Reparo que não estou ainda a ter imaginação suficiente para o que possa ser feito de totalmente de novo neste campo. Haverá certamente ideias novas, associadas até a novas competências, que irão emergir. 

Assim, embora a nossa atenção ainda esteja muito centrada no que vai ser substituído nos processos atuais – e nas avaliações dos elementos habituais, como trabalhos e exames, a parte mais interessante será o que muda. O exemplo de discussão em aula, dado pelo Paulo Trigo Pereira, à volta duma primeira consulta junto do ChatGPT de um conceito é um bom início. Há outras possibilidades: em lugar de dar mais bibliografia para ser lida sobre um tópico, dar dois ou três possibilidades de perguntas a fazer ao ChatGPT (ou outra ferramenta desse tipo), e a partir das respostas os alunos podem partir para a exploração individual, em formato de diálogo. Claro que nalgum momento terá de haver um confronto do resultado desse diálogo com o conhecimento consolidado. Estou certo de que até isso levará a que apareçam ferramentas que o fazem.

Das experiências que tenho feito, a conclusão é simples: de momento, estas ferramentas são mais úteis no processo criativo, incluindo no feedback a dar aos alunos, do que na substituição dos mecanismos de avaliação, como correção de exames ou trabalhos. Até se poderá conseguir usá-las de forma a reduzir o tempo e o trabalho associado com a classificação dos alunos. Só que não será a utilização mais interessante das potencialidades da IA. 

Escrever sobre IA não pode terminar sem se perguntar ao próprio ChatGPT onde poderá ser útil no ensino. Deixo aqui os tópicos sugeridos: AI-Powered Personalized Learning Platforms, Automated Grading Systems, AI-Driven Peer Review and Collaboration Tools, Intelligent Tutoring Systems, AI-Powered Classroom Management, Natural Language Processing (NLP) for Real-Time Feedback, Virtual Classrooms with AI-Enhanced Discussion, AI for Accessibility, Predictive Analytics for Student Success, Gamified Learning with AI, AI-Driven Simulations and Virtual Labs, Lifelong Learning and Upskilling, AI in Curriculum Design.

Repararam certamente que os coloquei em inglês. Fi-lo por uma razão simples, estas ferramentas são muito melhores em inglês do que em português (algo que o Paulo Trigo Pereira também referiu), o que poderá colocar em vantagem quem se sentir mais à vontade a trabalhar em inglês (ou nas línguas em que haja maior “material de treino” para a IA). Também as diferenças entre homens e mulheres no mercado de trabalho poderão ser influenciadas pelas diferenças de utilização destas ferramentes que possam ter. Deixo como sugestão de leitura, este texto, de João Pedro Pereira, sugerido pela Céu Mateus, pelo que tem de implicações para a forma como se desenvolve e promove o seu uso no ensino.

Do conhecimento passado sobre novas tecnologias, sabemos que há sempre um período inicial de muitas direções tentadas. Nem todas terão sucesso. Não conseguimos é em geral perceber à partida quais serão as melhores. Estamos nessa fase de levantar poeira.A pergunta a que vamos ter necessariamente de responder é: Como podemos aproveitar essas ferramentas para melhorar o ensino, sendo a própria noção de ensino poderá mudar? 

Desconhecida's avatar

Autor: Pedro Pita Barros, professor na Nova SBE

Professor de Economia da Universidade Nova de Lisboa.

Deixe um momento económico para discussão...